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Teoria da conspiração como símbolo da dinâmica psíquica

Ecuador, pode até ser usado dessa maneira, mas seria como num sentido figurado.

Conspiração está mais para um ato que visa o mal de outrém.

Tanto que dificilmente vai existir uma conspiração em prol da paz mundial ou governos conspirando para dar presentes a outros governos.
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Entendi agora Rain, mas eu vejo uma conspiração como algo além da fofoca, geralmente envolve mais coisas e tem um tom bem mais ativo.
 
Outra visão sobre conspirações, do blog Bule Voador: http://bulevoador.com.br/2012/09/37366/#more-37366

Contradições conspiratórias


Autor: Michael Shermer
Publicado em: The Work of Michael Shermer (página oficial)
Tradução e introdução: Camilo Gomes Jr.

INTRODUÇÃO
Nesta semana, em que se completaram 11 anos dos ataques terroristas que puseram abaixo as torres do World Trade Center e fizeram vítimas não apenas nos prédios atingidos, mas, obviamente, também nos quatro aviões comerciais sequestrados, esses lamentáveis eventos voltaram a ser notícia, bem como tema de sérios debates em mesas de botecos, como não poderia ter sido diferente. Nessas horas, todos vestimos os trajes de «entendidos no assunto» e expomos nossas teorias sobre o que motivou os ataques, de quem é a culpa histórica daquela tragédia, chegando até mesmo a discutir se a queda das torres gêmeas foi um evento a se lamentar ou a se «festejar» — «afinal», muitos argumentam, «vejam o simbolismo da coisa: o grande falo da América do Norte, o falo-mor do imperialismo capitalista selvagem, sempre ereto, sempre provocador, sempre potente, foi simplesmente ceifado, castrado, por aqueles que se cansaram de ser abusados e agiram, deram o seu basta, à sua maneira. Desse ponto de vista, é ou não é algo a se celebrar?»

Minha resposta pessoal: Não, não é. A quase totalidade de pessoas que morreram naquele dia fatídico não se constitui de imperialistas mancomunados num plano diabólico para dominar o mundo. Decerto os motivos que movem a política externa dos Estados Unidos mundo afora estão longe de serem nobres e em heroica defesa da democracia — nisso, estou plenamente de acordo. Mas funcionários de escritórios comerciais, firmas advocatícias, médios e grandes empresários, faxineiros, cozinheiros, porteiros, office boys, clientes, visitantes, bombeiros e policiais, todos mortos nos dois edifícios atingidos, bem como os passageiros e as tripulações dos aviões sequestrados, não são, nem pela mais forçosa interpretação que ainda se agarre a um mínimo de razoabilidade, responsáveis pelos males que o braço militar e os serviços de «inteligência» e «diplomacia» do Tio Sam já andaram e andam a espalhar pelo globo. Além disso, o grupo que assumiu a autoria do atentado não é particularmente famoso por ser uma liga de paladinos da justiça social e dos direitos humanitários, da igualdade entre todos os seres humanos. Pelo contrário, trata-se de um bando de fundamentalistas religiosos, cuja mentalidade ainda está plantada na Idade Média, que, se pudessem, implantariam teocracias tirânicas em cada acre de terra deste planeta.

Portanto, desse tipo de postura antiamericana irracional de quem festeja todo ano esse espetáculo do terror numa churrascada com amigos que pensam igualmente, eu prefiro manter distância. Além disso, o tosco argumento de que os Estados Unidos e governos por eles apoiados já mataram muito mais não justifica nada. Num caso e noutro, tratam-se de ações condenáveis e hediondas, que nenhum falso argumento moral é capaz de justificar com alguma sensatez.

Acontece, porém, que essas discussões sobre se a Al-Qaeda agiu certo ou errado não são as únicas a animar as torcidas nessa data. Também se tornam curiosamente comuns os debates sobre a «conspiração do 11 de Setembro». As teses não são unânimes, como se poderia esperar:1) foi o Governo Bush que orquestrou e executou tudo, em conluio com o próprio Bin Laden, que teria negócios com a família do então presidente; 2) o Governo Bush não estava mancomunado com a Al-Qaeda, mas sabia de todo o plano, deixando-o seguir em frente devido às vantagens políticas que poderiam advir do atentado; 3) o Governo Bush não estava mancomunado com Bin Laden nem sabia dos ataques, mas, assim que foi informado que dois aviões já haviam atingido as torres gêmeas e outros dois vagavam sem destino conhecido pelos céus dos Estados Unidos, o próprio presidente ou alguém no alto comando teria ordenado que as duas aeronaves civis fossem abatidas por caças militares, sacrificando-se, assim, as vidas dos passageiros e tripulantes dentro delas e inventando então as histórias de que um dos aviões atingira o Pentágono, em Washington — justamente numa área em obras e desocupada do prédio —, enquanto o outro, o famoso Voo 93 da United Airlines, teria caído acidentalmente, depois que as vítimas a bordo tentaram se rebelar contra os terroristas. (Quando gravações telefônicas de familiares das vítimas confirmaram que não era uma invenção a história da tentativa de os passageiros tentarem tomar dos sequestradores o controle do avião, essa versão da teoria conspiracionista foi mudada, afirmando-se, agora, que essas ligações foram interceptadas pelos militares, o que lhes deu uma ótima oportunidade para derrubar a aeronave, sem atrair suspeitas para o governo.)

Não é impossível que alguns dos elementos que compõem essas teorias conspiracionistas sejam factuais. (É bem sabido, por exemplo, que o escritor Salman Rushdie, que estava numa turnê de promoção de seu último livro, enfrentou vários constrangimentos nos aeroportos americanos no dia 6 de setembro e, de novo, na manhã do 11 de setembro, porque a CIA emitira um alerta à FAA — centro operacional que controla a aviação nos EUA — acerca da possibilidade de um ataque de fundamentalistas islâmicos dentro do território americano. O ataque poderia envolver aeronaves de alguma forma e o alvo ainda era desconhecido, mas havia a suspeita de que fosse o referido escritor britânico de origem indiana — já que Rushdie é jurado de morte por radicais iranianos, desde que lançou seu romance Versos satânicos, que apresenta uma visão crítico-satírica do islamismo, de Maomé e do Aiatolá Khomeini, o primeiro a pedir a cabeça do autor.) Porém, mesmo esses elementos menos improváveis não valida a teoria conspiracionista X ou Y, pelo simples fato de que todas contêm vários outros dados conflitantes com as evidências.

Em todo caso, o que isso tudo nos mostra é que a data do 11 de setembro dá sempre uma nova injeção de ânimo aos conspiracionistas. E estes sempre encontram seu público cativo, dispostos a aceitar, de forma não muito crítica, essas informações sensacionalistas, muitas das quais extremamente inverossímeis. Foi justamente por conta dessa postura tão recorrente que resolvi traduzir o último texto do Michael Shermer, que discorre precisamente sobre as ideias conspiracionistas e como tendem a se comportar os que costumam abraçá-las. Não é que as conspirações sejam impossíveis nem que um e outro fato relacionados ao 11 de Setembro e eventos extraordinários não sejam um tanto suspeitas. A questão é o salto incrível que os conspiracionistas costumam dar desses poucos detalhes isolados às conclusões espetaculares a que chegam, enquanto formulam teorias completas e complexas, que ligam John Kennedy a Bin Laden e ao ET de Varginha.

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O porquê de as pessoas que acreditam numa conspiração estarem propensas a acreditarem noutras

por Michael Shermer
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NA QUARTA-FEIRA, 16 DE MAIO, eu passei horas e horas num ônibus abafado num deserto de néon chamado Las Vegas, junto com um contente grupo de conspiracionistas britânicos, durante sua jornada pelo Sudoeste americano à procura de OVNIs, de alienígenas, da Área 51 e de outras verdades encobertas pelo governo, tudo para um documentário da BBC. Uma mulher divertiu-me com uma história sobre bolas alaranjadas de energia rodeando seu carro na rodovia Interstate 405, na Califórnia, as quais foram perseguidas pouco depois por helicópteros operacionais pretos. Um homem desafiou-me a explicar a fonte de um feixe de laser verde que o seguira no interior da Inglaterra certa noite.

Conspirações são um tema favorito constante para os produtores de televisão, pois há sempre um público receptivo. Um recente documentário da CBC — transmissora pública canadense de rádio e TV — de que eu participei, chamado Conspiracy Rising [A Conspiração em Ascensão], por exemplo, apresentou teorias sobre o que estava por trás das mortes de John F. Kennedy e da Princesa Diana, por trás dos OVNIs, da Área 51 e do 11 de Setembro, como se houvesse uma linha comum interligando todos esses eventos. De acordo com o radialista e disseminador de teorias conspiratórias Alex Jones, que também aparece no filme, «o complexo bélico-industrial matou John F. Kennedy» e «eu posso provar que há um cartel privado de bancos tentando estabelecer um governo mundial porque eles próprios admitem estarem fazendo isso» e «não importa de que perspectiva se olhe para o 11 de Setembro, não existe conexão terrorista islâmica alguma — os sequestradores eram com certeza homens a serviço do governo que foram enganados e usados como bodes expiatórios, assim como Lee Harvey Oswald».

Tais exemplos, juntamente com outros que me chegam aos ouvidos durante a ronda conspiracionista, são emblemáticos de uma tendência que detectei de que as pessoas que acreditam numa teoria dessas tendem a acreditar em muitas outras intrigas igualmente improváveis e frequentemente contraditórias. Essa observação foi recentemente confirmada de forma empírica pelos psicólogos Michael J. Wood, Karen M. Douglas e Robbie M. Sutton, da Universidade de Kent, num artigo intitulado «Mortas e vivas: as crenças em teorias conspiracionistas contraditórias», publicadas no periódico Social Psychological and Personality Science [Ciência da Psicologia Social e da Personalidade] de janeiro passado. Os autores começam definindo uma teoria conspiratória como sendo «um conluio proposto por pessoas ou organizações poderosas que trabalham juntas em segredo a fim de concretizar alguma meta (normalmente sinistra)» que é «sabidamente resistente à falsificação [...], tendo mais e mais defensores da conspiração sendo agregados, a fim de racionalizar cada nova evidência refutadora». Uma vez que você acredite que «uma conspiração massiva e sinistra poderia ser executada com sucesso em quase total segredo, [isso] sugere que muitas tramas do tipo são possíveis». Com esse paradigma cabalístico em seu devido lugar, as conspirações se podem tornar «a explicação oferecida por default para qualquer dado evento — uma visão de mundo unitária e bitolada em que crenças se agrupam numa rede que se autossustenta, conhecida como sistema monológico de crenças».

Esse sistema monológico de crenças explica as relações significativas entre as diferentes teorias conspiracionistas que constam do estudo. Por exemplo, «a crença de que uma célula renegada do MI6 [o serviço secreto britânico] foi responsável pela morte da [Princesa] Diana estava correlacionada com a crença em teorias de que o HIV foi criado num laboratório [...], de que o pouso na lua foi uma farsa, [...] e de que os governos estão encobrindo a existência de alienígenas». O efeito continua até mesmo quando as conspirações contradizem-se umas às outras: quanto mais os participantes acreditavam que Diana forjou a própria morte, mais eles acreditavam que ela havia sido assassinada.

Os autores sugerem que há um processo de ordem superior em ação, o qual eles chamam de coerência global, que invalida contradições pontuadas: «Alguém que acredite num número considerável de teorias conspiratórias começará naturalmente a ver as autoridades como essencialmente ardilosas, e novas crenças conspiratórias parecerão mais plausíveis à luz dessa crença». Além do mais, «a desconfiança dos relatos oficiais por parte dos defensores das conspirações pode ser tão forte que muitas teorias alternativas sejam simultaneamente endossadas, apesar de quaisquer contradições entre elas». Assim, afirmam os autores, «quanto mais os participantes acreditam que uma pessoa no centro de uma teoria conspiracionista relacionada à morte, tal como a Princesa Diana ou Osama bin Laden, ainda esteja viva, mais eles também tendem a acreditar que essa mesma pessoa foi morta, já que a forma alegada da morte envolve enganação por parte do oficialismo».

Conforme Alex Jones proclamou em Conspiracy Rising: «Ninguém está seguro, vocês conseguem entender isso? A pura maldade está fugindo ao controle por toda parte, da pior forma possível».

Em seu site Infowars.com, Jones exibe como linha que encabeça a página a frase «Because There Is a War on for Your Mind» [Pois Está Acontecendo uma Guerra pelo Controle de Sua Mente, numa tradução livre]. Isso é verdade; daí, o porquê de a ciência e a razão deverem sempre prevalecer sobre o medo e a irracionalidade. E o leva e traz de boataria conspiracionista encontra-se nestes últimos à custa das duas primeiras.
 
Não me lembro direito, mas eu li algo assim no Guia do Mochileiro das Galáxias: Esse sentimento de que algo maior está acontecendo, conspirando e que você desconhece é normal em todos os sentidos, toda criatura viva no universo tem isso, é um sintoma completamente normal.
E eu penso: É claro, é como um tilt na máquina do universo material em conexão com a consciência universal, uma fagulha de algum mal funcionamento na linha entre a origem e o destino universal do todo. Conspirações vão existir o tempo todo e muitas delas, sejam falsas ou extremamente verdadeiras, ficarão em nosso inconsciente durante muitas gerações, até que o problema se resolva, isso não tem a ver só com a mente do indivíduo, mas também do todo.
Acho que é algo como o Ecuador postou no primeiro post... =D
 
É saudável a suspeita e a desconfiança das verdades da mídia oficial bem como das verdades dos conspiracionistas.
 
Mais sobre o assunto:

http://astropt.org/blog/2013/08/08/por-que-as-pessaos-acreditam-em-teorias-de-conspiracao/

Por que as pessoas acreditam em teorias de conspiração?

por Rafael Rodrigues



Sei que esse é um tema recorrente aqui no AstroPT, mas depois da matéria do Carlos sobre o programa Frontline que versou sobre o tema, resolvi postar aqui um texto meio ensaísta que escrevi um tempo atrás sobre o assunto.

Quando eu era criança, estudava em uma pequena escola no meu bairro. Os fundos da escola faziam divisa com um terreno baldio e, por estar assim há bastante tempo, coberto por muito mato, sujeira largada por lá e animais peçonhentos (e provavelmente alguns humanos peçonhentos também). Era muito fácil para nós, alunos, pular dos fundos da escola para o terreno baldio e isso era um problema para as professoras. Até que um dia um grande buraco apareceu “da noite para o dia” no meio do terreno. Ninguém sabia exatamente o que era aquilo e o que havia acontecido. Em algum momento, surgiu o boato de que coisas estranhas aconteciam naquele buraco, como fumaça saindo do fundo, coisas luminosas rodando o lugar e até espíritos de uma mulher carregando um bebê pipocaram pela escola que, por ser pequena, teve estes rumores espalhados de forma absurdamente rápida. Até as professoras confirmaram terem visto algumas das coisas que se diziam ter visto por lá.

A coisa tomou uma proporção tão grande que os alunos ficaram assustados de verdade, o que obrigou as professoras a abrirem o jogo: foi tudo um boato inventado por uma delas, de forma automática e inocente, a fim de evitar que as crianças continuassem indo para o terreno baldio (e consequentemente, arriscassem se ferir). É claro que ninguém acreditou na história; todo mundo estava convencido de que os rumores sobre o buraco era verdade, e que as professoras estavam apenas querendo abafar a situação. Até que, um dia, o buraco foi fechado. Assim, sem mais nem menos. E, após alguma especulações durante um tempo, eventualmente quase todo mundo esqueceu da história (ou, se não esqueceu, pelo menos parou de levar tanto a sério).



É claro que as professoras não esperavam que um simples comentário para tentar inibir as crianças de ir para o terreno baldio fosse tomar proporções tão absurdas. Mas este é um bom exemplo do que acontece quando as pessoas são facilmente impressionáveis e possuem a tendência a acreditar em qualquer coisa. É claro que aqui estamos falando de crianças, que logo deixarão estas ideias de lado. Mas e quando acontece com adultos?

Isto vai de encontro a teorias a respeito de como surgem as superstições, que evocam experimentos feitos por B.F Skinner com pombos nos anos 30, onde um pombo dentro de uma caixa, ao ficar desesperado e com fome, bicou sem querer um botão, e assim recebeu comida. Mais algumas vezes fazendo o mesmo, ele passou a “pensar” que toda a vez que o botão fosse bicado, ele receberia comida. Mas o mais interessante é que, mesmo quando ele não recebia comida ao bicar o botão, continuava a fazê-lo mesmo assim. Isso nos dá uma boa base do pensamento supersticioso e nos ajuda a entender um pouco sobre como funciona nossa mente. Mas o que superstição tem a ver com teorias de conspiração? Bem, na verdade, tudo.

Nós, seres humanos, costumamos nos ver como diferentes dos animais, estando inclusive num patamar “superior” a estes por sermos “inteligentes”. Bem, isso tudo é muito bonito, romântico, até, mas com nosso conhecimento atual este pensamento não se sustenta. Embora tenhamos características que nos diferenciem de outras espécies animais somos, na verdade, regidos pelos mesmos instintos biológicos básicos de qualquer criatura viva, sendo a principal delas o instinto de sobrevivência. Herdamos isso dos nossos ancestrais primitivos e nossa própria sociedade, por mais complexa que seja, ainda é criada considerando estas leis biológicas.

Na selva, diferente de nossa sociedade (supostamente) mais segura, não dá tempo para analisar cada situação particular. Parar para pensar, num cenário onde você está constantemente em perigo de ser atacado por um predador (ou que, sendo predador, você está constantemente sob a ameaça de não encontrar uma presa e passar fome), não é só perigoso; é burrice.

Para garantir rapidez de julgamento num mundo onde perder tempo pode ser fatal, os animais desenvolveram a capacidade de criar padrões que permitem identificar facilmente um perigo ou uma oportunidade. Por exemplo: algo se mexendo nos arbustos é sempre um perigo (mesmo que não seja, pense: é muito melhor achar que é um predador e não ser do que achar que não é nada e ser devorado), um reflexo de água, uma oportunidade. Foi assim que sobrevivemos e chegamos até aqui. Mas, como todo modelo evolutivo, este também tem seu lado ruim; um padrão criado a partir de uma falha de julgamento pode levar um animal a discernir um perigo ou uma oportunidade de forma errada e, assim, aquilo que servia para ajudar a mantê-lo vivo pode prejudicá-lo – e às vezes até matá-lo.

Em nossa sociedade complexa*, este “software criador de padrões” que temos em nosso cérebro também pode tanto nos ajudar quanto nos prejudicar. O que parece ser um vulto pode ser um intruso querendo roubar nossa casa… Ou pode não ser nada. É benéfico se ajudar você a tomar cuidado, mas pode prejudicar (seu bolso, principalmente) se você decidir que o vulto é um fantasma e pagar alguém para “exorcizar” sua casa**.



Este tipo de comportamento, embora possa não parecer numa análise mais superficial, é semelhante à crença em teorias de conspiração. Psicólogos comportamentais e estudiosos do tema já conhecem este tipo de comportamento há um tempo. Nós, seres humanos, temos uma obsessão profunda (e provavelmente evolutiva) por dar sentido às coisas. Tudo tem que ter um sentido (dentro da nossa capacidade de compreensão). O problema é que nosso mundo não é tão simples assim. E, num mundo complexo que frequentemente não faz sentido (dentro de nossa concepção de sentido), tanto a superstição quanto a teoria de conspiração surgem como formas de “resumir” o mundo, de dar significado a ele e de simplificá-lo. É claro que no mundo dominado pela tecnologia de hoje, e onde provamos que tantas coisas, antigamente consideradas sobrenaturais, eram muito naturais e até mundanas, a superstição começa a ser deixada de lado. Mas nosso “software criador de padrões” e nossa obsessão por significados continua firme e forte, e acaba apenas trocando o foco e sendo atraído para outro caminho: o das teorias de conspiração.

Mas por que teorias de conspiração? Por que não outra coisa? Bem, por diversos motivos, dos quais posso elencar alguns. Mas primeiro, é preciso diferenciar os termos: Conspiração = reunião secreta de indivíduos com intenção de prejudicar/tirar vantagem de alguém ou muitos. Dentro desse prisma, conspiração é algo real, que aconteceu e acontece a todo momento. Já a “teoria de conspiração” se refere às hipóteses de possíveis conspirações existentes. O termo hoje em dia está bastante relacionado a conceitos como OVNIS e sociedades secretas, mas existem teorias de conspiração de todos os tipos, desde alegações de que celebridades não morreram até a ida à lua ter sido uma farsa, passando por hipóteses sobre 11 de setembro e a morte de Bin Laden.



Em todas estas (e outras) teorias de conspiração, temos os mesmos padrões: Partem de um pressuposto real (como, por exemplo, o incidente em Roswell), o que ajuda a dar verossimilhança para a história, envolvem um cronograma sinistro (que, não raro, é associado ao futuro/destruição da humanidade) que ajuda no caráter narrativo para despertar o interesse (quem não está interessado numa história de mistério sobre o futuro da humanidade?) e por último, mas não menos importante, possuem lacunas que podem ser rápida e facilmente preenchidas e que não podem ser verificadas*** em caso de contestação da teoria. Assim, acaba sendo virtualmente impossível ter provas incontestáveis de que uma teoria de conspiração é falsa, quando as evidências podem ser refutadas ou ignoradas simplesmente com a alegação de que são “manipuladas”, “fabricadas” ou “fazem parte do plano de desinformação para pensarmos que a conspiração não é real”. Na verdade, se trata de uma versão mais complexa do experimento com o pombo que eu citei no começo: Se, numa situação hipotética, outro pombo fosse colocado ali e pudesse perguntar por que o primeiro está bicando o botão quando não é sempre que a comida aparece, este provavelmente teria uma “desculpa” para manter a superstição: Ou não teria bicado forte o suficiente, ou não teria bicado no ponto certeiro do botão, ou ele precisa bicar e ciscar ao mesmo tempo. Enfim, explicações surgiriam eventualmente para justificar a crendice ao invés de simplesmente admitir suas falhas.



É claro que parece brincadeira dizer que teorias de conspiração servem para simplificar o mundo quando muitas delas são intrincadamente complexas. Mas a chave da teoria de conspiração não é sua complexidade (os mitos de muitas civilizações antigas também possuíam um nível de complexidade interessantíssimo; mas ainda assim continuavam sendo explicações mais compreensíveis da realidade), mas sim o fato de que eles possuem sentido para o público leigo (por isso é fácil para alguém que não entende de física espacial aceitar que uma bandeira não tremularia no vácuo do espaço e, portanto, a bandeira americana supostamente tremulando na lua seria uma prova de que a viagem foi forjada, pois esta é uma explicação simples, que parece fazer muito sentido). Para quem não acredita, pode parecer estranho, mas faz mais sentido imaginar que um jovem doutorando em neurociência tenha sido manipulado para matar diversas pessoas no cinema do que um jovem simplesmente enlouquecer e resolver atirar em um monte de gente achando que é o Coringa. O mundo é aleatório demais para ter o sentido que queremos e, por vezes, também é decepcionante demais. É difícil suportar um mundo onde centenas de vítimas morrem em um tsunami que não discrimina justos de injustos, mocinhos de bandidos. É complicado admitir que não houve um grande plano maligno ou um teste de uma arma secreta, e que foi simplesmente uma tragédia caótica, aléatória, e o que é pior: inevitável. Assim, atribuir tais coisas a teorias de conspiração nos ajuda, não só a dar sentido, mas a digerir um mundo que por vezes é bastante difícil de engolir.



Acreditar em teorias da conspiração, é claro, fica a cargo de cada um. O objetivo deste texto não é definir o que é e o que não é passivo de ser levado como verdade (até porque, quem sou eu para julgar?), e sim apenas esclarecer o tema à luz de estudos vigentes e do conhecimento atual que existe sobre o assunto. Mas é importante termos ciência da facilidade com que temos de enganar a nós mesmos, pois enquanto muitas vezes uma crença numa teoria de conspiração pode ser inofensiva, em outras pode acabar se tornando um problema e prejudicar a nossa vida e das pessoas ao nosso redor. Acreditem, já vi este tipo de paranoia acontecer com pessoas do meu convívio pessoal (é claro que potencializados pelo uso de drogas, mas enfim) e que hoje… Bem, essa é uma longa história e com certeza dará uma ótima teoria de conspiração para contar aos meus filhos futuramente. Mas fica para outra hora.



*Eu evito chamar nossa sociedade de avançada porque, convenhamos…
**É claro que aqui não entro no mérito, por exemplo, da existência ou não de coisas como espíritos; para efeitos de argumentação, parto do princípio que é uma dessas duas coisas: um intruso, ou um engano da mente.
***Existe uma falácia lógica relacionada, chamada “deus das lacunas”, mas eu não vou entrar em detalhes porque o texto já ficou extenso demais – mas este e qualquer dos assuntos e estudos comentadas neste texto podem ser encontradas em uma pesquisa na internet de forma relativamente fácil.

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Só confio em minha intuição,se ela me diz que o barato é estranho.
Quem tem ouvidos pra ouvir que ouça,quem tem cérebro pra pensar,que pense.
 
Só confio em minha intuição,


Parafraseando algo que o @Rommmm escreveu em outro tópico nesse mesmo tópico, acima, uma vez, desde que você conheça muito bem sua intuição, tudo bem.
 
Última edição:
Não gosto desse rótulo "teoria de conspiração", acabamos por excluir grandes caminhos por causa disso. Não devemos nos esquecer de que todo o nosso passado é um grande mito, eu tenho minhas dúvidas sobre o homem ter pisado na lua e tenho uma certa crença sobre o falso ataque ao World Trade Center, pois não experienciei tais momentos, eu não vivi isso, então é claro que a razão tentará criar um sentido para essa realidade. Rebuscando o inconsciente a gente aprende que a humanidade faz caca mesmo, muita teoria mirabolante revela-se como uma chave para muito mistério e muito lunático é lunático mesmo, então dê as mãos para a Dúvida e para a Fé e segue cantando, ou só caminhando em frente se não souber cantar. Essa p**** toda é muita louca mesmo!
 
eu tenho minhas dúvidas sobre o homem ter pisado na lua e tenho uma certa crença sobre o falso ataque ao World Trade Center, pois não experienciei tais momentos, eu não vivi isso, então é claro que a razão tentará criar um sentido para essa realidade.


Por outro lado, se você restringir a sua realidade ao que viveu, vai sobrar muito pouco para você considerar realidade.

E mesmo o que você viveu pode ser posto em dúvida. Nosso cérebro modela as imagens que vemos. Nossas emoções, momentâneas ou não, influenciam de modo crucial nossa percepção, e a nossa memória não é assim tão confiável quanto gostamos de pensar.
 
Segue um vídeo que achei por acaso. No final tem uma mensagem interessante.

Infelizmente não contém legenda em português.
 
Última edição:
temos que ter em mente , que nosso pior inimigo pode ser nossa própria mente , é doloroso porém verdadeiro ...
 
Hoje em dia cada um quer se garantir,seja buscado conhecimento de algo,aprofundando no mesmo,outros cantam Zeca ("deixe a vida me lavar").Na minha opinião ninguém esta no controle de nada,nenhum reino,nenhum sistema,por mais que as evidências dizem isso.Coisas novas acontecem,coisas novas nos surpreendem,coisas novas nos mudam,e se acontecem é porque tem propósito,e se tem propósito é pra nos levar pra algum lugar onde vamos entender quem somos.Que se dane essa droga de conspiração,se o homem foi a lua ou não etc e tau,nada disso vai me mudar porque essa historia toda é mais velha que minha vó.Não quero me preocupar com isso,na verdade não preciso disso,isso me contamina.Prefiro acreditar que o mundo que vivo é belo,que o tocar da brisa marítima me acaricia,que o calor do sol me renova,que as cores me alegram,que meu respirar é meu propósito,isso é viver,isso é ter prazer,isso é ser feliz.
 
Do Blog do Carlos Orsi

quinta-feira, 20 de março de 2014

Dei uma passada no YouTube para assistir ao vídeo da TV Folha com os supostos ideólogos da tal Marcha Com Deus Pela Família Etc. e Tal, e tomei um tremendo susto. Não sei se os leitores do blog se lembram, mas em julho do ano passado a revista Galileupublicou uma reportagem minha sobre teorias da conspiração. Entre outras coisas, a matéria incluía alguns avisos, feitos por psicólogos e cientistas políticos, sobre como teorias assim são perigosas, na medida em que solapam a capacidade de diálogo dentro da sociedade, transformam adversários em inimigos e, no fim, ameaçam a democracia.

Enfim. Enquanto assistia à Folha dar corda para que seus entrevistados se enforcassem, alguns sinais de alerta começaram a pipocar na minha cabeça: um deles disse que a "Nova Ordem Mundial" está controlando o Brasil. Outro, que o "Barão Rothschild" é o dono do mundo. Não sei como ninguém mencionou a Maçonaria, os Illuminati, os Reptilianos. De repente, ficou no chão da ilha de edição, ou no equivalente digital.

Falando assim pode parecer que achei graça, mas longe disso. Por dois motivos.

Primeiro: quando eu estava preparando minha matéria -- para quem não viu, ou não se lembra, o texto foi estruturado em tópicos, sendo que cada tópico representava uma conspiração diferente -- um dos temas que cheguei a propor ao editor Alexandre Matias foi "judeus".

Acabou descartado, basicamente para evitar maus-entendidos, mas a sugestão nasceu de um dado bem concreto: basicamente, toda teoria de conspiração surgida no mundo ocidental, pelo menos do século 18 para cá, é, no fundo, antissemita. Dos Illuminati da Baviera à Internacional Comunista, do Grupo Bilderberg aos Alienígenas Cinzentos, não parece haver uma única fantasia paranoica a oeste da Sibéria que não tenha dado um jeito de reivindicar, para sua galeria de vilões, o "Barão Rothschild" e seus sequazes circuncidados.

Esboçando uma genealogia da coisa, a maioria das teorias sobre "governo mundial" passam, mesmo que seus proponentes atuais não saibam, por Nesta Webster (1876-1960), uma -- mais ou menos -- historiadora britânica, figura humana, em linhas gerais, especialmente deplorável e antissemita delirante. Creio que todo mundo que veio do século 20 sabe o tipo de merda que isso costuma dar.

A segunda razão está lá no texto da Galileu. Com o perdão da autocitação, reproduzo:

Embora o termo “paranoia” esteja quase sempre associado à conspiração, ela não se traduz como patologia psicológica coletiva. O fato de lidarem com o implausível mascara que as teorias são parte da opinião pública, como descrevem os cientistas políticos J. Eric Oliver e Thomas J. Wood da Universidade de Chicago, em estudo publicado em 2012.

Eles escrevem que essas teorias servem para consolidar uma opinião populista que tende a extremos conservadores, como tradicionalismo, xenofobia, etnocentrismo e isolacionismo. Esta constatação confirma um artigo clássico sobre o assunto, publicado em 1964, em que o historiador americano Richard Hofstadter (1916-1970) chamava atenção para o caráter corrosivo destas teorias no debate público. Se o adversário conspira, as ferramentas da democracia — negociação e diálogo — não funcionam, restando uma escalada retórica que gera ressentimentos e pode produzir violência.


E, por fim:

O cientista político Michael Barkun, que já atuou como consultor do FBI, vê a subcultura das conspirações como um sistema integrado, uma rede em que o ponto de entrada não permite determinar o destino: o melhor indicador para prever se uma pessoa vai acatar uma nova teoria de conspiração é se ela já aceita outra, não importa qual.
Destilando o principal: "O fato de lidarem com o implausível mascara que as teorias são parte da opinião pública" e " o melhor indicador para prever se uma pessoa vai acatar uma nova teoria de conspiração é se ela já aceita outra, não importa qual". Em outras palavras, o fato de uma ideia ser ridícula não significa que não haja muita gente por aí que acredita nela e, dada a porosidade da cultura da conspiração, nenhuma besteira é "grande demais", em princípio, para que seja seguro deixá-la passar sem contestação racional.

Não creio que seja ético, ou mesmo viável, suprimir ideias pela força ou pela lei. Mas isso não significa que elas não devam ser combatidas no discurso público: "desconverter" conspiracionistas convictos pode ser quase impossível, mas há uma massa de indecisos e curiosos por aí que precisa, e merece, ser melhor informada.


http://carlosorsi.blogspot.com.br/2014/03/de-ovos-serpentes-e-o-que-fazer-respeito.html
 
O rebocador emocional das teorias da conspiração
POR MAURÍCIO TUFFANI
23/12/14 10:26

Um dos principais fatores para a aceitação das chamadas teorias da conspiração é nossa atração por narrativas de confronto entre o bem e o mal, destacaram os pesquisadores Eric Oliver e Thomas Wood, da Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, em um artigo publicado na revista de divulgação científica britânica “New Scientist” na segunda-feira (22.dez).

Os adeptos de teorias de conspiração não são apenas pessoas como aquelas que acreditam que o 11 de Setembro foi tramado pelo próprio governo norte-americano, ou as que revestem suas cabeças com papel-alumínio, pensando se proteger de métodos eletrônicos de espionagem por escaneamento cerebral.

Segundo os dois pesquisadores, cerca de 49% da população dos EUA, independentemente do grau de instrução e etnia, concorda com pelo menos uma dessas crenças, como a de que os serviços de saúde do país vacinam crianças apesar de saberem que esses medicamentos provocam autismo e distúrbios psicológicos.

A estimativa é baseada em quatro pesquisas realizadas de 2006 a 2011 nos Estados Unidos com 1. 351 adultos e publicadas por Oliver e Wood neste ano nas revistas científicas “Journal of American Medical Association” e “American Journal of Political Science”. Embora a maioria dos especialistas descartem essas crenças como delírios paranóicos, as evidências desses estudos apontam causas mais complexas e não necessariamente no âmbito patológico.

Nesta semana, ao explicar esses estudos em seu artigo “Por que somos tão ansiosos para abraçar as teorias da conspiração?”, na “New Scientist”, eles afirmaram:

“O cérebro não evoluiu para processar a informação sobre economias industriais, terrorismo ou medicina, mas para a sobrevivência na selva. Isso inclui a tendência a acreditar que predadores invisíveis estão à espreita e que eventos coincidentes estão relacionados de alguma forma. As teorias conspiratórias refletem como nós intuitivamente entendemos nosso mundo e, ironicamente, transmitem segurança emocional. São histórias com sujeitos bons e maus, conflitos, solução e outros elementos narrativos que têm um apelo natural. No final das contas, para os adeptos as teorias da conspiração dão a sensação de verdade.”

Além da narrativa sobre a vacinação, as pesquisas investigaram a aceitação de outras cinco teorias conspiratórias: a FDA estaria boicotando tratamentos naturais de câncer e outras doenças por pressões de fabricantes de medicamentos —será que não houve “mancadas” que ajudaram essa crença?—; serviços de saúde sabem que celulares causam câncer, mas não fazem nada contra isso por pressão das companhias telefônicas; a proliferação de sementes transgênicas faz parte de um plano secreto de corporações para diminuir a população mundial; e a fluoração da água faz parte de uma estratégia secreta de indústrias químicas para despejar resíduos no meio ambiente.

Segundo Oliver e Wood, sem considerar o “rebocador emocional” das teorias da conspiração não poderemos compreender as pessoas que usam chapéus de papel alumínio.

É uma conclusão interessante, mas há razões para crer que muitos escritores de ficção científica e roteiristas e produtores de Hollywood chegaram a ela muito antes e intuitivamente.

PS — Poucos minutos após eu divulgar o post acima no Facebook, o leitor Sandro Abel, observador atento dos propagadores de crendices, comentou sobre meu último parágrafo: “os gurus da ‘verdade mais verdadeira que as outras verdades’ também sabiam”. Realmente!

PS 2 — O biólogo Roberto Takata, doutor em genética e biologia evolutiva pela USP e um dos grandes militantes da divulgação científica do Brasil, publicou em seu blog “Gene Repórter”, em 2009, um post sobre outro estudo, realizado com 348 moradores do sudoeste de Nova Jersey, EUA, que mostrou que 93,9% dos respondentes a uma entrevista por telefone acreditavam em algum grau em pelo menos uma de uma lista de 10 teorias conspiratórias. Cliquem aqui para ler o post e também para conhecer o blog, que recomendo.


http://mauriciotuffani.blogfolha.uo...bocador-emocional-das-teorias-da-conspiracao/
 
Última edição:
Chomksy e a direita delirante, lado a lado na biblioteca de Bin Laden
22/05/2015 por Carlos Orsi

O diagnóstico chomskiano de que o império americano põe a sobrevivência da humanidade em risco dissolve-se facilmente nas grandes visões conspiratórias.

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Já tem gente nas redes sociais tirando onda com o fato de que dois livros de Noam Chomsky foram encontrados na biblioteca pessoal de Osama Bin Laden, mas devagar com o andor: como todo fã de heavy metal, histórias em quadrinhos e role-playing games sabe, a associação entre ícones e hábitos culturais e o comportamento de seus fãs psicóticos é geralmente injusta, frequentemente penosa e, quase sempre, só vale para o “outro”. Um leitor habitual de Chomsky pode achar um absurdo óbvio que se veja na retórica do autor um estímulo ao terrorismo islâmico, mas talvez não relute tanto em fazer ilações a respeito da presença de um livro de Reinaldo Azevedo na estante de algum pitboy espancador de homossexuais.

O mais curioso da biblioteca de Bin Laden, ao menos para mim, é como ela vara o espectro ideológico: há Chomsky, sim, mas também há um clássico indisputável da ultradireita cristã mais reacionária: o imortal Secrets of the Federal Reserve, de Eustace Clarence Mullins, Jr., ou apenas, como assinava, Eustace Mullins (1923-2010).

Este senhor era um antissemita hidrófobo, um dos teorizadores do “racismo científico” por trás do movimento norte-americano de supremacia branca e um dos pais intelectuais do movimento das “milícias constitucionais” nos Estados Unidos, que na década de 90 preconizou a ideia de que os cidadãos “de bem” deviam se armar e se organizar em milícias voluntárias, numa preparação para resistir à crescente tirania do governo. Esse movimento ganhou impulso após a ação de forças federais contra o complexo do Ramo Davidiano em Waco, Texas, para prender o líder cristão David Koresh, que vivia lá com seguidores fiéis e um harém de meninas de 12 a 14 anos, no melhor estilo dos patriarcas do Velho Testamento. O ataque das forças da lei à fortaleza de Koresh resultou num massacre de 74 pessoas, em 1993.

Mullins também foi amigo pessoal e biógrafo do poeta Ezra Pound (1885-1972), e dizia ter iniciado suas pesquisas sobre a grande conspiração por trás do Federal Reserve – o Banco Central dos Estados Unidos – sob instigação e com apoio financeiro do grande escritor fascista. Fundamentalmente, Secrets of the Federal Reserve descreve uma conspiração para pôr o sistema monetário e de crédito dos Estados Unidos nas mãos de um punhado de magnatas inescrupulosos, empenhados em escravizar o povo americano por meio da emissão de dinheiro de papel sem valor intrínseco e da imposição de dívidas espúrias e impagáveis. Por trás de tudo? A Casa de Rothschild, esse titânico bicho-papão (judaico!) das finanças internacionais.

Antissemitismo também é o forte de Bloodlines of the Illuminati, de Fritz Springmeier, um teórico da conspiração mais contemporâneo que aparece na lista de leituras de Osama Bin Laden. Se a conspiração judaica de Mullins é financeira, a de Springmeier é satânica – literalmente. Ele revela que Satanás, o próprio, estabeleceu 13 tribos demoníacas na Terra, em contraponto às 12 tribos escolhidas de Deus, e que essas tribos ainda hoje governam o mundo em segredo, como os tais Illuminati. Há famílias de origens variadas na lista, mas não se engane: Springmeier se desdobra para apontar que cada uma delas é, no fundo, judaica, ou fruto de miscigenação com judeus.

“A totalidade das 13 famílias é aparentada de vários modos, e suas ascendências remontam à antiga nobreza Europeia, à Tribo de Dan e aos cázaros”, escreve ele. Dan é uma das tribos do Reino de Israel, desaparecida quando esse reino foi conquistado pelos assírios, por volta de 740 AEC. Por algum motivo, ela é a única Tribo de Israel que não tem membros “assinalados” no Apocalipse (7:4-8), o que sugere muita coisa para quem tem tempo para pensar nessas coisas.

Já os cázaros, por sua vez, eram um povo nômade da região do Mar Negro que talvez tenha se convertido em massa ao judaísmo na Idade Média, o que fez com que a identidade étnica/cultural cázara sumisse da história. Esse é um ponto que às vezes suscita algum debate acadêmico entre historiadores, embora a evidência genética atual pareça militar contra a hipótese de que parcela significativa da população judaica de hoje tenha ascendência cázara. Onde se vê mais dessa “Hipótese Cázara”, no entanto, é em teorias de conspiração como a de Springmeier, onde os cázaros e a Tribo de Dan costumam desempenhar o papel de “judeus do mal” (Rothschild, o Estado de Israel, etc.), em contraposição ao “verdadeiro” Povo Eleito, que na verdade é… Bom, enfim.

Outra peça conspiracionista da biblioteca é Conspirators’ Hierarchy: The Committee of 300, de John Coleman, que se apresenta como um ex-agente de inteligência. O livro descreve uma enorme conspiração para o estabelecimento de um governo mundial ateu, e da qual todo mundo – mesmo – faz parte, incluindo os socialistas, os comunistas, os maçons, o governo dos Estados Unidos, a monarquia britânica, ordens religiosas católicas e mesmo a extrema-direita cristã, que na verdade é controlada por “um grupo de homossexuais”. Coleman diz que o objetivo final do “Comitê dos 300” é reduzir drasticamente a população mundial, bloqueando as vias de desenvolvimento econômico e violando o mandamento divino de “crescei e multiplicai-vos”.

E o que todas essas teorias da conspiração estão fazendo na biblioteca do homem que articulou a conspiração seminal deste século? Como bem notou o filósofo Matthew R.X. Dentith, a expressão “teoria da conspiração” tornou-se problemática porque, como vivemos num mundo onde conspirações realmente acontecem, a simples ideia de que se pode jogar uma proposição fora porque ela tem viés conspiracionista não se sustenta – dá até para taxonomizar uma nova falácia retórica, ad coniuratium, o “apelo à conspiração”.

Mas as teorias da conspiração de Mullins, Springmeier e Coleman são de um tipo especial: elas são escaláveis, expansíveis e totalizantes. Começando pelo final: são totalizantes porque tentam abraçar o Universo. Mesmo a de Mullins, que parece ter o objetivo mais modesto de expor a origem do Federal Reserve americano, acaba atribuindo duas guerras mundiais (incluindo ascensão de Hitler), a Revolta dos Boxers na China e a Grande Depressão à ação deliberada de agentes conspiratórios, numa cadeia de atrocidades e conjurações interligadas de fazer inveja à Hidra ou à Spectre.

São escaláveis porque permitem que se encaixem conspiradores sobre conspiradores, conspirações dentro de conspirações, num jogo de bonecas russas: a decisão é do Congresso americano? Não, na verdade é dos banqueiros. Dos banqueiros? Não, na verdade de Rothschild. De Rothschild? Não, na verdade dos judeus. Dos judeus? Não, na verdade dos cázaros. Dos cázaros? Não, na verdade das 13 Tribos Satânicas. Das 13 Tribos? Não, na verdade de Satã em pessoa. E dá para acrescentar Cthulhu acima de Satã, e o Monstro de Espaguete Voador acima de Cthulhu, e o Partido Comunista Venusiano acima do Monstro, e tudo continua funcionando muito bem.

E são expansíveis porque, assim como os mundos ficcionais de onde saíram a Hidra e a Spectre, essas teorias se amoldam para acomodar todo tipo de história, todo tipo de evento, todo tipo de eventualidade. São capazes de absorver retcons e crossovers com maior facilidade que a linha narrativa principal da Marvel Comics. Por exemplo: edição recente da revista Fortean Times (periódico que recomendo fortemente a qualquer um que tenha algum interesse em folclore contemporâneo, ou em acompanhar o produto alucinógeno dos fungos e leveduras que vão digerindo as bordas do zeitgeist) informa que vem ganhando adeptos a tese de que o naufrágio do Titanic foi causado para matar os banqueiros “do bem” que se dirigiam aos EUA para interferir – adivinhe só? – na fundação do Fed.

Essas características – expansividade, totalidade, escalabilidade – pode muito bem explicar a presença concomitante dos delírios de Springmeier e das críticas mais bem embasadas de Noam Chomsky na estante de Bin Laden.

Um diagnóstico como o apresentado por Chomsky em seu Hegemony or Survival – um dos livros da lista de Osama –, de que a hubris imperial norte-americana põe a sobrevivência da humanidade em risco, somada à ideia, também defendida por ele, de que a democracia ocidental é imperfeita, já que guiada e manipulada pelas elites, deixa-se dissolver muito facilmente na matrioska amorfa das grandes visões conspiratórias.

Em seu já clássico, e muito frequentemente citado, ensaio sobre teorias da conspiração, The Paranoid Style in American Politics, o historiador Richard Hofstadter (1916-1970) enuncia o perigo desse tipo de pensamento:

O porta-voz paranoico (…) está sempre defendendo as barricadas da civilização (…) não vê o conflito social como algo a ser mediado e negociado, como o político profissional. Já que o que está em risco é sempre o conflito entre bem e mal absolutos, o que se faz necessário não é transigência, mas a vontade de lutar até o fim.


O que se pode deduzir disso tudo é que Bin Laden provavelmente via a si mesmo como um defensor das barricadas da civilização contra o monstro do imperialismo americano, que talvez fosse apenas um títere de – quem sabe? – as Tribos de Satã. Citando mais uma vez Hofstadter: “Fica difícil resistir à conclusão de que o inimigo é, de muito modos, a projeção do ego; tanto os aspectos idealizados quanto os inaceitáveis do ego são atribuídos a ele”. A advertência de Nietzsche sobre monstros e abismos revela-se, aí, um fato urgente e material.


http://www.revistaamalgama.com.br/05/2015/chomsky-direrita-delirante-biblioteca-osama-bin-laden/
 
Físico construiu equação para estimar por quanto tempo suposta conspiração pode 'sobreviver' antes de ser revelada
É difícil manter uma conspiração sob sigilo, afirmam cientistas, porque cedo ou tarde um dos conspiradores irá dar com a língua nos dentes. Um estudo analisou por quanto tempo uma suposta conspiração pode "sobreviver" antes de ser revelada - de forma intencional ou não - ao público em geral.
As missões tripuladas à Lua são objeto de conhecidas teorias da conspiração
David Grimes, da Universidade de Oxford, na Inglaterra, concebeu uma equação para expressar esse fenômeno, e aplicou a fórmula a quatro famosos conluios. O trabalho foi publicado na revista científica Plos One.
A equação desenvolvida por Grimes, um físico que cursa pós-doutorado em Oxford, se baseia em três fatores: o número de conspiradores envolvidos, o tempo passado desde o evento e a possibilidade intrínseca de uma conspiração falhar.
Ele aplicou a equação a quatro famosas teorias da conspiração: a ideia de que a chegada do homem à Lua foi uma farsa, a crença de que a mudança climática não existe, a suposta ligação causal entre vacinas e autismo e a convicção de que companhias farmacêuticas esconderam a cura do câncer.
A análise de Grimes sugere que se as quatro conspirações fossem reais provavelmente já teriam sido reveladas.

Especificamente, o "boato" da conquista da Lua teria sido desmascarado em 3,7 anos; a "fraude" do aquecimento global, em 3,7 anos a 26,8 anos; a "conspiração" sobre vacinas e autismo, em 3,2 anos a 34,8 anos, e a "conspiração" do câncer, em 3,2 anos.

"Os métodos matemáticos usados nesse artigo são similares à matemática que usei anteriormente em minha pesquisa acadêmica sobre física das radiações", afirmou Grimes.

Construindo a equação
Para determinar sua equação, Grimes começou com a distribuição de Poisson, uma ferramenta estatística que estima a probabilidade de um evento particular ocorrer em um certo período de tempo. Usando suposições e dedução matemática, ele produziu uma fórmula geral, mas incompleta.

Ainda faltava uma boa estimativa sobre a probabilidade intrínseca de uma conspiração falhar, ou seja, vir a público. Para determinar isso, o pesquisador analisou informações sobre três conspirações reais.

A primeira foi o programa de vigilância da NSA (agência de inteligência americana) conhecido como Prism. O programa envolveu, no máximo, 36 mil pessoas, e foi revelado pelo ex-funcionário da NSA Edward Snowden após seis anos.

A segunda foi o experimento sobre sífilis de Tuskegee (EUA), em que homens negros com sífilis ficaram sem tratamento de forma deliberada para permitir estudar a "história natural" da doença. A pesquisa envolveu até 6,7 mil pessoas, e o médico Peter Buxtun revelou o caso após 25 anos.

A terceira foi um escândalo no FBI (polícia federal americana), tornado público pelo médico Frederic Whitehurst, sobre erros nas práticas forenses da agência, que levaram à prisão e à execução de pessoas inocentes.

Grimes estima que até 500 pessoas possam ter se envolvido nas práticas irregulares, e que o escândalo tenha levado seis anos para ser divulgado.

A equação criada pelo físico representa o "melhor cenário possível" para conspiradores - ou seja, assume que os conspiradores são bons em guardar segredos e que não há investigações externas sobre seus conluios.

Juntando os pontos
Ao confrontar os números de três conspirações conhecidas, Grimes calculou que a possibilidade intrínseca de uma conspiração falhar é de quatro em um milhão.

Embora o número seja pequeno, a chance de uma conspiração se tornar pública aumenta com o passar do tempo e com a quantidade de conspiradores.

O "boato" sobre o pouso na Lua, por exemplo, começou em 1965 e teria envolvido cerca de 411 mil funcionários da Nasa (agência espacial americana). Com esses parâmetros, a equação de Grimes sugere que uma farsa sobre o tema teria sido revelada depois de 3,7 anos.

Além disso, como a suposta trama já tem 50 anos, a equação estima que, para isso, no máximo 251 conspiradores estariam envolvidos. Desta forma, é mais razoável acreditar que a conquista da Lua foi real.

Monty McGovern, matemático na Universidade de Washington, disse que os métodos do estudo "surpreendem por serem razoáveis e as probabilidades, bastante plausíveis".

"Embora acredite que seja difícil mudar a opinião dos convictos, espero que esse artigo seja útil para aqueles mais em dúvida sobre a possibilidade de cientistas perpetuarem ou não um boato", afirmou Grimes.

http://ultimosegundo.ig.com.br/mund...e-conspiracoes-estao-fadadas-ao-fracasso.html
 

Anexos

  • On the Viability of Conspiratorial Beliefs journal.plosone.pdf
    454.9 KB · Visualizações: 0
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