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Aqui discutimos micologia amadora e enteogenia.

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Derretimento do corpo, sublimação da mente

Salaam`aleik

Kal-hifa
Membro da Staff
Cultivador confiável
16/01/2014
1,383
1
83
Nômade
Dose: 5 g secos (cubensis B+)
Administração: 4 horas em jejum depois de um almoço bem leve, não ingerindo carne desde o dia anterior. Cogumelos inteiros, estipes e chapéus bem mastigados e engolidos junto com 1 g de vitamina C (Cebion, comprimido efervescente) em 1 copo (200 ml) d'água. Aos poucos tomei mais água junto (+/- 1 copo).
Efeitos fisiológicos: nenhum antes nem após a trip, a não ser diurese e midríase (pupilas dilatadas). Fui ao banheiro umas 4 vezes. Repus a água aos poucos.
Após umas 2 ou 3 horas, entre idas ao banheiro, comi uns amendoins, bolachas. Tive uns 2 ou 3 soluços de náusea enquanto deitado, após consumir. (melhor não comer nada mesmo)
Sono se tornou possível somente após +/- 8 horas. Duração de 12 horas, profundo por 9 horas, ciclos REM normais de 1h-1h30, ficando mais curtos pela manhã. Sono leve nas 3 horas finais.
Acordei com uma leve dor de cabeça, por abstinência de cafeína (mais de 36 horas da última dose). Sem outros efeitos colaterais clássicos de substâncias sintéticas (tremedeiras, etc).
Estado psicológico: de paz e admiração.

Após 20 min da ingestão, comecei a sentir a sensação “boa” e os primeiros efeitos fisiológicos (diurese). Em 40 min começaram os efeitos visuais (imagens 2D se tornando 3D), e em 1 hora o corpo estava ficando pesado, então apaguei as luzes, e deitei na cama. Coloquei música e imagens, apertei o cinto para a decolagem.

Passei a maior parte da viagem deitado na cama, com a luz apagada, imagens e música. Levantei algumas vezes para ir ao banheiro, e testar os sentidos.

Em uma dessas vezes, me olhei no espelho. Tentei ver se o cara do outro lado fazia algo de diferente, mas ele ainda era eu. Só que estava derretendo, com a pele líquida. Muito engraçado.

Noutra, resolvi comer alguma coisa, e experimentei amendoins torrados. “Bebi” os amendoins, direto da casca... Felicidade pura. Cada “croc” emitia ondas que faziam as paredes da casa ondularem. Mordi uma bolacha rechada, em câmera lenta... Podia sentir cada molécula da bolacha virando felicidade, e depois de comer umas três, dei pulos de alegria.

Num ponto alto da trip, estava muito feliz, e comecei a chorar... Chorei de felicidade e de alegria, as lágrimas não paravam.
E chorei também como quando era criança, que chora sem motivo. Não foi ruim, foi muito bom... Fazia muito tempo que não chorava assim, e isso me fez lembrar muita coisa da época.

Depois da choradeira, em mais uma ida ao banheiro, percebi que já estava num nível além das minhas outras trips, "audaciosamente indo aonde nenhum Eu jamais esteve"... Não havia sentido a decolagem, mas já estava bem longe da Terra.

Como teste, apaguei as luzes e fiquei de ponta cabeça no chão. O mundo estava pesado... Voltei para a cama, imagens e música. A sensação era de que a parede era o chão, e o chão, a parede.

Meu corpo então derreteu. Primeiro eu me tornei parte da cama e da parede, era feito de cimento coberto de pano azul. E então o corpo derreteu mesmo, igual sorvete. Eu afundava, e meus olhos flutuavam para dentro do meu corpo derretido, enquanto eu me desfazia na cama. Minha boca se abriu, ficando maior que a cabeça, e a língua saía como um broto, que então se abria em outra boca, outra língua, e assim sucessivamente, como se fosse uma animação de um filme do Pink Floyd. Era como se estivesse borbulhando igual piche, ou “A Coisa”, bolhas que cresciam e estouravam lentamente, se invertendo e misturando novamente ao resto. Eu levantava um braço ou perna, só para sentir ele derretendo de novo, igual uma fonte de chocolate.

Se alguém visse de fora, eu devia estar fazendo caretas e poses, à là O Exorcista :roflmao:

Assim fui me desfazendo, em uma poça de lágrimas, suor e sangue, células, depois quebrando em proteínas, neurotransmissores e etc. A mente ficou flutuando nisso, como um caroço duro de azeitona, no meio do molho de tomate. Após completamente dissolvido, o que sobrou do corpo derretido desapareceu no espaço, se espalhou no escuro, incontido pelo vazio. Então o "caroço" também se desfez, por sublimação, em luzes como numa aurora, e ficou só a consciência. Flutuando no vazio do tempo, reduzida a um ponto, indivisível, infinitamente pequeno.

Livre do meu corpo, a sensação era de que toda a minha vida, todas as minhas memórias, pareciam estar no mesmo lugar, no mesmo ponto. Voltei aos meus 8 anos, e lembrei do tempo que eu passava sonhando acordado, viajando nas idéias e construções mentais que eu fazia sobre as coisas, em termos de lembranças, pensamentos e lugares familiares. Achei engraçado relembrar as coisas que eu pensava, e como eu pensava! Coisas que eu não lembrava, e me trouxeram algumas respostas das quais eu precisava. Passei algum tempo em “loop” nesses pensamentos, até a hora de voltar.

Então voltei à minha forma original e real - o corpo físico, sólido e intacto -, e abri os olhos. Mas ainda não estava em condições de fazer nada. Não conseguia sequer trocar a música, por exemplo. Tentei dormir, mas não consegui. Fiquei viajando na música, e reorganizando os pensamentos, refletindo sobre a trip.

Após algum tempo a leseira passou, então acendi as luzes, e já estava “de volta”. Fui ao banheiro, e comi um lanche, bem devagar. Me senti um pouco cansado, como outras vezes em que usei muita coisa, mas só na cabeça, sem o mal estar físico, tremedeiras, sede e etc. Em seguida fui dormir, demorei um pouco, mas peguei no sono. Dormi por umas 12 horas.

O pico da experiência durou umas 3 ou 4 horas, mais do que as 2 horas da experiência anterior. A duração completa foi novamente de 6 horas, após as quais eu ainda estava com a atenção reduzida (viajando em sons do ambiente, que viravam música), mas já sem efeitos visuais. Apesar da trip forte, em nenhum momento foi ruim ou assustador – chorar foi bom, derreter foi divertido, e as coisas das quais lembrei me trouxeram mais auto-conhecimento.
Acordei me sentindo em paz. Tomei um café, almocei e passei o dia refletindo sobre a experiência. Além de, claro, cuidar do cultivo :)

Bem que dizem, que os cogumelos nos trazem aprendizado! Esse foi o meu. Aprendi que tudo o que me trouxe até aqui, os cogumelos e a trip, valeu a pena!

No entanto, a consciência e o ego, o id, se mostraram mesmo indivisíveis, e imortais. Não consegui me “dividir em vários” ou “morrer”, e permaneci consciente e racional, durante toda a experiência, mesmo não tendo mais forma física.

Agora sei do quê os cogumelos são capazes, e que me sinto confortável em não ter um corpo físico.

E sabendo onde uma vez cheguei, buscarei, novamente, ir além :feliz:

Paz e Luz!
 
Última edição:
E sabendo onde uma vez cheguei, buscarei, novamente, ir além :feliz:

Belo relato!

É isso aí, quem busca a sabedoria não se limita a terrenos seguros e confortáveis.

Keep going...
 
Ótima experiência @Salaam`aleik , imagino o quão profundo foi o pico e também o loop em que você esteve.
No entanto, a consciência e o ego, o id, se mostraram mesmo indivisíveis, e imortais. Não consegui me “dividir em vários” ou “morrer”, e permaneci consciente e racional, durante toda a experiência, mesmo não tendo mais forma física.
E sabendo onde uma vez cheguei, buscarei, novamente, ir além :feliz:
Talvez seja isto, talvez seja necessário "morrer" para ir além. Aliás quando se vai além, a vontade tende a ser contrária, você (ego) não vai tentar morrer, mas talvez tente sobreviver.
 
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