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Budismo

Quem está sonhando afinal?

Nyoshul Khen Rinpoche (Tibete, 1932 – França, 1999):

De modo último, todas as coisas estão resolvidas na natureza absoluta. Dentro de tais fenômenos que são como sonhos, o que há para adotar e se apegar? O que há para julgar? O que há para rejeitar ou abandonar? Não há nada tanto para pegar quanto largar.

Quando você desperta — quando você reconhece a natureza de sonho das aparências — o que há para fazer? É só um sonho, então e aí?

Não há nada mais a fazer em relação a isso, a não ser conhecer o sonhador, o conhecedor. Quem está sonhando afinal?

“Natural Great Perfection”, cap. 7

28 de outubro de 2011

http://samsara.blog.br/2011/10/quem-esta-sonhando-afinal/
 
Deus no budismo

O Buda, muito longe de negar que havia um Absoluto, garantiu que aqueles que alcançassem a iluminação deveriam se fundir com Isso e assim perceber a Realidade em oposição ao mundo das ilusões e dos fenômenos. O que ele realmente disse, contudo, que tem levado pessoas a acusarem-no de ateísmo, é que não temos nenhum meio de expressar qualquer coisa sobre Isso. Palavras pertencem ao universo dos fenômenos e são aplicáveis apenas à ele. Quando alguém vai além dos fenômenos, em direção à Realidade, palavras precisam obrigatoriamente ser deixadas para trás. Nenhum ensinamento, nenhuma descrição, nenhum pensamento podem expressar o Absoluto — mas podemos experimentá-lo, se suficientemente evoluídos.

O que Buda combateu foram as numerosas tentativas que foram feitas, estão sendo feitas e continuarão a ser feitas, de dizer que o Absoluto é isso ou aquilo, um Deus pessoal, um Criador, um Deus-Pai. Ele insistentemente recusou responder qualquer pergunta sobre o assunto porque isso era inexprimível em palavras. Ele não iria permitir a seus discípulos imaginar um Absoluto a semelhança deles, como é a tendência do homem em todo lugar. Ele assinalou sutilmente que é melhor se ajustar para tentar alcançar a iluminação e, assim, experimentar o Absoluto por si próprio, em vez de perder tempo tentando ineficazmente falar sobre isso, já que nada que possa ser dito sobre Isso pode ser verdade em absoluto. Palavras iriam inevitavelmente modificá-Lo e moldá-Lo, resultando no máximo em uma aproximação grosseira. Palavras podem ser verdadeiras apenas em certo nível, mas apenas nesse nível, portanto serão apenas verdades relativas. Assim, como um entendimento que só funciona por meio de palavras pode conter o que não pode ser colocado em palavras? Apenas pela experiência direta.

Se esse fato tivesse sido assimilado, às custas do orgulho humano, teria havido muito menos intolerância, violência e sofrimento cometidos em nome da religião, entre os vários adeptos de seus seus próprios credos; todos afirmando de maneira confiante e dogmática que somente eles receberam a Verdade e que todos os outros estão errados e devem ser salvos de sua ignorância voluntária.


Então, se não há nenhum Deus no sentido de um Deus pessoal — ou se for compreendido que conceitos de um Deus pessoal, um Criador ou um Deus-Pai, são apenas relativamente verdadeiros e adequados apenas a alguns estágios do desenvolvimento humano — porque há tantas referências aos “deuses” [no budismo tibetano], sugerindo toda uma hierarquia?

A palavra páli “deva” é traduzida como “deus”, mas na verdade significa “espírito”, um ser de um reino superior que, no budismo, pode influenciar seres humanos, ajudar e protegê-los. A Terra não é o único mundo de seres da cosmologia budista. Há incontáveis universos em diferentes planos de existência, isto é, em diferentes estágios de desenvolvimento (espiritual). Alguns são mais elevados que nós (que somos a maioria). Alguns são inferiores. Há muitas referências a seres humanos renascendo em reinos superiores ou inferiores.

Mas, no budismo, não há lugar para a hierarquia massiva da religião Hindu, que acrescentou o próprio Buda a essa hierarquia (até os cristãos fizeram Dele um dos seus santos), nem para a Trindade de Criador, Preservador e Destruidor, nada exceto um Absoluto inexprimível. Em Sua direção as pessoas estão evoluindo ou involuindo, alguns se tornando espíritos de planos superiores, outros afundando em mundos inferiores. E todos pertencem ao mundo dos fenômenos, não à Realidade. Apenas o Absoluto é Real. E nem podemos realmente dizer isso sem declarar algo menor que a Verdade. Mas Ela está lá para ser realizada por alguém com o desejo e determinação como os de Milarepa.


Todo ser humano, todo ser, é um Buda em potencial. Depende de cada um realizar sua própria Natureza Búdica.

Lobzang Jivaka
“The Life of Milarepa”

http://samsara.blog.br/2006/10/deus-no-budismo/
 
Interessante.

O caminho é... caminhar!

MAS o que dizer para o povo? Não dizer? Não falar?

Sim... Caminhar, somente.

O Cristo mesmo nunca escreveu uma palavra sequer...
 
Perguntaram a Buda:

Você é um Deus? Não, ele respondeu.

Então você é um santo? Também não, disse Buda.

Você é o que então? Eu estou acordado, respondeu Buda.

do livro A Ascensão de Prometeus (Robert Anton Wilson)
 
Caos do caminho

Chogyam Trungpa (Tibete, 1939 – Canadá, 1987):

O que você faria se não houvesse conflito? Isso seria mortal. Lidar com conflitos é precisamente a ideia de trilhar o caminho espiritual. O caminho é uma estrada selvagem e retorcida na montanha, com todo tipo de curvas; há animais ferozes, ataques de bandidos, todo tipo de situação surgindo. No que se refere à ocupação da nossa mente, o caos do caminho é a diversão.

“The Dawn of Tantra”
(Ocean of Dharma Quotes of the Week, 10/11/11)

10 de novembro de 2011

http://samsara.blog.br/2011/11/caos-do-caminho/
 
Oração não dual

Joseph Goldstein:

De modo mais profundo, a prece se torna uma maneira de nos darmos conta de que nossa mente é inseparável daqueles a quem estamos orando. Nesse nível, a prece nos desperta para nossa natureza mais profunda. [...]

A prece começa no nível relativo da dualidade — pensando em seres fora de nós mesmos — mas ela também nos conecta com a natureza última da mente. Quem está orando? E para quem?

Stephen L. Carter, em seu livro “Civility”, descreve uma entrevista com Madre Teresa:
Um entrevistador perguntou a Madre Teresa o que ela diz a Deus quando reza.
“Não digo nada”, ela respondeu. “Apenas escuto”.

Então o entrevistador perguntou o que Deus diz para ela.

“Ele não diz nada”, disse Madre Teresa. “Apenas escuta”. E antes que o atônito entrevistador pudesse pressioná-la mais, ela acrescentou: “E se você não compreende isso, não posso explicar para você”.

“One Dharma”, cap. 4
14 de novembro de 2011

http://samsara.blog.br/2011/11/oracao-nao-dual/
 
Fabricações mentais

Sutra Guirlanda de Flores:

Analise o corpo interior:
Quem aqui dentro é o “eu”?
Quem consegue pensar desse modo
Compreenderá a existência ou não do eu.

Este corpo é uma configuração temporária
E não tem local de residência;
Quem compreende este corpo
Não terá nenhum apego a ele.

Considerando o corpo cuidadosamente,
Todas as coisas serão vistas claramente:
Sabendo que todos os elementos são irreais,
A pessoa não irá criar fabricações mentais.

Baseada em quê a vida surge,
E baseada em quê ela desaparece?
Como uma roda de fogo girando,
Seu começo e fim não podem ser determinados.

O sábio pode observar com insight
A impermanência de todos os fenômenos;
Todas as coisas são vazias e sem eu,
Sempre independentes de todos os rótulos.

Todas as consequências nascem de ações;
Como sonhos, não são verdadeiramente reais.
De momento a momento elas continuamente vão morrendo,
Tanto antes quanto depois.

De todas as coisas vistas no mundo
Apenas a mente é a hospedeira;
Ao se apegar a formas conforme sua interpretação
Ela fica iludida, sem correspondência com a realidade.

[...] Pelo poder da relação entre percebedor e objeto percebido
Nascem todos os tipos de coisas;
Elas logo passam, não permanecendo,
Morrendo instante a instante.

“Um bodisatva pede esclarecimento”
Sutra Guirlanda de Flores (Avatamsaka), livro 39
“Flower Ornament Scripture”

18 de novembro de 2011

http://samsara.blog.br/2011/11/fabricacoes-mentais/
 
MUNDOS SEM FUNDAÇÃO

A tradição Mahayana fala não apenas de um, mas de dois sentidos de ego-self: ego do self e ego do fenômeno (dharmas). O ego do self é o apego habitual por um self sobre o qual vimos discutindo. Os Mahayanistas dizem que as primeiras tradições atacaram esse sentido de self, mas não desafiaram a confiança em um mundo existente de forma independente ou nas relações transitórias da mente com esse mundo. Nagarjuna ataca a existência independente de todos os três termos - o sujeito, a relação e o objeto. O que se segue é um exemplo, construído de forma sintética, do tipo de argumento elaborado por Nagarjuna.

O que queremos dizer quando falamos que quem vê existe de forma independente, ou que o que é visto existe de forma independente? Certamente queremos dizer que quem vê existe mesmo quando não está vendo algo; ele existe antes e/ou depois de ver algo. E da mesma forma, queremos dizer que o que é visto existe antes e/ou depois de ser visto por aquele vê. Ou seja, se eu sou o sujeito que vê o que é visto, e eu realmente existo, isso significa que eu posso me afastar e não ver aquilo que pode ser visto - eu posso, em vez disso, escutar algo ou pensar em algo. E se uma coisa que pode ser vista realmente existe, ela deveria ser capaz de permanecer lá mesmo quando eu não a estiver vendo - alguém poderia vê-la em um momento futuro, por exemplo.

Em um exame mais detalhado, entretanto, Nagarjuna mostra que isso faz pouco sentido. Como podemos falar de um sujeito que vê algo, mas que não está vendo o que vê? E, inversamente, como podemos falar de algo visto que não está sendo visto por aquele que o vê? Nem faz sentido dizer que existe um ver independente acontecendo em algum lugar sem qualquer sujeito vendo e sem qualquer coisa sendo vista. A própria condição de um "sujeito que vê", a própria idéia de um sujeito "ver" não pode ser separada das "coisas que ele vê". E vice-versa, como pode o que está sendo visto ser separado do sujeito que vê?

Poderíamos tentar um movimento negativo e responder que tudo isso é verdade e que o sujeito que vê não tem uma existência prévia ao que é visto e ao ato de ver. Mas então como pode um inexistente sujeito que vê dar origem a um ato de ver existente e a algo visto existente? Ou, se procuramos argumentar no sentido oposto e dizer que a coisa vista não existia até que o sujeito que vê a visse, a resposta é "como pode uma coisa inexistente ser vista por um sujeito que vê?

A Mente Incorporada: Ciências Cognitivas e Experiência Humana
Autores: Francisco J. Varela, Evan Thompson, Eleanor Rosch
 
Budismo e psicanálise: Um caminho possível?

Somos seres simbólicos... Seres de imaginação e de identificação. Travamos uma luta conosco e com a vida diariamente. Luta esta, vista e revista em nossas ansiedades, medos e lutos inexoráveis. Vivemos no passado e no "por vir". Nunca estamos presentes no "aqui e agora". A Psicanálise e algumas filosofias orientais, como o Budismo, apresentam várias características singulares, mas também características onipresentes e entrelaçadas entre si. Tanto a Psicanálise quanto o Budismo prorrogam a "presença" no aqui e agora, de maneira a abraçar o acaso e o novo, sem estar a todo tempo atravessado por "fantasmas" do inconsciente e por ilimitadas lembranças do passado, e nem na expectativa de um futuro criado a todo o momento em nossas mentes ávidas.

O Budismo fala muito no conceito de "Vazio". O que é o "Vazio"? Vazio é a presença pura, incondicional e nua da consciência humana. É o estar vivo. É este Vazio que possibilita o "Tudo". Muito diferente do niilismo, que trata da perda de sentido para a vida. Este "estar vivo", esta presença pura e constante, que sempre esteve conosco, mas que de alguma forma nos esquecemos e nos distanciamos, é a presença que nos faz criar, dar sentido ao mundo, nos identificarmos com o mundo, as pessoas, com as coisas, e criar conceitos.

Vemos o mundo através de "Filtros". Filtros de percepção. Tanto a Psicanálise, como a Meditação, as religiões e filosofias transcendentes, como o Budismo, tratam de alterar esses filtros, proporcionando uma renovação constante deles, ou eliminação de muitos deles, descatexizando as fixações de nossas mentes, e trazendo a possibilidade de estar no mundo de forma mais relaxada, compassiva e integrada. Apesar disso, o homem sempre será um criador de conceitos, basicamente um ser desejante; se não quer desejar algo, ou não deseja algo, deseja a ideia de não desejar.

A Psicanálise vem ocupar um canal de nominar ou dar sentido ao Vazio, através de seus próprios conceitos. Já o caminho do budismo consiste em justamente se liberar dos conceitos, e apenas sentir; é ver a vida a partir de outro nível, que ultrapassa a dualidade Inconsciente/Consciente, Ego/Não Ego, Coração/Mente, Racional/Intuitivo, e outras mais, mostrando-nos a prática do "Percebimento". O que o Princípio de Prazer nos diz? Diz que, após um acúmulo de tensão, nos liberamos dessa tensão através do prazer. No Budismo há a velha máxima dita por Buda que fala que o nascimento é sofrimento, envelhecimento e doença são sofrimento, e morte é sofrimento. Mas, ao mesmo tempo, Buda ensinou que existe uma causa para o sofrimento, existe um fim para o sofrimento e existe um caminho de prática que dá um fim ao sofrimento. No Budismo toda felicidade ou prazer atingido na vida nada mais é que uma diminuição do sofrimento, mas que é totalmente fugaz e impermanente, sendo o objetivo de dar fim ao sofrimento o verdadeiro objetivo da vida, que é atingido quando chegamos ao "Nirvana", libertação espiritual ou Iluminação. Então podemos ver que Freud e Buda não estavam tão longe em termos de se entender a penúria do homem e as vicissitudes de seus desejos, prazeres e satisfações. Libertação nada mais é que a libertação das emoções negativas.

Essa tensão que está enraizada em todos nós nada mais é a "agressividade" acumulada e não direcionada para fins positivos. Será que não podemos relacionar isso à chamada "Pulsão de morte", descrita por Freud? Procuramos resgatar um "estado anterior de coisas". Como diz Freud em "Além do Princípio do Prazer": "o objetivo de toda vida é a morte", é o desejo de voltar a ser uma substância inanimada, inorgânica. Freud diz também: "Em última instância, o que deixou sua marca sobre o desenvolvimento dos organismos deve ter sido a história da Terra em que vivemos e de sua relação com o Sol". Isso mostra o que Freud nos quer dizer, ou o que podemos interpretar do que ele disse, que seria o fato de o Sol impor uma "energia", energia essa que criou e desenvolveu a vida. Essa energia podia ser descrita como uma "carga". Uma carga que todos nós procuramos despejar, nos aliviar o tempo todo em nossas vidas. E pode ser liberado através justamente do prazer. Esta "carga" pode tanto compreender essa energia primeva, na qual devemos nos livrar, mas também pode compreender toda a teia organizada em nossa mente, principalmente no inconsciente, que traz todos os traumas conscientes e inconscientes das relações com nossos pais, familiares, amigos, "inimigos"... , ou seja, todas as fantasmagorias neuróticas existentes em nossas mentes. Se levarmos em conta esse conceito de "carga", fica uma proximidade muito grande com aquilo que atende pelo nome de "Karma".

O karma espiritual nada mais é que uma lei de causa e efeito. Esse karma está embutido em nós de tal forma que não tem uma limitação que podemos descrever racionalmente. É uma causa-efeito, mas não tão aparente quanto possa parecer. Uma relação que pode ser vista e revista e comparada à Psicanálise é a compulsão à repetição. Na compulsão à repetição todos os nossos comportamentos condicionados entram em jogo, que aparece na gente como se fosse uma trilha inconsciente neuronal que sempre refaz o mesmo caminho e não deixa espaço para a criatividade e espontaneidade. E uma forma de transformação psíquica disso só pode ser viabilizada por via do Outro, e se "destituindo" de si próprio ou da preocupação excessiva como o próprio Ego ou a auto imagem.

O instinto de Eros nos diz que buscamos sempre esta tal de transcendência com o Outro. Procuramos nos ligar ao outro, às pessoas. São os chamados instintos de vida em contrapartida aos instintos de morte ou pulsão de morte. Eis que surge o amor no meio disso tudo , que é o que nos gera e que dá vazão aos nossos sentimentos. O amor respira a vida. Muitos dizem, em relação ao desejo, que a nossa "carne é fraca", mas se vermos a realidade profunda do amor e do desejo, podemos dizer que a inscrição do desejo se encontra na alma, e não na carne. O amor é a forma de encontramos uma certa fusionalidade com o outro, uma volta à sensibilidade infantil do amor glorioso e oceânico, que um dia pairou por nós como completude. O amor é a via justamente também da saída da repetição de comportamentos e de certas identidades ao que costumamos chamar de "Eu". Através do amparo e desamparo encontrados na relação amorosa se articula uma série de encontros e desencontros com o outro e consigo mesmo.

Como articular uma nova forma de desamparo? Pode haver um descompasso que se trava entre o sujeito e a sua procura de amparo no amor. A criança, no seu amparo materno, seja no campo intrauterino ou na relação com a mãe não tem absoluta consciência disso, mas essa relação - e respectivas consequências psíquicas advindas dela - comandam e dão princípio a todo o "vir a ser" da pessoa. No amor, há uma procura de fechar esse buraco do desamparo, um chamado "prazer negativo". Negativo, pois procura reparar uma perda. Isso já é um aspecto muito clássico do ponto de vista psicanalítico, mas a questão fundamental em que devemos nos remeter é: Será que existe um ponto onde pode haver uma passagem? Uma espécie de transcendência disso tudo no próprio amor? Existe um mais além no amor? A consciência da experiência no mundo "adulto" é mais absoluta em relação à da criança. Consciência, que se diga aqui, é a plena consciência racional e emocional desse chamado "amor". Bion diz no seu livro "Transformações" que, por definição, o termo "consciente" relaciona-se a estados dentro da personalidade: consciência de uma realidade externa é secundária à consciência de uma realidade psíquica interna. Ele ainda diz: "Realmente, consciência de uma realidade externa depende da capacidade da pessoa tolerar ser lembrada de uma realidade interna".

Consciência do afeto, do sentimento, das sensações vividas no próprio corpo, e do corpo em contato com o outro. Isso, absolutamente, está longe da expectativa de fusionalidade. Mas o que de bom pode despertar disso, o que de fato não está ligado nem envolvido com a "agressividade" humana, pode-se dizer que pode haver até uma "agregação" de valor interno e até espiritual muito maior do que pode ter acontecido durante o período da relação mãe-bebê.

Tal possibilidade de pequena transcendência cotidiana reside no fato da experiência ser um fato consciente, onde existe uma consciência reinante sendo vivida na inter-relação entre duas pessoas. Isso não poderia ser muito mais forte e "real" do que a não lembrada vivência narcísica com a mãe? Vivência essa enlutada e distante... Distante do possível prazer presente, prazer esse visível e até positivo, transcendendo a simples cauterização do desamparo. Fato este, consciente, dissociando-se da ideia de inconsciente e pré-consciente. Há uma incredulidade; Um descrédito dos mais desavisados.

Achamos que realmente fomos expulsos do paraíso sem ao menos nunca "realmente" termos estado lá?

Enquanto o amor nos chama, o que também clama por nós é a Compaixão. Aliás, o que é compaixão? É entender no outro essa grande falta que nos corrói e constrói. Essa falta que nos move, mas que pode ser compreendida no outro, também. O Outro não é algo que corrupta sua mente. O outro deve ser visto como alguém tão "castrado" quanto você mesmo. No Budismo há a clara intenção de, na busca pela transcendência, mostrar que ela pode ser realizada via solidão meditativa. A meditação como investigação e redenção de si mesmo é positiva. Mas
isso não tira a necessidade de se estar com o outro, aprender com o outro.

A meditação pode transformar toda essa "carga" ou esse karma? O Dharma é o resultado e forma singela dessa transformação. O conceito de Dharma é se doar aos outros, ter compaixão pelas dificuldades dos outros (inconscientes, fantasiosas e reais), e pelo sentimento e sofrimento dos outros. O Dharma é enxergar o lado positivo da vida, ressignificar, mas não de uma maneira feita por uma tentativa imposta pelo consciente, e sim de uma maneira verdadeira e real, de uma mente já transformada, acolher o outro em sua essência, em seu chamado. Não é gostar da personalidade do outro, mas é compreender incondicionalmente a vida que está fluindo por detrás de todas as máscaras e percepções não reais dos outros, e acolher o outro psiquicamente.

Nossa consciência é como um campo. Um campo onde são plantadas várias coisas durante a vida. E tudo o que acontece de bom ou de ruim gera marcas nesse campo da consciência. E a Psicanálise, onde entra nisso tudo? Em tudo, praticamente... O Saber da Psicanálise consiste em ir além do Princípio da Causalidade. Então, de que forma essa causalidade se dá em nós? Essa causalidade é atemporal; é uma causalidade de transferência, de posterioridade, associativa, paradoxal, e do acaso, isto é, não se limita a um objeto que pode ser catalogado, digerido, e demonstrado por x + y = z. Nesse jogo de energias estão os instintos de vida e morte. As representações psíquicas são limitadas para dar conta do nível de energia da pulsão de morte. A Pulsão de Morte tenta desfazer as ligações psíquicas. E é característica e tarefa de nossa instância psíquica, nosso "Eu", nunca se satisfazer, justamente para dar conta desta "energia". Isso o Budismo fala claramente, de que não há satisfação mundana. O homem procura a todo o momento a realização, a satisfação, mas logo que há uma certa satisfação, já é necessário outro desejo para cumprir com a tarefa de ser feliz. Ser feliz parece ser sempre uma tarefa a ser cumprida, e nunca apenas "Ser" é o bastante, nunca apenas estar "aqui e agora", com a mente clara e vívida, sem desejos, podendo permanecer "aqui" em um estado de pleno contentamento.

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Por Caio Garrido (via Saindo da Matrix - Budismo e psicanálise: Um caminho possível?)
 
Nada a esperar, nenhuma queda a temer

Nyoshul Khen Rinpoche
Nyoshul Khen Rinpoche (Tibete, 1932 – França, 1999):

Todos os pensamentos, sentimentos, emoções, percepções, sensações, estados da mente, conceitos e tudo mais são como nuvens no céu, momentaneamente se reunindo e depois dispersando, se dissolvendo de volta exatamente nesse mesmo espaço. Que bem pode haver em se apegar a isso? Que bem pode haver em tentar se afastar disso?
Tudo é a exibição ilusória, milagrosa, como um sonho, da própria mente de alguém. Não há nada especial a se fazer sobre isso, exceto reconhecer sua natureza verdadeira, sua vacuidade, e ser livre dentro do que quer que pareça surgir.
Não é necessário julgar experiências e pensamentos como bons ou ruins, como desejáveis ou indesejáveis, proveitosos ou improveitosos. Deixe apenas ir e vir do modo como é, sem se envolver demais, sem se identificar com nada, nem cedendo nem seguindo, nem suprimindo nem inibindo. Simplesmente deixe todas as coisas internas e externas aparecerem e desaparecerem à sua própria maneira, apenas como nuvens no céu, e permaneça acima e além disso tudo, mesmo no meio das atividades e responsabilidades diárias.
Há tantas coisas para se fazer neste mundo, mas há apenas uma coisa que uma pessoa precisa conhecer, e isso é a sua própria natureza. Esse é o medicamento universal, a panaceia que cura todos os males e doenças. O que quer que vem, também vai. A própria natureza, o ser fundamental de alguém, está além — não se afeta pelas manchas que surgem ou por fenômenos temporários. Não vem nem vai: permanece imutável. Ao reconhecer isso, a transcendência inata é vivenciada. Então, samsara e nirvana não significam nem esperança nem medo para o praticante; a dualidade não mais prevalece. Não há nada a esperar, nenhuma queda a temer.
Como Guru Rinpoche, Tilopa e Naropa, e o Mahasidda Saraha disseram: “Com objetos externos, não se preocupe. Como objetos internos (o próprio sujeito), não se preocupe. Sem olhar para fora ou dentro, deixe como é: vazio, livre e aberto. Não são os objetos externos que nos prendem, mas sim o apego interno que nos amarra.”
Essa é a instrução essencial dos mahasiddas da India e dos yogues realizados do Tibet. Ela é baseada nas palavras do próprio Buda Shakyamuni, que disse que a raiz de todo sofrimento é se agarrar, se apegar. Não há outro ensinamento além deste. Isso é a raiz de tudo. Esse é o princípio por trás de todas as diferentes explicações.
A sensualidade não está nos objetos, está na mente que deseja, no próprio desejo. O desejo preenche os objetos com a qualidade de serem desejáveis, com sensualidade e valor. De outro modo, o que é desejável de modo absoluto? Tudo depende da mente, do próprio condicionamento da pessoa; o que uma pessoa deseja e aspira, a outra pode repudiar e evitar a todo custo. Não é óbvio isso?

“Natural Great Perfection”, cap. 7
5 de dezembro de 2011

http://samsara.blog.br/2011/12/nada-a-esperar-nenhuma-queda-a-temer/
 
Barreiras contra o dharma

Chogyam Trungpa (Tibete, 1939 – Canadá, 1987):

Tanto faz se você é uma pessoa bondosa, neutra ou agressiva, quando começa a se relacionar com o dharma, com os ensinamentos, você sente que há uma grande barreira, uma grande cerca, entre o dharma e você, que evita que você se encaixe nos ensinamentos ou se comunique com eles.
Quando você começa a abrir os portões e a derrubar os muros, pela primeira vez começa a entender que a piada era sobre você o tempo todo. Acumular munição e construir cerca atrás de cerca foi a sua viagem, sua criação, em vez de algo realmente acontecendo fora. Desperdiçamos tanta energia e recursos nessa viagem.
Quando começamos a compreender que a piada era sobre nós, criada por nós, então estamos de fato seguindo o dharma, seguindo nossa mente de acordo com o dharma.

“The Collected Works of Chogyam Trungpa”, vol. 2, “Aggression”
(Ocean of Dharma Quotes of the Week, 01/12/11)

http://samsara.blog.br/2011/12/barreiras-contra-o-dharma/
14 de dezembro de 2011
 
Caminho Alegre da Boa Fortuna - o completo caminho budista à iluminação (ED. 2010)



"Se olharmos para um céu azul, completamente sem nuvens, não teremos razão alguma para preferir o leste ou o oeste ao leste. Do mesmo modo, quando obtemos a realização da equanimidade, não preferimos algumas pessoas às outras. Todos os seres passam a ser igualmente importantes para nós. Antes de obter essa realização, é como se nosso olhar estivesse mirando um terreno desnivelado. Algumas áreas parecem superiores e outras, inferiores. Nossos problemas pessoais são causados, em sua maioria, por nossa própria mente tendenciosa. Pensamos que nós, nossa família e nossos amigos somos mais importantes que os outros."

GESH KELSANG GYATSO
caminho alegre da boa fortuna.jpg
 
Base das atividades

Dalai Lama (Tibete, 6 de julho de 1935 ~):

No dia-a-dia, se você viver uma boa vida, honestamente, com amor, com compaixão, com menos egoísmo, então, automaticamente, isso vai conduzir ao nirvana. [...] Devemos implementar esses ensinamentos na vida diária. Se você acredita ou não em Deus não importa tanto; se você acredita ou não em Buda não importa tanto; como budista, se você acredita ou não em reencarnação não importa tanto. É preciso viver uma boa vida.
E uma boa vida não significa apenas boa comida, boas roupas, boa casa. Isso não é suficiente. O que é preciso é uma boa motivação: compaixão, sem dogmatismo, sem filosofias complicadas; apenas compreender que os outros são seres humanos irmãos e irmãs e respeitar seus direitos e sua dignidade humana.
Poder ajudar uns aos outros é uma de nossas capacidades humanas únicas. Devemos nos abrir para o sofrimento das outras pessoas; mesmo se você não puder ajudar com dinheiro, mostrar preocupação, dar apoio moral e expressar simpatia são coisas valiosas por si mesmas.
Essa é que deve ser a base das atividades; se chamam isso de religião ou não, não importa. [...] Em minha simples religião, o amor é a motivação-chave.
“Kindness, Clarity and Insight”
(Dharma Quote of The Week – Snow Lion, 18/11/2011)
19 de dezembro de 2011

http://samsara.blog.br/2011/12/base-das-atividades/
 
Prazer e felicidade

Matthieu Ricard (França, 1946 ~):

Apesar de ser intrinsecamente diferente da felicidade, o prazer não é inimigo dela. Tudo depende da maneira como é vivido. Se o prazer está contaminado com um forte desejo e impede a liberdade interior, dando origem à avidez e dependência, é um obstáculo à felicidade. Por outro lado, se é vivido no momento presente, num estado de paz interior e liberdade, o prazer adorna a felicidade sem obscurecê-la.
Uma experiência sensorial agradável, seja ela visual, auditiva, tátil, olfativa, seja gustativa, não estará em oposição a sukha* a menos que esteja maculada pelo apego e gere avidez ou dependência. O prazer torna-se suspeito quando provoca uma necessidade insaciável de repetição.
Por outro lado, quando é vivido perfeitamente no instante presente, como um pássaro que cruza o céu sem deixar nenhum rastro, o prazer não aciona nenhum dos mecanismos de obsessão, sujeição, fadiga ou desilusão que costumam surgir quando experimentamos essas sensações.
O desapego, como sabemos, não é uma rejeição, mas uma liberdade que prevalece quando deixamos de nos atar às causas do sofrimento. Em um estado de paz interior, com conhecimento lúcido de como funciona a nossa mente, um prazer que não obscurece sukha não é indispensável nem temível.
“Felicidade”, cap. 4

* sukha: (sânscrito) êxtase espiritual. Nesse livro, o autor usa o termo em um sentido de “felicidade e plenitude verdadeiras”

21 de dezembro de 2011

http://samsara.blog.br/2011/12/prazer-e-felicidade/
 
OM, homenagem à venerável perfeição da sabedoria!


O bodhisattva Avalokiteshvara, em profunda meditação Prajna Paramita
viu claramente a vacuidade da natureza dos cinco agregados
e libertou-se da dor.

Ó Shariputra, forma não é senão vacuidade,
Vacuidade não é senão forma;

Forma é precisamente vacuidade,
Vacuidade precisamente forma.
Sensação, percepção, reação e consciência,
São também assim.

Ó Shariputra, todas as coisas são expressões da vacuidade.
Não nascidas, não destruídas; não maculadas, não puras,
Sem crescimento nem declínio.
Assim na vacuidade não há forma,
Sensação, percepção, reação nem consciência;
Não há olhos, ouvidos, nariz, língua, corpo, mente;
Não há cor, som, odor, sabor, tato, objeto;
Não há campo de visão nem campo de consciência;
Não há ignorância nem fim da ignorância.
Não há velhice e morte nem cessação da velhice e da morte;
Não há sofrimento nem causa do sofrimento.
Não há caminho, não há sabedoria nem proveito.

Sem proveito – assim os Bodhisattvas vivem esta Prajna Paramita
Sem obstáculos na mente.
Sem obstáculos e por isso sem medo.
Muito para além das ilusões, Nirvana é aqui.
Todos os Budas passados, presentes e futuros vivem esta Prajna Paramita
E alcançam a suprema, perfeita iluminação.

Por isso deves saber que Prajna Paramita é o sagrado mantra;
O mantra de grande sabedoria, o melhor mantra.
O mantra luminoso, o mantra supremo,
O mantra incomparável
Que dissipa todo o sofrimento.
Isto é verdade.
Por isso pratica o mantra da Prajna Paramita
Pratica este mantra e proclama:

GATE GATE PARAGATE PARASAMGATE BODHI SVAHA!

Isto completa o Coração da Venerável Perfeição da Sabedoria.

http://filosofiauniversalista.blogspot.com/2011/11/sutra-do-coracao-vou-alem-mais-alem.html


“Foi, foi, foi para longe, foi inteiramente no longínquo, saudar à Iluminação”
 
Dissolver o ego

Algumas pessoas dizem que a prática budista visa dissolver o eu. Não compreendem que não existe um eu a ser dissolvido. Existe apenas a noção do eu a ser transcendida.

em http://samsara.blog.br/2007/06/dissolver-o-eu/
 
Prajñaparamita Vajracchedika Sutra

O Sutra do Diamante Lapidador da Sabedoria Transcendental


Completo em http://www.dantas.com/budismo/sutra_do_diamante.htm

(...)

Então Subhuti perguntou ao Buddha: "Honrado-Pelo-Mundo, ao atingir a Realização do Incomparável Esclarecimento, o Buddha não obteve qualquer tipo de recompensa?"
Buddha respondeu: "Exatamente isso, Subhuti. Pela Realização do Incomparável Esclarecimento Eu não adquiri nem mesmo a menor coisa; pois de fato dizer que o Buddha 'atingiu a Realização do Incomparável Esclarecimento' não é possível; por isso [tal fato] é chamado 'Realização do Incomparável Esclarecimento'."

(...)

"Subhuti, o que pensais? Ninguém deve imaginar que o Tathagata aprecia a idéia: 'Eu tenho que liberar todos os seres viventes'. Não permitais que ninguém tenha tal pensamento, Subhuti. Por quê? Porque em realidade não há nenhum ser vivente a ser liberado pelo Tathagata. Se houvessem seres viventes passíveis de serem liberados pelo Tathagata, Ele participaria da idéia de Seidade, de uma identidade de personalidade, e de individualidade separada.
"Subhuti, embora as pessoas comuns aceitem o egoísmo como real, o Tathagata declara que o Ego não é diferente do não-Ego. Subhuti, aqueles a quem o Tathagata refere-se como 'pessoas comuns' não são realmente pessoas comuns; são elas apenas chamadas 'pessoas comuns'."

(...)

"Subhuti, se qualquer um viesse a dizer que o Tathagata vem ou vai ou se senta ou reclina-se, ele falha em entender meu ensinamento. Por que? Porque o [assim chamado] Tathagata não vai a parte alguma nem vem de nenhuma parte, por isso é Ele chamado 'o Tathagata'."
 
"Não-violência e covardia são termos contraditórios. A não-violência é a maior das virtudes, enquanto a covardia é o maior dos vícios.
A não-violência provém do amor, a covardia do ódio.
A não-violência sempre sofre, enquanto a covardia sempre gera o sofrimento.
A perfeita não-violência é a maior das bravuras.
Sua conduta não é jamais desmoralizante, enquanto a forma da covardia se conduzir sempre o é."
(Ghandi)
 
O Silêncio. Parar o Diálogo Interno. Não Pensar. Acabar com a Mente.

M = Mestre
D = Discípulo

M: Sábio filho, abandone a mente – o atributo limitador que origina a individualidade, assim causando a grande enfermidade de repetidos nascimentos e mortes – e realize Brahman.

D: Mestre, como se pode extinguir a mente? Não é muito difícil? Não é a mente muito vigorosa, inquieta e sempre vacilante? Como se pode renunciar à mente?

M: Abandonar a mente é muito fácil, tão fácil quanto amassar uma flor delicada, tirar um fio de cabelo da manteiga ou piscar os olhos. Não tenha dúvida. Para um buscador resoluto, senhor de si e não enfeitiçado pelos sentidos, que pelo intenso desapaixonamento se tornou indiferente aos objetos externos, não pode haver a menor dificuldade em abandonar a mente.

D: Como pode ser tão fácil?

M: A questão da dificuldade só surge quando há uma mente a ser renunciada. Verdadeiramente falando, não existe mente. Quando lhe dizem: “Aqui tem um fantasma”, a criança ignorante é levada a acreditar na existência do fantasma inexistente, ficando sujeita ao medo, ao sofrimento e aos incômodos. Da mesma forma no imaculado Brahman, ao imaginar coisas que não existem – como isto e aquilo – uma falsa entidade conhecida como mente surge como algo aparentemente real, funcionando como isto e aquilo e mostrando-se incontrolável e poderosa ao incauto; porém, para o buscador senhor de si e dotado de discernimento, conhecedor da natureza da mente, ela é fácil de ser abandonada. Só um tolo, ignorante da natureza da mente, diz que é muito difícil.

D: Qual é a natureza da mente?

M: Pensar nisto e naquilo. Na ausência de pensamento, não existe mente. Extinguindo-se os pensamentos, a mente permanecerá apenas em nome, tal como o chifre de uma lebre; desaparecerá como uma não entidade, como o filho de uma mulher estéril, o chifre de uma lebre, ou uma flor no céu. Isto também é mencionado no Yoga Vasishta.

D: Como?

M: Vasishta diz: “Ouve, ó Rama, nada há chamado ‘mente’. Assim como o espaço existe sem forma, também a mente existe como um vazio inanimado. Permanece apenas como nome; ela não tem forma. Não está no exterior, nem no coração. Entretanto, como o espaço, a mente, embora não tenha forma, preenche tudo.”

D: Como pode ser assim?

M: Onde quer que o pensamento surja como isto e aquilo, lá estará a mente.

D: Se existe mente onde quer que haja pensamento, mente e pensamento são diferentes?

M: O pensamento é o sinal da mente. Quando surge um pensamento, pressupõe-se uma mente. Na ausência de pensamentos, não pode haver mente. Portanto, a mente nada mais é do que pensamento. O pensamento é, em si, a mente.

D: O que é “pensamento”?

M: “Pensamento” é imaginação. O estado livre de pensamentos é a Suprema Bem-aventurança (Sivasvarupa). Os pensamentos são de dois tipos: a evocação de coisas experienciadas e não experienciadas.

D: Para começar, por favor diga-me o que é “pensamento”.

M: Os sábios dizem que nada mais é do que pensar em qualquer objeto externo como isto ou aquilo, é ou não é, deste ou daquele jeito, etc.

D: Como isto pode ser classificado sob o título de coisas experienciadas e não experienciadas?

M: Dos objetos dos sentidos (como o som, etc.) já experienciados – como “eu vi”, “eu ouvi”, “eu toquei”, etc. – pensar neles como tendo sido vistos, ouvidos e tocados é evocar coisas já experienciadas. Trazer à mente objetos dos sentidos não experienciados é o pensamento sobre coisas não experienciadas.

D: Como, então, é possível extinguir a mente?

M: Esquecer tudo é o meio supremo. O mundo não surge, a não ser pelo pensamento. Não pense e o mundo não surgirá. Quando nada surge na mente, a própria mente é perdida. Portanto, não pense em nada; esqueça tudo. Este é o melhor modo de matar a mente.

D: Alguém já disse isto antes?

M: Vasishta assim falou a Rama:

Vasishta: Elimine os pensamentos de todos os tipos – de coisas apreciadas, não apreciadas, ou outras. Como a madeira, ou a pedra, permaneça livre de pensamentos.

Rama: Devo eu esquecer tudo, completamente?

Vasishta: Exatamente, esqueça tudo completamente e permaneça como a madeira ou a pedra.

Rama: O resultado será a estagnação, como a das pedras ou da madeira.

Vasishta: Não é assim. Tudo isso é apenas ilusão. Esquecendo a ilusão, você estará livre dela. Embora pareça estar estagnado, você será a própria Beatitude. O seu intelecto ficará inteiramente claro e aguçado. Sem se embaraçar na vida mundana, mas parecendo ativo aos outros, permaneça como a própria Beatitude de Brahman e seja feliz. Diferentemente da cor azul do céu, não permita que a ilusão do mundo renasça no puro Espaço do Ser-Consciência. Esquecer essa ilusão é o único modo de matar a mente e permanecer como Bem-aventurança. Mesmo que Shiva, Vishnu ou o Próprio Brahman sejam seus mestres, a realização não é possível sem este meio. Sem esquecer tudo é impossível estabelecer-se enquanto Ser. Portanto, esqueça tudo, inteiramente.

D: Não é muito difícil?

M: Embora seja difícil para o ignorante, é muito fácil para os poucos que discernem. Nunca pense em nada, exceto no Brahman único e ininterrupto. Praticando isso longamente, você esquecerá facilmente o não-Ser. Não pode ser difícil ficar quieto, sem pensar em nada. Não deixe nenhum pensamento surgir na mente; pense sempre em Brahman. Assim, todos os pensamentos mundanos desaparecerão e só restará o pensamento de Brahman. Quando isso se tornar firme, esqueça até mesmo isso e, sem pensar “eu sou Brahman”, seja o próprio Brahman. Não pode ser difícil de praticar.

Agora, meu sábio filho, siga este conselho: pare de pensar em qualquer outra coisa que não seja Brahman. Com esta prática, a sua mente será extinta; você esquecerá tudo e permanecerá puramente como Brahman.

Luzes de Nisargadatta Maharaj

Aprofunde na percepção do “Eu Sou” e você encontrará. Como se encontra algo que você ignora ou se esqueceu? Você o mantém em mente até se lembrar. A percepção de ser, do “Eu sou” é a primeira a emergir. Pergunte-se de onde ela vem ou apenas observe-a em silêncio. Quando a mente permanece no “Eu sou”, sem se mover, você entra em um estado que não pode ser verbalizado mas pode ser experienciado. Tudo o que você precisa fazer é tentar e tentar novamente.
 
Objetivo dos ensinamentos sobre a Natureza Buda

Longchenpa, ou Longchen Rabjampa
Então qual é o propósito dos ensinamentos sobre a natureza Buda, que é sutil e difícil de analisar, já que não serão compreendidos por pessoas comuns?
Há cinco méritos em apontar a presença da natureza Buda:
  1. o medo será removido e a pessoa ficará ansiosa para alcançar liberação, sabendo que não é difícil de concretizar
  2. a arrogância em relação aos outros seres será removida, e a pessoa se tornará respeitosa em relação a todos, que são iguais aos Budas, assim como em relação ao nosso mestre
  3. a ignorância em relação à presença do significado absoluto — que são as visões dos kayas e sabedorias — será removida de nossas mentes, e a sabedoria da realização do estado último surgirá
  4. ao compreender a natureza dessa maneira, a pessoa acaba com os extremos do eternalismo e do nihilismo, e a sabedoria primordial da compreensão do significado perfeito irá surgir
  5. o sentimento de importância do eu e o apego ao ego serão removidos, a pessoa verá eu e outros como iguais, e irá desenvolver grande amor por todos.

http://samsara.blog.br/2010/06/objetivo-dos-ensinamentos-sobre-a-natureza-buda/
 
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