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Aqui discutimos micologia amadora e enteogenia.

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Budismo

"Na verdade, que mais aprendi com os mestres que escutei, com os filósofos que li, com as sociedades que visitei e com essa própria ciência da qual o Ocidente se orgulha, senão fragmentos de lições que, unidos uns aos outros, reconstituem a meditação do Sábio ao pé da árvore? Todo esforço para compreender destrói o objeto a que estávamos ligados, em benefício de um esforço que o suprime em benefício de um terceiro, e assim por diante, até chegarmos à única presença durável, que é esta em que desaparece a distinção entre o sentido e a ausência de sentido: a mesma de onde partíramos. Já se vão 2500 anos que os homens descobriram e formularam essas verdades. Desde então, nada descobrimos, a não ser - experimentando, após outros, todas as portas de saída - outras tantas demonstrações suplementares da conclusão de que gostaríamos de escapar."


Claude Lévi-Strauss - Tristes Trópicos (pg. 389, Cia. das Letras, 1996)
 
Orgulho e fracasso de sonho

Reconhecer a continuidade e a penetração por toda parte dessa natureza de vacuidade, essa ausência de qualquer existência verdadeira, é reconhecer a verdade absoluta. Esse é o estado natural da mente, intocado por qualquer obscurecimento, em que todos os fenômenos são vistos como os Budas os vêm, como sonhos ou ilusões mágicas.
Aqui, pensamentos não fazem surgir emoções negativas ou acúmulo de karma, circunstâncias favoráveis não geram nem orgulho nem apego, e circunstâncias adversas são rapidamente transformadas no caminho da iluminação — por exemplo, encontrar alguém que te irrita, em vez de causar raiva, ajuda a gerar compaixão e se torna uma chance para o reconhecimento da verdade absoluta que é inseparável da bodhicitta*.
Se for incapaz de abrir mão do apego às coisas, você simplesmente falhou em reconhecer a natureza vazia delas. Uma vez que compreender essa natureza de vacuidade, você não mais sentirá orgulho por sucesso de sonho ou depressão por fracasso de sonho.

Dilgo Khyentse Rinpoche (Tibete, 1910 – Butão, 1991)

“The Heart Treasure of The Enlightened Ones”, v. 41

* bodhicitta: aspiração à iluminação com a intenção de beneficiar todos os seres

http://samsara.blog.br/2011/06/orgulho-e-fracasso-de-sonho/
 
Transfiguração

Veja a imensa esfera de conhecimento do melhor entre os seres;
Sabendo quando é a hora certa e quando não é, ele ensina a verdade às pessoas.

Destruindo os diversos argumentos lançados pelos hereges,
Ele demonstra as transfigurações espirituais dos seres conforme suas disposições.

Buda não é finito ou infinito:
O grande sábio transcendeu finitude ou inifinitude.

Como o sol atravessando o céu dando luz todo dia,
Assim faz o guia sagaz, independente de presente, passado e futuro.

Assim como o globo da lua cheia brilha à noite,
Assim cada pessoa vê o guia, repleto de qualidades puras.

Assim como o globo do sol cruza o espaço sem interrupção,
Assim é a transfiguração do Buda.

Assim como o espaço é independente de qualquer terra,
Assim a transfiguração do Buda, a Lâmpada do Mundo, é conhecida.

Assim como a terra é o suporte de todos os seres corpóreos no mundo,
Tão firme é a roda do ensinamento da Lâmpada do Mundo.

Assim como o vento sopra rapidamente pelo céu, não se fixando a nada,
Do mesmo modo a natureza Buda opera no mundo.

Assim como todas as terras são fundadas em uma massa de água,
Do mesmo modo, os budas de todos os tempos são fundados em uma massa de conhecimento.

“Entrada no Reino da Realidade” (Gandavyuha Sutra)
(Avatamsaka Sutra, livro 39)
“Flower Ornament Scripture”

http://samsara.blog.br/2011/06/transfiguracao/
 
Não é propriamente um texto budista, mas é inspirado pela figura de Buda. E é uma das passagens mais marcantes de Sidarta, de Herman Hesse.

"Sidarta, porém, vagueou pelo bosque, entregue aos seus pensamentos.

Foi nesse momento que Gotama, o Augusto, cruzou-lhe o caminho. O jovem saudou-o reverentemente e quando notou o olhar bondoso, sereno, do Buda, encheu-se de coragem. Pediu ao Venerável que lhe desse licença para falar. Com um aceno silencioso, o Augusto anuiu.

E Sidarta começou:

— Ontem, ó Majestoso, coube-me em sorte ouvir a tua maravilhosa doutrina. Junto com meu amigo, vim de longe, a fim de conhecê-la. E agora meu amigo aderiu aos teus discípulos, abrigando-se na tua proximidade. Eu, porém, hei de reiniciar a minha peregrinação.

— À vontade — tornou o Venerável, cortêsmente.

— Minha palavras são excessivamente audaciosas — continuou Sidarta — mas não quero separar-me do Augusto, sem ter-lhe comunicado, com toda a franqueza, os meus pensamentos. Consentiria o Venerável em prestar-me atenção por mais um instante?

Silencioso, o Buda deu anuência.

— Há uma coisa, ó Venerabilíssimo, — prosseguiu Sidarta — que despertou em mim especial admiração, logo que conheci a tua doutrina. Nessa doutrina, tudo fica completamente claro. Tudo é demonstrado. Tu mostras o mundo sob a forma de uma corrente perfeita, jamais e nenhures interrompida, corrente eterna, constituída de causas e efeitos. Nunca, em parte alguma, isso se percebeu com tamanha nitidez, nem tampouco foi exposto tão irrefutavelmente. Realmente, os corações de todos os brâmanes deverão vibrar de alegria, quando seus olhos enxergarem o cosmo através de tua doutrina, esse cosmo que forma um conjunto inteiriço, sem lacunas, límpido como cristal, não depen dente nem do acaso nem dos deuses. Se o mundo é bom ou mau, se a vida em seus confins é sofrimento ou prazer, essa pergunta pode permanecer sem resposta. Pede ser que aquilo tenha pouca importância. Mas a unidade do mundo, o nexo existente entre todos os acontecimentos, o fato de todas as coisas, tanto as grandes como as pequenas, estarem incluídas no mesmo decorrer, na mesma lei das causas, do devir e do morrer — tudo isso, ó Augusto, ressalta luminosamente na tua excelsa doutrina.

Mas, nessa mesma doutrina, há um único lugar em que tal unidade e lógica das coisas estejam interrompidas. Por uma minúscula lacuna penetra na unidade desse mundo um elemento estranho, novo, que antes não existiu, que não pode ser mostrado nem comprovado. Refiro-me à tua tese acerca da possibilidade de superarmos o mundo e alcançarmos a redenção. Ora, essa pequeníssima lacuna, essa brechazinha, basta para destruir e liquidar toda a unidade e eternidade da lei cósmica. Perdoa-me a audácia de ter feito esta objeção.

Silencioso, impassível, escutara Gotama. A seguir falou o Homem Perfeito, na sua voz delicada e clara:

— Ouviste a doutrina, ó filho de brãmane e honra-te teres meditado profundamente a seu respeito. Enconíraste nela uma lacuna, uma falha. Continua a refletir sobre ela. Permite-me, porém, ó moço ávido de saber, que te advirta do emaranhamento das opiniões e da disputa acerca das palavras. Pouco valor têm as opiniões, sejam elas lindas ou feias, sensatas ou estúpidas. Qualquer um pode agarrar-se a elas ou também refutá-las. Mas a doutrina que ouviste da minha boca não é nenhuma opinião e não tem o propósito de explicar o mundo a pessoas ávidas de saber. Seu desígnio é a redenção do sofrimento. O que Gotama ensina é ela e nada mais.

— Não tenhas rancor contra mim, ó Augusto — disse o jovem. — Não me dirigi a ti para discutir contigo, para provocar uma disputa em torno de palavras. Deveras tens razão: pouco valor têm as opiniões. Mas, com tua licença, direi mais uma coisa: não duvidei de ti nenhum instante. Não duvidei em absoluto de que és o Buda, de que alcançaste o objetivo supremo a cuja busca se encaminharam tantos milhares de brâmanes e filhos de brâmanes. Obíiveste a redenção da morte! Ela te coube em virtude do teu próprio empenho, pelo método que é teu, pelo pensamento, pela meditação, pelo conhecimento, pela iluminação. Não a conseguisíe através da doutrina! E — eis o meu raciocínio, ó Augusto — ninguém chega à redenção me diante a doutrina! A pessoa .alguma, ó Venerável, poderás comunicar e revelar por meio de palavras ou ensinamentos o que se deu contigo na hora da tua iluminação! Ela contém muita coisa, a doutrina do esclarecido Buda. A numerosas pessoas indica o caminho para uma vida honesta, afastada do Mal. Mas há uma única coisa que não se acha nessa doutrina, por mais clara e veneranda que ela seja. Não nos é dado saber o segredo daquela experiência que teve o próprio Augusto, só Tú entre centenas de milhares de homens. São esses os pensamentos e as percepções que me vieram» quando ouvi a doutrina. Por isso, hei de prosseguir na minha peregrinação, não para ir à procura de outra doutrina melhor, já que sei muito bem que não há nenhuma, senão para separar-me de quaisquer doutrinas e mestres, a fim de que possa alcançar sozinho o meu destino ou então morrer. Contudo me lembrarei freqüentemente deste dia, ó Sublime, e desta hora, na qual um santo se deparou aos meus olhos.

Serenamente, o Buda fitava o chão. Placidamente, com perfeita impassibilidade, luzia o rosto inescrutável.

— Oxalá — disse lentamente o Venerável — que teus pensamentos não sejam erros! Que te seja permitido alcançar o teu destino! Mas, dize-me: viste a multidão de meus samaws, o sem-número de meus irmãos, que se agasalharam na minha doutrina? E achas, ó samana forasteiro, achas realmente que seria melhor para todos eles que abandonassem a doutrina e regressassem à vida do mundo e dos prazeres?

— Longe de mim pensar semelhante coisa — exclamou Sidarta. — Que eles continuem fiéis à tua doutrina e realizem os seus propósitos! Não me cumpre julgar a vida de outrem. Devo opinar, escolher, rejeitar unicamente no que se refere a mim mesmo. Nós, os samanas, procuramos a redenção do eu, ó Augusto. Ora, se eu fosse um dos teus discípulos, ó Venerável, poderia acontecer-me — assim receio — que meu eu só aparentemente, falazmente obtivesse sossego e redenção, mas na realidade continuasse a viver e a crescer, uma vez que eu teria então a tua doutrina, teria o fato de ser teu adepto, teria meu amor a ti, teria a comunidade dos monges e faria de tudo isso o meu eu.

Esboçando um meio-sorriso, Gotama contemplava o forasteiro com inabalável clareza e bondade. A seguir, despedindo-o com um gesto quase imperceptível, disse o Augusto:

— És inteligente, ó samana. Sabes falar inteligentemente, mas, meu amigo, acautela-te contra o excesso de inteligência!"
 
Última edição:
Seguem algumas palavrinhas de Buda Shakyamuni, mais conhecido como Siddharta Gautama:

“Agora Kalamas, não se deixem levar pelos relatos, pelas tradições, pelos rumores, por aquilo que está nas escrituras, pela razão, pela inferência, pela analogia, pela competência/credibilidade de alguém, em respeito por alguém ou pela referência ao pensamento de que tudo que eu falo pode ser considerado verdade literal"
Kalama Sutta

“A pessoa que compra ouro [se não quiser ser enganada] deve testá-lo aquecendo-o, esfregando-o e dobrando-o para verificar sua autenticidade. Esse é o modo pelo qual deve ser entendido meu ensinamento: depois de ser testado e não por mero respeito ou aceitação. Só aceite aquilo que for útil e benéfico".
Jñanasara Samuccaya (citado por Aryadeva, do séc. III d.C.)
 
Ilusão como oportunidade

Somos facilmente enganados por maya. Todo o show dos nossos sentidos tem nos iludido fazendo-nos acreditar nele e, assim, nos seduzindo para um mundo de sofrimento. E o ilusionista é aquele velho pregador de peças: a própria mente da pessoa.

Mas quando essa natureza ilusória é reconhecida como sendo apenas isso, a pessoa é libertada das amarras do show de mágica, momento em que isso se torna um espetáculo maravilhoso e até mesmo uma demonstração da criatividade e liberdade desimpedidas da mente. Então, a própria maya é tanto o meio para essa compreensão quanto sua expressão.

Esse método consciente e intencional de se relacionar com todos os fenômenos como sendo ilusões se posiciona assim de forma totalmente positiva no caminho espiritual, uma completa reviravolta em relação ao julgamento original negativo que via isso como uma enganação. Agora, a ilusão é vista como clareamento e oportunidade.

A natureza de nossa relação com isso é o ponto em destaque, em vez da natureza da ilusão, que certamente não existe mesmo, de qualquer modo.

Aryadeva diz:

Já que tudo é uma exibição ilusória,
é possível alcançar a iluminação.
[...]

Sarah Harding, em “Niguma, Lady of Illusion”
(Dharma Quote of The Week – Snow Lion, 24/03/11)


http://samsara.blog.br/2011/08/ilusao-como-oportunidade/
 
Primeira Nobre Verdade

Yongey Mingyur Rinpoche

A primeira das Quatro Nobres Verdades é conhecida como a Verdade do Sofrimento. [...]

À primeira vista, pode parecer bem depressivo. Ao ouvir ou ler sobre isso muitas pessoas acabam desconsiderando o budismo como algo indevidamente pessimista. “Ah, esses budistas estão sempre reclamando que a vida é miserável. A única maneira de ser feliz é renunciar ao mundo e partir para alguma montanha, meditando o dia todo. Que tédio! Não sou miserável. Minha vida á maravilhosa!”.

É importante, antes de tudo, notar que os ensinamentos budistas não dizem que, para encontrar verdadeira liberdade, as pessoas precisam abandonar suas casas, empregos, carros e qualquer posse material. Como sua história de vida demonstra, o próprio Buda tentou uma vida de extrema austeridade sem encontrar a paz que buscava.

Além disso, não há como negar que, para algumas pessoas, as circunstâncias podem se juntar por um tempo de tal modo que parece impossível uma vida melhor. Já encontrei muitas pessoas que pareciam bem satisfeitas com suas vidas. Se perguntasse como estão, elas responderiam: “Bem!” ou “Ótimo!”. Até, obviamente, ficarem doentes, perderem o emprego ou seus filhos chegarem na adolescência e, de repente, se transformarem de seres afetuosos e alegres em impacientes estranhos mal-humorados que não querem mais nada com os pais.

Então, se eu perguntar como vão as coisas, a resposta muda um pouco: “Estou bem, tirando o fato de que…” ou “Tudo está ótimo, mas…”.

Essa é, talvez, a mensagem essencial da Primeira Nobre Verdade: a vida costuma interromper as coisas, causando mesmo entre os mais contentes surpresas momentâneas. Tais surpresas — junto com experiências mais sutis e menos perceptíveis como as dores que vêm com a velhice ou a frustração de esperar numa fila na padaria ou simplesmente chegar atrasado em um compromisso — podem ser todas compreendidas como manifestações do sofrimento.

No entanto, entendo porque essa perspectiva mais abrangente pode ser difícil de compreender. “Sofrimento”, usado nas traduções da Primeira Nobre Verdade, é um termo carregado. Quando as pessoas leem ou escutam isso tendem a pensar que só se refere a dor extrema ou angústia crônica.

Mas “dukkha”, a palavra usada nos sutras, na verdade é mais próxima de termos de uso comum no mundo moderno como “inquietação”, “mal estar”, “desconforto” e “insatisfação”. [...]

Então, enquanto o sofrimento — ou dukkha — se refere sim a condições extremas, o termo [...] é melhor compreendido como um sentimento constante de que “algo ainda não está perfeito”: que a vida seria melhor caso as circunstâncias fossem diferentes; que seríamos mais felizes se fôssemos mais jovens, magros ou ricos, se estivéssemos em um relacionamento ou então fora dele. A lista de angústias não tem fim.

Dukkha assim abraça todo o raio de condições, desde algo tão simples como uma coceira a experiências mais traumáticas como dor crônica ou doenças fatais. Talvez algum dia a palavra dukkha seja aceita em muitas culturas e línguas diferentes, do mesmo modo que a palavra sânscrita “karma”, nos dando uma compreensão mais ampla da palavra que costuma ser traduzida como “sofrimento”.

Assim como ter um médico que identifique os sintomas é o primeiro passo para tratar uma doença, compreender dukkha como a condição básica da vida é o primeiro passo para se livrar do desconforto e inquietação. Na verdade, para algumas pessoas, apenas ouvir a Primeira Nobre Verdade pode ser uma experiência libertadora em si mesma. Um antigo aluno meu recentemente admitiu que por toda sua infância e adolescência sempre se sentiu alienado de todos ao redor. Eles eram mais espertos que ele, se vestiam melhor, pareciam interagir sem qualquer esforço. Parecia que todas as outras pessoas tinham ganhado um “Manual da Felicidade” ao nascer e esqueceram de dar um a ele.

Mais tarde, quando estudou filosofia oriental na faculdade, se deparou com as Quatro Nobres Verdades, e toda sua percepção começou a mudar. Ele compreendeu que não estava sozinho em seu desconforto. Na verdade, inaptidão e alienação são experiências compartilhadas pelas pessoas há séculos. Ele pôde largar aquela triste história sobre não ter um “Manual da Felicidade” e simplesmente apenas ser exatamente como era.

Não que não houvesse trabalho a ser feito, mas pelo menos ele poderia parar de fingir que pertencia, sendo que na verdade se sentia de outro jeito. Ele pode começar a trabalhar com seu sentimento básico de inadequação não como um estranho solitário, mas como alguém que tem um traço em comum com o restante da humanidade. Também passou a ter menos chances de ser pego desprevenido quando sentia suas maneiras particulares de sofrimento [...].

Yongey Mingyur Rinpoche (Nepal, 1975 ~)
“Joyful Wisdom”, 1 | 2

http://samsara.blog.br/2011/08/primeira-nobre-verdade/
 
San Mitsu: Os Três Mistérios do Budismo Shingon

O Budismo Shingon é uma escola do budismo esotérico fundada pelo monge Kobo Daishi, também chamado de Kūkai, no início do período Heian no Japão. O Shingon segue a linha do Vajrayana e preceitua que a iluminação búdica pode ser alcançada por todos ainda nesta vida através da observação do San Mitsu (os Três Segredos ou Três Mistérios): as atividades simbólicas Corpo, Palavra e Mente.

Os Três Mistérios estão presentes em todas as coisas que compõe o Universo, pois o Universo contém em si todos os ensinamentos de Buda. Assim, quando falamos em praticar os ensinamentos de Buda, nós estamos falando de três coisas: shinmitsu, kumitsu e imitsu.

1. Quando juntamos as mãos em frente ao corpo (gasshou – pronuncia-se gasshô), isso é chamado “o mistério da ação dos corpos” (shinmitsu)
2. Quando recitamos mantras, isso é chamado “o mistério da palavra” (kumitsu)
3. Quando meditamos, isso é chamado “o mistério da mente” (imitsu)

O Segredo do Corpo: Mudra

Os mudras expressam a forma da atividade secreta do corpo, e simbolicamente criam uma conexão entre o praticante e o universo. O Monge Kūkai, fundador da escola Shingon, assim escreveu:

“Se os Budas estão no reino do Dharma, eles existem dentro de meu corpo. Se eu também sou do reino do Dharma, então eu existo dentro dos Budas”.
A atividade secreta do Corpo é o uso da energia a partir da matéria; isto é, é a utilização das coisas físicas e materiais presentes no plano denso para utilização da energia dos planos mais sutis. Em outras palavras, para facilitar o entendimento deste ensinamento, podemos dizer que mudra designa qualquer coisa material e física que é empregada para gerar e utilizar energia, proporcionando, assim, a conexão do seu praticante com o Universo.

O Segredo da Palavra: Mantra

A atividade secreta da palavra é expressa através dos mantras e dos dharanis, que são fórmulas de invocação. Assim escreveu o Monge Kūkai:

“Ao vocalizar as sílabas de maneira clara e compreensiva, a verdade se manifesta. O que é chamado? A verdade das sílabas vocalizadas? São os três segredos nos quais todas as coisas e Buda são iguais. Essa é a essência original de todos os seres”.

A escola Shingon descreve os mantras em termos de som, do sânscrito escrito, e do significado simbólico.
O mantra é, portanto, o nome primordial, a verdadeira palavra que carrega o seu poder originário de criação; é a atividade secreta da palavra que traz consigo a essência de todos os seres. Ele age a partir da vibração, sendo o som a sua manifestação física. Através da pronunciação repetida, é possível obter controle sobre a forma de energia gerada por ele.

O Segredo da Mente: Visualização

A atividade secreta da mente é expressa na visualização dos Budas e outras deidades, dos símbolos dos mantras (yantras) e de outras formas simbólicas.

Sobre o tema, o Monge Kūkai escreveu:

“Os três segredos do Corpo do Dharma não estão limitados às partículas mais finas, e não se dissipam, mesmo preenchendo todo o espaço. Eles penetram rochas, plantas, e árvores sem discriminação. Eles penetram os humanos, os deuses, os demônios, e os animais sem escolher. Eles se estendem a todos os lugares. Não há nada através do qual eles não possam agir”.
Yantras, Mandalas e outras formas pictográficas simbólicas são representações microcósmicas do macrocosmo, e a sua visualização ativa essa energia, colocando seu praticante em contato com ela.

Autor: Aoi Kuwan (http://www.deldebbio.com.br/index.php/2011/08/08/san-mitsu-os-tres-misterios-do-budismo-shingon/)
 
Contar com a vida

Começamos a aprender que há apenas uma coisa na vida com a qual podemos contar. Com o que podemos contar? Poderíamos dizer: “Posso contar com meu parceiro(a)”. Podemos amar nossos maridos e esposas; mas jamais poderíamos depender completamente deles, porque uma outra pessoa (como nós mesmos) é sempre, de alguma maneira, não confiável.

Não há pessoa na terra com quem podemos contar completamente, embora possamos certamente amar e apreciar os outros. No que então podemos confiar? Se não é uma pessoa, o que é? Com o que podemos contar na vida? Perguntei isso a alguém e ela disse: “Comigo mesma”. Você pode contar consigo mesma? Depender de si é bom, mas é inevitavelmente limitado.

Há uma coisa que você pode sempre contar: que a vida seja como ela é. Vamos falar mais concretamente. Suponha que há alguém que eu queira demais; talvez queira casar com tal pessoa, ou obter um diploma avançado, ou que meus filhos sejam saudáveis e felizes. Mas a vida como ela é pode ser exatamente o oposto daquilo que desejo.

Não sabemos se vamos casar com tal pessoa. Se casarmos, ela pode morrer amanhã. Podemos ou não conseguir nosso diploma. Provavelmente conseguiremos, mas não podemos contar com isso — não podemos contar com nada. A vida sempre vai ser do jeito que é. Então por que não podemos contar com isso? O que há de tão difícil aí? Por que estamos sempre desconfortáveis? Imagine que sua casa acabou de ser destruída por um terremoto, e você está prestes a perder seu braço e todas suas economias. Você pode contar com a vida como ela é? Poderia fazer isso?

Confiar nas coisas como elas são é o segredo da vida. Mas não queremos ouvir isso. Posso confiar absolutamente que no ano que vem minha vida mudará, será diferente, apenas exatamente do jeito que é. Se amanhã eu tiver um ataque cardíaco, posso contar com isso, porque se eu tiver, terei. Posso repousar na vida como ela é.

Charlotte Joko Beck
“Everyday Zen” II

http://samsara.blog.br/2011/08/contar-com-a-vida/
 
será que eu sou o Trumman ,thrumann seilá , aquele do filme ou isso é só uma coincidência? Parece que foi escrito diretamente para mim!

valeu mestre!

uma coisa que eu gostei do budismo , meio resumido , mas foi feito o imprint em mim

"....... reconheça a luz branca , como sendo sua divindade tutelar ...."

".... nem bom nem mau , siga o caminho do meio..."

ops foram duas coisas hehehe
 
Desfazendo Equívocos


Se você quer milagres, não procure o budismo. O supremo milagre para o budismo é você lavar seu prato depois de comer.

Se você quer curar seu corpo físico, não procure o budismo. O budismo só cura os males de sua mente: ignorância, cólera e desejos desenfreados.

Se você quiser arranjar emprego ou melhorar sua situação financeira, não procure o budismo. Você se decepcionará, pois ele vai lhe falar sobre desapego em relação aos bens materiais. Não confunda, porém, desapego com renúncia.

Se você quer poderes sobrenaturais, não procure o budismo. Para o budismo, o maior poder sobrenatural é o triunfo sobre o egoísmo.

Se você quer triunfar sobre seus inimigos, não procure o budismo. Para o budismo, o único triunfo que conta é o do homem sobre si mesmo.

Se você quer a vida eterna em um paraíso de delícias, não procure o budismo, pois ele matará seu ego aqui e agora.

Se você quer massagear seu ego com poder, fama, elogios e outras vantagens, não procure o budismo. A casa de Buda não é a casa da inflação dos egos.

Se você quer a proteção divina, não procure o budismo. Ele lhe ensinará que você só pode contar consigo mesmo.

Se você quer um caminho para Deus, não procure o budismo. Ele o lançará no vazio.

Se você quer alguém que perdoe suas falhas, deixando-o livre para errar de novo, não procure o budismo, pois ele lhe ensinará a implacável Lei de Causa e Efeito e a necessidade de uma autocrítica consciente e profunda.

Se você quer respostas cômodas e fáceis para suas indagações existenciais, não procure o budismo. Ele aumentará suas dúvidas.

Se você quer uma crença cega, não procure o budismo. Ele o ensinará a pensar com sua própria cabeça.

Se você é dos que acham que a verdade está nas escrituras, não procure o budismo. Ele lhe dirá que o papel é muito útil para limpar o lixo acumulado no intelecto.

Se você quer saber a verdade sobre os discos voadores ou sobre a civilização de Atlântida, não procure o budismo. Ele só revelará a verdade sobre você mesmo.

Se você quer se comunicar com espíritos, não procure o budismo. Ele só pode ensinar você a se comunicar com seu verdadeiro eu.

Se você quer conhecer suas encarnações passadas, não procure o budismo. Ele só pode lhe mostrar sua miséria presente.

Se você quer conhecer o futuro, não procure o budismo. Ele só vai lhe mandar prestar atenção a seus pés, enquanto você anda.

Se você quer ouvir palavras bonitas, não procure o budismo. Ele só tem o silêncio a lhe oferecer.

Se você quer ser sério e austero, não procure o budismo. Ele vai ensiná-lo a brincar e a se divertir.

Se você quer brincar e se divertir, não procure o budismo. Ele o ensinará a ser sério e austero.

Se você quer viver, não procure o budismo, pois ele o ensinará a morrer.

Se você quer morrer, não procure o budismo, pois ele o ensinará a viver.

Por Reverenda Yvonette Silva Gonçalves (http://amitabha.dharmanet.com.br/equivocos.htm)
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Prática de uma religião

Pessoas que vêm a centros Zen com frequência estão perturbadas por suas experiências anteriores com religião. O significado original da palavra “religião” é interessante: vem do latim “religare”, que significa “ligar novamente, ligar homem e os deuses”. [...]

O que estamos ligando? Antes de tudo, ligamos nosso ser a ele mesmo — porque até dentro de nós mesmos estamos separados. E nos ligamos aos outros; e, eventualmente, a todas as coisas, sencientes e não sencientes. E ligamos os outros aos outros. Tudo que não estiver ligado é nossa responsabilidade. Mas na maior parte do tempo nossa tarefa é nos ligar ao nosso colega de quarto, ao nosso trabalho, nosso companheiro(a), filho ou amigo, e então nos ligar ao Sri Lanka, ao México, a todas as coisas neste mundo e neste universo.

Ah, isso soa bem! Mas na verdade não vemos com frequência a vida dessa maneira. [...] As pessoas sempre me perguntam: se essa unidade fundamental é o estado real das coisas, por que quase nunca é vista? Não é por falta de dados científicos; conheço muitos físicos que têm o conhecimento intelectual, mas o modo como lidam com a vida não reflete esse conhecimento.

A causa principal da barreira, e o motivo principal porque falhamos em ver aquilo que já é, é nosso medo de sermos machucados por aquilo que parece separado de nós. [...] É triste, mas alguns de nós morrem sem ter vivido, porque estamos obcecados em tentar não nos machucar. [...]

Se realmente quisermos ver a unidade fundamental, não apenas uma vez, mas na maior parte do tempo — que é o que a vida religiosa é — nossa prática primária [...] é com a chamada “barreira do pensamento-emoção”. Significa que quando algo parece nos ameaçar, reagimos. No minuto que reagimos, surge uma barreira e nossa visão fica nublada. Como a maioria de nós reage a cada cinco minutos, é óbvio que na maior parte do tempo a vida está nublada para nós. [...] Nossa prática primária é com essa barreira. Sem essa prática, sem compreensão sobre tudo que entra e sai das barreiras que construímos — o que não é fácil — permanecemos escravizados e separados.

[...] mas quando não há sujeito ou objeto, a barreira do pensamento-emoção cai e pela primeira vez podemos ver claramente. Quando podemos ver, sabemos o que fazer. E o que faremos será amor e compaixão. A vida religiosa pode ser vivida.

Enquanto não nos sentirmos abertos e amáveis, nossa prática está ali nos esperando, e já que na maior parte do tempo não nos sentimos abertos e amáveis, devemos praticar meticulosamente. Essa é a vida religiosa; isso é que é “religião” — embora não precisemos usar tais palavras. É a reconciliação das pessoas e seus conceitos separados, a reconciliação de nossos pontos de vista sobre como deve ser, como as pessoas devem ser, a reconciliação com nossos medos. A reconciliação de tudo que é experiência… de quê? De Deus? Daquilo que simplesmente é? A vida religiosa é um processo de reconciliação, segundo a segundo.

E cada vez que atravessamos essa barreira algo muda dentro de nós. Com o tempo nos tornamos menos separados. E isso não é fácil, porque queremos nos agarrar ao que é familiar: ser separado, ser superior ou inferior, ser “alguém” na relação com o mundo. Uma das marcas da prática séria é estar alerta e reconhecer quando a separação está ocorrendo. No minuto em que surgir a ideia — mesmo que só de passagem — de julgar outra pessoa, a luz vermelha da prática deve acender.

Todos fazemos algumas ações danosas de que não temos consciência. Mas quanto mais praticarmos, mais veremos aquilo que antes não podíamos ver. Isso não significa que iremos ver tudo — sempre há algo que não podemos ver. E isso não é bom nem ruim; é apenas a natureza das coisas.

Então prática não é só vir a retiros ou meditar toda manhã. Isso é importante, mas não suficiente. A força de nossa prática, e a habilidade de comunicá-la aos outros, depende de sermos nós mesmos. Não precisamos tentar ensinar os outros. Não precisamos dizer uma única palavra. Se nossa prática for forte ela se mostra o tempo todo. Não precisamos falar sobre o Dharma; o Dharma é simplesmente aquilo que somos.

Charlotte Joko Beck
“Everyday Zen”, VII

5 de setembro de 2011 |

http://samsara.blog.br/2011/09/pratica-de-uma-religiao/
 
Folha de São Paulo - 17/09/2011

Dalai-lama defende autonomia da religião

Em palestra para cientistas em São Paulo, líder religioso reafirma budismo como forma de conhecimento da mente

Ele propôs "separar as coisas da ciência das coisas da religião" e fez propaganda de seu mais novo livro sobre o tema

LAURA CAPRIGLIONE
DE SÃO PAULO

Era para ser um diálogo entre ciência e budismo o debate "Estados de Consciência - Encontro entre o Saber Tradicional e o Científico".

Mas a principal atividade do dalai-lama no segundo dia de sua visita ao Brasil, ontem, acabou reforçando a impressão de que religião e ciência seguem longe de se entender.

O que se viu foi o "Oceano de Sabedoria" (tradução da expressão tibetana dalai-lama) defendendo a autonomia do pensamento religioso em relação ao científico, depois de duas "aulas" sobre o funcionamento do cérebro, ministradas pelos neuropesquisadores Caroline Schnakers, da Universidade de Liège (Bélgica), e Adrian Owen, da Universidade de Cambridge.

Como bons cientistas, os dois falaram sobre a consciência, localizando-a no cérebro. O pesquisador tibetano Geshe Lobsang Tenzin Negi, da Universidade Emory, nos EUA, foi o primeiro a notar: consciência para a ciência ocidental é a afirmação do "eu". Para a tradição budista, trata-se de uma condição universal, desentranhada da materialidade cerebral.

SEPARAÇÃO

"Devemos saber separar as coisas da ciência das coisas da religião", endossou o líder tibetano à plateia de 2.500 médicos, psicólogos, enfermeiros, terapeutas e cuidadores que lotaram o Golden Hall do World Trade Center, zona sul de São Paulo.

Segundo o dalai-lama, a expansão do conhecimento científico sobre a mente não é garantia alguma de redução do sofrimento humano. "Às vezes, até provoca mais. A descoberta do mecanismo da fissão nuclear não gerou mais sofrimento? Sem a compaixão [conceito central no budismo], o conhecimento é incapaz de aumentar a felicidade", disse.

Em entrevista coletiva realizada na hora do almoço, o dalai-lama defendeu a diversidade religiosa. Segundo ele, todas as religiões possuem um fundo comum, baseado na compaixão, no perdão, no amor e na autodisciplina.
"É necessário que existam diferentes abordagens religiosas, porque, se houvesse uma só -por mais maravilhosa que fosse-, não daria conta da diversidade de motivações que levam as pessoas a buscar [o sagrado]".

CRISTÃOS E BUDISTAS

Brincando, relatou como um amigo protestante insiste em chamá-lo de "bom cristão", por sua defesa de princípios caros ao cristianismo.

"Eu sempre respondo que ele é que é um bom budista", disse ele.

E aproveitou para fazer a propaganda do livro que está lançando, ainda sem tradução no Brasil: "Toward a True Kinship of Faiths: How the World's Religions Can Come Together" (rumo a um verdadeiro parentesco das crenças: como as religiões do mundo podem se unir).

Na saída, o líder religioso -sem mais- puxou para si e abraçou a jornalista Zilda Brandão, 64. Emocionada, chorando muito, disse: "É o dia mais feliz da minha vida".

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ANÁLISE

Budista se comporta como um curioso da neurociência

REINALDO JOSÉ LOPES
EDITOR DE CIÊNCIA E SAÚDE

As pessoas se acostumaram com a ideia de que o papel dos líderes religiosos é condenar a falta de preocupação ética da ciência ou, no máximo, ponderar sobre o significado profundo de uma nova descoberta.

O dalai-lama foi mais desapegado em seu encontro com cientistas em São Paulo: comportou-se simplesmente como um curioso da neurociência, alguém que quer entender o que as últimas décadas de pesquisa estão revelando sobre o cérebro.

Em dado momento, ele chegou até a sugerir um desenho experimental para os companheiros de mesa-redonda. Entre duas pessoas que passaram por um coma, uma delas de mente muito ativa antes da doença e outra menos intelectualmente voraz, qual das duas teria capacidades de consciência menos danificadas?

Essa fagulha de curiosidade se mistura com uma determinação férrea de não misturar as estações. "Budismo é para budistas", declarou ele. Seguindo a máxima do paleontólogo americano Stephen Jay Gould (1941-2002), o dalai-lama vê religião e ciência como magistérios separados, ambos capazes de contribuir para o desenvolvimento humano, mas que não devem ser misturados.

Ele tampouco mostra preocupação em fazer da religião a base do que se deve considerar como certo ou errado. Embora tenha exortado os pesquisadores a usar a ciência de forma moral, para criar "indivíduos, famílias e comunidades felizes", ele deixou claro que, na sua opinião, é perfeitamente possível levar uma vida moralmente irrepreensível sem ser religioso.

Nesse ponto, o pensamento do líder budista, curiosamente, acaba ecoando as recentes campanhas de grupos ateus pelo mundo, que defendem, em anúncios em ônibus e outdoors, que "Você pode ser bom sem Deus".

Ou, já que o budismo é uma religião não teísta, que dá para ser bom sem crer em carma ou iluminação.
 
Causas mentais da felicidade

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A dificuldade de uma visão puramente materialista da vida é que, além de ignorar toda uma dimensão da mente, ela não lida efetivamente com os problemas desta vida. Uma mente materialista é uma mente instável, porque sua felicidade é construída com circunstâncias físicas transitórias. Doenças mentais afetam tanto ricos quanto pobres, o que é uma indicação clara das limitações dessa abordagem.

Embora seja essencial manter uma base material razoável para viver, a ênfase na vida de uma pessoa deve ser cultivar as causas mentais e espirituais da felicidade. A mente humana é muito poderosa e nossas necessidades mundanas não são tão grandes a ponto de exigirem toda nossa atenção, especialmente levando em conta que o sucesso material soluciona tão poucos dos muitos desafios e problemas com que homens e mulheres se defrontam durante suas vidas, e ele não será de nenhuma ajuda na morte.

Por outro lado, se uma pessoa cultivar qualidades espirituais como harmonia mental, humildade, desapego, paciência, amor, compaixão, sabedoria e assim por diante, então a pessoa fica equipada com uma força e inteligência capaz de lidar efetivamente com os problemas desta vida; e como a riqueza que ela está acumulando é mental em vez de material, não terá que ser deixada para trás com a morte. Não será preciso entrar no estado pós-morte de mãos vazias.

XIV Dalai Lama (Tibete, 6 de julho de 1935 ~)
“The Path to Enlightenment”
(Dharma Quote of The Week – Snow Lion, 04/02/2011)

19 de setembro de 2011

http://samsara.blog.br/2011/09/causas-mentais-da-felicidade/
 
Por que palavras?


Um monge aproximou-se de seu mestre - que se encontrava em meditação no pátio do Templo à luz da lua - com uma grande dúvida:

"Mestre, aprendi que confiar nas palavras é ilusório; e diante das palavras, o verdadeiro sentido surge através do silêncio. Mas vejo que os Sutras e as recitações são feitas de palavras; que o ensinamento é transmitido pela voz. Se o Dharma está além dos termos, porque os termos são usados para defini-lo?"

O velho sábio respondeu:" As palavras são como um dedo apontando para a Lua; cuida de saber olhar para a Lua, não se preocupe com o dedo que a aponta."

O monge replicou: "Mas eu não poderia olhar a Lua, sem precisar que algum dedo alheio a indique?"

"Poderia," confirmou o mestre, "e assim tu o farás, pois ninguém mais pode olhar a lua por ti. As palavras são como bolhas de sabão: frágeis e inconsistentes, desaparecem quando em contato prolongado com o ar. A Lua está e sempre esteve à vista. O Dharma é eterno e completamente revelado. As palavras não podem revelar o que já está revelado desde o Primeiro Princípio."

"Então," o monge perguntou, "por que os homens precisam que lhes seja revelado o que já é de seu conhecimento?"

"Porque," completou o sábio, "da mesma forma que ver a Lua todas as noites faz com que os homens se esqueçam dela pelo simples costume de aceitar sua existência como fato consumado, assim também os homens não confiam na Verdade já revelada pelo simples fato dela se manifestar em todas as coisas, sem distinção. Desta forma, as palavras são um subterfúgio, um adorno para embelezar e atrair nossa atenção. E como qualquer adorno, pode ser valorizado mais do que é necessário."

O mestre ficou em silêncio durante muito tempo. Então, de súbito, simplesmente apontou para a lua.

http://paraserzen.blogspirit.com/archive/2009/06/16/por-que-palavras.html

Ilustração de Yoshitoshi Tsukioka, Lua da Iluminação: Cem visões da Lua (Moon of Enlightenment: One Hundred Views of the Moon, 1885-1892); para ver mais desta série acesse http://yoshitoshi.verwoerd.info
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Ele tampouco mostra preocupação em fazer da religião a base do que se deve considerar como certo ou errado. Embora tenha exortado os pesquisadores a usar a ciência de forma moral, para criar "indivíduos, famílias e comunidades felizes", ele deixou claro que, na sua opinião, é perfeitamente possível levar uma vida moralmente irrepreensível sem ser religioso.

Nesse ponto, o pensamento do líder budista, curiosamente, acaba ecoando as recentes campanhas de grupos ateus pelo mundo, que defendem, em anúncios em ônibus e outdoors, que "Você pode ser bom sem Deus".

Ou, já que o budismo é uma religião não teísta, que dá para ser bom sem crer em carma ou iluminação.

Dá pra ser bom sem Deus... mas isso não é o bastante!
 
Você vive na ilusão e na aparência das coisas.
Há uma realidade, mas você não a conhece.
Quando compreendê-la, vai ver que você não é nada,
E, sendo nada, você é tudo.
Isso é tudo.
Kalu Rinpoche (Tibete, 1905 ~ Índia, 1989)

Esta citação que o Ecuador colocou no início do post me lembrou esta história que eu li do Osho.

Huineng (慧能 ou 惠能; em Japonês: Daikan Enō, 638713)

HuiNeng queria muito ser aceito num mosteiro budista. Então se dirigiu até o portão do mosteiro e solicitou a presença do mestre. Quando o mestre o viu disse: 'vá embora daqui, eu não o aceito.' HuiNeng, que não sabia ler nem escrever disse: 'por favor mestre, me aceite como seu humilde discípulo.' HuiNeng recebeu mais uma negativa do mestre. Após muita insistência o mestre percebeu que não havia maneira de fazer o jovem HuiNeng desistir e afirmou: 'eu o aceito, mas a partir de agora vá para a cozinha, você irá trabalhar servindo chá e limpando panelas de arroz. E em hipótese alguma me procure.' HuiNeng aceitou prontamente e foi para a cozinha.

Doze anos se passaram quando o mestre sentiu que iria morrer e precisava de alguém para substitui-lo. Numa reunião no mosteiro o mestre disse que aquele que escrevesse um gatha (poema em quatro linhas) que mostrasse através das palavras que tinha alcançado a iluminação, este seria então o novo mestre do mosteiro. Era um mosteiro com aproximadamente quinhentas pessoas e todos estavam ansiosos sobre quem seria o novo mestre. Neste mosteiro existia um discípulo muito erudito e que todos acreditavam que nem valeria a pena tentar escrever o gatha, pois a erudição deste homem o conduziria facilmente a posição desejada por muitos.

Mas este erudito discípulo sentia que ele não era um iluminado e tinha vergonha de comentar isso com os outros, e então arquitetou um plano: 'vou escrever o meu gatha no muro do mosteiro sem minha assinatura, e se o mestre afirmar que quem escreveu as palavras no muro é um iluminado, eu me manifesto.' Caso contrário permaneceria calado. O gatha do erudito dizia:

"A mente é um espelho
onde a poeira se junta
limpe o espelho
e atingirá a iluminação"

No dia seguinte todos no mosteiro se deliciaram com as sábias palavras e estavam querendo saber quem as tinha escrito. O mestre ao ver o gatha disse: 'quem escreveu isto é um iluminado.' A notícia se espalhou rapidamente pelo mosteiro e inclusive atingiu as dependências da cozinha onde HuiNeng trabalhava a doze anos. Quando Hui Neng foi servir chá para alguns monges não pode deixar de ouvir o gatha que tinha sido escrito no muro e soltou uma sonora gargalhada. Os monges se sentiram magoados e o repreenderam dizendo: 'como você é capaz de rir de um discípulo iluminado? Logo você que nem sabe ler nem escrever?' HuiNeng disse: 'realmente não sei ler nem escrever, mas quem escreveu estas palavras não é um iluminado. Sigam-me até o pátio e alguém por favor escreva no chão o que eu vou dizer. E HuiNeng falou:

"Não existe mente
e não existe espelho
onde pode então
a poeira acumular"

No mesmo instante em que as pessoas começaram a perceber o poder das palavras de HuiNeng, o mestre do mosteiro chegou entre eles e disse: 'HuiNeng você está errado. Esta não são as palavras de um iluminado. Aquele que escreveu no muro, este sim atingiu a iluminação. E volte imediatamente para a cozinha onde é o seu lugar. E os monges do mosteiro celebraram naquela noite com o discípulo erudito.

Nessa noite, o mestre do mosteiro que em doze anos nunca fora até HuiNeng, dirigiu-se a cama dele e o acordou. HuiNeng que ficou emocionado com a presença do mestre perguntou o porque de tamanha honra e ouviu de seu mestre: 'HuiNeng, há doze anos atrás quando você veio até este mosteiro pedindo para entrar, eu não o aceitei porque percebi no instante em que o vi que você já era um iluminado. E também agora você está certo. Seu gatha é de um homem iluminado. Mas não podia falar isso na frente daquelas pessoas. Seu eu falasse que o mestre do mosteiro seria você, acredite, eles o matariam. Jamais aceitariam serem discípulos de alguém que limpava panelas de arroz. Pois como você bem sabe, está rodeado de idiotas ilustrados. Que por doze anos foram servidos por um iluminado e não perceberam. Agora HuiNeng, fuja daqui imediatamente!'

acho essa história muito legal, espero que vocês tenham curtido.

e sobre a questão da dmt, budismo e experiências psicodélicas, minha opinião é que as substâncias a base de triptaminas são potentes indutores destes estados. o mckenna por exemplo, afirmava que estas substâncias podem funcionar muito bem com várias religiões. e elas só perdem por não usá-las.

abraço:)
 
Show transitório sem fim

Joseph Goldstein:

Sendo sujeitos à mudança, por que procuramos o que também está sujeito à mudança? Embora possamos ver e compreender, em algum grau, a futilidade de buscar satisfação em coisas que — devido à sua própria natureza — não duram, nos encontramos com frequência vivendo nossas vidas apenas esperando pela próxima grande experiência; tanto faz se são as próximas férias, o próximo relacionamento, a próxima refeição ou até mesmo a próxima respiração.

Nós nos inclinamos e ficamos eternamente amarrados na antecipação. Refletir sobre, e observar diretamente a impermanência nos lembra de novo e de novo que toda experiência é apenas parte de um show transitório sem fim.

Meu primeiro professor do dharma, Anagarika Munindra, costumava nos perguntar: “Onde está o fim de se ficar vendo, saboreando ou sentindo?”. Claro que não há nada de errado nessas experiências; elas simplesmente não têm a capacidade de satisfazer nosso anseio profundo por felicidade.

O maravilhoso paradoxo do caminho espiritual é que todos esses fenômenos efêmeros que — como objetos de nosso desejo — nos deixam insatisfeitos, enquanto objetos do estado desperto se tornam o próprio veículo do despertar. Quando tentamos tomar posse e agarrar experiências que são transitórias por natureza, acabamos no final sempre insatisfeitos. Mas quando olhamos com atenção plena a natureza de constante mudança dessas mesmas experiências, não ficamos mais tão possuídos pela sede do desejo. Por estado desperto me refiro à qualidade de prestar atenção completa ao momento, se abrindo para a verdade da mudança.

Então não é uma questão de fechar nossos sentidos e se retirar do mundo, mas de abrir nosso olho de sabedoria e viver livre no mundo.

“One Dharma”, cap. 3

10 de outubro de 2011

http://samsara.blog.br/2011/10/show-transitorio-sem-fim/
 
Nada além de rótulos

Detalhe de "Nature of Mind", painel 6, Alex Grey
Sutra Guirlanda de Flores:

Os fenômenos não têm nenhuma função
Nem natureza individual;
Assim, todos eles
Não têm conhecimento um do outro.

Como as águas de um rio,
Seus fluxos correm perto,
Cada um inconsciente do outro:
Assim é com todas as coisas.

Também é como uma grande fogueira,
Chamas brilhantes explodem juntas,
Cada uma inconsciente da outra:
Os fenômenos também são assim.

Também como um ventania contínua,
Os ventos soprando e ressoando em tudo que tocam,
Cada um inconsciente do outro:
Assim é com todas as coisas.

Também como as várias camadas da terra,
Uma sobre a outra,
E ainda assim cada uma inconsciente das outras:
Os fenômenos são todos assim.

Olho, ouvido, nariz, língua, corpo,
Mente, intelecto, as consciências dos sentidos:
Com isso, a pessoa sempre vaga em círculos,
Embora não haja ninguém nem nada que vague em círculos.

A natureza das coisas é fundamentalmente sem nascimento,
Embora aparentem ter nascimento;
Aqui não há nenhum revelador,
E nada sendo revelado.

Olho, ouvido, nariz, língua, corpo,
Mente, intelecto, as consciências dos sentidos:
Todas são vazias e sem essência;
A mente iludida as concebe como se existissem.

Vistas como realmente são,
Todas as coisas não têm natureza inerente.
O olho da realidade não é conceitual:
Essa visão não é falsa.​

Real ou irreal,
Falso ou não falso,
Mundano ou transmundano:
Não há nada além de rótulos.

“Um bodisatva pede esclarecimento”
Sutra Guirlanda de Flores (Avatamsaka), livro 39
“Flower Ornament Scripture”
21 de outubro de 2011 |

http://samsara.blog.br/2011/10/nada-alem-de-rotulos/


 
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