- 28/07/2022
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Nunca foi tão fácil comprar e consumir cogumelos alucinógenos no Brasil. O número de empresas que vendem abertamente o produto na internet só cresce. Anunciados como "cogumelos mágicos", vêm em porções que custam de R$ 60 a mais de R$ 1.000. Com entrega em casa.
Mas cogumelo não é droga? A psilocibina, contida em fungos psicodélicos, sim —faz parte da lista de substâncias proibidas no Brasil, junto com drogas como a cocaína e a heroína. Mas os cogumelos inteiros, ou in natura, podem ser vendidos por aqui. Pelo menos por enquanto.
Nos últimos meses, uma espécie de guerra se instalou no mundo dos cogumelos. Rogério Di Girolamo, 48, dono da loja Natureza Divina e um dos primeiros e maiores vendedores de cogumelos mágicos no Brasil, resolveu partir para cima da concorrência.
Com a ajuda de um advogado, enviou ao menos 25 notificações extrajudiciais para empresas que, no seu entendimento, colocam em risco o futuro dos cogumelos no país.
A briga já acumula denúncias, prisões e até supostas ameaças de morte.
Pelo menos cinco pessoas ouvidas pelo UOL se disseram perseguidas por contrariar os interesses de Girolamo, que pode ser considerado o "rei dos cogumelos" no Brasil.
"Nós sabemos que o cogumelo está numa zona cinzenta e que pode ser proibido a qualquer momento", diz o dono da Natureza Divina ao UOL.
Sua preocupação, afirma, é com as empresas que vendem "cápsulas de cogumelo feitas em fundo de quintal e receitadas como medicamento", o que poderia atrair a atenção das autoridades e prejudicar os negócios.
Girolamo tenta criar uma associação, o Instituto Cubensis Brasil, da qual seria presidente e através da qual poderia estabelecer (as suas) diretrizes para o setor.
As notificações assinadas por seu advogado, Luciano Canola, ameaçam denunciar quem não se limitar a vender os cogumelos somente in natura, indicando que "não são para consumo humano", mas apenas para "fins botânicos".
Pelo menos dois empresários que não aderiram foram formalmente denunciados.
O site Natureza Sana foi denunciado no Ministério Público e na Justiça Criminal do Rio.
Pedro Guedes, 37, outro cultivador, disse ao UOL que recebeu uma notificação extrajudicial em outubro, assinada por Canola.
"Como não aceitei, fizeram uma denúncia no Ministério Público de Goiás me acusando de falsificação de remédio e crime contra a saúde pública", diz o empresário.
Guedes contesta o argumento de Girolamo de que a venda de cápsulas e chocolates com cogumelos, por si só, torne a venda ilegal.
"Nas cápsulas e no chocolate os cogumelos também estão in natura", argumenta.
A guerra aos produtores de cogumelos levou também a duas prisões em 2023.
Em abril, dois cultivadores foram presos. Um deles, de Brasília, ficou detido por dois meses. Procurado pelo UOL, não quis falar com a reportagem.
Já Isaac Martins, 37, de Itanhaém, no litoral de São Paulo, ficou um dia preso. Ele assinou um acordo de não persecução penal, em que o acusado se compromete cumprir algumas exigências do MP em troca de não ser punido, e teve seu processo encerrado.
Conhecido no meio dos cogumelos como Izzy Mushroom, o vendedor de cogumelos afirma que, no dia seguinte à sua soltura, foi procurado pelo advogado parceiro de Girolamo.
"O Canola me procurou tentando me convencer a entrar para a associação e a contratar sua defesa."
Após as prisões, um clima de pânico se instalou. Pelo menos uma dezena de empresas encerraram atividades, tiraram sites do ar e sumiram do mapa.
Nesse intervalo, mais uma empresa foi notificada por Canola e Girolamo: a Altea Mágica.
Em junho, André Luz, dono da Altea, publicou um vídeo em uma rede social afirmando ter sido ameaçado de morte pelo secretário da associação que Girolamo tenta criar.
Luz anunciou no vídeo que faria um boletim de ocorrência, mas depois desistiu, apagou o conteúdo e gravou outro explicando seus motivos. "O objetivo era cessar os ataques. Surtiu efeito. Vamos ver o que acontece na Justiça", disse Luz ao UOL.
Girolamo nega ter feito ameaças aos concorrentes, mas admite a pressão por causa da venda de cápsulas e chocolates de cogumelos "mágicos".
"Caso a Anvisa venha a proibir o cogumelo in natura, todos que se utilizam dessa medicina não terão mais acesso e todos os cultivadores serão considerados traficantes", acredita.
Sob condição de anonimato, um cultivador que também diz ter recebido a notificação de Canola disse ao UOL que o Instituto Cubensis Brasil ofereceria defesa jurídica aos afiliados em troca de um pagamento mensal, além de pareceres jurídicos por R$ 25 mil e habeas corpus preventivos por cerca de R$ 100 mil.
Acusações semelhantes aparecem em vídeos de um grupo autodenominado Anonymous Free Cubensis, que publicou trechos de lives do grupo de Girolamo.
Os anônimos acusam o grupo de disseminar o medo, com denúncias e ameaças, para dominar o mercado.
Conversas divulgadas em vídeos mostram a intenção dos organizadores de denunciar quem não entrasse na associação e, depois, cobrar preços altos de quem decidisse aderir.
Em um desses vídeos, o advogado Luciano Canola aparece falando em regulamentar o mercado a partir da associação, proibindo a venda dos cogumelos mágicos em cápsulas e chocolates, estabelecendo preços e formas de anúncios.
Girolamo nega a oferta de venda de serviços vinculados à associação, como habeas corpus. "A finalidade era a união e educar os cultivadores a rotular o produto de forma correta a fim de evitar o fim do mercado de cogumelos mágicos no Brasil", justifica.
Um dos primeiros capítulos na guerra dos cogumelos envolveu Ana Paula Paz, 40, cofundadora da empresa Coguvalley, de Santa Catarina, e uma das maiores concorrentes da Natureza Divina no mercado.
Ana Paula decidiu trabalhar com os cogumelos mágicos após ter usado microdoses para tratar a depressão pós-parto.
"Fui a primeira mulher a vender na rede social e a primeira pessoa a botar a cara em 2016. Antes todos se escondiam atrás de perfis fakes, com fotos ou desenhos. Eu fazia vídeos, era bem blogueirinha."
A dona da Coguvalley afirma que começou a ser perseguida no final de 2018, após dar uma entrevista sobre os benefícios do uso das cápsulas de microdose de cogumelos mágicos para um canal no YouTube.
O vídeo foi denunciado e acabou retirado da plataforma. Ela e o sócio, seu marido e cultivador de cogumelos, Diego Xavier, apontam o proprietário da Natureza Divina como denunciante.
Ana Paula também diz ter sido ameaçada, pouco depois, por uma pessoa chamada Franklin. "Disse saber onde meus filhos estudavam e que a escola não era segura."
Segundo a empresária, na ocasião, a pessoa disse estar a serviço de Girolamo.
Ana Paula participou de reuniões de criação da associação do dono da Natureza Divina, mas logo saiu. "Vi que não era para mim."
Ela, que também recebeu notificação em outubro de 2022, afirma que o grupo de Girolamo usa práticas que descreve como milicianas, "Primeiro coagem, com ameaças, e depois oferecem proteção."
Girolamo admite que Franklin fornecia um tipo de cogumelo psicodélico para sua empresa, mas nega que tenha pedido para ele ameaçar qualquer pessoa. De acordo com o dono da Natureza Divina, Franklin agia por conta própria.
Com o setor em pé de guerra, o "rei dos cogumelos" desistiu de seguir adiante com sua associação por enquanto. Afirma que vai "esperar a poeira baixar" para retomar o plano.
FONTE: Por que produtores de "cogumelos mágicos" estão em guerra no Brasil
Isso não vai acabar bem...
Mas cogumelo não é droga? A psilocibina, contida em fungos psicodélicos, sim —faz parte da lista de substâncias proibidas no Brasil, junto com drogas como a cocaína e a heroína. Mas os cogumelos inteiros, ou in natura, podem ser vendidos por aqui. Pelo menos por enquanto.
Nos últimos meses, uma espécie de guerra se instalou no mundo dos cogumelos. Rogério Di Girolamo, 48, dono da loja Natureza Divina e um dos primeiros e maiores vendedores de cogumelos mágicos no Brasil, resolveu partir para cima da concorrência.
Com a ajuda de um advogado, enviou ao menos 25 notificações extrajudiciais para empresas que, no seu entendimento, colocam em risco o futuro dos cogumelos no país.
A briga já acumula denúncias, prisões e até supostas ameaças de morte.
Pelo menos cinco pessoas ouvidas pelo UOL se disseram perseguidas por contrariar os interesses de Girolamo, que pode ser considerado o "rei dos cogumelos" no Brasil.
"Nós sabemos que o cogumelo está numa zona cinzenta e que pode ser proibido a qualquer momento", diz o dono da Natureza Divina ao UOL.
Sua preocupação, afirma, é com as empresas que vendem "cápsulas de cogumelo feitas em fundo de quintal e receitadas como medicamento", o que poderia atrair a atenção das autoridades e prejudicar os negócios.
Girolamo tenta criar uma associação, o Instituto Cubensis Brasil, da qual seria presidente e através da qual poderia estabelecer (as suas) diretrizes para o setor.
As notificações assinadas por seu advogado, Luciano Canola, ameaçam denunciar quem não se limitar a vender os cogumelos somente in natura, indicando que "não são para consumo humano", mas apenas para "fins botânicos".
Pelo menos dois empresários que não aderiram foram formalmente denunciados.
O site Natureza Sana foi denunciado no Ministério Público e na Justiça Criminal do Rio.
Pedro Guedes, 37, outro cultivador, disse ao UOL que recebeu uma notificação extrajudicial em outubro, assinada por Canola.
"Como não aceitei, fizeram uma denúncia no Ministério Público de Goiás me acusando de falsificação de remédio e crime contra a saúde pública", diz o empresário.
Guedes contesta o argumento de Girolamo de que a venda de cápsulas e chocolates com cogumelos, por si só, torne a venda ilegal.
"Nas cápsulas e no chocolate os cogumelos também estão in natura", argumenta.
A guerra aos produtores de cogumelos levou também a duas prisões em 2023.
Em abril, dois cultivadores foram presos. Um deles, de Brasília, ficou detido por dois meses. Procurado pelo UOL, não quis falar com a reportagem.
Já Isaac Martins, 37, de Itanhaém, no litoral de São Paulo, ficou um dia preso. Ele assinou um acordo de não persecução penal, em que o acusado se compromete cumprir algumas exigências do MP em troca de não ser punido, e teve seu processo encerrado.
Conhecido no meio dos cogumelos como Izzy Mushroom, o vendedor de cogumelos afirma que, no dia seguinte à sua soltura, foi procurado pelo advogado parceiro de Girolamo.
"O Canola me procurou tentando me convencer a entrar para a associação e a contratar sua defesa."
Após as prisões, um clima de pânico se instalou. Pelo menos uma dezena de empresas encerraram atividades, tiraram sites do ar e sumiram do mapa.
Nesse intervalo, mais uma empresa foi notificada por Canola e Girolamo: a Altea Mágica.
Em junho, André Luz, dono da Altea, publicou um vídeo em uma rede social afirmando ter sido ameaçado de morte pelo secretário da associação que Girolamo tenta criar.
Luz anunciou no vídeo que faria um boletim de ocorrência, mas depois desistiu, apagou o conteúdo e gravou outro explicando seus motivos. "O objetivo era cessar os ataques. Surtiu efeito. Vamos ver o que acontece na Justiça", disse Luz ao UOL.
Girolamo nega ter feito ameaças aos concorrentes, mas admite a pressão por causa da venda de cápsulas e chocolates de cogumelos "mágicos".
"Caso a Anvisa venha a proibir o cogumelo in natura, todos que se utilizam dessa medicina não terão mais acesso e todos os cultivadores serão considerados traficantes", acredita.
Sob condição de anonimato, um cultivador que também diz ter recebido a notificação de Canola disse ao UOL que o Instituto Cubensis Brasil ofereceria defesa jurídica aos afiliados em troca de um pagamento mensal, além de pareceres jurídicos por R$ 25 mil e habeas corpus preventivos por cerca de R$ 100 mil.
Acusações semelhantes aparecem em vídeos de um grupo autodenominado Anonymous Free Cubensis, que publicou trechos de lives do grupo de Girolamo.
Os anônimos acusam o grupo de disseminar o medo, com denúncias e ameaças, para dominar o mercado.
Conversas divulgadas em vídeos mostram a intenção dos organizadores de denunciar quem não entrasse na associação e, depois, cobrar preços altos de quem decidisse aderir.
Em um desses vídeos, o advogado Luciano Canola aparece falando em regulamentar o mercado a partir da associação, proibindo a venda dos cogumelos mágicos em cápsulas e chocolates, estabelecendo preços e formas de anúncios.
Girolamo nega a oferta de venda de serviços vinculados à associação, como habeas corpus. "A finalidade era a união e educar os cultivadores a rotular o produto de forma correta a fim de evitar o fim do mercado de cogumelos mágicos no Brasil", justifica.
Um dos primeiros capítulos na guerra dos cogumelos envolveu Ana Paula Paz, 40, cofundadora da empresa Coguvalley, de Santa Catarina, e uma das maiores concorrentes da Natureza Divina no mercado.
Ana Paula decidiu trabalhar com os cogumelos mágicos após ter usado microdoses para tratar a depressão pós-parto.
"Fui a primeira mulher a vender na rede social e a primeira pessoa a botar a cara em 2016. Antes todos se escondiam atrás de perfis fakes, com fotos ou desenhos. Eu fazia vídeos, era bem blogueirinha."
A dona da Coguvalley afirma que começou a ser perseguida no final de 2018, após dar uma entrevista sobre os benefícios do uso das cápsulas de microdose de cogumelos mágicos para um canal no YouTube.
O vídeo foi denunciado e acabou retirado da plataforma. Ela e o sócio, seu marido e cultivador de cogumelos, Diego Xavier, apontam o proprietário da Natureza Divina como denunciante.
Ana Paula também diz ter sido ameaçada, pouco depois, por uma pessoa chamada Franklin. "Disse saber onde meus filhos estudavam e que a escola não era segura."
Segundo a empresária, na ocasião, a pessoa disse estar a serviço de Girolamo.
Ana Paula participou de reuniões de criação da associação do dono da Natureza Divina, mas logo saiu. "Vi que não era para mim."
Ela, que também recebeu notificação em outubro de 2022, afirma que o grupo de Girolamo usa práticas que descreve como milicianas, "Primeiro coagem, com ameaças, e depois oferecem proteção."
Girolamo admite que Franklin fornecia um tipo de cogumelo psicodélico para sua empresa, mas nega que tenha pedido para ele ameaçar qualquer pessoa. De acordo com o dono da Natureza Divina, Franklin agia por conta própria.
Com o setor em pé de guerra, o "rei dos cogumelos" desistiu de seguir adiante com sua associação por enquanto. Afirma que vai "esperar a poeira baixar" para retomar o plano.
FONTE: Por que produtores de "cogumelos mágicos" estão em guerra no Brasil
Isso não vai acabar bem...
