Como vc sabe ???
Como eu sei o quê?
Já falou com ele ???
Com quem? Com Deus?
Já morreu viu que não tinha nada e voltou ???
Quando eu disse que quase ninguém “amaria” a Deus caso o cristianismo ensinasse que Deus é indiferente a nós e que não há Céu nem Inferno, eu não estava querendo dizer que Deus é indiferente a nós (até porque o Deus cristão nem sequer existe, ele é apenas uma imagem mental na cabeça das pessoas, cada pessoa tendo uma imagem diferente dele) e que não há Céu e Inferno (embora de fato não haja), eu só estava querendo dizer que, numa situação hipotética em que a tradição cristã ensinasse isso, quase ninguém acreditaria e adoraria a Deus. Eu apenas sugeri uma hipótese para ilustrar que as pessoas “amam” a Deus por mero interesse pessoal.
Mas, respondendo à sua pergunta, sim, eu já morri. E já que você tocou nesse assunto, vou tentar dizer mais ou menos o que acontece na hora da morte por meio de uma metáfora.
Imagino que você já deve ter visto várias daquelas pegadinhas filmadas por câmeras escondidas, certo? O que acontece nessas pegadinhas é o seguinte: fulano chega para sicrano e começa a zoá-lo, sicrano não sabe que é apenas uma pegadinha e começa a ficar nervoso com fulano, quando sicrano já está P da vida fulano diz para ele que é apenas uma pegadinha e lhe aponta a câmera escondida. Na hora da morte acontece algo parecido com isso: você vai perceber que toda a sua vida não passou de uma pegadinha, um faz de conta, e que você esteve sendo feito de trouxa esse tempo todo por estar levando a sério uma mera brincadeira. Não há nada de místico ou espiritual nisso. E lembrando que essa comparação com uma pegadinha de câmera escondida é apenas uma metáfora, não é para ser levada ao pé da letra. E obviamente não é apenas isso que acontece na hora da morte, há muito mais coisas que são percebidas, isso que eu descrevi é apenas uma pequena parte da coisa toda.
Mas eu nem gosto de falar sobre isso, já que podem me interpretar erradamente e achar que eu estou dizendo que a pessoa sobrevive à morte, sendo que ela não sobrevive, pois o que nasce deve morrer, tudo o que tem um começo tem que ter um fim. Apenas o que não tem começo não pode ter fim. A pessoa teve um começo, portanto ela tem que ter um fim. De fato há algo que permanece após a morte, mas esse algo não é de modo algum a pessoa que você acredita ser. Os cristãos acham que a pessoa continua viva após a morte, que ela vai para o Céu ou para o Inferno, e eles estão enganados, porque não é isso que acontece. O indivíduo não é nada além de memória, e quando você morrer todas as suas memórias serão extintas para sempre e todo sempre, e tudo o que você viveu será como se nunca tivesse acontecido – porque de fato nunca aconteceu.
Mas ainda mais importante que saber o que é a morte é saber quem ou o que é esse eu que vai morrer. Qual a verdadeira natureza desse eu? Ele é um corpo, um cérebro, uma mente, uma alma, um espírito? Alguma vez você já viu esse eu? Por acaso existe alguém aí para morrer?
Embora eu diga que o indivíduo vai ter um fim, essa afirmação ainda não é de todo exata, porque nem sequer há um indivíduo para chegar ao fim. Muito mais certo que falar que na hora da morte a pessoa vai chegar ao fim é falar que na hora da morte será percebido que nem sequer há uma pessoa para chegar ao fim – o que chega ao fim é apenas a ilusão de haver uma pessoa (embora até mesmo essa crença de que há uma pessoa seja, em última instância, apenas mais uma ilusão).