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Saúde Mental

Eu fico com 50% genes e 50% ambiente. A depressão provoca alterações morfológicas da massa encefálica, por exemplo.

Mas o impacto de uma mente doente, na minha opinião, se dá principalmente na relação do corpo com a mente. E acredito, inclusive, que um serve de prognóstico para o outro.

Assim, uma mente cheia de tristeza e sofrimento "criaria" uma enfermidade ou doença para que a atenção e a dor fossem redirecionadas para outro local, dando um pouco de alívio para a parte sobrecarregada.
Acredito nisso. Por exemplo, uma doença nos nervos ou juntas desengatilhada pelo acúmulo de estresse. Os nódulos e o enrijecimento muscular... Artrite reumatoide, etc...
 
Mesmo isso é probabilístico.

Quer dizer, pessoas com certos genes ou combinações genéticas vão ter probabilidade maior de desenvolver esse ou aquele quadro ou sintoma, mas não é garantido.
Óbvio.
Mas acho que essa informação aliada a um teste psicológico (como já é feito em alguns centros do Daime) podem embasar muito melhor a escolha e em consequencia reduzir muitos danos. Talvez isso implique em segregação também mas aí é outro assunto.
 
Última edição:
Mas acho que essa informação aliada a um teste psicológico (como já é feito em alguns centros do Daime) podem embasar muito melhor a escolha e em consequencia reduzir muitos danos.


Pode implicar em mais cuidados e mesmo segregação, como você escreveu.

Só que, fora do alcance da avaliação de uma instituição, as pessoas tendem a não fazer isso com os psicoativos que compram ou cultivam. Na verdade temos uma dificuldade de avaliarmos nossos próprios riscos.

Já vi dados que indicam que pessoas com transtornos de humor e outros tendem a usar mais psicoativos, legais e ilegais, que o restante da população. Será que é efeito dos psicoativos, uma tentativa de se automedicar devido a algum incômodo psicológico que a pessoa já sentia ou uma mistura dos dois?
 
Será que o contexto de uma instituição não é potencialmente menos danoso ao neófito. Digo, em relação ao possíveis danos que o uso marginalizado tende a acarretar (abuso, isolamento...). Para avaliar os próprios riscos com mais base, talvez.
 
'Fui convidado a fazer uma preleção sobre saúde mental. Os que me convidaram supuseram que eu, na qualidade de psicanalista, deveria ser um especialista no assunto. E eu também pensei. Tanto que aceitei. Mas foi só parar para pensar para me arrepender. Percebi que nada sabia.

Eu me explico:

Comecei o meu pensamento fazendo uma lista das pessoas que, do meu ponto de vista, tiveram uma vida mental rica e excitante, pessoas cujos livros e obras são alimento para a minha alma. Nietzsche, Fernando Pessoa, Van Gogh, Wittgenstein, Cecília Meireles, Maiakovski. E logo me assustei.
Nietzsche ficou louco. Fernando Pessoa era dado à bebida. Van Gogh matou-se. Wittgenstein alegrou-se ao saber que iria morrer em breve: não suportava mais viver com tanta angústia. Cecília Meireles sofria de uma suave depressão crônica. Maiakoviski suicidou-se.

Essas eram pessoas lúcidas e profundas que continuarão a ser pão para os vivos muito depois de nós termos sido completamente esquecidos.

Mas será que tinham saúde mental? Saúde mental, essa condição em que as idéias comportam-se bem, sempre iguais, previsíveis, sem surpresas,obedientes ao comando do dever, todas as coisas nos seus lugares, como soldados em ordem unida, jamais permitindo que o corpo falte ao trabalho, ou que faça algo inesperado; nem é preciso dar uma volta ao mundo num barco a vela, basta fazer o que fez a Shirley Valentine (se ainda não viu, veja o filme) ou ter um amor proibido ou, mais perigoso que tudo isso, a coragem de pensar o que nunca pensou.

Pensar é uma coisa muito perigosa... Não, saúde mental elas não tinham... Eram lúcidas demais para isso.

Elas sabiam que o mundo é controlado pelos loucos e idosos de gravata. Sendo donos do poder, os loucos passam a ser os protótipos da saúde mental.

Claro que nenhum dos nomes que citei sobreviveria aos testes psicológicos a que teria de se submeter se fosse pedir emprego numa empresa.
Por outro lado, nunca ouvir falar de político que tivesse depressão. Andam sempre fortes em passarelas pelas ruas da cidade, distribuindo sorrisos e certezas.

Sinto que meus pensamentos podem parecer pensamentos de louco e por isso apresso-me aos devidos esclarecimentos.

Nós somos muito parecidos com computadores. O funcionamento dos computadores, como todo mundo sabe, requer a interação de duas partes.

Uma delas chama-se hardware, literalmente 'equipamento duro', e a outra denomina-se software, 'equipamento macio'.

Hardware é constituído por todas as coisas sólidas com que o aparelho é feito. O software é constituído por entidades 'espirituais' - símbolos que formam os programas e são gravados nos disquetes. Nós também temos um hardware e um software. O hardware são os nervos do cérebro, os neurônios, tudo aquilo que compõe o sistema nervoso. O software é constituído por uma série de programas que ficam gravados na memória.

Do mesmo jeito como nos computadores, o que fica na memória são símbolos, entidades levíssimas, dir-se-ia mesmo 'espirituais', sendo que o programa mais importante é a linguagem. Um computador pode enlouquecer por defeitos no hardware ou por defeitos no software.

Nós também. Quando o nosso hardware fica louco há que se chamar psiquiatras e neurologistas, que virão com suas poções químicas e bisturis consertar o que se estragou. Quando o problema está no software, entretanto, poções e bisturis não funcionam. Não se conserta um programa com chave de fenda. Porque o software é feito de símbolos; somente símbolos podem entrar dentro dele.

Ouvimos uma música e choramos. Lemos os poemas eróticos de Drummond e o corpo fica excitado. Imagine um aparelho de som. Imagine que o toca-discos e os acessórios, o hardware, tenham a capacidade de ouvir a música que ele toca e se comover. Imagine mais, que a beleza é tão grande que o hardware não a comporta e se arrebenta de emoção!

Pois foi isso que aconteceu com aquelas pessoas que citei no princípio: a música que saia de seu software era tão bonita que seu hardware não suportou... Dados esses pressupostos teóricos, estamos agora em condições de oferecer uma receita que garantirá, àqueles que a seguirem à risca, 'saúde mental' até o fim dos seus dias.

Opte por um software modesto. Evite as coisas belas e comoventes. A beleza é perigosa para o hardware. Cuidado com a música... Brahms, Mahler,Wagner, Bach são especialmente contra-indicados. Quanto às leituras, evite aquelas que fazem pensar.

Tranquilize-se; há uma vasta literatura especializada em impedir o pensamento. Se há livros do doutor Lair Ribeiro, por que se arriscar a ler Saramago?

Os jornais têm o mesmo efeito. Devem ser lidos diariamente. Como eles publicam diariamente sempre a mesma coisa com nomes e caras diferentes, fica garantido que o nosso software pensará sempre coisas iguais. E, aos domingos, não se esqueça do Silvio Santos e do Gugu Liberato.

Seguindo essa receita você terá uma vida tranqüila, embora banal. Mas como você cultivou a insensibilidade, você não perceberá o quão banal ela é. E,em vez de ter o fim que tiveram as pessoas que mencionei, você se aposentará para, então, realizar os seus sonhos.

Infelizmente, entretanto, quando chegar tal momento, você já terá se esquecido de como eles eram...'

Rubem Alves
'Sobre o tempo e a eternidade'
Campinas: Ed. Papirus, 1996.
Um dos tópicos mais reflequitivos e ao mesmo tempo deprimentes que já li neste fórum, e também com situações poéticas e filosóficas, parabéns pela contribuição intelectual
 
j
'Fui convidado a fazer uma preleção sobre saúde mental. Os que me convidaram supuseram que eu, na qualidade de psicanalista, deveria ser um especialista no assunto. E eu também pensei. Tanto que aceitei. Mas foi só parar para pensar para me arrepender. Percebi que nada sabia.

Eu me explico:

Comecei o meu pensamento fazendo uma lista das pessoas que, do meu ponto de vista, tiveram uma vida mental rica e excitante, pessoas cujos livros e obras são alimento para a minha alma. Nietzsche, Fernando Pessoa, Van Gogh, Wittgenstein, Cecília Meireles, Maiakovski. E logo me assustei.
Nietzsche ficou louco. Fernando Pessoa era dado à bebida. Van Gogh matou-se. Wittgenstein alegrou-se ao saber que iria morrer em breve: não suportava mais viver com tanta angústia. Cecília Meireles sofria de uma suave depressão crônica. Maiakoviski suicidou-se.

Essas eram pessoas lúcidas e profundas que continuarão a ser pão para os vivos muito depois de nós termos sido completamente esquecidos.

Mas será que tinham saúde mental? Saúde mental, essa condição em que as idéias comportam-se bem, sempre iguais, previsíveis, sem surpresas,obedientes ao comando do dever, todas as coisas nos seus lugares, como soldados em ordem unida, jamais permitindo que o corpo falte ao trabalho, ou que faça algo inesperado; nem é preciso dar uma volta ao mundo num barco a vela, basta fazer o que fez a Shirley Valentine (se ainda não viu, veja o filme) ou ter um amor proibido ou, mais perigoso que tudo isso, a coragem de pensar o que nunca pensou.

Pensar é uma coisa muito perigosa... Não, saúde mental elas não tinham... Eram lúcidas demais para isso.

Elas sabiam que o mundo é controlado pelos loucos e idosos de gravata. Sendo donos do poder, os loucos passam a ser os protótipos da saúde mental.

Claro que nenhum dos nomes que citei sobreviveria aos testes psicológicos a que teria de se submeter se fosse pedir emprego numa empresa.
Por outro lado, nunca ouvir falar de político que tivesse depressão. Andam sempre fortes em passarelas pelas ruas da cidade, distribuindo sorrisos e certezas.

Sinto que meus pensamentos podem parecer pensamentos de louco e por isso apresso-me aos devidos esclarecimentos.

Nós somos muito parecidos com computadores. O funcionamento dos computadores, como todo mundo sabe, requer a interação de duas partes.

Uma delas chama-se hardware, literalmente 'equipamento duro', e a outra denomina-se software, 'equipamento macio'.

Hardware é constituído por todas as coisas sólidas com que o aparelho é feito. O software é constituído por entidades 'espirituais' - símbolos que formam os programas e são gravados nos disquetes. Nós também temos um hardware e um software. O hardware são os nervos do cérebro, os neurônios, tudo aquilo que compõe o sistema nervoso. O software é constituído por uma série de programas que ficam gravados na memória.

Do mesmo jeito como nos computadores, o que fica na memória são símbolos, entidades levíssimas, dir-se-ia mesmo 'espirituais', sendo que o programa mais importante é a linguagem. Um computador pode enlouquecer por defeitos no hardware ou por defeitos no software.

Nós também. Quando o nosso hardware fica louco há que se chamar psiquiatras e neurologistas, que virão com suas poções químicas e bisturis consertar o que se estragou. Quando o problema está no software, entretanto, poções e bisturis não funcionam. Não se conserta um programa com chave de fenda. Porque o software é feito de símbolos; somente símbolos podem entrar dentro dele.

Ouvimos uma música e choramos. Lemos os poemas eróticos de Drummond e o corpo fica excitado. Imagine um aparelho de som. Imagine que o toca-discos e os acessórios, o hardware, tenham a capacidade de ouvir a música que ele toca e se comover. Imagine mais, que a beleza é tão grande que o hardware não a comporta e se arrebenta de emoção!

Pois foi isso que aconteceu com aquelas pessoas que citei no princípio: a música que saia de seu software era tão bonita que seu hardware não suportou... Dados esses pressupostos teóricos, estamos agora em condições de oferecer uma receita que garantirá, àqueles que a seguirem à risca, 'saúde mental' até o fim dos seus dias.

Opte por um software modesto. Evite as coisas belas e comoventes. A beleza é perigosa para o hardware. Cuidado com a música... Brahms, Mahler,Wagner, Bach são especialmente contra-indicados. Quanto às leituras, evite aquelas que fazem pensar.

Tranquilize-se; há uma vasta literatura especializada em impedir o pensamento. Se há livros do doutor Lair Ribeiro, por que se arriscar a ler Saramago?

Os jornais têm o mesmo efeito. Devem ser lidos diariamente. Como eles publicam diariamente sempre a mesma coisa com nomes e caras diferentes, fica garantido que o nosso software pensará sempre coisas iguais. E, aos domingos, não se esqueça do Silvio Santos e do Gugu Liberato.

Seguindo essa receita você terá uma vida tranqüila, embora banal. Mas como você cultivou a insensibilidade, você não perceberá o quão banal ela é. E,em vez de ter o fim que tiveram as pessoas que mencionei, você se aposentará para, então, realizar os seus sonhos.

Infelizmente, entretanto, quando chegar tal momento, você já terá se esquecido de como eles eram...'

Rubem Alves
'Sobre o tempo e a eternidade'
Campinas: Ed. Papirus, 1996.
já sabia desses inconvenientes dentro da vida de cada uma dessas pessoas históricas, isso mostra essa certa contração da sociedade em prol do que é sábio ou não, já que o próprio sábio pode cometer tanto equívocos quanto fazer coisas que vão ser pela sociedade considerados equivocadas ou erros por completo, não é atoa que a minha foto de perfil no insta é o Van Gogh kkkk
 
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