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A utopia da teoria unificada do Universo e outros textos de Marcelo Gleiser

Não se trata de "matéria versus outros estados". Chamar "outros estados" de matéria, talvez uma "matéria diferente", parece um grande apego ao modelo materialista. Seria oque? Uma matéria ondular? Uma matéria intangível, impalpável? .....Uma matéria imaterial?
"Matéria, matéria, matéria! Consuma, consuma consuma! Apegue-se!" Esses parecem ser os mantras entoados por tantos veículos de comunicação e sustentado por um modelo científico retrógrado. Talvez "pseudocientífico" uma vez que não se adéqua ao paradigma vigente?

Convido você, que gosta muito do termo "apego", @Ecuador , repetindo-o a muitos, a refletir sobre o que essa repetição talvez diga a respeito de você próprio.

Parece muito mais seguro um modelo Newtoniano, onde o mundo é feito só de matéria palpável, de fenômenos estritamente mecânicos, matematicamente presumíveis, onde a máxima relação causa-e-consequência nos dá a ilusão de tudo controlar e antever.
Esse mundo, além de seguro, é interessante para a manipulação das massas, presas eternamente ao imperativo do material.
 
Convido você, que gosta muito do termo "apego", @Ecuador , repetindo-o a muitos, a refletir sobre o que essa repetição talvez diga a respeito de você próprio.



Então tá. Um abraço.
 
Perguntas irrespondíveis

03/08/2014 01h40

Na semana passada, o jornalista George Johnson, que escreve ocasionalmente sobre ciência para o "New York Times", publicou um ensaio em que comparava dois livros relativamente recentes que oferecem pontos de vista opostos à natureza da realidade. Dado que esse é o tema de meu livro mais recente, "A Ilha do Conhecimento", revejo alguns dos pontos dessas obras, contrastando-os com minha posição.

De um lado, temos o famoso filósofo Thomas Nagel, que argumentou em seu livro de 2012, "Mente e Cosmo", que o materialismo mais simples, conforme é entendido hoje e usado na formulação das ciências físicas e biológicas, não é capaz de explicar alguns dos fenômenos naturais mais complexos, incluindo a origem e a evolução da vida e a natureza do consciente humano.

Ele propõe que uma extensão das ideias atuais se faz necessária, ainda dentro do materialismo, mas utilizando modos ainda desconhecidos de se pensar sobre a matéria e sua relação com o espaço e o tempo. O interessante é que Nagel é ateu, limitando, portanto, essa extensão do materialismo e mais materialismo, se bem que engendrando o próprio Cosmo com forma de consciência.

De outro, temos o ultraplatonismo do físico Max Tegmark, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, que no livro "Nosso Universo Matemático" propõe que a realidade física, o espaço, o tempo, a matéria e a energia, em todas as suas manifestações, originam-se de uma realidade puramente matemática.

A posição de Tegmark, que deixaria até Platão surpreso, é que essa realidade é a essência da natureza. Não é difícil extrapolar esse conceito a uma construção racional de Deus. Tegmark, assim como os que defendem a existência de um "domínio" de verdades matemáticas, onde mentes privilegiadas podem, ocasionalmente, vislumbrar a verdade, nos remete à uma religiosidade um tanto estranha, onde o racional é divinizado.

Como escreveu o matemático Edward Frenkel em sua resenha do livro de Tegmark, o autor se esqueceu de que a maior parte da matemática pura não tem qualquer relação com a natureza. É justamente essa liberdade que lhe fornece o seu poder especulativo. A maioria dos matemáticos puros consideram a realidade física um empecilho à beleza do pensamento.

Parece-me inocente, e criptorreligioso, achar que podemos ter conhecimento completo do mundo, seja ele através de um novo materialismo ou de uma realidade matemática completa. Primeiro, porque nossos instrumentos têm limites de alcance e precisão; segundo, porque a própria natureza oferece barreiras, como a velocidade da luz, a incerteza quântica e o crescimento da desordem (entropia). O mesmo com a matemática, como mostrou Gödel com seus teoremas da incompletude. Seremos sempre parcialmente míopes para o que de fato ocorre.

Daí a imagem da ilha do conhecimento, cercada pelo oceano do desconhecido, que os filósofos Nietzsche e Wittgenstein e os físicos John Wheeler e David Gross, dentre outros, compartilharam de formas variadas. Para sabermos tudo, precisamos conhecer todas as perguntas, o que é claramente impossível. Melhor assim, pois ficamos livres para continuar a perguntar, inspirados pelo que não sabemos.

http://www1.folha.uol.com.br/colunas/marcelogleiser/2014/08/1494678-perguntas-irrespondiveis.shtml
 
Ciência e o sentido da vida

12/10/2014 01h40

Outro dia, estava dando uma palestra, quando alguém me fez "aquela" pergunta: professor, por que o senhor é cientista? Respondi que não podia ser outra coisa, que considerava um privilégio poder dedicar minha vida ao ensino e à pesquisa.

Mas o que de fato está por trás dessa profissão, ao menos para mim, é uma oportunidade única para criarmos algo de novo, algo que nos diferencie do resto.

A ciência oferece uma oportunidade para que possamos nos engajar com o "mistério", como Einstein chamava nossa atração pelo desconhecido: "A emoção mais significativa que podemos sentir é o mistério.

Ela é o berço da verdadeira arte e da ciência. Quem não a conhece e não é mais capaz de se maravilhar, está mais morto do que vivo, como uma vela que se apagou".

Einstein pôs as artes e as ciências sobre o mesmo patamar, frutos que são da criatividade humana. Para ele, nossas criações são produto desse questionamento incessante sobre quem somos e sobre o mundo à nossa volta.

A ciência abre portas para o desconhecido, para o que nos foge aos sentidos. Aquilo que não vemos ou ouvimos é tão real quanto o que percebemos.

Usamos instrumentos variados para amplificar nossa percepção da realidade, mesmo sabendo que nossa visão será sempre limitada: qualquer microscópio, telescópio ou detector tem alcance e precisão determinados pelo estado da tecnologia.

É claro que um telescópio do século 19 não pode competir com os telescópios mais avançados de hoje. Com isso, o que captamos da realidade depende de forma essencial daquilo que nossos instrumentos nos permitem ver.

Esse fato tem uma consequência importante: o que captamos do mundo depende das tecnologias que usamos. Ou seja, com o avanço delas, muda, muitas vezes, nossa visão de mundo.

Um exemplo que já usei aqui é o microscópio. A visão da vida antes e depois da invenção do microscópio mudou completamente. O instrumento, inventado ao fim do século 17, permitiu que víssemos criaturas invisíveis aos olhos.

Com isso, novas perguntas sobre a natureza da vida puderam ser feitas -perguntas que, antes da invenção do microscópio não eram nem vislumbradas.

Essa é uma lição importante, que elaboro no livro "Ilha do Conhecimento": o conhecimento não evolve linearmente; cresce de forma imprevisível, interagindo com as tecnologias que temos ao nosso dispor.

Portanto, o mistério que nos cerca, e que tanto fascinava Einstein, estará sempre à nossa volta: não há como decifrá-lo por completo.

Isso dá uma conotação única à ciência. Sendo um caminho para o conhecimento, ela nos oferece uma oportunidade de estar sempre buscando, e crescendo com a busca.

O sentido da vida é dar sentido à vida. Não existe, ou deve existir, um fim. Pense num alpinista.

Ele se prepara para subir o pico que vê à sua frente e, depois de muito esforço, consegue. De lá de cima, pode fazer duas coisas: se dar por satisfeito e descer, ou olhar em torno e ver todos os picos que ainda não escalou.

A busca pelo conhecimento científico é assim: uma escalada por todos os picos que podemos encontrar. E quando conquistarmos todos eles, basta olhar para cima, e continuar nossa busca no espaço.

http://www1.folha.uol.com.br/coluna.../10/1530975-ciencia-e-o-sentido-da-vida.shtml
 
A fé dos cientistas

2014-10-26 01:40

Falar de fé no contexto científico parece blasfêmia. A ciência não é a antítese da noção de fé, baseada como é em certezas, na verificação explícita de hipóteses? Essa visão da ciência como perfeitamente lógica e racional é uma idealização.

É claro que o produto final da pesquisa científica deve ser algo concreto, hipóteses que devem ser comprovadas, dados obtidos em experimentos passíveis de repetição por outros. Talvez seja esse o grande mistério da ciência, uma atividade criada por humanos, seres falíveis que almejam a perfeição.

No início do século 20, a física estava em crise. Experimentos demonstravam propriedades da matéria que não podiam ser explicadas pelas teorias então vigentes, baseadas na mecânica de Newton ou no eletromagnetismo de James Maxwell, os pilares da física clássica.

A exploração do mundo dos átomos expôs uma realidade completamente diferente, onde novas regras eram necessárias. Cientistas tiveram que reformular sua visão de mundo, o que nunca é fácil.

No mundo clássico, a Natureza fazia sentido, seguindo regras simples de causa e efeito, o que chamamos de determinismo. No mundo quântico, essa certeza tem que ser posta de lado, e precisamos adotar regras baseadas em probabilidades. Einstein, Schrödinger, Planck e outros grandes nomes da ciência sofreram, recusando-se a aceitar isso. Para eles, a natureza tinha que seguir regras simples, determinísticas, mesmo se não soubéssemos quais.

Esse tipo de postura só pode ser chamado de fé. É acreditar numa natureza ordenada, racional, mesmo quando se manifesta de forma aleatória. "Deus não joga dados," escreveu Einstein a seu colega Max Born. Einstein e outros buscaram teorias que explicassem as estranhas probabilidades quânticas como manifestações de uma ordem mais fundamental. E falharam.

Existe, no entanto, uma diferença essencial entre a fé religiosa e a fé científica: dogma. Em ciência, o dogma é insustentável, pois cedo ou tarde mesmo as ideias mais arraigadas - se erradas - sucumbem á evidência dos dados. Em ciência, a fé numa ideia errada tem de ser abandonada. Na religião, a evidência dos dados é elusiva ou mesmo irrelevante, o que faz com que a fé seja uma proposta sempre viável.

Estamos passando por um momento curioso na física de altas energias e na cosmologia. Algumas teorias populares podem não ser testáveis. Isso significa que não podemos determinar se estão erradas, o oposto da proposta científica.

Feito um zumbi que nunca morre, é possível que uma teoria siga sempre sendo redefinida de forma a escapar do alcance dos experimentos. É o caso, por exemplo, da supersimetria, uma simetria hipotética da natureza onde cada partícula de matéria (elétrons, quarks...) tem uma parceira supersimétrica. Propostas há quatro décadas, essas partículas nunca foram encontradas.

No ano que vem, o Grande Colisor de Hádrons na Suíça dobra sua energia em busca delas. Se forem encontradas, ótimo. E se não forem? Minha previsão é que, enquanto alguns físicos abandonarão a supersimetria, outros continuarão a crer nela, dizendo que ela ocorre a energias inalcançáveis por nossas máquinas. Nesse caso, essa hipótese científica se tornará um artigo de fé.

http://www1.folha.uol.com.br/colunas/marcelogleiser/2014/10/1538072-a-fe-dos-cientistas.shtml
 
A inatingível unidade do conhecimento
MARCELO GLEISER

14/12/2014 - 03h36


RESUMO Em novo livro, cientista duas vezes premiado com o Pulitzer propõe modelo para conciliar os saberes científicos em nome de uma compreensão unificada da realidade. Hipótese porém não leva em conta que o conhecimento é móvel e variável, como pondera autor deste ensaio, e não saber é, na verdade, enriquecedor.

*

O biólogo americano Edward O. Wilson é um dos raros super-stars da ciência. Vencedor de dois prêmios Pulitzer pelos seus elegantes ensaios, professor aposentado da Universidade Harvard, Wilson é considerado o maior especialista do mundo em formigas. Entre muitos resultados, Wilson explorou as leis que regem a inteligência coletiva de insetos como as formigas e abelhas, a importância, na evolução das sociedades, de valores como o altruísmo e o sacrifício de alguns para beneficiar a sobrevivência do grupo.

Wilson lançou um novo livro neste ano,"The Meaning of Human Existence" [W.W. Norton, R$ 79,80, 192 págs., sob encomenda na livraria Cultura; R$ 46,65, e-book] (O sentido da existência humana), no qual busca forjar um caminho para a unificação das ciências com as áreas humanas. No livro, que foi finalista do National Book Award, Wilson continua sua obra de 1998, "Consiliência: A Unidade do Conhecimento" (Campus, 1999, esgotado). Se a iniciativa tiver sucesso, afirma o autor, atingiremos uma compreensão transformadora do sentido de nossa existência.

Wilson parte da premissa de que, por trás da complexidade da natureza, existem leis simples, que remetem a uma explicação unificada da realidade. A ideia, inspirada pelo que o historiador Gerald Holton chamou de "encantamento iônico", remete a Tales de Mileto, o primeiro dos filósofos ocidentais.

Tales viveu em torno de 650 a.C. na região de Iônia, hoje parte da Turquia -daí o "iônico". Interessado no aspecto material da realidade, sugeriu que tudo era água. O sentido de Tales era mais metafísico do que físico, a água representando o potencial transformador de uma natureza sempre em fluxo. O ponto essencial permanece: oculta nas profundezas do real, existe uma estrutura unificada, a fonte de tudo. Decifrar suas leis equivale a desvendar o mistério da existência -dos elétrons ao amor.

Wilson identifica o encantamento iônico ao elemento religioso que crê ser a matriz da inspiração na busca científica pelo conhecimento: "Acredito ser essa a fonte do encantamento iônico: satisfazer nosso apetite religioso buscando por uma compreensão da realidade objetiva, rejeitando revelações proféticas".

O autor adota o reducionismo como senhor do conhecimento. A unidade das ciências começa na física, dado que é ela que determina as leis fundamentais da natureza. Como somos feitos de partículas de matéria, entender as leis que regem seu comportamento é uma precondição para entendermos o resto. O plano, portanto, é unificar a física, extrapolar para as outras ciências físicas (química, astronomia, geologia...) e, de lá, para a biologia e as ciências neurocognitivas. Com isso, teremos uma compreensão clara do caráter fisiológico das emoções humanas: dos elétrons ao amor. Como as disciplinas humanas são produto do cérebro humano, serão necessariamente incluídas nessa grande unificação do conhecimento.

Para chegar a tal objetivo, fora a unificação da física, os cientistas terão de convencer os humanistas a abraçar esse movimento, repensando conjuntamente a estrutura de suas disciplinas sob a luz quantitativa da ciência. Boa sorte.

Wilson não despreza as disciplinas humanas. Pelo contrário, acha que devem ser celebradas: "São a história natural da cultura, nossa herança mais preciosa e privada". Considera que as artes, a filosofia, a teologia, a história são, em essência, produtos de quem somos, da nossa história evolucionária: para entendermos história temos que começar na pré-história. É um erro separar nossa habilidade como entidades criadoras dos processos evolucionários que, ao longo de 2 milhões de anos, moldaram o Homo sapiens a partir duma linhagem de primatas bípedes. Assim, traçamos uma linha que parte do Big Bang e passa pela origem da matéria, da vida, da vida complexa, dos humanos e termina nas obras criadas pela nossa espécie em todas as áreas do conhecimento. Essa é a conciliação que busca Wilson: uma ponte ligando a história cósmica à história humana.

Wilson resume sua missão: "A conciliação do saber busca salvar o espírito através da liberação da mente humana -não de sua rendição. Seu princípio central, como sabia Einstein, é a unificação do conhecimento. Quando lá chegarmos, compreenderemos quem somos e por que estamos aqui".

MISSÃO

Infelizmente, a missão é inatingível tanto em princípio quanto na prática. Em princípio, porque a noção de unificação na física, o ponto de partida de Wilson, não faz sentido epistemologicamente. Na prática, porque não podemos acumular conhecimento suficiente para construirmos uma visão unificada da realidade.

Ao encantamento iônico temos que contrapor a "falácia iônica", termo proposto pelo historiador das ideias Isaiah Berlin (1909-97). Qualquer sistema de conhecimento que almeje completude é necessariamente cego a como o conhecimento é adquirido. "Toda filosofia é produto de duas coisas apenas: curiosidade e miopia", escreveu o filósofo francês Bernard de Fontenelle ao final do século 17. A aquisição de conhecimento é, por necessidade, um processo que se ramifica: quanto mais sabemos, mais percebemos o quanto ainda temos por saber.

Buscamos sempre por descrições cada vez mais unificadas dos fenômenos naturais. Mas não temos qualquer indicação de que essa estrada tenha fim. Mesmo na física de partículas elementares, podemos apenas construir descrições unificadas provisórias, que serão suplantadas por novas descobertas. A gravidade de Aristóteles era muito diferente da de Newton; a dele, muito diferente da de Einstein. Mesmo hoje, estamos repensando as propriedades da força gravitacional; existem propostas de considerá-la como uma força diferente das demais, irreconciliável com o que ocorre no nível subatômico.

Não temos por que esperar que a mente humana possa decifrar a essência da realidade; precisamos aprender a viver com o mistério, com o fato de que não podemos chegar ao fim do conhecimento.

Mesmo que sejamos feitos de átomos, não podemos usar a física atômica para descrever nossa fisiologia ou comportamento. Níveis de organização material diferentes requerem leis diferentes, e essas leis são novas e irredutíveis.

Usando as formigas de Wilson, o comportamento do grupo segue leis bem diferentes das que regem o metabolismo celular de cada formiga e, mais ainda, das que regem as propriedades dos seus átomos. Não existe uma continuidade entre o que ocorre com os átomos e o altruísmo de algumas formigas. A cada nível crescente de complexidade material, mudam as descrições e a metodologia. Caso contrário, economistas teriam que estudar mecânica quântica para examinar o mercado de capitais.

Wilson acredita numa espécie de determinismo cósmico, baseado numa causalidade universal. Se o consciente humano é redutível à simples leis físicas, podemos relacionar nosso comportamento, nossas escolhas subjetivas, a uma teia de causa e efeito que teve início no próprio Big Bang. Nesse caso, a noção de livre-arbítrio seria uma ilusão "biologicamente adaptativa", que nos protege contra o fatalismo: acreditando ter controle sobre nossas vidas, continuamos a nos reproduzir.

Esse tipo de determinismo é inconsistente com a física quântica -na qual existe uma incerteza essencial ao nível de cada partícula que pode tomar essa ou aquela propriedade (girar para no sentido horário ou anti-horário, por exemplo). Cada opção leva a uma história divergente. E, se tudo é já definido, qual a intenção de Wilson ao querer que tomemos o futuro em nossas mãos, que preservemos a Terra e seus habitantes, eliminando a guerra e a intolerância?

Na prática, também, existem limites intransponíveis, dado que a aquisição do conhecimento científico depende da tecnologia usada nos instrumentos de medida. Basta comparar a astronomia antes e depois do telescópio, a biologia antes e depois do microscópio, e como esses campos do conhecimento avançam devido ao progresso dos instrumentos de observação. Ver mais não significa ver tudo.

Pode haver um caminho para a unificação do conhecimento? Apenas no engajamento construtivo das disciplinas. Cientistas e humanistas devem, sim, colaborar, encurtando as distâncias entre suas metodologias e objetivos. Existem muitas áreas em que as duas vertentes do conhecimento convergem, como, por exemplo, na questão do livre-arbítrio ou na natureza da verdade.

Por outro lado, querer construir um único edifício do conhecimento é querer empobrecê-lo. Existem muitas formas de olhar para o mundo. Melhor do que chegar a um pressuposto fim no qual tudo é um, é celebrar a pluralidade do saber, a natureza instável do conhecimento, fonte de nosso desejo de querer sempre buscar. Aceitar a incompletude do saber não é uma atitude derrotista; ao contrário, é libertadora, pois entende que a busca não tem fim. O que pode ser mais instigante do que saber que existirá sempre algo de novo a ser descoberto?

MARCELO GLEISER, 55, é professor titular de física, astronomia e filosofia natural no Dartmouth College, nos EUA. Seu livro mais recente é "A Ilha do Conhecimento" (Record).

http://www1.folha.uol.com.br/ilustr...0-a-inatingivel-unidade-do-conhecimento.shtml
 
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