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Farmacologia da Consciência: Uma Narrativa de Experiência Subjetiva
Andrew Weil
Artigo 48 de "Toward a Science of Consciousness", Conferência realizada em Tucson (1996) e Elsinore (1997)
Tradução: Leila Nery Souza Triska
Esta é uma sessão que "muda o compasso", e sinto uma certa responsabilidade em abri-la. Pela prática, sou um botânico e um médico. Eu encontrei somente 4 ou 5 outros médicos que cursaram botânica como graduados, e nenhum deles fez uso de seu treinamento em botânica nas suas práticas médicas. Eu uso muito. Como praticante de medicina natural, eu recomendo muitos remédios derivados de plantas aos pacientes.
Meus interesses atuais são respostas de cura e respostas de placebo, que eu considero serem exemplos de respostas de cura mediadas pela mente. Respostas de placebo são realmente o "filé "da medicina. Ao invés de nos preocuparmos em excluí-las, penso que deveríamos estar pesquisando como utilizá-las mais para tratamentos menos invasivos e custosos.
Algumas pessoas que me conhecem pelo meu trabalho em medicina natural ficam incomodadas quando sabem que meu trabalho passado foi pesquisa em plantas e drogas psicotrópicas. Eu conduzi os primeiros experimentos humanos controlados com maconha em 1968, investiguei cogumelos contendo psilocibina na América do Norte e Sul, e estudei uma variedade de plantas alucinógenas como também plantas medicinais. Eu fiz muito deste trabalho entre 1971 e 1985, quando eu era pesquisador em etnofarmacologia, associado ao Museu Botânico de Harvard ; eu não posso separar estas duas fases da minha carreira, pois muito da minha compreensão em interações mente-corpo e sua relevância para cura derivam de observações que eu fiz de pessoas em estado alterado de consciência induzidos por drogas psicoativas.
Uma das questões mais comuns quando indagado a falar sobre drogas psicoativas - especificamente drogas alucinógenas e psicodélicas - é como elas agem. Minha resposta é que eu não tenho uma definição. O que sabemos sobre farmacologia destas substancias - por exemplo , que elas interagem com receptores da serotonina - não nos diz nada sobre como elas induzem algumas pessoas a complexas, ricas e variadas experiências assim como faz outras fugir delas aterrorizadas. A proposta da minha conversa hoje é dirigir sua atenção ao tremendo abismo que existe entre o que entendemos neuroquimica e neurobiologicamente sobre o que realmente as pessoas experienciam da consciência.
No curso desta palestra me referirei a dois quebra-cabeças etnofarmacológicos que foram recentemente resolvidos através da pesquisa. Um consiste num animal e outro numa planta, ambos fontes de drogas psicoativas incomuns, associados com muitas experiências incomuns .
Primeiro deixe-me contar-lhes uma breve anedota do tempo que eu controlava estudos de maconha; isto foi realizado em Boston University em 1968 (Weil, Zinberg e Nelsen 1968).
Uma tentativa básica era simplesmente mostrar que você podia estudar sobre a maconha em seres humanos num laboratório - nenhuma façanha nos dias de hoje. Havia grandes obstáculos em se conseguir maconha legalmente, e ter permissão das burocracias da Universidade, do Estado e Federal. De alguma forma, nas Universidades era mais difícil. Eu era um estudante senior na Harvard Medical School naquele tempo, e o único controle que Harvard tinha sobre o projeto era através de mim; o comitê de assuntos humanos ameaçava negar meu diploma médico se eles não gostassem do meu projeto experimental. Era central para o projeto o uso de "cobaias inocentes" em marijuana, pois eu estava interessado em descobrir o que a droga por si só fazia com pessoas que não tivessem expectativas como resultado de experiências anteriores. Harvard não queria que eu usasse pessoas nesta condição. Eles pensavam que se eu introduzisse as pessoas à maconha, a universidade seria processada quando estas pessoas se tornassem eventualmente viciados em heroina. Depois de muita briga, eles decidiram que nós não podíamos usar estudantes de Harvard como "cobaias", mas que poderíamos usar estudantes fora desta Universidade.( a propósito, por toda esta desavença, meus colegas e eu tivemos grande dificuldade em achar "cobaias inocentes" na população estudante de Boston).
Finalmente, as experiências começaram, e eu estava fascinado pela reação dos "cobaias inocentes" , cada um vinha para três sessões, uma com cigarros placebo de talos da planta macho destituídos de THC, e dois com cigarros de marijuana ativa de diferentes potências. Apesar dos experimentos serem duplo-cego, eu pude fazer boas suposições de quem fumou marijuana e quem não, por causa dos sinais físicos que as pessoas mostravam após consumir os cigarros. Os que tinham THC tinham olhos vermelhos, e aumentavam seus níveis cardíacos, vinte ou trinta pontos acima do normal. Era impressionante ver um por um com olhos vermelhos e níveis cardíacos aumentados dizendo "Eu tomei a droga esta noite? Eu não acredito que peguei a verdadeira". Muito interessante. Agora este era um cenário neutro de laboratório, onde nenhum encorajamento estava dado no sentido de se "ficar mais alto", e isto foi o que achamos: pessoas que eram marijuana-inexperientes, apesar que demonstrassem o efeito fisiológico da droga, não tiveram experiências, nem alterações significativas da consciência. Eu penso que foi uma observação importante, algo que demanda explicação e que sugere os tipos de problema que limitam o uso de farmacologia para explicar a experiência humana.
Trabalhando através dos anos com várias substancias psicoativas, entrevistando muitos usuários destas e refletindo nas minhas próprias experiências com elas, eu me tornei um forte proponente do ponto de vista que experiências com drogas são criadas por três grupos de fatores: droga, jogo e cenário. Em "droga" eu incluiria a natureza farmacológica da substancia, a dose, a via de administração, que pode ter enorme influência nos efeitos das drogas psicoativas; "jogo" seria um conjunto de fatores relacionados às expectativas das pessoas ao que vai acontecer com elas, ambos conscientes e inconscientes. Um problema em analisar grupo é que as expectativas inconscientes são mais determinantes de experiências que as expectativas conscientes. Expectativas inconscientes, por definição são difíceis de se elucidar. "Cenário" se refere ao ambiente físico no qual uma droga é tomada assim como o ambiente social e cultural.
Estes três grupos de fatores interagem para criar uma experiência numa pessoa em particular, num lugar e tempo particular. A farmacologia por si só, não importa o quão sofisticada, não pode explicar estas interações por si mesmas. A farmacologia da droga é apenas um grupo de fatores que interagem igualmente com os outros dois. Na minha experiência, farmacologistas elogiam falsamente os conceitos de jogo e cenário, mas vão adiante e agem como se tudo o que importa é farmacologia .O fato difícil é que sob condições apropriadas de grupo e cenário, uma dose de anfetamina administrada experimentalmente pode fazer cobaias caírem de sono, enquanto que uma dose de barbitúrico administrada experimentalmente pode tornar uma pessoa estimulada e alerta. Estas respostas são reversos de 180 graus de ações farmacológicas determinadas em seres humanos e animais. O poder do jogo e do cenário é imenso; se você ignorar estas variáveis ao tentar interpretar as respostas às drogas, você estará em risco. Eu digo a vocês isto com base nas experiências que vou descrever agora.
Eu gostaria de ler para vocês uma passagem de um livro com que eu topei em 1971. O livro era "Mago do Amazonas Superior, e o autor era Bruce Lamb, um homem que eu mais tarde vim a conhecer muito bem, e que morreu ano passado. Ele trabalhava como consultor técnico de uma grande companhia madeireira sediada em Nova York, que alguns anos atrás estava extraindo madeiras tropicais das florestas do Peru. Bruce Lamb tinha coordenado grandes equipes de operários peruanos .Um homem que ele gostava muito dentro da força de trabalho parecia denotar respeito entre os outros. Ele tinha um tipo de carisma especial. Assim que Lamb o conheceu, descobriu que era um famoso curandeiro, um curador tradicional. Através dos anos, eles se tornaram grandes amigos. O curador, cujo nome era Manuel Córdova, contou sua estória de vida a Lamb, que eventualmente a escreveu no livro cuja passagem eu lerei. Manuel Córdova morreu numa idade avançada, há 15 anos; sua estória continua causando fascínio...
Quando jovem, em torno da virada do século, ele foi raptado por índios Amahuaca, no Noroeste da Amazônia, cujo território estava sendo invadido por exploradores da borracha . Em sonhos e visões, os índios tinham visto que seu modo de vida estava prestes à extinção. Eles conceberam a idéia de que, se eles pegassem a pessoa certa da cultura invasora e a treinassem a seu modo, ela poderia salvá-los. Por isso pegaram Manuel Córdova e o legaram para viver com eles. O principal método de seu treinamento era dá-lo repetidas doses da bebida alucinógena ayahuasca, que eu penso ter ouvido falar antes nesta conferência de Fred Alan Wolf. Ayahuasca é a principal preparação de planta alucinógena da América do Sul, usada especialmente no Noroeste da Amazônia. É feita de formas diferentes em diferentes regiões, mas o ingrediente constante é uma planta trepadeira lenhosa, Banisteriops caapi, cujo princípio ativo é a harmina, um dos drogas alucinógenas com radicais amino indólicos, do mesmo grupo que encontramos no LSD e na psilocibina. Estas drogas tem similaridades estruturais com a serotonina e a melatonina.
A casca da trepadeira Banisteriops é normalmente combinada com as folhas de outras plantas que contêm uma droga psicodélica relacionada, a dimetiltriptamina ou DMT. Quando antropologistas e botânicos descreveram primeiramente a preparação desta bebida, eles escreveram que o DMT contido nela não podia contribuir para sua atividade porque é destruído pela monoamino oxidase do intestino e é somente ativo por via parenteral. Índios que fazem e bebem ayahuasca dizem que eles adicionam as folhas contendo DMT para tornar as visões mais brilhantes. Seu propósito geral em tomar a bebida é ter visões, que eles usam de uma maneira prática para diagnosticar doenças e determinar caminhos de cura através de mudanças de circunstancias da vida. O que resulta é que a harmina inativa a monoamino oxidase, de tal modo que quando você combina estas duas plantas, você em uma preparação oral ativa do DMT. Isto é extraordinário. Se você perguntar aos antropólogos e botânicos como os índios chegaram a este preparado farmacológico sofisticado, eles te dirão que foi por tentativa e erro. Se você estiver sentado numa palestra e um professor lhe diz isso, você anota num caderno sem questionar. Mas eu posso lhe dizer que se você está na floresta tropical olhando para aquela profusão de plantas, é difícil imaginar um shaman cozinhando um novo punhado de Banisteriops (Lamb 1974) todos os dias e dizendo, "Bem, vamos ver. Hoje eu vou tentar aquela folha". Se você perguntar aos shamans que fizeram o ayahuasca como eles aprenderam a técnica, eles também lhe dão uma resposta consistente. Eu já perguntei a vários deles, e eles sempre respondem que a Banisteriops mostrou a eles em visões. Esta é a resposta que você obtém de todos os shamans, que eles aprenderam em visões.
Córdova passou um número de anos com esta tribo até que seu relacionamento terminou e ele voltou para a sua própria cultura. Eu gostaria de ler para vocês uma breve descrição de uma das sessões de treinamento. No começo ele tomou a bebida sozinho com o chefe da tribo, que era o mestre em arranjo de grupo e de cenário para manipular a experiência com a poção alucinógena. Somente mais tarde, quando Córdova estava mais familiar com a ayahuasca, o chefe o permitiu que se juntassem às sessões de visão em grupo.
Era um seleto grupo de 12 que ia a um local afastado dentro da floresta. Faziam parte alguns dos mais velhos e vários dos melhores caçadores ritual e os cantos eram parecidos com as ocasiões anteriores, talvez um pouco mais elaborados. Dos cantos preparatórios da fumaça perfumada e da evocação do espírito honi xuma ( isto é, a trepadeira que fornece a droga), era evidente que o Chefe Xumu tentando nesta sessão fixar na minha consciência as circunstâncias importantes e essenciais de sua vida tribal. Parecia haver um intenso sentimento de harmonia entre o grupo, todos dedicados ao propósito do ancião.
Eu estava consciente da mão frágil que misturava o fluido mágico e passava as xícara por cada um. Nós bebemos em união e ficamos em serena comunhão, saboreando a fumaça perfumada e a quietude da floresta silenciosa. Um canto tranqüilo deteve nossos pensamentos conscientes em conjunto á medida que a poção tomou efeito. Uma segunda xícara foi passada para intensificar a reação. Visões coloridas, indefinidas na forma, começaram a evoluir dentro de uma vista de encantada beleza. Logo em seguida, cânticos sutis e evocativos conduzidos pelo chefe tomaram conta da progressão de nossas visões.
Em seguida, começou o desfile de animais, começando pelos felinos da floresta. Alguns deles não tinham sido vistos antes. Havia um ------- puma, várias espécies de pequenos---------manchados e aí então, um jaguar pintado gigante. Um murmúrio do grupo indicava reconhecimento. Este animal imenso se arrastava com a cabeça pendurada e a língua para fora. Horrível, suas presas grandes se mostravam na bocarra aberta. Uma mudança instantânea de comportamento para vigília causou um tremor no círculo de fantasmas telespectadores.
Então , aqui temos pessoas compartilhando visões e reagindo ao conteúdo destas visões de maneira consistente.
Agora, ao escutar o relato de uma experiência como esta, a primeira pergunta que vem a mim é: é acreditável? Eu acredito nisto? Como eu posso acreditar em algo tão fora do comum, ao menos que eu tenha tido uma experiência similar ou me sentido totalmente convicto sobre a credibilidade das pessoas contando a estória...Eu não conhecia Manuel Córdova, mas eu conhecia Bruce Lamb e não tinha nenhuma razão para duvidar de sua precisão de relato. Claro que ele poderia ter sido enganado pelo seu informante. Neste caso eu tive uma experiência com uma substancia relacionada a esta, que me faz acreditar na estória que acabei de contar.
O primeiro dos dois quebra-cabeças etnofarmacológicos que eu prometi contar para vocês consiste num animal maravilhoso, nativo do nosso deserto, aqui de Tucson, chamado Bufo alvarius, que costumava ser chamado de sapo do Rio Colorado e agora é chamado de sapo do Deserto de Sonora (Valdés). É um sapo enorme: espécies grandes são quase do tamanho de bolas de futebol. Nesta época do ano eles estão hibernando no subsolo, mas assim que as noites esquentarem, daqui a um mês, eles começarão a aparecer. Eles se reúnem em torno de luzes à noite, e comem qualquer criatura menor que eles mesmos. Quando vêm as chuvas de verão, eles acasalam, e seus girinos se desenvolvem rapidamente na água parada em todo o deserto. Como todos os membros do gênero Bufo, eles tem secreções venenosas. Eles tem glândulas de veneno, enormes, atrás dos olhos, e pequenas nas pernas, banhando a pele de toxinas. Bufo alvarius não possuem predadores. Muitos morrem sob os pneus dos carros, mas nenhum ser os come.
Nos anos 60 e no início dos anos 70, a editora da Universidade do Texas publicou uma monografia sobre o gênero Bufo que incluía um capítulo sobre os venenos de diferentes espécies. Foi observado nesta publicação desconhecida que Bufo alvarius era único que tinha uma enzima rara que convertia a bufotenina, uma toxina de sapo comum, em um análogo da serotonina, um psicodélico muito potente chamado5-metoxi dimetiltriptamina, ou 5-MeO-DMT, um parente bem próximo do DMT nas folhas que produzem visões brilhantes para os bebedores de ayahuasca.De fato, estas duas triptaminas normalmente ocorrem juntas em algumas plantas que os índios preparam em rapés alucinógenos. O veneno de Bufo alvarius contem 15% de 5-MeO-DMT. Eu desconfio que algumas pessoas que leram a monografia tiveram a idéia de experimentar o veneno como pscodélico, mas eu não tenho nenhuma maneira de prová-lo. Algumas pessoas acham que o conhecimento da psicoatividade deste sapo veio dos povos nativos que usaram o veneno como alucinógeno nos tempos pré-Colombianos. De qualquer maneira, é o primeiro alucinógeno de origem animal.
Números significativos de pessoas, aqui e em outros lugares, estão coletando estes sapos e retirando seu veneno, que é seco e usado como fumo. Eu temo que este novo interesse represente uma ameaça aos nossos sapos, especialmente na medida que seu habitat está desaparecendo, com o crescimento urbano. É possível ordenhar as glândulas de veneno sem machucar os animais. O método é apertar a glândula até que ela esguiche um jato de veneno, que pode ser coletado num prato. Quando o sapo é solto após o procedimento, ele volta a comer tudo pela frente, aparentemente sem ter sido perturbado.
Quando eu ouvi pela primeira vez sobre pessoas inalando os vapores do veneno de Bufo alvarius para alterar a consciência, fiquei interessado mas céptico, pois nosso sapo tem uma forte reputação de ser perigosamente venenoso. Ele freqüentemente envenena cães que o abocanham, fatalmente. Eu conheço um dono de cachorro que tirou um sapo da boca de seu animal em 10 segundos, mas apesar disso, após 30 minutos, o cão começou a salivar profusamente, então teve um ataque e morreu de parada respiratória. Existe um relato na literatura médica de um garoto de sete anos do sudeste do Arizona que lambeu um destes animais e foi trazido para esta instituição em estado epiléptico; ele sobreviveu. Aparentemente, quando você fuma o veneno - e eu digo aparentemente pois eu não fiz qualquer análise química para provar - a neurotoxicidade poderosa é destruída ou largamente destruída, enquanto o 5MeO-DMT entra dentro do seu sistema de forma eficiente. Eu conheço muitas pessoas que usaram o veneno de sapo, algumas que fumaram centenas de vezes, e não parecem piores por terem usado.
Quando os vapores de 5-MeO-DMT são inalados, eles causam uma mudança quase instantânea na consciência. Tipicamente, uma pessoa cairá para trás e simplesmente não estará presente por alguns minutos. A experiência é muito breve, 5 ou 7 minutos, seguida de um retorno gradual à consciência normal. Freqüentemente as pessoas só se lembram da volta; algumas vezes recordam uma sensação de terem sido dissolvidas, ou não tendo existido por um período de tempo. Algumas pessoas acham a coisa todo muito assustadora. Outras acham a volta, a reconstituição do self extremamente prazerosa. Eu acho que altas doses de veneno de Bufo seria uma experiência muito aterrorizante para a maioria dos que tem pouca experiência anterior de alterações de consciência induzidas por drogas.
Eu usei o veneno e o 5 MeO-DMT sintético apenas poucas vezes, e eu relatarei uma experiência que tive. Eu inalei os vapores com um amigo meu que já tinha usado antes, e a fase inicial da intoxicação foi - bem, eu simplesmente não me lembrei. Mas no período de reconstituição, e tornando-me mais consciente de mim mesmo e da realidade externa, houve uma experiência diferente que durou um minuto ou dois, onde eu simplesmente parecia estar presente em cada consciência (minha e do outro).Quando nós pudemos falar um com o outro de novo, meu amigo contou que tinha tido a mesma experiência. Logo, enquanto eu nunca tinha tido visões de grupo simultâneas, eu tive um gostinho de uma experiência que me faz pensar que tal compartilhamento é possível, especialmente com treinamento e sob a direção habilidosa de alguém que conhecia como manipular um estado alterado induzido por um alucinógeno poderoso.
Agora eu simplesmente gostaria de externar minha opinião de que, de fato, se a experiência que eu li para vocês foi real, eu acho que estamos muito longe de poder imaginar de sermos capazes de explicar a experiencia em termos do que sabemos sobre microtúbulos e redes neuronais Eu sou todo para a pesquisa de microtúbulos e redes neuronais. Eu também sou contra a redução de experiências complexas, que tem um imenso significado para aqueles que a experienciam , dentro de qualquer tipo de moldura mecanicista.
Agora eu darei a vocês outro exemplo, tendo a ver com o segundo quebra-cabeças etnofarmacológico, que diz respeito a uma planta que tem deixado os pesquisadores perplexos. Albert Hofmann, o químico farmacêutico suíço que descobriu o LSD, e R. Gordon Wasson, banqueiro de Nova York que descobriu o uso de cogumelos alucinógenos no México, na década de 50, se uniram para investigar a etnofarmacologia de três alucinógenos usados tradicionalmente por índios Mazatec, no estado mexicano de Oaxaca. Hofmann identificou psilocibina das espécies de cogumelo de Wasson, e então sintetizou-a. Eles então levaram o composto à Maria Sabina, shaman que era informante do chefe de Wasson, em seu vilarejo nas montanhas. Ela conduziu a velada, uma cerimônia com o cogumelo, usando a droga sintética da Suíça. No fim ela declarou como boa, e ficou feliz por não depender de chuva para suas cerimônias - um grande triunfo da farmacologia de laboratório.
Hofmann e Wasson então dirigiram sua atenção para as "glórias matutinas mexicanas", outro alucinógeno conhecido pelos conquistadores espanhóis , cuja identidade era desconhecida. Eles identificaram as espécies principais em uso e encontraram um análogo ao LSD, que a natureza produz, uma substancia chamada LAE, a monoetilamida do ácido lisérgico.
Então eles foram atrás de uma terceira planta alucinógena, conhecida como Maria Pastora. Os índios disseram a Wasson que esta substancia não era tão poderosa como as outras duas, mas era importante no treinamento de shamans, especialmente no primeiro nível de treinamento. Eventualmente, espécies da planta eram coletadas e identificadas como menta, uma descoberta inesperada , pois a família das mentas, as Lamiáceas, não é um grupo de plantas rico em alcalóides ou toxinas, e não possuía nenhuma espécie com psicoativo conhecido. Maria Pastora, mais tarde foi identificada como um membro do gênero Salvia. Vocês conhecem a sálvia para culinária, e provavelmente viram sálvias ornamentais, nenhuma delas são farmacologicamente ativas. Esta era uma nova espécie, logo chamada Salvia divinorum , por causa de sua associação com shamanismo e divindade. Mas Hofmann, a despeito de seu êxito, foi incapaz de encontrar um constituinte ativo nela. Depois de muitas investigações infrutíferas, ele concluiu que, se existisse um constituinte ativo, este deveria ser instável.
Nos anos 70, muitos investigadores mexicanos trabalharam com a Salvia divinorum , e também não puderam encontrar nada de significante nela. Através dos anos, cresceu a idéia de que se a planta tivesse alguma psicoatividade, deveria ser numa potência muito baixa, e conter algo muito instável. Como está se revelando, estas suposições estavam erradas. Só recentemente que os constituintes responsáveis foram corretamente identificados, e eles revelam-se extremamente potentes , poderosos e também incomuns. O componente ativo principal é uma droga chamada salvinorina A . É um diterpeno, sem nitrogênio. Quase a maioria das drogas psicoativas contem ao menos um átomo de nitrogênio. Os compostos da Kava Kava (Piper methysticum) do Pacífico são não-nitrogenados, como o THC da marijuana, mas não há exceções entre os psicodélicos e alucinógenos verdadeiros. Todos estes são alcalóides, que, por definição contem nitrogênio. A salvinorina A tem uma estrutura química completamente diferente. É também completamente insolúvel em água. Logo, um problema que adiou sua descoberta é que se você simplesmente administrar as folhas da planta oralmente, pode não haver absorção dos componentes ativos e portanto não haverá psicoatividade. Há absorção se as folhas estiverem primeiro emulsificadas. Os índios preparam Salvia divinorum pegando pares de folhas e rolando-as numa vasilha , em que eles chupam e mascam, ou fazendo uma infusão em água agitando bastante para produzir uma espuma. Eles dizem que a força do preparado depende da consistência da espuma. Presumivelmente, esta é uma emulsão que converte a salvinorina A em uma forma absorvível.
Nos últimos dois anos a clandestinidade psicodélica deste país tem tido muito interesse nesta planta, cujo cultivo está muito disseminado aqui. Não é uma substancia controlada, cresce rapidamente e produz muitas folhas. O rendimento de salvinorin A das folhas é enorme, e o composto é facilmente purificado Alguns pesquisadores psicodélicos descobriram que você também pode tomar esta droga, ou um extrato concentrado das folhas, de uma maneira semelhante a fumar a pasta de cocaína, isto é, você pode aquecê-la num cachimbo de vidro e inalar seus vapores; quando usada desta forma a salvinorina A se revela o mais potente alucinógeno natural, até então descoberto, ativo nas doses de 200-500mcg, o que é ligeiramente abaixo do nível de atividade do LSD. Usado desta maneira, eu acho que se torna abusivo em potencial, pois sua experiência é terrível. Eu tentei uma vez e nunca mais farei novamente.
Recentemente, eu revisei um artigo sobre a Salvia divinorum que está para ser publicado no Journal of Psicoative Drugs, a melhor revisão que já vi. O autor é L. J. Valdés, um químico que escreveu outros artigos no assunto. Gostaria de ler um pedaço dele. Valdés teve a sorte de finalmente trabalhar com um shaman Mazatec, que o ensinou como usar esta planta. Ele gravou esta informação em grandes detalhes e então fez seus estudos químicos e farmacológicos. Aqui está sua descrição de sua Segunda experiência. O shaman primeiro lhe deu o que ele chamou de "dose de principiante" da emulsão feita de vinte pares de folhas. Agora, por esta ocasião, , seis meses depois, ele tomou uma dose maior. O shaman disse que era essencial tomá-la em condições de escuridão e à noite, já que somente assim as visões ocorreriam plenamente. Ele também explicou a progressão necessária das visões que ao final o levariam a ver figuras religiosas e santos dos quais muito havia de aprender. Eu não descreverei toda a cerimônia, que incluía muitas orações e oferendas. O shaman esfregou as folhas na água, agitando a mistura vigorosamente, oferecendo então a Valdés. Ele ficou durante 1 hora descrevendo a viagem que ele faria ao céu., as coisas que ele veria, e as pessoas que ele encontraria. Infelizmente o vilarejo estava extremamente barulhenta à noite, com muitos latidos de cães.
"Depois de 15 minutos, começamos a ter visões.[Eu diria que incluindo nós está um pesquisador, José Luis Diaz, e se alguém de vocês tiver perguntas sobre a Salvia divinorum, ele é um dos poucos experts nela].Neste momento eu falei, alternando entre inglês e espanhol, o que ajudou a fixá-las na minha mente. Diaz falou primeiro e mencionou flores. Estas mais tarde se tornaram frutas e sementes gigantes. Ao mesmo tempo, eu senti que estava me retorcendo dentro do meu corpo, assim como girando em volta. Eu vi uma cruz ardente com dois raios horizontais. Ela parou de flamejar e começou a emitir luz.De repente eu comecei a me sentir pesado.
Após 15 minutos, o shaman interrompeu a sessão, dizendo que havia muito barulho, para se Ter uma experiência significativa; ele sugeriu que Valdés e Diaz fossem embora. Alguém estava lá para conduzi-los de volta ao hotel onde estavam. Quando eles estavam saindo, o shaman disse que as visões voltariam e durariam à noite. Ele contou-lhes que com mais experiência eles começariam a entender o uso da planta e as maneiras de cura e estudariam por conta própria. Valdés relata que durante a viagem de volta, no silêncio da escuridão do carro, as imagens retornaram. "Eu vi a Virgem de Guadalupe. Se a visão começava a apagar, eu podia chamá-la de volta. Eu retornei ao hotel, onde havia música e barulho. Eu pensei que a experiência estava terminada , e as coisas retornaram ao normal". Eles comeram uma refeição leve, tomaram banho e apagaram a luz e foram para a cama. Eram 11:30.
Eram agora duas horas e meia após eles terem tomado a primeira bebida. No quarto do hotel, as imagens voltaram mais fortes do que nunca. Apesar de eu não falar, eu via uma luz pulsante violeta que mudava para um formato de inseto, talvez um besouro ou uma mariposa, e então mudava para uma anêmona do mar. Se expandia dentro de um deserto cheio de cactos, e permanecia assim por vários minutos. Durante a primeira sessão e por toda a noite, minhas visões todas pareciam algo como a fronteira entre um filme mudo e um desenho animado. Eu me sentia mais como um observador destas visões mutantes, do que alguém tomando parte delas. De repente, no entanto, eu estava num prado, largo, com flores coloridas e brilhantes. Eu logo atravessei um riacho por uma pequena ponte de madeira. Perto de mim estava algo que parecia o esqueleto de um modelo de avião gigante, feito de tubos da cor de arco-íris. O céu era azul brilhante, e eu podia ver a florsta à distancia. Eu me vi falando com um homem usando um robe branco brilhante, que estava apertando minha mão e a segurando. Era uma alucinação fantástica, já que eu acreditava que estava naquele prado. Não era como um sonho. Depois de alguns momentos, a paisagem do deserto voltou. Eu lentamente voltei a dormir durante uma hora mais ou menos. Acordei cedo pela manhã, sem sentir efeitos colaterais.
A mais fantástica experiência foi esta que aconteceu comigo, na volta do hotel. Don Alejandro descreveu como a viagem visionária pareceria. Eu tenho certeza de que quando eu me achei no prado conversando com o homem de branco, que tinha a descrição de um santo, eu estava no céu do shaman. A alucinação era bem completa, sendo visual, formal e tátil.
De novo, eu diria a vocês que eu acho que nós estamos muito, muito longe de sermos capazes de analisar e entender este tipo de experiência em termos de qualquer coisa sobre farmacologia de drogas alucinógenas ou processamentos por redes neuronais .
Quero terminar com um comentário pessoal. Eu admiro e respeito o que eu chamaria a qualidade de mistérios do universo. O significado literal de mistério é "o que está escondido". Existem aspectos da realidade que estão escondidos de nós, ao menos para os nossos intelectos. Ainda, mistérios podem ser experienciados mesmos se não puderem ser compreendidos intelectualmente. Eu não acho que nós possamos eliminar o mistério de nossa experiência de realidade, nem é uma questão da ciência tentar isto. A ciência pode aproximar-se do mistério. Mas parece que, quanto mais brilhante nós iluminemos a realidade com a luz da ciência, mais nos tornamos a par da extensão da escuridão ao redor.
QUESTÕES E COMENTÁRIOS
Q. Ano passado, milhões de pessoas nos Estados Unidos gastaram 1.5 bilhão de dólares no Prozac e derivados do Prozac para o maior experimento psicológico da história do planeta. Eu gostaria que você comentasse sobre isto.
R. Vamos ver o que acontece daqui a vinte anos - como o Prozac será considerado então. Lembrem-se do famoso aforismo, que um novo remédio deve ser o mais usado possível enquanto tiver o poder de curar. Logo, vamos ver o que acontece. Como eu disse no começo, eu sou um grande partidário da medicina do placebo. Respostas de placebo realmente são respostas de cura de dentro, que não tem nada a ver com o paciente. Mas você pode obter respostas mais fidedignas fazendo tratamentos em que ambos você e o paciente acreditem. Eu gosto de usar o termo "placebo ativo" para este tipo de intervenção. Eu acho que todas as drogas psicoativas são placebos ativos. Elas definitivamente afetam você fisiologicamente, mas o que você faz com a mudança na sua fisiologia é uma questão de fatores fora da alçada da farmacologia.
Q. Cedo na sua carreira, Sol Snyder, o famoso farmacologista, estudou uma série de drogas alucinógenas todas as quais - corrija-me se estiver errado - tendo grupos poli-aromáticos, anéis indólicos etc. Ele estudou a energia do mais alto orbital molecular ocupado. Este era correlacionado com a potência destas drogas. O ponto é: nós temos falado nesta conferência sobre teoria quântica e tentado relacioná-la com atividades de eventos quânticos simples, como elétrons e bosons e coisas deste tipo. Suas estórias sobre visões mútuas e consciências compartilhadas podem ser explicadas no contexto dos efeitos quânticos, efeitos não locais. Eu acho que isto pode ser uma ligação ou pista para o papel dos efeitos quânticos nestes tipos de fenômenos.
R. Eu acho que quanto mais consistência pudermos achar nos resultados em pesquisa neurobiológica e experiência humana, melhor. Nós queremos tentar reunir estas duas esferas. Se a física quântica possui um modelo para fazer isso, tanto melhor. Ao mesmo tempo, eu tenho certeza que se resolvermos um problema não quer dizer que não haverá outros.
Q. Eu suponho que você está a par das especulações de Terrence Mc Kenna, sobre o papel das plantas psicoativas na evolução da consciência, o que para muitos de nós são largas especulações. Você comentaria sobre elas? Também eu conheço o nome original da harmina como sendo telepatina, e eu me pergunto se já houve estudos controlados no Ocidente com ela, o que você acha sobre a possibilidade destes.
R. Para a primeira questão, eu diria que a palavra "especulações" é perfeitamente apropriada, e eu não tenho nenhuma objeção em "larga" também. A teoria principal de Mc Kenna é que a ingestão de plantas psicodélicas, especificamente cogumelos, é o fator principal desencadeante que moveu os primatas à consciência humana. Qualquer pessoa com um senso de comportamento animal concordaria, que um indivíduo membro de qualquer espécie primata que acidentalmente ingerisse uma droga psicodélica estaria em grande risco de ser eliminado do "pool" de genes. Eu acho que a ingestão destas substancias somente se torna manejável com um nível de civilização que possa fornecer uma posição segura na qual as distorções na consciência sensorial não sejam perigosas. Para a segunda questão, eu acho que a virtual ausência de uma pesquisa aplicada nestas substâncias em seres humanos é inoportuna. Ao menos elas são janelas para ambas neurobiologia e experiência consciente, e ferramentas de pesquisa feitas para dar ordem à mesma. No processo de incriminação de drogas psicoativas proscritas, nossa sociedade tornou impossível para os pesquisadores trabalhar com as psicodélicas; elas foram fortemente mal reputadas, como a heroína e PCP. Todas elas estão na Escala 1 do Controlled Substances Act, o qual, para efeitos práticos, as torna indisponíveis para pesquisa. Esta é uma grande perda para a ciência da consciência. Talvez haja uma esperança. Ano passado o FDA indicou um novo diretor no departamento encarregado de drogas psicoativas. Este funcionário mostrou boa vontade em mudar as políticas do passado e tornar um pouco mais fácil fazer pesquisa humana com estes compostos. Muito recentemente, só no ano passado, a pesquisa humana foi iniciada com LSD e com MDMA. Um psiquiatra na University of New Mexico está estudando o DMT em humanos. Espero que mais estudos se sigam.
Q. Minha questão é, poderia descrever a experiência que fez você nunca mais querer fumar o extrato de Salvia divinorum de novo?
R. Eu era bastante novato naquele tempo, pois eu não tinha lido o artigo de Valdés e tudo o que sabia da Salvia divinorum era que ela era uma incógnita. Alguém veio a mim com uma amostra do extrato concentrado e se ofereceu para me mostrar como inalar os vapores de uma cachimbo de vidro. Ele disse que as pessoas estavam tendo fantásticas experiências com ela. Claro que, quando você inala os vapores, é muito difícil quantificar a dose que você recebe. Eu suponho ter inalado mais do que 500 mcg de salvinorina A . Eu tive uma sensação instantânea de cair para trás, mas não em um espaço comum. Então eu me senti envolvido num tipo de treliça de alta dimensão, como se estivesse sendo sufocado. Minha consciência de ego não desapareceu como com a 5-MeO-DMT. Ao invés disto eu estava reduzido a um pequeno ponto que estava aprisionado em algo bastante denso e pesado. Havia um sentido esmagador de que a realidade tivesse um fim - aquele tempo, espaço e realidade simplesmente terminaram para sempre. Havia também um pensamento ou imagem repetida do cachimbo. Eu sabia que havia feito isto comigo mesmo usando o cachimbo, e algo ou alguém estava rindo para mim malevolamente. Era uma grande piada cósmica às minhas custas. Eu tinha trazido a realidade a um fim, e era ele. Eu devo dizer que estava muito impressionado quando a realidade começou a voltar. Levou muito tempo até eu poder falar Quando eu falei, fui indagado sobre quanto tempo transcorreu desde que eu inalei a droga. Eu pensei que tinha sido 10 ou 20 minutos. De fato, foram 50 minutos. A experiência em perturbou psiquicamente e me deixo assim por algum tempo. Agora que sei que a planta pode ser tomada como emulsão oral, parece ser uma maneira mais de interagir com ela .Eu tenho uma amostra da planta crescendo num vaso - não tão bem porque é nativa de floresta nublada e precisa de mais umidade do que a que existe em Tucson. Quando eu passar por ela, eu a olharei com considerável respeito.
REFERÊNCIAS
Lamb, F. B. 1975. Wizard of the upper amazon: The story of Manuel Curdova-Rios Boston: Houghton Mifflin, pp. 32-3.Valdés, L. J. in press. Salvia divinorum and the unique diterpene hallucinogen, salvinorin (divinorin) A .Journal of Psicoative Drugs .
Weil, A . T., N. E. Zinberg, and J. M. Nelsen. 1968. Clinical and Psicological effects of marijuana in man. Science 162: 1234-12.
Andrew Weil
Artigo 48 de "Toward a Science of Consciousness", Conferência realizada em Tucson (1996) e Elsinore (1997)
Tradução: Leila Nery Souza Triska
Esta é uma sessão que "muda o compasso", e sinto uma certa responsabilidade em abri-la. Pela prática, sou um botânico e um médico. Eu encontrei somente 4 ou 5 outros médicos que cursaram botânica como graduados, e nenhum deles fez uso de seu treinamento em botânica nas suas práticas médicas. Eu uso muito. Como praticante de medicina natural, eu recomendo muitos remédios derivados de plantas aos pacientes.
Meus interesses atuais são respostas de cura e respostas de placebo, que eu considero serem exemplos de respostas de cura mediadas pela mente. Respostas de placebo são realmente o "filé "da medicina. Ao invés de nos preocuparmos em excluí-las, penso que deveríamos estar pesquisando como utilizá-las mais para tratamentos menos invasivos e custosos.
Algumas pessoas que me conhecem pelo meu trabalho em medicina natural ficam incomodadas quando sabem que meu trabalho passado foi pesquisa em plantas e drogas psicotrópicas. Eu conduzi os primeiros experimentos humanos controlados com maconha em 1968, investiguei cogumelos contendo psilocibina na América do Norte e Sul, e estudei uma variedade de plantas alucinógenas como também plantas medicinais. Eu fiz muito deste trabalho entre 1971 e 1985, quando eu era pesquisador em etnofarmacologia, associado ao Museu Botânico de Harvard ; eu não posso separar estas duas fases da minha carreira, pois muito da minha compreensão em interações mente-corpo e sua relevância para cura derivam de observações que eu fiz de pessoas em estado alterado de consciência induzidos por drogas psicoativas.
Uma das questões mais comuns quando indagado a falar sobre drogas psicoativas - especificamente drogas alucinógenas e psicodélicas - é como elas agem. Minha resposta é que eu não tenho uma definição. O que sabemos sobre farmacologia destas substancias - por exemplo , que elas interagem com receptores da serotonina - não nos diz nada sobre como elas induzem algumas pessoas a complexas, ricas e variadas experiências assim como faz outras fugir delas aterrorizadas. A proposta da minha conversa hoje é dirigir sua atenção ao tremendo abismo que existe entre o que entendemos neuroquimica e neurobiologicamente sobre o que realmente as pessoas experienciam da consciência.
No curso desta palestra me referirei a dois quebra-cabeças etnofarmacológicos que foram recentemente resolvidos através da pesquisa. Um consiste num animal e outro numa planta, ambos fontes de drogas psicoativas incomuns, associados com muitas experiências incomuns .
Primeiro deixe-me contar-lhes uma breve anedota do tempo que eu controlava estudos de maconha; isto foi realizado em Boston University em 1968 (Weil, Zinberg e Nelsen 1968).
Uma tentativa básica era simplesmente mostrar que você podia estudar sobre a maconha em seres humanos num laboratório - nenhuma façanha nos dias de hoje. Havia grandes obstáculos em se conseguir maconha legalmente, e ter permissão das burocracias da Universidade, do Estado e Federal. De alguma forma, nas Universidades era mais difícil. Eu era um estudante senior na Harvard Medical School naquele tempo, e o único controle que Harvard tinha sobre o projeto era através de mim; o comitê de assuntos humanos ameaçava negar meu diploma médico se eles não gostassem do meu projeto experimental. Era central para o projeto o uso de "cobaias inocentes" em marijuana, pois eu estava interessado em descobrir o que a droga por si só fazia com pessoas que não tivessem expectativas como resultado de experiências anteriores. Harvard não queria que eu usasse pessoas nesta condição. Eles pensavam que se eu introduzisse as pessoas à maconha, a universidade seria processada quando estas pessoas se tornassem eventualmente viciados em heroina. Depois de muita briga, eles decidiram que nós não podíamos usar estudantes de Harvard como "cobaias", mas que poderíamos usar estudantes fora desta Universidade.( a propósito, por toda esta desavença, meus colegas e eu tivemos grande dificuldade em achar "cobaias inocentes" na população estudante de Boston).
Finalmente, as experiências começaram, e eu estava fascinado pela reação dos "cobaias inocentes" , cada um vinha para três sessões, uma com cigarros placebo de talos da planta macho destituídos de THC, e dois com cigarros de marijuana ativa de diferentes potências. Apesar dos experimentos serem duplo-cego, eu pude fazer boas suposições de quem fumou marijuana e quem não, por causa dos sinais físicos que as pessoas mostravam após consumir os cigarros. Os que tinham THC tinham olhos vermelhos, e aumentavam seus níveis cardíacos, vinte ou trinta pontos acima do normal. Era impressionante ver um por um com olhos vermelhos e níveis cardíacos aumentados dizendo "Eu tomei a droga esta noite? Eu não acredito que peguei a verdadeira". Muito interessante. Agora este era um cenário neutro de laboratório, onde nenhum encorajamento estava dado no sentido de se "ficar mais alto", e isto foi o que achamos: pessoas que eram marijuana-inexperientes, apesar que demonstrassem o efeito fisiológico da droga, não tiveram experiências, nem alterações significativas da consciência. Eu penso que foi uma observação importante, algo que demanda explicação e que sugere os tipos de problema que limitam o uso de farmacologia para explicar a experiência humana.
Trabalhando através dos anos com várias substancias psicoativas, entrevistando muitos usuários destas e refletindo nas minhas próprias experiências com elas, eu me tornei um forte proponente do ponto de vista que experiências com drogas são criadas por três grupos de fatores: droga, jogo e cenário. Em "droga" eu incluiria a natureza farmacológica da substancia, a dose, a via de administração, que pode ter enorme influência nos efeitos das drogas psicoativas; "jogo" seria um conjunto de fatores relacionados às expectativas das pessoas ao que vai acontecer com elas, ambos conscientes e inconscientes. Um problema em analisar grupo é que as expectativas inconscientes são mais determinantes de experiências que as expectativas conscientes. Expectativas inconscientes, por definição são difíceis de se elucidar. "Cenário" se refere ao ambiente físico no qual uma droga é tomada assim como o ambiente social e cultural.
Estes três grupos de fatores interagem para criar uma experiência numa pessoa em particular, num lugar e tempo particular. A farmacologia por si só, não importa o quão sofisticada, não pode explicar estas interações por si mesmas. A farmacologia da droga é apenas um grupo de fatores que interagem igualmente com os outros dois. Na minha experiência, farmacologistas elogiam falsamente os conceitos de jogo e cenário, mas vão adiante e agem como se tudo o que importa é farmacologia .O fato difícil é que sob condições apropriadas de grupo e cenário, uma dose de anfetamina administrada experimentalmente pode fazer cobaias caírem de sono, enquanto que uma dose de barbitúrico administrada experimentalmente pode tornar uma pessoa estimulada e alerta. Estas respostas são reversos de 180 graus de ações farmacológicas determinadas em seres humanos e animais. O poder do jogo e do cenário é imenso; se você ignorar estas variáveis ao tentar interpretar as respostas às drogas, você estará em risco. Eu digo a vocês isto com base nas experiências que vou descrever agora.
Eu gostaria de ler para vocês uma passagem de um livro com que eu topei em 1971. O livro era "Mago do Amazonas Superior, e o autor era Bruce Lamb, um homem que eu mais tarde vim a conhecer muito bem, e que morreu ano passado. Ele trabalhava como consultor técnico de uma grande companhia madeireira sediada em Nova York, que alguns anos atrás estava extraindo madeiras tropicais das florestas do Peru. Bruce Lamb tinha coordenado grandes equipes de operários peruanos .Um homem que ele gostava muito dentro da força de trabalho parecia denotar respeito entre os outros. Ele tinha um tipo de carisma especial. Assim que Lamb o conheceu, descobriu que era um famoso curandeiro, um curador tradicional. Através dos anos, eles se tornaram grandes amigos. O curador, cujo nome era Manuel Córdova, contou sua estória de vida a Lamb, que eventualmente a escreveu no livro cuja passagem eu lerei. Manuel Córdova morreu numa idade avançada, há 15 anos; sua estória continua causando fascínio...
Quando jovem, em torno da virada do século, ele foi raptado por índios Amahuaca, no Noroeste da Amazônia, cujo território estava sendo invadido por exploradores da borracha . Em sonhos e visões, os índios tinham visto que seu modo de vida estava prestes à extinção. Eles conceberam a idéia de que, se eles pegassem a pessoa certa da cultura invasora e a treinassem a seu modo, ela poderia salvá-los. Por isso pegaram Manuel Córdova e o legaram para viver com eles. O principal método de seu treinamento era dá-lo repetidas doses da bebida alucinógena ayahuasca, que eu penso ter ouvido falar antes nesta conferência de Fred Alan Wolf. Ayahuasca é a principal preparação de planta alucinógena da América do Sul, usada especialmente no Noroeste da Amazônia. É feita de formas diferentes em diferentes regiões, mas o ingrediente constante é uma planta trepadeira lenhosa, Banisteriops caapi, cujo princípio ativo é a harmina, um dos drogas alucinógenas com radicais amino indólicos, do mesmo grupo que encontramos no LSD e na psilocibina. Estas drogas tem similaridades estruturais com a serotonina e a melatonina.
A casca da trepadeira Banisteriops é normalmente combinada com as folhas de outras plantas que contêm uma droga psicodélica relacionada, a dimetiltriptamina ou DMT. Quando antropologistas e botânicos descreveram primeiramente a preparação desta bebida, eles escreveram que o DMT contido nela não podia contribuir para sua atividade porque é destruído pela monoamino oxidase do intestino e é somente ativo por via parenteral. Índios que fazem e bebem ayahuasca dizem que eles adicionam as folhas contendo DMT para tornar as visões mais brilhantes. Seu propósito geral em tomar a bebida é ter visões, que eles usam de uma maneira prática para diagnosticar doenças e determinar caminhos de cura através de mudanças de circunstancias da vida. O que resulta é que a harmina inativa a monoamino oxidase, de tal modo que quando você combina estas duas plantas, você em uma preparação oral ativa do DMT. Isto é extraordinário. Se você perguntar aos antropólogos e botânicos como os índios chegaram a este preparado farmacológico sofisticado, eles te dirão que foi por tentativa e erro. Se você estiver sentado numa palestra e um professor lhe diz isso, você anota num caderno sem questionar. Mas eu posso lhe dizer que se você está na floresta tropical olhando para aquela profusão de plantas, é difícil imaginar um shaman cozinhando um novo punhado de Banisteriops (Lamb 1974) todos os dias e dizendo, "Bem, vamos ver. Hoje eu vou tentar aquela folha". Se você perguntar aos shamans que fizeram o ayahuasca como eles aprenderam a técnica, eles também lhe dão uma resposta consistente. Eu já perguntei a vários deles, e eles sempre respondem que a Banisteriops mostrou a eles em visões. Esta é a resposta que você obtém de todos os shamans, que eles aprenderam em visões.
Córdova passou um número de anos com esta tribo até que seu relacionamento terminou e ele voltou para a sua própria cultura. Eu gostaria de ler para vocês uma breve descrição de uma das sessões de treinamento. No começo ele tomou a bebida sozinho com o chefe da tribo, que era o mestre em arranjo de grupo e de cenário para manipular a experiência com a poção alucinógena. Somente mais tarde, quando Córdova estava mais familiar com a ayahuasca, o chefe o permitiu que se juntassem às sessões de visão em grupo.
Era um seleto grupo de 12 que ia a um local afastado dentro da floresta. Faziam parte alguns dos mais velhos e vários dos melhores caçadores ritual e os cantos eram parecidos com as ocasiões anteriores, talvez um pouco mais elaborados. Dos cantos preparatórios da fumaça perfumada e da evocação do espírito honi xuma ( isto é, a trepadeira que fornece a droga), era evidente que o Chefe Xumu tentando nesta sessão fixar na minha consciência as circunstâncias importantes e essenciais de sua vida tribal. Parecia haver um intenso sentimento de harmonia entre o grupo, todos dedicados ao propósito do ancião.
Eu estava consciente da mão frágil que misturava o fluido mágico e passava as xícara por cada um. Nós bebemos em união e ficamos em serena comunhão, saboreando a fumaça perfumada e a quietude da floresta silenciosa. Um canto tranqüilo deteve nossos pensamentos conscientes em conjunto á medida que a poção tomou efeito. Uma segunda xícara foi passada para intensificar a reação. Visões coloridas, indefinidas na forma, começaram a evoluir dentro de uma vista de encantada beleza. Logo em seguida, cânticos sutis e evocativos conduzidos pelo chefe tomaram conta da progressão de nossas visões.
Em seguida, começou o desfile de animais, começando pelos felinos da floresta. Alguns deles não tinham sido vistos antes. Havia um ------- puma, várias espécies de pequenos---------manchados e aí então, um jaguar pintado gigante. Um murmúrio do grupo indicava reconhecimento. Este animal imenso se arrastava com a cabeça pendurada e a língua para fora. Horrível, suas presas grandes se mostravam na bocarra aberta. Uma mudança instantânea de comportamento para vigília causou um tremor no círculo de fantasmas telespectadores.
Então , aqui temos pessoas compartilhando visões e reagindo ao conteúdo destas visões de maneira consistente.
Agora, ao escutar o relato de uma experiência como esta, a primeira pergunta que vem a mim é: é acreditável? Eu acredito nisto? Como eu posso acreditar em algo tão fora do comum, ao menos que eu tenha tido uma experiência similar ou me sentido totalmente convicto sobre a credibilidade das pessoas contando a estória...Eu não conhecia Manuel Córdova, mas eu conhecia Bruce Lamb e não tinha nenhuma razão para duvidar de sua precisão de relato. Claro que ele poderia ter sido enganado pelo seu informante. Neste caso eu tive uma experiência com uma substancia relacionada a esta, que me faz acreditar na estória que acabei de contar.
O primeiro dos dois quebra-cabeças etnofarmacológicos que eu prometi contar para vocês consiste num animal maravilhoso, nativo do nosso deserto, aqui de Tucson, chamado Bufo alvarius, que costumava ser chamado de sapo do Rio Colorado e agora é chamado de sapo do Deserto de Sonora (Valdés). É um sapo enorme: espécies grandes são quase do tamanho de bolas de futebol. Nesta época do ano eles estão hibernando no subsolo, mas assim que as noites esquentarem, daqui a um mês, eles começarão a aparecer. Eles se reúnem em torno de luzes à noite, e comem qualquer criatura menor que eles mesmos. Quando vêm as chuvas de verão, eles acasalam, e seus girinos se desenvolvem rapidamente na água parada em todo o deserto. Como todos os membros do gênero Bufo, eles tem secreções venenosas. Eles tem glândulas de veneno, enormes, atrás dos olhos, e pequenas nas pernas, banhando a pele de toxinas. Bufo alvarius não possuem predadores. Muitos morrem sob os pneus dos carros, mas nenhum ser os come.
Nos anos 60 e no início dos anos 70, a editora da Universidade do Texas publicou uma monografia sobre o gênero Bufo que incluía um capítulo sobre os venenos de diferentes espécies. Foi observado nesta publicação desconhecida que Bufo alvarius era único que tinha uma enzima rara que convertia a bufotenina, uma toxina de sapo comum, em um análogo da serotonina, um psicodélico muito potente chamado5-metoxi dimetiltriptamina, ou 5-MeO-DMT, um parente bem próximo do DMT nas folhas que produzem visões brilhantes para os bebedores de ayahuasca.De fato, estas duas triptaminas normalmente ocorrem juntas em algumas plantas que os índios preparam em rapés alucinógenos. O veneno de Bufo alvarius contem 15% de 5-MeO-DMT. Eu desconfio que algumas pessoas que leram a monografia tiveram a idéia de experimentar o veneno como pscodélico, mas eu não tenho nenhuma maneira de prová-lo. Algumas pessoas acham que o conhecimento da psicoatividade deste sapo veio dos povos nativos que usaram o veneno como alucinógeno nos tempos pré-Colombianos. De qualquer maneira, é o primeiro alucinógeno de origem animal.
Números significativos de pessoas, aqui e em outros lugares, estão coletando estes sapos e retirando seu veneno, que é seco e usado como fumo. Eu temo que este novo interesse represente uma ameaça aos nossos sapos, especialmente na medida que seu habitat está desaparecendo, com o crescimento urbano. É possível ordenhar as glândulas de veneno sem machucar os animais. O método é apertar a glândula até que ela esguiche um jato de veneno, que pode ser coletado num prato. Quando o sapo é solto após o procedimento, ele volta a comer tudo pela frente, aparentemente sem ter sido perturbado.
Quando eu ouvi pela primeira vez sobre pessoas inalando os vapores do veneno de Bufo alvarius para alterar a consciência, fiquei interessado mas céptico, pois nosso sapo tem uma forte reputação de ser perigosamente venenoso. Ele freqüentemente envenena cães que o abocanham, fatalmente. Eu conheço um dono de cachorro que tirou um sapo da boca de seu animal em 10 segundos, mas apesar disso, após 30 minutos, o cão começou a salivar profusamente, então teve um ataque e morreu de parada respiratória. Existe um relato na literatura médica de um garoto de sete anos do sudeste do Arizona que lambeu um destes animais e foi trazido para esta instituição em estado epiléptico; ele sobreviveu. Aparentemente, quando você fuma o veneno - e eu digo aparentemente pois eu não fiz qualquer análise química para provar - a neurotoxicidade poderosa é destruída ou largamente destruída, enquanto o 5MeO-DMT entra dentro do seu sistema de forma eficiente. Eu conheço muitas pessoas que usaram o veneno de sapo, algumas que fumaram centenas de vezes, e não parecem piores por terem usado.
Quando os vapores de 5-MeO-DMT são inalados, eles causam uma mudança quase instantânea na consciência. Tipicamente, uma pessoa cairá para trás e simplesmente não estará presente por alguns minutos. A experiência é muito breve, 5 ou 7 minutos, seguida de um retorno gradual à consciência normal. Freqüentemente as pessoas só se lembram da volta; algumas vezes recordam uma sensação de terem sido dissolvidas, ou não tendo existido por um período de tempo. Algumas pessoas acham a coisa todo muito assustadora. Outras acham a volta, a reconstituição do self extremamente prazerosa. Eu acho que altas doses de veneno de Bufo seria uma experiência muito aterrorizante para a maioria dos que tem pouca experiência anterior de alterações de consciência induzidas por drogas.
Eu usei o veneno e o 5 MeO-DMT sintético apenas poucas vezes, e eu relatarei uma experiência que tive. Eu inalei os vapores com um amigo meu que já tinha usado antes, e a fase inicial da intoxicação foi - bem, eu simplesmente não me lembrei. Mas no período de reconstituição, e tornando-me mais consciente de mim mesmo e da realidade externa, houve uma experiência diferente que durou um minuto ou dois, onde eu simplesmente parecia estar presente em cada consciência (minha e do outro).Quando nós pudemos falar um com o outro de novo, meu amigo contou que tinha tido a mesma experiência. Logo, enquanto eu nunca tinha tido visões de grupo simultâneas, eu tive um gostinho de uma experiência que me faz pensar que tal compartilhamento é possível, especialmente com treinamento e sob a direção habilidosa de alguém que conhecia como manipular um estado alterado induzido por um alucinógeno poderoso.
Agora eu simplesmente gostaria de externar minha opinião de que, de fato, se a experiência que eu li para vocês foi real, eu acho que estamos muito longe de poder imaginar de sermos capazes de explicar a experiencia em termos do que sabemos sobre microtúbulos e redes neuronais Eu sou todo para a pesquisa de microtúbulos e redes neuronais. Eu também sou contra a redução de experiências complexas, que tem um imenso significado para aqueles que a experienciam , dentro de qualquer tipo de moldura mecanicista.
Agora eu darei a vocês outro exemplo, tendo a ver com o segundo quebra-cabeças etnofarmacológico, que diz respeito a uma planta que tem deixado os pesquisadores perplexos. Albert Hofmann, o químico farmacêutico suíço que descobriu o LSD, e R. Gordon Wasson, banqueiro de Nova York que descobriu o uso de cogumelos alucinógenos no México, na década de 50, se uniram para investigar a etnofarmacologia de três alucinógenos usados tradicionalmente por índios Mazatec, no estado mexicano de Oaxaca. Hofmann identificou psilocibina das espécies de cogumelo de Wasson, e então sintetizou-a. Eles então levaram o composto à Maria Sabina, shaman que era informante do chefe de Wasson, em seu vilarejo nas montanhas. Ela conduziu a velada, uma cerimônia com o cogumelo, usando a droga sintética da Suíça. No fim ela declarou como boa, e ficou feliz por não depender de chuva para suas cerimônias - um grande triunfo da farmacologia de laboratório.
Hofmann e Wasson então dirigiram sua atenção para as "glórias matutinas mexicanas", outro alucinógeno conhecido pelos conquistadores espanhóis , cuja identidade era desconhecida. Eles identificaram as espécies principais em uso e encontraram um análogo ao LSD, que a natureza produz, uma substancia chamada LAE, a monoetilamida do ácido lisérgico.
Então eles foram atrás de uma terceira planta alucinógena, conhecida como Maria Pastora. Os índios disseram a Wasson que esta substancia não era tão poderosa como as outras duas, mas era importante no treinamento de shamans, especialmente no primeiro nível de treinamento. Eventualmente, espécies da planta eram coletadas e identificadas como menta, uma descoberta inesperada , pois a família das mentas, as Lamiáceas, não é um grupo de plantas rico em alcalóides ou toxinas, e não possuía nenhuma espécie com psicoativo conhecido. Maria Pastora, mais tarde foi identificada como um membro do gênero Salvia. Vocês conhecem a sálvia para culinária, e provavelmente viram sálvias ornamentais, nenhuma delas são farmacologicamente ativas. Esta era uma nova espécie, logo chamada Salvia divinorum , por causa de sua associação com shamanismo e divindade. Mas Hofmann, a despeito de seu êxito, foi incapaz de encontrar um constituinte ativo nela. Depois de muitas investigações infrutíferas, ele concluiu que, se existisse um constituinte ativo, este deveria ser instável.
Nos anos 70, muitos investigadores mexicanos trabalharam com a Salvia divinorum , e também não puderam encontrar nada de significante nela. Através dos anos, cresceu a idéia de que se a planta tivesse alguma psicoatividade, deveria ser numa potência muito baixa, e conter algo muito instável. Como está se revelando, estas suposições estavam erradas. Só recentemente que os constituintes responsáveis foram corretamente identificados, e eles revelam-se extremamente potentes , poderosos e também incomuns. O componente ativo principal é uma droga chamada salvinorina A . É um diterpeno, sem nitrogênio. Quase a maioria das drogas psicoativas contem ao menos um átomo de nitrogênio. Os compostos da Kava Kava (Piper methysticum) do Pacífico são não-nitrogenados, como o THC da marijuana, mas não há exceções entre os psicodélicos e alucinógenos verdadeiros. Todos estes são alcalóides, que, por definição contem nitrogênio. A salvinorina A tem uma estrutura química completamente diferente. É também completamente insolúvel em água. Logo, um problema que adiou sua descoberta é que se você simplesmente administrar as folhas da planta oralmente, pode não haver absorção dos componentes ativos e portanto não haverá psicoatividade. Há absorção se as folhas estiverem primeiro emulsificadas. Os índios preparam Salvia divinorum pegando pares de folhas e rolando-as numa vasilha , em que eles chupam e mascam, ou fazendo uma infusão em água agitando bastante para produzir uma espuma. Eles dizem que a força do preparado depende da consistência da espuma. Presumivelmente, esta é uma emulsão que converte a salvinorina A em uma forma absorvível.
Nos últimos dois anos a clandestinidade psicodélica deste país tem tido muito interesse nesta planta, cujo cultivo está muito disseminado aqui. Não é uma substancia controlada, cresce rapidamente e produz muitas folhas. O rendimento de salvinorin A das folhas é enorme, e o composto é facilmente purificado Alguns pesquisadores psicodélicos descobriram que você também pode tomar esta droga, ou um extrato concentrado das folhas, de uma maneira semelhante a fumar a pasta de cocaína, isto é, você pode aquecê-la num cachimbo de vidro e inalar seus vapores; quando usada desta forma a salvinorina A se revela o mais potente alucinógeno natural, até então descoberto, ativo nas doses de 200-500mcg, o que é ligeiramente abaixo do nível de atividade do LSD. Usado desta maneira, eu acho que se torna abusivo em potencial, pois sua experiência é terrível. Eu tentei uma vez e nunca mais farei novamente.
Recentemente, eu revisei um artigo sobre a Salvia divinorum que está para ser publicado no Journal of Psicoative Drugs, a melhor revisão que já vi. O autor é L. J. Valdés, um químico que escreveu outros artigos no assunto. Gostaria de ler um pedaço dele. Valdés teve a sorte de finalmente trabalhar com um shaman Mazatec, que o ensinou como usar esta planta. Ele gravou esta informação em grandes detalhes e então fez seus estudos químicos e farmacológicos. Aqui está sua descrição de sua Segunda experiência. O shaman primeiro lhe deu o que ele chamou de "dose de principiante" da emulsão feita de vinte pares de folhas. Agora, por esta ocasião, , seis meses depois, ele tomou uma dose maior. O shaman disse que era essencial tomá-la em condições de escuridão e à noite, já que somente assim as visões ocorreriam plenamente. Ele também explicou a progressão necessária das visões que ao final o levariam a ver figuras religiosas e santos dos quais muito havia de aprender. Eu não descreverei toda a cerimônia, que incluía muitas orações e oferendas. O shaman esfregou as folhas na água, agitando a mistura vigorosamente, oferecendo então a Valdés. Ele ficou durante 1 hora descrevendo a viagem que ele faria ao céu., as coisas que ele veria, e as pessoas que ele encontraria. Infelizmente o vilarejo estava extremamente barulhenta à noite, com muitos latidos de cães.
"Depois de 15 minutos, começamos a ter visões.[Eu diria que incluindo nós está um pesquisador, José Luis Diaz, e se alguém de vocês tiver perguntas sobre a Salvia divinorum, ele é um dos poucos experts nela].Neste momento eu falei, alternando entre inglês e espanhol, o que ajudou a fixá-las na minha mente. Diaz falou primeiro e mencionou flores. Estas mais tarde se tornaram frutas e sementes gigantes. Ao mesmo tempo, eu senti que estava me retorcendo dentro do meu corpo, assim como girando em volta. Eu vi uma cruz ardente com dois raios horizontais. Ela parou de flamejar e começou a emitir luz.De repente eu comecei a me sentir pesado.
Após 15 minutos, o shaman interrompeu a sessão, dizendo que havia muito barulho, para se Ter uma experiência significativa; ele sugeriu que Valdés e Diaz fossem embora. Alguém estava lá para conduzi-los de volta ao hotel onde estavam. Quando eles estavam saindo, o shaman disse que as visões voltariam e durariam à noite. Ele contou-lhes que com mais experiência eles começariam a entender o uso da planta e as maneiras de cura e estudariam por conta própria. Valdés relata que durante a viagem de volta, no silêncio da escuridão do carro, as imagens retornaram. "Eu vi a Virgem de Guadalupe. Se a visão começava a apagar, eu podia chamá-la de volta. Eu retornei ao hotel, onde havia música e barulho. Eu pensei que a experiência estava terminada , e as coisas retornaram ao normal". Eles comeram uma refeição leve, tomaram banho e apagaram a luz e foram para a cama. Eram 11:30.
Eram agora duas horas e meia após eles terem tomado a primeira bebida. No quarto do hotel, as imagens voltaram mais fortes do que nunca. Apesar de eu não falar, eu via uma luz pulsante violeta que mudava para um formato de inseto, talvez um besouro ou uma mariposa, e então mudava para uma anêmona do mar. Se expandia dentro de um deserto cheio de cactos, e permanecia assim por vários minutos. Durante a primeira sessão e por toda a noite, minhas visões todas pareciam algo como a fronteira entre um filme mudo e um desenho animado. Eu me sentia mais como um observador destas visões mutantes, do que alguém tomando parte delas. De repente, no entanto, eu estava num prado, largo, com flores coloridas e brilhantes. Eu logo atravessei um riacho por uma pequena ponte de madeira. Perto de mim estava algo que parecia o esqueleto de um modelo de avião gigante, feito de tubos da cor de arco-íris. O céu era azul brilhante, e eu podia ver a florsta à distancia. Eu me vi falando com um homem usando um robe branco brilhante, que estava apertando minha mão e a segurando. Era uma alucinação fantástica, já que eu acreditava que estava naquele prado. Não era como um sonho. Depois de alguns momentos, a paisagem do deserto voltou. Eu lentamente voltei a dormir durante uma hora mais ou menos. Acordei cedo pela manhã, sem sentir efeitos colaterais.
A mais fantástica experiência foi esta que aconteceu comigo, na volta do hotel. Don Alejandro descreveu como a viagem visionária pareceria. Eu tenho certeza de que quando eu me achei no prado conversando com o homem de branco, que tinha a descrição de um santo, eu estava no céu do shaman. A alucinação era bem completa, sendo visual, formal e tátil.
De novo, eu diria a vocês que eu acho que nós estamos muito, muito longe de sermos capazes de analisar e entender este tipo de experiência em termos de qualquer coisa sobre farmacologia de drogas alucinógenas ou processamentos por redes neuronais .
Quero terminar com um comentário pessoal. Eu admiro e respeito o que eu chamaria a qualidade de mistérios do universo. O significado literal de mistério é "o que está escondido". Existem aspectos da realidade que estão escondidos de nós, ao menos para os nossos intelectos. Ainda, mistérios podem ser experienciados mesmos se não puderem ser compreendidos intelectualmente. Eu não acho que nós possamos eliminar o mistério de nossa experiência de realidade, nem é uma questão da ciência tentar isto. A ciência pode aproximar-se do mistério. Mas parece que, quanto mais brilhante nós iluminemos a realidade com a luz da ciência, mais nos tornamos a par da extensão da escuridão ao redor.
QUESTÕES E COMENTÁRIOS
Q. Ano passado, milhões de pessoas nos Estados Unidos gastaram 1.5 bilhão de dólares no Prozac e derivados do Prozac para o maior experimento psicológico da história do planeta. Eu gostaria que você comentasse sobre isto.
R. Vamos ver o que acontece daqui a vinte anos - como o Prozac será considerado então. Lembrem-se do famoso aforismo, que um novo remédio deve ser o mais usado possível enquanto tiver o poder de curar. Logo, vamos ver o que acontece. Como eu disse no começo, eu sou um grande partidário da medicina do placebo. Respostas de placebo realmente são respostas de cura de dentro, que não tem nada a ver com o paciente. Mas você pode obter respostas mais fidedignas fazendo tratamentos em que ambos você e o paciente acreditem. Eu gosto de usar o termo "placebo ativo" para este tipo de intervenção. Eu acho que todas as drogas psicoativas são placebos ativos. Elas definitivamente afetam você fisiologicamente, mas o que você faz com a mudança na sua fisiologia é uma questão de fatores fora da alçada da farmacologia.
Q. Cedo na sua carreira, Sol Snyder, o famoso farmacologista, estudou uma série de drogas alucinógenas todas as quais - corrija-me se estiver errado - tendo grupos poli-aromáticos, anéis indólicos etc. Ele estudou a energia do mais alto orbital molecular ocupado. Este era correlacionado com a potência destas drogas. O ponto é: nós temos falado nesta conferência sobre teoria quântica e tentado relacioná-la com atividades de eventos quânticos simples, como elétrons e bosons e coisas deste tipo. Suas estórias sobre visões mútuas e consciências compartilhadas podem ser explicadas no contexto dos efeitos quânticos, efeitos não locais. Eu acho que isto pode ser uma ligação ou pista para o papel dos efeitos quânticos nestes tipos de fenômenos.
R. Eu acho que quanto mais consistência pudermos achar nos resultados em pesquisa neurobiológica e experiência humana, melhor. Nós queremos tentar reunir estas duas esferas. Se a física quântica possui um modelo para fazer isso, tanto melhor. Ao mesmo tempo, eu tenho certeza que se resolvermos um problema não quer dizer que não haverá outros.
Q. Eu suponho que você está a par das especulações de Terrence Mc Kenna, sobre o papel das plantas psicoativas na evolução da consciência, o que para muitos de nós são largas especulações. Você comentaria sobre elas? Também eu conheço o nome original da harmina como sendo telepatina, e eu me pergunto se já houve estudos controlados no Ocidente com ela, o que você acha sobre a possibilidade destes.
R. Para a primeira questão, eu diria que a palavra "especulações" é perfeitamente apropriada, e eu não tenho nenhuma objeção em "larga" também. A teoria principal de Mc Kenna é que a ingestão de plantas psicodélicas, especificamente cogumelos, é o fator principal desencadeante que moveu os primatas à consciência humana. Qualquer pessoa com um senso de comportamento animal concordaria, que um indivíduo membro de qualquer espécie primata que acidentalmente ingerisse uma droga psicodélica estaria em grande risco de ser eliminado do "pool" de genes. Eu acho que a ingestão destas substancias somente se torna manejável com um nível de civilização que possa fornecer uma posição segura na qual as distorções na consciência sensorial não sejam perigosas. Para a segunda questão, eu acho que a virtual ausência de uma pesquisa aplicada nestas substâncias em seres humanos é inoportuna. Ao menos elas são janelas para ambas neurobiologia e experiência consciente, e ferramentas de pesquisa feitas para dar ordem à mesma. No processo de incriminação de drogas psicoativas proscritas, nossa sociedade tornou impossível para os pesquisadores trabalhar com as psicodélicas; elas foram fortemente mal reputadas, como a heroína e PCP. Todas elas estão na Escala 1 do Controlled Substances Act, o qual, para efeitos práticos, as torna indisponíveis para pesquisa. Esta é uma grande perda para a ciência da consciência. Talvez haja uma esperança. Ano passado o FDA indicou um novo diretor no departamento encarregado de drogas psicoativas. Este funcionário mostrou boa vontade em mudar as políticas do passado e tornar um pouco mais fácil fazer pesquisa humana com estes compostos. Muito recentemente, só no ano passado, a pesquisa humana foi iniciada com LSD e com MDMA. Um psiquiatra na University of New Mexico está estudando o DMT em humanos. Espero que mais estudos se sigam.
Q. Minha questão é, poderia descrever a experiência que fez você nunca mais querer fumar o extrato de Salvia divinorum de novo?
R. Eu era bastante novato naquele tempo, pois eu não tinha lido o artigo de Valdés e tudo o que sabia da Salvia divinorum era que ela era uma incógnita. Alguém veio a mim com uma amostra do extrato concentrado e se ofereceu para me mostrar como inalar os vapores de uma cachimbo de vidro. Ele disse que as pessoas estavam tendo fantásticas experiências com ela. Claro que, quando você inala os vapores, é muito difícil quantificar a dose que você recebe. Eu suponho ter inalado mais do que 500 mcg de salvinorina A . Eu tive uma sensação instantânea de cair para trás, mas não em um espaço comum. Então eu me senti envolvido num tipo de treliça de alta dimensão, como se estivesse sendo sufocado. Minha consciência de ego não desapareceu como com a 5-MeO-DMT. Ao invés disto eu estava reduzido a um pequeno ponto que estava aprisionado em algo bastante denso e pesado. Havia um sentido esmagador de que a realidade tivesse um fim - aquele tempo, espaço e realidade simplesmente terminaram para sempre. Havia também um pensamento ou imagem repetida do cachimbo. Eu sabia que havia feito isto comigo mesmo usando o cachimbo, e algo ou alguém estava rindo para mim malevolamente. Era uma grande piada cósmica às minhas custas. Eu tinha trazido a realidade a um fim, e era ele. Eu devo dizer que estava muito impressionado quando a realidade começou a voltar. Levou muito tempo até eu poder falar Quando eu falei, fui indagado sobre quanto tempo transcorreu desde que eu inalei a droga. Eu pensei que tinha sido 10 ou 20 minutos. De fato, foram 50 minutos. A experiência em perturbou psiquicamente e me deixo assim por algum tempo. Agora que sei que a planta pode ser tomada como emulsão oral, parece ser uma maneira mais de interagir com ela .Eu tenho uma amostra da planta crescendo num vaso - não tão bem porque é nativa de floresta nublada e precisa de mais umidade do que a que existe em Tucson. Quando eu passar por ela, eu a olharei com considerável respeito.
REFERÊNCIAS
Lamb, F. B. 1975. Wizard of the upper amazon: The story of Manuel Curdova-Rios Boston: Houghton Mifflin, pp. 32-3.Valdés, L. J. in press. Salvia divinorum and the unique diterpene hallucinogen, salvinorin (divinorin) A .Journal of Psicoative Drugs .
Weil, A . T., N. E. Zinberg, and J. M. Nelsen. 1968. Clinical and Psicological effects of marijuana in man. Science 162: 1234-12.