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Aqui discutimos micologia amadora e enteogenia.

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Krishnamurti

A meditação não pode ser um sistema
Então a Meditação não é Meditação consciente. Percebem isto? Não pode ser meditação consciente, seguindo um sistema, um guru – Meditação coletiva, Meditação de grupo, Meditação individual, de acordo com Zen ou algum outro sistema. Não pode ser um sistema, porque então vocês praticam, praticam, praticam, e os seus cérebros tornam-se mais e mais obtusos, mais e mais mecânicos. Então, existe uma Meditação que não tem direção, que não tem consciência, não é deliberada? Descubram. - Last Talks at Saanen 1985
A meditação não é diferente da vida
Meditação não é algo diferente da vida cotidiana; não vá ao canto de uma sala e medite durante dez minutos, e então saia e seja um açougueiro - tanto metaforicamente quanto realmente. Meditação é uma das coisas mais sérias. Você pode meditar o dia todo, no escritório, com a família, quando você diz "eu te amo" a alguém, quando você está observando suas crianças. Mas então você as educa para tornarem-se soldados, para matar, serem nacionalizados, para adorar a bandeira, educando-as para entrar nessa armadilha do mundo moderno. Observar isso tudo, perceber a sua parte nisso, tudo isso é parte da meditação. E quando você meditar assim, você encontrará uma beleza extraordinária; você agirá corretamente a todo momento; e se você não agir corretamente em um certo momento isso não importa, você voltará novamente - você não gastará tempo em arrependimento. Meditação é parte da vida, não algo diferente da vida. - The Flight of the Eagle, p 46
 
O mantra perdeu seu significado
O que é meditação? É fugir do barulho do mundo? Ter uma mente silenciosa, uma mente quieta, uma mente pacífica? E você pratica sistemas, métodos, para tornar-se ciente, para manter seus pensamentos sob controle. Você senta de pernas cruzadas e repete algum mantra. Eu fui informado de que o significado etimológico da palavra 'mantra' é 'refletir sobre não tornar-se'. Esse é um dos significados. E também significa 'absolver, deixar de lado toda atividade auto-centrada'. Esse é o real significado raiz de mantra. Mas nós repetimos, repetimos, repetimos, e continuamos com nosso interesse próprio, nossas maneiras egoístas, e assim o mantra perdeu o seu significado. Assim, o que é meditação? - That Benediction is Where You are, p 75
Siddhis são como luzes de velas
Vocês fazem todo tipo de coisas para chegar a esta estranha beleza do silêncio. Não façam, apenas observem. Olhem, senhores, vocês sabem que nisso tudo há vários poderes de clarividência, ler o pensamento de alguém. Existem vários poderes, vocês sabem do que eu estou falando, não? Vocês os chamam siddhis, não? Vocês sabem que todas essas coisas são como velas - luz de velas ao sol? Quando não há sol, há escuridão, e então a luz de uma vela é muito importante; mas quando há sol, a luz, a beleza, a claridade, então todos esses poderes, esses siddhis são como luzes de velas. Eles não têm valor, absolutamente. E quando você tem a luz, não há nada mais - desenvolver vários centros, os chakras, kundalinis, vocês sabem, esse negócio todo. Você precisa de uma mente sã, lógica, razoável, não de uma mente estúpida. Uma mente embotada pode sentar-se por séculos respirando, concentrando-se nos vários chakras, e vocês sabem todo esse jogo com kundalinis - isso não pode nunca chegar àquilo que é atemporal, que é a real beleza, verdade e amor. - Krishnamurti in India 1970-71, pp 180-181

Não é o caminho da meditação correta
E essa constante luta para tornar-se virtuoso, para adquirir virtude através da disciplina, através da examinação cuidadosa de si mesmo, e assim por diante, obviamente também não é meditação. A maioria de nós é pego nesses processos, e como eles não proporcionam entendimento de nós mesmos, eles não são a maneira da meditação correta. Afinal de contas, sem entender a si mesmo, que base você tem para pensar corretamente? Tudo o que você vai fazer sem o entendimento de si mesmo é conformar-se ao seu background, a resposta do seu condicionamento. E tal resposta ao condicionamento não é meditação. Mas estar ciente dessas respostas, ou seja, estar ciente dos movimentos do pensamento e dos sentimentos sem qualquer senso de condenação, para que os movimentos do ego, as maneiras do ego, sejam entendidas - essa é a maneira da meditação correta. - The Collected Works vol V, p 361
 
Pergunta: Você diz que devemos nos revoltar contra a sociedade e, ao mesmo tempo, diz que não devemos ter ambição. O desejo de melhorar a sociedade não é uma ambição?

Krishnamurti: Expliquei cuidadosamente o que entendo por revolta, mas devo utilizar duas palavras diferentes para deixar mais claro. Revoltar-se dentro da sociedade para melhorá-la um pouco, realizar certas reformas, é como a revolta de prisioneiros para melhorar a vida dentro das paredes da prisão; e essa revolta não é realmente uma revolta, mas somente um motim. Compreendem a diferença? Revoltar-se dentro da sociedade é como um motim de prisioneiros que querem uma comida melhor, um tratamento melhor dentro da prisão, mas a revolta nascida da compreensão é um indivíduo rompendo com a sociedade; essa é a revolução criativa.
Porém, se vocês como indivíduos rompem com a sociedade, essa ação é motivada pela ambição? Se for, então vocês não romperam, continuam dentro da prisão, porque a própria base da sociedade é a ambição, o poder da ambição, a ganância. Mas se compreenderem e fizerem uma revolução no próprio coração e mente, então não serão mais ambiciosos; não serão mais motivados pela inveja, pela ganância, pelo poder de compra, e estarão, portanto, totalmente fora de uma sociedade que é baseada nesses elementos. Então serão indivíduos criativos, e na sua ação haverá a semente de uma nova cultura.
Portanto, existe uma vasta diferença entre a ação da revolução criativa e a da revolta ou motim dentro da sociedade. Enquanto estiverem preocupados com a mera reforma, em decorar as barras e as paredes da prisão, não serão criativos. Uma emenda sempre precisa de outra reforma, e traz somente mais miséria, mais destruição, enquanto a mente que compreende toda essa estrutura de poder aquisitivo, de ganância, de ambição, e rompe com ela, está em constante revolução. É expansiva, criativa; portanto, como uma pedra atirada na água do lago, sua ação produz ondas, e elas formam uma civilização totalmente diferente.


Pense nisso: Reflexões libertadoras sobre temas do cotidiano
Ed. Nova Era
 
Pergunta: Como a criança pode descobrir o que ela é sem a ajuda dos pais e professores?

Krishnamurti: Eu disse que ela pode ou essa é a interpretação de vocês para as minhas palavras? A criança descobrirá sobre si própria se o ambiente no qual ela vive ajudá-la a fazê-lo. Se pais e professores estiverem realmente preocupados que essa jovem pessoa descubra quem ela é, eles não a forçarão; criarão um ambiente no qual ela poderá vir a ser conhecer.
Vocês fizeram essa pergunta, mas ela constitui um problema vital? Se sentissem que é importante para a criança descobrir sobre si mesma e que ela não conseguirá se for dominada por uma autoridade, vocês não ajudariam a formar um ambiente propício? Trata-se, novamente, da conhecida atitude: diga-me o que fazer e eu farei. Não falamos:"Vamos resolver juntos." O problema de como criar um ambiente no qual a criança possa ter o conhecimento de si mesma preocupa todos - pais, professores e as próprias crianças. Mas o autoconhecimento não pode ser imposto, a compreensão não pode ser forçada; se isso for um problema vital para vocês e para mim, para pais e professores, então juntos criaremos escolas adequadas.


Pense nisso
 
Pergunta: A alma sobrevive à morte?

Krishnamurti: Se você realmente quer saber, como irá descobrir? Lendo o que Shankara, Buda ou Cristo disseram a respeito? Ouvindo um líder ou santo em particular? Eles podem estar totalmente errados. Você está preparado para admitir - o que significa que a mente está em posição de questionar?
Você precisa primeiro, descobrir se existe realmente uma alma para sobreviver. O que é a alma? Sabe o que é? Ou simplesmente lhe disseram que existe - seus pais, o sacerdote, um determinado livro, seu ambiente cultural - e você aceitou?
A palavra "alma" implica algo além da mera existência física, não é? Existe o corpo físico e também o caráter, as tendências, as virtudes; e, transcendendo tudo, você diz que existe alma. Se tal estado existe, deve ser espiritual, algo que possui a qualidade da atemporalidade; e você está perguntando se esse algo espiritual sobrevive à morte. Essa é uma parte da questão.
A outra é: o que é a morte? Você sabe? Você deseja saber se existe sobrevivência após a morte, mas, veja, essa questão não é importante. A pergunta importante é: você pode entender a morte enquanto está vivo? Qual o significado de alguém dizer que existe ou não a sobrevivência após a morte? Você vai continuar sem saber. Mas pode descobrir por si mesmo o que é a morte, não depois de estar morto, mas enquanto está vivo, saudável, vigoroso; enquanto pensa, sente.
Também faz parte da educação. Ser educado não é somente ser proficiente em matemática, história ou geografia, é também ter a capacidade de compreender o fenômeno extraordinário chamado morte - não quando estiver fisicamente morrendo, mas enquanto está vivo, rindo, subindo em uma árvore, velejando ou nadando. A morte é desconhecida, e o que importa é saber sobre o desconhecido enquanto você está vivo.

Pense nisso
 
Pergunta: Estou acostumado a beber chá. Um professor diz que se trata de um hábito nocivo e outro diz que não.

Krishnamurti: O que você acha? Coloque de lado por um momento o que as outras pessoas dizem - pode ser preconceito delas - e ouça a pergunta. O que você acha de um jovem já ser "apegado" a algo - tomar chá, fumar, participar de torneios de comilança ou qualquer outro hábito? Pode ser certo adquirir o hábito de algo quando você tem 70 ou 80 anos, próximo do fim da jornada; mas se você está somente iniciando sua vida e já está acostumado a alguma coisa é terrível, não acha? Esta é a pergunta importante, não se você deve tomar chá.
Veja, quando você se acostuma com alguma coisa, sua mente já está a caminho do cemitério. Se você pensa como hindu, comunista, católico, protestante, então sua mente já está se restringindo, deteriorando. Mas se ela está alerta, inquirindo para descobrir por que está aprisionada por determinado hábito, porque você pensa de determinada maneira, então a pergunta secundária, que é se você deveria fumar ou tomar chá, poderá ser examinada.

Pense nisso
 
Pergunta: É seu passatempo dar palestras? Não fica cansado de falar? Por que está fazendo isso?

Krishnamurti: Fico contente por você ter feito esta pergunta. Sabem, se amam uma coisa, nunca se cansam dela - quero dizer o amor que existe sem a busca por um resultado, sem desejar algo em troca. Quando amam alguma coisa, não é autorrealização, portanto não há desapontamento, não há fim. Porque estou fazendo isso? Vocês podem perguntar também por que as rosas florescem, por que o jasmim espalha o seu perfume ou por que o pássaro voa.
Vejam, tentei não falar, descobrir o que acontece se eu não falar. Também está certo. Compreendem? Se vocês falam porque conseguem algo com essa ação - dinheiro, recompensa, um senso da sua própria importância -, então vem o cansaço, a fala se torna destrutiva, não há significado, porque é somente autorrealização. Mas se houver amor no coração, e o coração não estiver cheio das coisas da mente, então será como uma fonte, como uma nascente que sempre tem fornecido água pura.

Pergunta: Qual a diferença entre mim e você?

Krishnamurti: Existe alguma diferença fundamental entre nós? Você tem a pele clara e a minha é escura; você pode ser bem esperto e saber bem mais do que eu; ou eu posso morar na aldeia enquanto você viaja pelo mundo inteiro e assim por diante. Obviamente, existem diferenças na forma, na fala, no conhecimento, nos modos, na tradição e na cultura, mas se somos brâmanes ou não brâmanes, americanos, russos, japoneses, chineses, ou qualquer outro povo, não existe uma grande similaridade entre todos nós? Todos sentimos medo, todos desejamos segurança, todos desejamos ser amados, todos desejamos comer e ser feliz. Mas, vejam, as diferenças superficiais destroem nossa conscientização da similaridade fundamental entre nós como seres humanos. Compreender e se libertar dessa similaridade traz muito amor, muita consideração. Infelizmente, muitos de nós ficamos aprisionados nela, e, portanto, nos dividimos em virtude das diferenças superficiais de raça, cultura, crença. As crenças são uma maldição; elas segregam as pessoas e criam antagonismos. É somente quando vamos além das crenças, além de todas as diferenças e semelhanças, que a mente pode se libertar para descobrir o que é a verdade.
 
Pergunta: Devemos formar uma ideia sobre o outro, ou não?

Krishnamurti: Vocês devem ter ideias sobre as pessoas? Devem formar uma opinião, fazer um julgamento sobre alguém? Quando vocês têm ideias sobre o professor, o que é importante para vocês? Não o professor, mas as ideias sobre ele. É isso que acontece na vida, não é? Todos temos opiniões sobre as pessoas; dizemos: "Ele é bom"; "Ele é fútil"; "Ele é supersticioso"; "Ele faz isto ou aquilo." Temos uma lista de ideias entre nós mesmos e a outra pessoa, portanto nunca encontramos realmente aquela pessoa. Ao ver alguém ou algo, dizemos: "Ele fez isto", por isso se torna importante datar os eventos. Compreendem? Se vocês veem alguém fazendo algo que consideram bom ou ruim, vocês têm uma opinião sobre ela que tende a se tornar fixa, e quando encontram aquela pessoa dez dias ou um ano depois, ainda pensam nela baseados nessa opinião. Mas durante esse período ela pode ter mudado; portanto, é muito importante não dizer "Ela é assim", mas "Ela era assim em fevereiro", porque no final daquele ano ela pode ser inteiramente diferente. Se vocês disserem de alguém: "Conheço aquela pessoa", podem estar inteiramente errados, porque vocês a conhecem somente até certo ponto, ou pelos eventos que ocorreram em determinada data, e, além disso, vocês não a conhecem mais. O importante é encontrar outro ser humano sempre com a mente aberta, não com preconceitos, ideias fixas e com as próprias opiniões.
 
Pergunta: Por que desejamos viver com luxo?

Krishnamurti: O que você quer dizer com luxo? Ter roupas limpas, manter o corpo limpo, comer boa comida - chama isso de luxo? Acredito que seja luxo para o homem que está faminto, com as roupas em trapos e que não pode tomar banho todos os dias. Portanto, o luxo varia de acordo com os desejos de cada um; é uma questão de grau.
E sabe o que acontece se você ficar ligado ao luxo, apegado ao conforto e desejar sempre se sentar em um sofá ou em uma cadeira estofada? A mente adormece. É bom ter um pouco de conforto corporal, porém enfatizá-lo, dar a ele grande importância, é ter a mente adormecida. Já notou como a maioria das pessoas gordas é feliz? Nada parece perturbá-las sob suas várias camadas de gordura. Essa é uma condição física, mas a mente também coloca camadas de gordura. Ela não quer ser questionada ou perturbada, e, aos poucos, adormece. O que chamamos de educação geralmente induz o estudante ao sono, porque se ele faz perguntas realmente penetrantes, profundas, o professor fica perturbado e diz: "Vamos continuar com a aula."
Então, quando a mente está apegada a qualquer forma de conforto, quando está ligada a um hábito, a uma crença ou a um ponto em particular que chama de "minha casa", ela começa a adormecer. E compreender esse fato é mais importante do que se vivemos ou não com luxo. A mente é bem ativa, alerta, atenta, nunca está ligada ao conforto; o luxo nada significa para ela. Mas simplesmente ter poucas roupas não quer dizer que a mente esteja alerta. O sannyasi, que vive extremamente de modo bem simples pode ser internamente bem complexo, cultivando a virtude, desejando atingir a verdade, Deus. O importante é ser internamente muito simples, muito austero, ou seja, não ter uma mente atravancada por crenças, medos, desejos inumeráveis, pois somente assim será capaz do verdadeiro pensar, explorar, descobrir.

Pergunta: Pode haver paz na vida enquanto estivermos lutando contra nosso ambiente?

Krishnamurti: Vocês não têm de lutar contra seu ambiente? Não devem rompê-lo? Aquilo em que os pais acreditam, a base social, as tradições, o tipo de comida que ingerem e coisas próximas a vocês como a religião, o sacerdote, o rico, o pobre - tudo isso é seu ambiente. E vocês não precisam romper com ele questionando-o, insurgindo-se contra ele? Se não se insurgirem, sem simplesmente o aceitarem, haverá um tipo de paz, mas a paz da morte; porém, se lutarem e descobrirem por si mesmos o que é verdade, encontrarão ainda um outro tipo de paz, que não é mera estagnação. É essencial lutar contra seu entorno. Vocês precisam. Portanto, a paz não é importante. O importante é compreender e romper com seu ambiente, e daí virá a paz. Porém, se a buscarem apenas aceitando seu ambiente, serão induzidos ao sono, e talvez até à morte. Por isso, desde a mais tenra idade, deve haver um senso de revolta em vocês. De outra forma, vocês somente serão vencidos.
 
Última edição:
Pergunta: O homem é apenas mente e cérebro ou é algo mais?

Krishnamurti: Como iremos descobrir? Se vocês meramente acreditarem, especularem ou aceitarem o que Shankara, Buda ou alguém mais disse, não estarão investigando, não estarão tentando descobrir o que é a verdade.
Vocês só possuem um instrumento, que é a mente; e a mente é também o cérebro. Portanto, para descobrir a verdade, vocês precisam compreender os caminhos da mente, não é? Se a mente estiver distorcida, nunca verão direito; se ela for limitada, não poderão perceber o ilimitado. A mente é o instrumento da percepção, e para perceber verdadeiramente é preciso que a mente esteja correta, limpa de todo condicionamento, de todo medo. Ela precisa também estar livre do conhecimento, porque o saber a distrai e complica tudo. A mente tem uma enorme capacidade para inventar, imaginar, especular, pensar - não é preciso que essa capacidade seja colocada de lado para que a mente fique limpa e simples? Porque é somente a mente inocente, a que vivenciou enormemente e ainda assim está livre do conhecimento e da experiência, que pode descobrir o que existe além do cérebro e da mente. De outra forma, o que descobrirem será influenciado pelo que vocês já viveram, e sua experiência será o resultado do seu condicionamento.

Pergunta: Por que os homens caçam tigres?

Krishnamurti: Porque querem matar pela emoção do ato. Todos fazemos inúmeras coisas impensadamente - como rasgar as asas de uma mosca para ver o que acontece. Conversamos e dizemos coisas estúpidas sobre outras pessoas; matamos para comer; assassinamos pela suposta paz; tiramos vidas pelo nosso país ou pelos nossos ideais. Portanto, existe um grande veio de crueldade em nós, não é? Mas se pudermos compreender e rejeitar isso, simplesmente observar os tigres passarem será um grande divertimento - como fizemos vários de nós nas cercanias de Bombaim. Um amigo nos levou até a floresta em seu carro para observarmos um tigre que alguém tinha visto em um local próximo. Estávamos retornando e tínhamos acabado de fazer uma curva quando, de repente, lá estava o tigre no meio da estrada. Amarelo e preto, esbelto de pelo lustroso, com uma longa cauda, era adorável de se olhar, cheio de graça e poder. Desligamos os faróis e ele se aproximou rosnando, passando tão perto que quase roçou no carro. Foi uma visão maravilhosa. É muito mais divertido poder observar uma cena dessas sem um rifle na mão; uma cena de grande beleza.
 
Pergunta: O que é destino?

Krishnamurti: Querem realmente encarar o problema? Fazer esta pergunta é a coisa mais fácil do mundo, mas só terá significado se ela afetar vocês diretamente a fim de que a encarem com seriedade. Já notaram quantas pessoas perdem o interesse depois de fazer perguntas? Outro dia um homem apresentou uma questão e depois começou a bocejar, coçar a cabeça e conversar com a pessoa ao lado. Tinha perdido completamente o interesse. Por isso sugiro que vocês só façam uma pergunta quando estiverem realmente interessados nela.
O problema de saber o que é o destino é muito difícil e complexo. Vejam, se a causa for estabelecer uma meta, ele inevitavelmente produzirá um resultado. Um vasto número de pessoas, sejam russas, norte-americanas ou hindus, se prepara para a guerra; o destino é a guerra; embora possam pensar que desejam a paz e que estão se preparando somente para sua própria defesa, estabeleceram causas que trarão a guerra. Da mesma forma, quando milhões de pessoas, por séculos, tomaram parte no desenvolvimento de uma determinada civilização ou cultura, deram início a movimentos nos quais o seres humanos, como indivíduos, são aprisionados e eliminados, gostando ou não. E todo o processo de ser preso e eliminado por uma corrente particular de cultura ou civilização pode ser chamado de destino.
Afinal, se você nasceu filho de um advogado, que insiste que você também se torne advogado, e se você cede aos desejos dele mesmo que deseje ser outra coisa, então seu destino será obviamente tornar-se um advogado. Mas se recusar-se, se insistir em fazer aquilo que sente que é verdadeiro, que realmente quer fazer - seja escrever, pintar ou não ter dinheiro e esmolar -, então saiu da corrente, rompeu com o destino que seu pai pretendeu para você. É o mesmo que acontece com uma cultura ou civilização.
Por isso, é muito importante que sejamos corretamente educados - não para sermos asfixiados pela tradição; não para cairmos no destino de um determinado grupo social, cultura ou familiar; não para nos tornarmos seres mecanizados nos movendo para um determinado fim. O homem que compreender todo o processo, que romper com ele e permanecer só, criará o próprio momentum; e se sua ação for romper com a falsidade em direção à verdade, então o próprio momentum se tornará a verdade. Trata-se de homens livres do destino.

Pergunta: Por que desejamos nos vingar de alguém que nos atingiu?

Krishnamurti: É uma resposta instintiva, de sobrevivência, não acham? Porém, a mente inteligente, a mente que está desperta, que já pensou sobre isso profundamente, não sente o desejo de revidar - não porque está tentando ser virtuosa ou cultivar o perdão, mas porque o revide é bobagem, não tem significado algum. Mas vejam, isso requer meditação.
 
Pergunta: O que é a vida, como podemos ser felizes?

Krishnamurti: Uma boa pergunta para um jovem. O que é a vida? Se perguntarem a um negociante, ele dirá que a vida é o processo de vender coisas e fazer dinheiro, porque essa é a vida que ele tem de manhã até a noite. O homem de ambição dirá que a vida é uma luta para realizar, atingir uma meta. Para o homem que atingiu uma posição e poder, que é o chefe de uma organização ou de um país, a vida é cheia de atividades que ele mesmo realizou. E para o trabalhador, especialmente neste país, a vida é um trabalho interminável sem um dia de descanso; é ser sujo, miserável e não ter comida suficiente.
Bem, o homem consegue ser feliz com toda a competição, luta, fome e miséria? Obviamente, não. Então o que ele faz? Ele não questiona, não pergunta o que é a vida, mas filosofa a respeito da felicidade. Fala sobre fraternidade enquanto explora os outros. Inventa um ser superior, uma superalma, algo que finalmente o deixará permanentemente feliz. Mas a felicidade não surge quando você a procura; é um produto secundário, acontece quando existe a bondade, quando existe amor, quando não há ambição, quando a mente está calmamente buscando a verdade.
 
Pergunta: Por que Deus criou tantos homens e mulheres no mundo?

Krishnamurti: Por que você garante que Deus nos criou? Existe uma explicação bem simples: o instinto biológico. Instinto, desejo, paixão, luxúria, todos são parte da vida. Se vocês dizem: “A vida é Deus”, então é diferente. Então Deus é tudo, inclusive paixão, luxúria, inveja, medo. Todos esses fatores ajudaram a produzir no mundo um número esmagador de homens e mulheres, por isso existe o problema da superpopulação, que é uma das maldições desta terra. Mas, vejam, o problema não é de fácil resolução. Existem várias urgências e compulsões que o homem herdou e, sem a compreensão dessa complexidade, simplesmente tentar regular a taxa de nascimento não tem muito significado. Fizemos uma bagunça no mundo, cada um de nós, porque não sabemos o que é viver. Viver não é essa coisa vistosa, medíocre, disciplinada que chamamos de nossa existência. Viver é algo bem diferente; é demasiado rico, interminavelmente mutável, e enquanto não compreendermos esse movimento eterno, nossas vidas estarão destinadas a ter muito pouco significado.
 
Pergunta: Por que desejamos ser famosos?

Krishnamurti: Por que vocês acham que desejam ser famosos? Posso explicar, mas no final talvez desistam de ser famosos. Vocês desejam ser famosos porque todos a sua volta nesta sociedade desejam ser famosos. Os pais, os professores, o guru, o iogue - todos querem ser famosos, e vocês também.
Vamos pensar juntos a respeito. Por que as pessoas desejam ser famosas? Em primeiro lugar, porque é lucrativo ser famoso, e lhes dá muito prazer , não é? Se forem conhecidos em todo o mundo, se sentirão muito importantes, o que lhes dará um senso de imortalidade. Você desejam ser famosos, querem ser conhecidos e comentados em todo o mundo porque, no íntimo vocês não são ninguém. Em seu âmago não há riqueza, não há nada, mas se forem ricos internamente, então, ser ou não conhecido não terá importância.
Ser rico internamente é muito mais trabalhoso do que ser rico e famoso na superfície; é preciso muito mais cuidado e atenção. Se vocês tiverem um pouco de talento e souberem como explorá-lo, serão famosos, mas a riqueza interna não é acumulada dessa maneira. A mente precisa compreender e afastar as coisas que não são importantes, como a fama. A riqueza interior implica ficar só; mas o homem que deseja ser famoso tem medo de ficar só, porque depende da bajulação e da aprovação de outros.
 
Meditação não é oração, nem é devoção
Oração obviamente produz resultados; ou milhões de pessoas não rezariam. E ao rezar, obviamente a mente torna-se quieta; pela constante repetição de certas frases, a mente torna-se quieta. E nessa quietude há uma certa intimação, certas percepções, certas respostas. Mas isso ainda é uma parte do truque da mente, porque afinal, através de uma forma de mesmerização você pode deixar a mente muito quieta. E naquela quietude existem certas respostas escondidas surgindo do inconsciente e de fora da consciência. Mas ainda assim é um estado no qual não existe entendimento. E meditação não é devoção - devoção a uma ideia, a uma figura, a um princípio - porque as coisas da mente ainda são idólatras. Alguém pode não idolatrar uma estátua, considerando-a idólatra e boba, supersticiosa; mas se de fato idolatra, como a maioria das pessoas, as coisas na mente - e isso também é idolatria. E ser devotado a uma figura ou ideia, a um Mestre, não é meditação. Obviamente, é uma forma de fuga de si mesmo. É uma fuga muito confortável, mas ainda é uma fuga. - The Collected Works vol V, p 361
Meditação não é uma repetição de palavras
Meditação é uma maneira de viver, não uma fuga da vida. Obviamente a meditação não é ter experiências de visões ou ter estranhas experiências místicas; como vocês sabem, você pode tomar uma droga que expandirá a sua mente, ela produzirá algumas reações químicas, que tornarão a mente altamente sensível e naquele estado sensível você pode ver coisas aumentadas, ainda que de acordo com o seu condicionamento. E meditação não é uma repetição de palavras. Vocês sabem, tem havido uma moda ultimamente de alguém lhe dar uma palavra, uma palavra em sânscrito, você fica repetindo aquela palavra e por isso espera atingir alguma experiência extraordinária - o que é uma bobagem total. Logicamente, se você ficar repetindo um monte de palavras sua mente torna-se amortecida e, portanto quieta; mas isso absolutamente não é meditação. - Talks & Dialogues Saanen 1968, p 94
 
"Não é demonstração de saúde ser bem ajustado a uma sociedade profundamente doente."

J. Krishnamurti



 
Pergunta: Por que adoramos a Deus?

Krishnamurti: Acho que nós não adoramos a Deus. Não riam. Vejam, nós não amamos Deus; se amássemos, não haveria o ato que chamamos de adoração. Adoramos a Deus porque O tememos; existe medo em nossos corações, não amor. O templo, o puja, o rosário sagrado - não são de Deus, são criações da vaidade e do medo do homem. São somente os infelizes e os assustados que adoram a Deus. Aqueles que têm riqueza, posição e autoridade não são pessoas felizes. Um homem ambicioso é um ser humano muito infeliz. A felicidade chega somente quando vocês estão livres de tudo isso - e então não adoram a Deus. É o miserável, o torturado, aquele que está em desespero que rasteja até o templo; mas se as pessoas colocassem de lado essa chamada adoração e compreendessem sua miséria, então seriam homens e mulheres felizes, pois descobririam o que é a verdade, o que é Deus.
 
Pergunta: O que nos faz temer a morte?

Krishnamurti: Vocês acham que uma folha que cai no chão teme a morte? Acreditam que um pássaro vive com medo de morrer? Ele encontra a morte quando ela chega, mas não está preocupado com ela, pois está muito ocupado em viver, capturar insetos, construir um ninho, cantar uma canção, voar pelo simples prazer de voar. Já viram passarinhos pairando no ar sem baterem as asas, sendo carregados pelo vento? Parece um divertimento sem fim! Eles não estão preocupados com a morte. Se ela chegar, está certo, eles acabaram. Não há preocupação com o que irá acontecer, eles estão vivendo cada momento, não é? Nós, seres humanos, é que estamos sempre preocupados com a morte - porque não estamos vivendo. Esse é o problema: estamos morrendo, não estamos vivendo. As pessoas mais velhas estão mais próximas do fim, e os jovens vem logo atrás.
Vejam, existe a preocupação com a morte porque temos medo de perder o conhecimento, as coisas que reunimos. Temos medo de perder a esposa ou o marido, um filho ou um amigo; temos medo de perder o que aprendemos, acumulamos. Se pudéssemos carregar tudo que reunimos - nossos amigos, nossas posses, nossas virtudes, nosso caráter -, então não teríamos medo da morte, não é? Por isso inventamos teorias sobre a morte e o além. O fato é que a morte é um fim, e muitos de nós não queremos encará-lo. Não queremos deixar o conhecimento; portanto, é o apego ao conhecimento, e não o desconhecido, que cria o medo em nós. O desconhecido não pode ser percebido pelo conhecido. Mas a mente, sendo formada pelo conhecimento, diz: "Vou acabar", e fica assustada.
Mas se conseguirem viver cada momento e não se preocuparem com o futuro, se conseguirem viver sem o pensamento do amanhã - o que não significa a superficialidade de meramente estar ocupado hoje -, se, estando consciente de todo o processo do conhecimento, vocês puderem soltar o conhecimento, deixa-lo ir inteiramente, verão algo surpreendente acontecendo. Tentem por um dia: coloquem de lado tudo que conhecem, esqueçam, e simplesmente vejam o que ocorre. Não transportem preocupações de um dia para o outro, de uma hora para a seguinte, de momento para momento; soltem tudo e verão que da liberdade surgirá uma vida extraordinária, que inclui tanto viver como morrer. A morte é somente o término de alguma coisa, e na própria morte existe renovação.
 
Vou dizer a vocês uma coisa. Sabem o que é espaço. Existe espaço nesta sala. A distância entre os quartos e aqui, entre a ponte e sua casa, entre esta margem do rio e a outra - tudo isso é espaço. Bem, existe também espaço na sua mente? Ou ela está tão povoada que não existe espaço? Se a mente possui espaço, então nesse espaço existe silêncio - desse silêncio surge tudo, pois vocês podem ouvir, podem prestar atenção sem resistência. Essa é a importância de haver espaço na mente. Se a mente não estiver superpovoada, ocupada sempre, então poderá ouvir o cachorro latindo, o trem atravessando a ponte distante, e estará também totalmente consciente do que for falado por uma pessoa aqui. Então, a mente é uma coisa viva, não está morta.

J. Krishnamurti
 
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