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Nietzsche

Trecho do prefácio do livro Assim falou Zaratustra, que está sendo relançando em edição digital:

Zaratustra: o bem e o mal

Durante 10 anos, segundo narrativas que chegaram a nós, Zaratustra viveu quase sempre isolado, habitando no alto de uma montanha, em cavernas sagradas. Não ingeria nenhum alimento de origem animal. Em outros relatos, teria ido ao deserto, onde fora tentado por uma entidade maligna. Após anos de solidão completa, regressou ao seu povo com as boas novas...

Assim começou a sua missão. Segundo os masdeístas, ele encontrou muita dificuldade para converter as pessoas à sua nova religião. Em dez anos de pregação teve somente um crente: o seu primo. Durante este período, o chamado de Zaratustra foi como uma voz no deserto. Ninguém o escutava. Ninguém o entendia.

Nietzsche foi buscar no zoroastrismo, religião ancestral da Pérsia (atual Irã), o personagem para expor suas próprias ideias. O que parece ter atraído ao filósofo alemão é o dualismo cósmico da doutrina de Zaratustra (ou Zaroastro, daí o termo “zoroastrismo”). Cabe notar, no entanto, que a guerra semieterna entre o “Deus Bom” e o “Deus Mau” era, numa análise mitológica mais aprofundada (a qual Nietzsche certamente estava a par), uma analogia para a batalha moral que se dá antes dentro da alma humana do que fora dela.

A grande questão não era, portanto, termos medo de um Demônio externo – entidade que serviu e ainda serve para evocar o medo nos seguidores de dogmas. A questão era reconhecermos nossos próprios monstros internos, e apaziguá-los, dominá-los, nos tornando timoneiros de nossa própria embarcação.

Nietzsche foi muito mal interpretado ao longo dos anos, e por isso cabe lermos esta obra (para muitos, sua obra-prima) tendo em mente que o “Deus” ao qual ele anuncia a morte é, sobretudo, o “deus das barganhas”, que guia ovelhas com maior pavor dos “infernos” do que propriamente uma vontade genuína de se espiritualizar. Da mesma forma, o “Super-homem” não é um “homem de espécie superior” num sentido de “raça humana superior” (que a ciência já comprovou que sequer existe, ou seja: que todos somos homo sapiens desde seu surgimento na África), mas sim num sentido de “homem que supera a si mesmo, que vai além das suas capacidades atuais, que cria o novo”.

Tomei o cuidado (espero que me perdoem) de relembrar estes conceitos assim que aparecem ao longo do livro, com pequenas notas. Noutros casos, inseri notas mais pitorescas, como a que explica que “a péla dourada” nada mais é que uma bola do jogo de péla, espécie de ancestral do jogo de tênis (o esporte), e que teve o seu auge no século em que nasceu Nietzsche.

De resto, escutemos ao que falou Zaratustra...

http://textosparareflexao.blogspot.com/2013/03/lancamento-assim-falou-zaratustra.html
 
Ecuador ,
Esse livro é fantástico... O meu "capítulo" preferido é esse aqui:

Do caminho do criador

Queres, meu irmão, insular-te? Queres procurar o caminho que te guia a ti mesmo? Espera ainda um momento e ouve-me.
O que procura, facilmente se perde a si mesmo.
Todo o insulamento é um erro”. Assim fala o rebanho. E tu pertenceste ao rebanho durante muito tempo.
Em ti também ainda há de ressoar a voz do rebanho. E tu pertenceste ao rebanho durante muito tempo.
Em ti também ainda há de ressoar a voz do rebanho. E quando disseres: “Já não tenho uma consciência comum convosco”, isso será uma queixa e uma dor.
Olha: essa mesma dor é filha da consciência comum e a última centelha dessa consciência ainda brilha na tua aflição.
Queres, porém, seguir o caminho da tua aflição, que é o caminho para ti mesmo? Demonstra-me o teu direito e a tua força para isso!
Acaso és uma força nova e um novo direito?
Um primeiro movimento? Uma roda que gira sobre si mesma? Podes obrigar as estrelas a girarem em torno de ti?
Ai! Existe tanta ansiedade pelas alturas!
Há tantas convulsões de ambição! Demonstra-me que não pertences ao número dos cobiçosos nem dos ambiciosos!
Ai! Existem tantos pensamentos grandes que apenas fazem o mesmo que um fole. Incham e esvaziam.
Chamas-te livre? Quero que me digas o teu pensamento fundamental, e não que te livraste de um jugo.
Serás tu alguém que tenha o direito de se livrar de um jugo? Há quem perca o seu último valor ao libertar-se da sua sujeição.
Livre de quê? Que importa isso a Zaratustra? O teu olhar, porém, deve anunciar-se claramente: livre, para quê?
Podes proporcionar a ti mesmo teu bem e o teu mal, e suspender a tua vontade por cima de ti como uma lei? Podes ser o teu próprio juiz e vingador da tua lei?
Terrível é estar a sós com o juiz e o vingador da própria lei, como estrela lançada ao espaço vazio no meio do sopro gelado da soledade.
Ainda hoje te atormenta a multidão; ainda conservas o teu valor e as tuas esperanças todas.
Um dia, contudo, te fatigará a soledade, se abaterá o teu orgulho e cerrarás os dentes. Um dia clamarás: “Estou só!”
Chegará um dia em que já não vejas a tua altura, e em que a tua baixeza esteja demasiado perto de ti. A tua própria sublimidade te amendrontará como um fantasma. Um dia gritarás: “Tudo é falso!”
Há sentimentos que querem matar o solitário. Não o conseguem? Pois eles que morram! Mas, serás tu capaz de ser assassino?
Meu irmão, já conheces a palavra “desprezo”? E o tormento da justiça de ser justo para com os que te menosprezam?
Obrigas muitos a mudarem de opinião a teu respeito; por isso te consideram. Abeiraste-te deles e, contudo, passaste adiante; é coisa que te não perdoam.
Elevaste-te acima deles; mas quanto mais alto sobes, tanto mais pequeno te vêm os olhos da inveja. E ninguém é tão odiado como o que voa.
“Como quereríeis ser justo para comigo! — assim é que deves falar. — Eu elejo para mim a vossa injustiça, como lote que me está destinado”.
Injustiça e baixeza é o que eles arrojam ao solitário; mas, meu irmão, se queres ser uma estrela, nem por isso os hás de iluminar menos.
E livra-te dos bons e dos justos! Agrada-lhes crucificar os que invejam a sua própria virtude: odeiam o solitário.
E livra-te ainda assim da santa simplicidade! A seus olhos não é santo o que é simples, e apraz-lhe brincar com fogo… das fogueiras.
E livra-te também dos impulsos do teu amor! O solitário estende depressa demais a mão a quem encontra!
Há homens a quem não deves dar a mão, mas tão somente a pata, e além disso quero que a tua pata tenha garras.
O pior inimigo, todavia, que podes encontrar, és tu mesmo; lança-te a ti próprio nas cavernas e nos bosques.
Solitário, tu segues o caminho que te conduz a ti mesmo! E o teu caminho passa por diante de ti e dos teus sete demônios.
Serás herege para ti mesmo, serás feiticeiro, adivinho, doido, incrédulo, ímpio e malvado.
É mister que queiras consumir-te na tua própria chama. Como quererias renovar-te sem primeiro te reduzires a cinzas?
Solitário, tu segues o caminho do criador: queres tirar um deus dos teus sete demônios!
Solitário, tu segues o caminho do amante: amas-te a ti mesmo, e por isso te desprezas, como só desprezam os amantes.
O amante quer criar porque despreza! Que saberia do amor aquele que não devesse menosprezar justamente o que amava?
Vai-te para o isolamento, meu irmão, com o teu amor e com a tua criação, e tarde será que a justiça te siga claudicando.
Vai-te para o isolamento com as minhas lágrimas, meu irmão. Eu amo o que quer criar qualquer coisa superior a si mesmo e dessa arte sucumbe”.
Assim falava Zaratustra.
 
"Abençoados são os esquecidos, pois podem se aproveitar até mesmo de seus equívocos." (Para além do bem e do mal)

"Maturidade no homem significa o reencontro com a seriedade que se tinha nas brincadeiras de infância." (Para além do bem e do mal)

"Quando se coloca o centro de gravidade da vida, não na vida mas no além, tira-se da vida todo o seu centro de gravidade." (O Anticristo)

"Não existem fenômenos morais, apenas uma interpretação moral dos fenômenos." (Para além do bem e do mal)
 
Com todo respeito ao filósofo, mas na minha vida Nietzsche já deu, pretendo assim que tiver mais tempo disponível ler toda sua obra por mero divertimento intelectual e erudição, mas não consigo levar nada do que Nietzsche fala a sério, mas devo admitir foi uma influência forte na minha vida por um bom tempo, creio eu que tenha sido puro modismo.
 
Niet é bruto na superficie e suave nas profundezas.
Alguns de seus aforismos me proporcionaram experiencias numinosas, mas nao sem antes ter sido despedaçado por seu martelo.
 
"Todo pensamento, como lava fluida, constrói um castelo ao redor de si e esmaga a si próprio com 'leis'"

(15 [29] verão-outono 1883, KSA 10.486)
 
"Aquilo para o qual encontramos palavras é algo que já morreu em nossos corações". (Nietzsche)
 
Um fato curioso e ao mesmo tempo poético de sua vida é que ao final, quando já louco, ele assinava como Dionísio.

Um dos meu preferidos:
É preciso ter um caos dentro de si para dar à luz uma estrela cintilante.

Assim falou Zaratustra

Nada de anormal ai, ele assinar como Dionísio, afinal ele queria ser Dionísio, falava bem de Dionísio em tudo e claro, alegava que o modo de vida de dionisíaco que sim era a real libertação.
 
Nada de anormal ai, ele assinar como Dionísio, afinal ele queria ser Dionísio, falava bem de Dionísio em tudo e claro, alegava que o modo de vida de dionisíaco que sim era a real libertação.


Às vezes as pessoas se confundem ou tentam se confundir com o guru, a deidade, ou o arquétipo que cultuam. Se for feito de forma centrada e consciente pode ser benéfico. Se não, pode ser uma neurose.

Por exemplo, quantas pessoas alegando serem Jesus Cristo vocês já viram ou ouviram falar?

Então não sei se é "normal" essa identificação dele com Dionísio, ou se é poético, como o @.Gabiru escreveu.
 
Não @Ecuador, no caso de N. não é tão simples assim.
Quando se fala em ser Dionisio, não é a transcrição literal do fato, "ao pé da letra". É algo mais como haverá de ter a conduta de Dionisio, e claro, cuidando para não cair no niilismo.
 
Normal ou anormal, um destino estranho. Não sei se pode-se dizer que foi uma libertação, tupy. Ele ficou louco a ponto de babar. Assinava como Jesus também.
///
"Temos a arte para não morrer da verdade."
 
'Com o desconhecido, confrontamo-nos com o perigo, o desconforto e a aflição; o primeiro instinto é abolir essas sensações dolorosas. Primeiro princípio: qualquer explicação é melhor do que nenhuma...A busca por causas é assim condicionada e instigada pelo sentimento do medo. A pergunta "Por quê?" não constitui uma busca em si, mas encontrar um certo tipo de resposta - uma resposta que seja pacificadora, tranquilizante e reconfortante.' (Crepúsculo dos Ídolos)
 
e claro, cuidando para não cair no niilismo.
Por que? "o eterno retorno não comporta qualquer possibilidade de interpretação que não seja a niilista."
Um universo sem propósito, um universo total é assustador ao homem, e o dionisíaco é a essência de tal universo. É o apolíneo que o preencherá de imagens, signos, mascarando a realidade nua e crua, que só podemos experienciar através da embriaguez.
 
Por que? "o eterno retorno não comporta qualquer possibilidade de interpretação que não seja a niilista."
Um universo sem propósito, um universo total é assustador ao homem, e o dionisíaco é a essência de tal universo. É o apolíneo que o preencherá de imagens, signos, mascarando a realidade nua e crua, que só podemos experienciar através da embriaguez.
"Todo pensamento, como lava fluida, constrói um castelo ao redor de si e esmaga a si próprio com 'leis'"

(15 [29] verão-outono 1883, KSA 10.486)
 
"Todo pensamento, como lava fluida, constrói um castelo ao redor de si e esmaga a si próprio com 'leis'"

Nós precisamos de leis, para a nossa própria estabilidade, e quanto mais estamos agarrados ao material mais leis precisamos. Quando conseguimos nos desprender as leis menores se tornam inúteis e passamos a ver tudo em um plano maior, com menos regras, porém mais exigentes, como amar ao próximo como a ti mesmo.
 
Nós precisamos de leis, para a nossa própria estabilidade, e quanto mais estamos agarrados ao material mais leis precisamos. Quando conseguimos nos desprender as leis menores se tornam inúteis e passamos a ver tudo em um plano maior, com menos regras, porém mais exigentes, como amar ao próximo como a ti mesmo.
O pensamento deixa de ser esmagado por leis quando ele não é mais um pensamento e sim uma experiência viva que se consolidou. Quando o processo artificial de pensar deixa de ser um processo e passa a ser Natureza.
Precisamos de lei só enquanto seres operando numa escala material-artificial da realidade. Animais não precisam de leis, eles criam as leis em tempo real de acordo com a capacidade de enfrentar as represálias de suas ações. Acho que a gente deve encontrar esse limiar, não pra ser mais animal ou natural, mas sim pra ser mais livre e humano.
A metodologia apresentada no Niet para se livrar desse Castelo é Dionísio. Eu concordo com ele.
A velha conhecida alternancia destruição-renascimento , apolo-dionísio, shiva-bhrama e por aí vai.

claro que isso é só pensamento, cheio de leis. :velhinho:

"O idealista é incorrigível: se é expulso do seu céu, faz um ideal do seu inferno."
 
Última edição por um moderador:
Nós precisamos de leis, para a nossa própria estabilidade, e quanto mais estamos agarrados ao material mais leis precisamos. Quando conseguimos nos desprender as leis menores se tornam inúteis e passamos a ver tudo em um plano maior, com menos regras, porém mais exigentes, como amar ao próximo como a ti mesmo.

Posso até concordar com você Equador, mas aí já não estamos falando em Nietzsche. O Dionisíaco é "feio", assustador, não há amor, não há próximo, pois o próximo é produto da individualidade e o amor é um conceito. Há aí um estado para se experienciar, certamente nunca em sua totalidade, pois isso o destruiria. A embriaguez é a quebra da individualidade, mas não nesse sentido romântico decadente cristão. Tais devaneios humanos acerca do amor são consequências do Apolíneo. E se não falamos da vida enquanto arte, não há valor na vida, apenas o aburguesamento nessa decadente tradição cristã.
 
Há aí um estado para se experienciar, certamente nunca em sua totalidade, pois isso o destruiria.

Se você não pode ir ao fundo, porque senão seria destruído, e você não quer ser destruído (ao menos simbolicamente), ao que parece, de que lhe servirá o caminho? O que é proposto não é uma alternância destruição-renascimento? Você quer ficar somente na embriaguez ocasional?

E realmente tenho dificuldade em entender o que você quer dizer por "A embriaguez é a quebra da individualidade, mas não nesse sentido romântico decadente cristão.", pois a tradição cristão pouco toca na questão de quebra da individualidade.

Por outro lado parece muito preocupado em enfatizar a tal decadência cristã, mas não vejo a filosofia proposta por Nietzsche com toda essa punjância toda. Será que ela está decadente também? Não se preocupe, são os ciclos de destruição-renascimento.

Quanto ao valor da vida, cada tradição religiosa ou linha de pensamento propõe seus critérios. Eu observo e vejo onde me encaixo, mas sei que há outras pessoas que vão sentir que outros caminhos são os mais adequados para elas, e portanto geralmente evito palavras de descaso contra o que não escolhi para mim.
 
Acho que você não me compreendeu Equador, não estou falando por mim, são conceitos de Nietzsche, talvez eu só possa te dar razão quanto ao termo "destruir", realmente acho que não é essa a palavra que se encaixa ali, eu o utilizei da maneira incorreta, pois Nietzsche também irá falar de "destruir-se para construir", então você não apenas pode ir até o fundo, como DEVE, no entanto o Dionisíaco em sua totalidade é impossível de se atingir, pois em algum momento estaremos atados ao Apolíneo. Nietzsche faz uma crítica ferrada ao cristianismo não enquanto religião, mas enquanto moral, e a moral é decadente.
Me referi a embriaguez a respeito do que disse de "um plano maior, com regras mais exigentes como amar ao próximo como a si mesmo". Isso é a moral, isso é que o evita de penetrar no Dionisíaco, pois a moral alimenta a fraqueza e a decadência do ser humano com tais ilusões, e a embriaguez é o conceito oposto do sonho, um estado fisiológico que te permitirá romper com essa moral, para aí sim alcançar planos elevados, e não mais uma moral decadente consoladora. Talvez seja melhor pesquisar mais sobre o Dionisíaco e o Apolíneo na Arte em Nietzsche, a Tragédia dos gregos. Isso não é um caminho, não é um pensamento cristão, se não sabe deixar para trás seus valores cristãos certamente nunca trará o dionisíaco para sua vida, logo nunca haverá verdadeira arte em sua vida. Não sou eu quem está dizendo, se não gosta de Nietzsche não leia. Nietzsche não hesita em suas palavras para atacar o cristianismo, que vê como a decadência da era moderna, não é nenhum descaso, é apenas filosofia, é a sua moral cristã que o faz ver dessa forma.
 
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