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Um ebook, ao menos o início de um. Os quatro elementos e a morte.

  • Criador do tópico Criador do tópico HD_agade
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HD_agade

Hifa
Membro Ativo
19/10/2014
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CAP I - Você sonhou hoje ?

Julie abriu os olhos ,deitada na cama, esticou-se energeticamente, e só então lembrou-se que era seu aniversário de doze anos, mas isso não pareceu ser tão importante quanto o sonho que tivera, aniversários eram quase sempre iguais, pelo menos até ali, mas os sonhos sempre eram diferentes, todas as noites.Mesmo que não se lembrasse de todos por mais que se esforçasse, ela sabia que sonhava sempre.

Leu na internet que os sonhos eram o melhor método que a mente descobrira durante a evolução para abster-se da realidade, como um recreio divertido entre todos os dias, mas desconfiava que havia algo a mais, como uma maneira mágica de viajar por mundos diferentes. Descobrir o porque, no entanto, não era assim tão divertido quanto apreciar o que a memória lhe proporcionava quando acordava e ficava cinco minutos deitada se deliciando com cachorros que falavam, paralelepípedos coloridos no espaço onde caminhava saltitando, ou até mesmo os mais normais, como um jardim no meio da floresta onde ficava sentada rodeada por esquilos. Era um passatempo preferido, mas não comum, poucas pessoas que conhecera se esforçavam em lembrar de seus sonhos, ou mesmo gostavam de falar deles, então se contentava em resguardar esse hobby isolado para si, todos os dias antes de se levantar.

Um coelho gigante com enormes orelhas pontudas e pelos branquinhos pulava em direção a ela sobre as montanhas naquela noite, e conforme se aproximava ia diminuindo até caber nas palmas da mão de Julie, que o erguia até a altura do rosto e lhe dava um beijo, depois ele pulava para o chão e conforme ia se afastando , crescia novamente.

Sorriu , se levantou e escolheu um vestido amarelo no guarda-roupa próximo a porta, o espelho era todo enfeitado com adesivos nas bordas, e já faziam tanto tempo que estavam ali que de tanto ignorá-los já nem se lembrava direito da maioria, um passarinho azul e um coração vermelho se destacavam, mas eram os únicos que tinha certeza de que estavam ali.

Se dirigiu para o banheiro, tirou o pijama e ligou o chuveiro.Como fazia todas as manhãs, experimentou a água com as pontas dos dedos, e só depois molhou a cabeça.

A agua quente escorrendo pelo corpo sempre fora o melhor bom dia que recebia, depois vinha o beijo da mãe e o abraço do pai, logo antes de sentar-se à mesa, fazer um agradecimento e apreciar torradas com mel e de vez em quando torta de maçã,banana e canela. Naquela manhã no entanto sabia que algo especial a esperava, então depois de demorar-se um pouco mais no bom dia do chuveiro , se arrumou em frente ao espelho e se dirigiu para as escadas.

As luzes estavam apagadas e a luz da manhã entrava sonolenta pelas janelas do corredor, ouviu os pais conversando na cozinha, e quando desceu, reparou na decoração atípica por toda a sala: nos sofás e no chão tapetes de crochê azul e as cortinas também da mesma cor faziam a maior diferença no ambiente, conjuntos de bexigas azuis infladas com gás que as faziam flutuar espalhavam-se por todo o lugar,e dizeres de "Feliz aniversário Julie" e um smile sorrindo estavam desenhados nelas com cola. Presentes embrulhados com papel azul se aglomeravam perto do televisor, contou pelo menos três que eram provavelmente livros, e isso já a deixou satisfeita, no entanto azul não era sua cor favorita e por isso não entendia a decoração.

Seus pais pareciam animados com a conversa na cozinha, então se dirigiu aos presentes, o primeiro embrulho que abriu se revelou ser uma tradução de um romance escrito por um alemão, Patrick Süskind, que o pai havia comentado no almoço, algumas semanas atrás, o livro que se chamava O Perfume passava-se em um Paris do século XVII, e contava a história de um menino que nasce sem cheiro nenhum.

O segundo livro que desembrulhou foi A hora da estrela, de Clarisse Linspector, que já havia lido na biblioteca da escola mas que ficou grata por tê-lo em sua coleção.

O terceiro livro , ela mesma quem pediu de aniversário, por ter gostado do filme que assistira no cinema, As aventura de PI.

Quando terminou de abrir o último presente, reparou que seus pais a estavam observando.

-Parabéns filha.

-Obrigado pai, obrigado mãe, por tudo.

-Julie, queremos que saiba que sempre estaremos com você.

-Fazemos parte de você.

-Que estranho vocês falando assim... Hoje eu sonhei com um coelho gigante! Com o que vocês sonharam ?

Eles se entreolharam e Julie se lembrou que as outras pessoas não falavam muito sobre sonhos, as vezes seus pais poderiam nem se lembrar...

-Querida, vá lá para fora, você precisa ver uma coisa muito importante.

-Mais um presente ? Que demais!- Correu e os abraçou.

Ela se virou e correu para a porta. Desceu um lance de escadas e foi até o meio do quintal procurando algum embrulho, quando de repente ouviu o som mais apavorante de toda sua vida, sentiu um forte impacto nas costas e quando se virou sua casa não estava mais ali, substituída por uma infinidade de destroços e fogo. O sentimento foi tão cruel que por muitos momentos não conseguiu respirar, nem gritar, nem se mover...

CAP II Quando estiver preparado... acorde.

As pessoas buscam muitas coisas, fortemente buscam algumas coisas, e outras, com o passar do tempo se esquecem que buscavam.

Buscam paz, mas não querem morrer, buscam luz se esquecendo das sombras, buscam liberdade esquecendo que o amor muitas vezes aprisiona, e isso não é necessariamente ruim, é só parte do que o amor é, do que ele faz , do que ele requer...


Julie abriu os olhos de repente, sem lembrar de tê-los fechado, levantou-se se sentando, respirou fundo e desesperadamente.

  • Meus pais! - Gritou, foi a única coisa que importava, a dor sufocando-a como uma mão invisível apertando seu coração que batia tão forte quanto a vontade de chorar, mas não conseguia.

  • Eles nunca existiram – A voz era extremamente calma para dizer o que acabava de dizer.

  • Estou no hospital ? Eu quero vê-los... - Começou , tendo a certeza de que ouviu errado o que ouvira, poderia ser consequência da explosão?

  • Tudo bem, é sempre difícil entender – A voz serena vinha de uma figura sentada ao lado da cama , uma jovem de rosto transparente, onde Julie não encontrou nenhum sinal de lamento, e isso a deixou com raiva.

  • Quem é você? - A voz soou mais agressiva do que esperava , mas não importava– Onde estou ?

  • Poderia dizer que você acordou, e que esta é a realidade, mas isso é no que eu acredito, e eu? Eu sou mais igual a você do que qualquer pessoa que você conheceu até hoje, nos seus... sonhos.

  • Do que você está falando? - Julie havia se levantado quando gritou, e agora se afastava da moça e da cama, e quando olhou ao redor, encontrou um espelho na parede, mas em seu reflexo não era ela mesma que se via, e sim uma mulher mais velha- Quem sou eu ?

  • Isso sim é uma pergunta inicial! No entanto, não posso responder isso, mas posso te ajudar a encontrar a resposta para essa e outras perguntas importantes.

  • Eu... eu estou morta ?

  • Você estava viva até agora ? Onde estava agora há pouco ?
Quando Julie se lembrou de abrir a porta e sair para o jardim, foi como se lembrasse de um sonho, uma memória longínqua dançando em sua mente.

  • Eu tenho doze anos, hoje é meu aniversário, eu logo vou acordar - “Mas essa noite eu sonhei com o coelho gigante”

  • Depois daqui, eu nunca mais acordei, por isso eu chamo aqui de realidade. - A mulher se levantou e olhou para a cama – E por isso também.
As palmas das mãos apontaram para a cama, e esta começou a se desfazer, indo se juntar ao chão, e momentos seguintes não estava mais lá.

“Tudo bem Julie, definitivamente você está em um sonho, um sonho bem anormal” - Disse para si mesma, sentindo repentinamente tranquilizada. Abriu um sorriso e disse:

  • Hum... que legal, eu normalmente acordo depois que algo assim acontece, e fico deitada imaginando que demais seria se isso fosse mesmo verdade. Uma vez sonhei que estava no meio do oceano, viajando nas costas de uma baleia e quando ela pulava, por algum motivo eu não caia, foi um dos melhores sonhos que tive.

  • Você gostaria de falar sobre sonhos ?

  • Sim! Afinal temos muito tempo , pelo menos até eu acordar...

  • Tudo bem. Algumas pessoas do mundo em que você estava, costumavam atribuir significados diversos a cada coisa que se sonhava, mas por mais criativo que fosse, você já reparou que sempre significava algo sobre sua vida naquele mesmo mundo, uma oportunidade no emprego, para tomar cuidado no trânsito, algumas eram mais fortes prevendo até catástrofes , ao que você atribuiria sonhar com o mar ?

  • É, eu já li alguns livros sobre isso, dizia que algumas pessoas preferem acreditar que possuem significados por ser natural do ser humano procurar alguma coerência em qualquer coisa que não tenha se descoberto ainda. Sonhar com o mar, se fosse para eu dar um significado, diria que solidão, mas como eu estava me divertindo com uma baleia, não sei ao certo...

  • E você se lembra da textura da baleia ? Da sensação do pulo, e de como a água batia no seu corpo quando caiam ?
Julie pensou por um momento, e o sonho veio a mente como se tivesse acabado de acordar dele.

    • Sim, era... bem real, o frio na barriga quando caía, e a água... era salgada!

    • Vamos chamar o lugar que você estava agora de sub-realidade, e nela, acredito que …

    • Olha, eu sei que você faz parte da minha própria consciência , e portanto não seria adequado eu ficar brava comigo mesma, mas se existe uma sub-realidade, é esta aqui, que você consegue até transformar uma cama de pedra em chão, eu tenho absoluta certeza de que tenho doze anos e que vou acordar logo.

    • Mas se isso é um sonho, como você poderia saber?Sonhos lúcidos são meio raros para a maioria das pessoas...

    • É, mas eles acontecem, pelo que li. Taí , isso é um sonho lúcido e eu deveria poder fazer o que quisesse nele, e acho que você e esta sala vão desaparecer daqui a pouco. - Fechou os olhos e se concentrou o máximo que pôde.Mas quando abriu os olhos, tudo o que mudara fora a moça que voltara a se sentar na cadeira e cruzara as pernas pacientemente .

    • Podemos continuar ? Eu gosto especialmente do que vou falar agora …

    • Tudo bem, talvez eu não saiba controlar um sonho lúcido tão bem...Prossiga.

    • Então, na sub-realidade em que você vivia, existiam esses jogos de computadores em que simulavam a realidade ?

    • Sim, existiam simuladores de avião, carros de corrida, e até de vidas cotidianas...

    • Isso, mas era algo em que você por alguns momentos se esquecia que estava em um jogo ?

    • Não... acho que não, afinal sempre se via o computador... ah espere, estavam criando sim um em que se colocava óculos e tudo o mais, e acho que era até possível sim de se confundir , mas teria que estar superconcentrado no jogo, eu acredito...

    • É... bem, em algumas sub-realidades alguns simuladores foram desenvolvidos tão, tão reais , que as vezes dormia-se jogando e quando acordava ainda estavam no jogo. Não é incrível como a tecnologia pode avançar a esse ponto ?

    • Sim, é mesmo incrível! Mas eu nunca vi nada assim...

    • É só ver como a tecnologia começou a ser criada em tempos primórdios e avançou até a época da sua sub-realidade, é inimaginável onde ela pode chegar, não é mesmo ?

    • Acho que pode ter um limite em algum lugar...

    • É, como criar sonhos, certo ? Não é estranho como a tecnologia precisaria avançar tanto para alcançar algo que nós já possuímos, naturalmente ?

    • Se é que é possível algo assim... Mas para qual finalidade os cientistas tentariam recriar sonhos ?

    • Exato! Tudo o que a tecnologia busca, ou o que buscam com a tecnologia, é o conforto. Uma forma mais fácil de produzir alimento, um colchão para se dormir melhor, um teto para se evitar chuvas...

    • Uma tela para passar a noite inteira sentado em frente.

    • E até mesmo páginas juntas para se passar dias...

    • É, eu não tinha pensado nisso...

    • Pense então, em roupas para se proteger do frio, ou do sol... - A mulher olhou de uma maneira peculiar para Julie e logo em seguida deu uma piscadela.

    • Roupas... - E como se um véu tivesse sido tirado de seus olhos, percebeu que estava nua, assim como a mulher em sua frente. ! . - Mas... como...?

    • Você já tinha reparado, só não tinha se preocupado com isso.

    • Onde estão minhas roupas ?

    • Seus objetos que te poupam de desconforto com o próprio corpo ?

    • Não... não é isso, é que... eu não estou acostumada a sonhar que estou nua!
CAP III - VIda, uma preparação para quê ?

A moça deu uma risada natural, e logo em seguida colocou as mãos voltadas para baixo, e uma camada muito fina do próprio chão começou a subir pelos seus pés formando uma espécie de vestimenta, o que pareceu para Julie bem sofisticada para algo feito do chão .

  • Incrível, mas eu já sonhei com um coelho gigante que se encolhia conforme ele se aproximava.

  • Ahn, e se quando o coelho se aproximava, você , na verdade, estava aumentando?

  • Você é bastante inteligente, é normal que o nosso subconsciente seja assim, não é mesmo ?

  • Você acha que um coelho , ou uma baleia tenham subconsciente, ou que no caso deles, o instinto seja tudo o que exista além da consciência ?

  • Eu... - Aquilo estava ficando incômodo, quem afinal ,gosta de parecer menos inteligente que alguma parte do próprio cérebro ? - Cachorros sonham, ao menos eles fazem ruídos e caretas algumas vezes que estão dormindo, então existe um sub-consciente neles, e provavelmente em outros mamíferos também... Não estávamos falando de tecnologia ?

  • Pois não, se um mamífero, ou uma colmeia pudesse desenvolver uma tecnologia mais avançada do que eles possuem naturalmente , qual seria ?

  • Acho que para produzir mais mel e agradar a rainha, ou para evitar a morte.

  • A morte... - A moça retirou com um movimento de mãos as vestimentas criadas, e olhou fixamente para Julie – Se você prefere acreditar que seus pais não morreram antes de você acordar aqui... O que você sentia nesse tempo em que passou na sub-realidade, quando pensava na morte, na dos seus pais, ou a sua própria?

  • Eu pensava em algo bem distante, algo que eu não precisava me preocupar no momento, e que não estava preparada, que eu nunca estaria preparada...

  • Não seria a vida , uma preparação para a morte ? Pense, morrem pessoas diariamente que aparecem no noticiário, e isso nos afeta de uma maneira distante, morrem conhecidos, que não são tão próximos, e isso nos afeta um pouco mais, depois morrem os pais, irmãos, e então chega a nossa vez, e nós nunca achamos que estamos preparados...

  • É, porque provavelmente não estamos mesmo, e como você disse, a tecnologia tem avançado muito, assim sendo, chegará um dia em que esse desconforto será tirado de nossas vidas...

  • E não seria possível, que assim como a tecnologia possa recriar algo que já possuímos naturalmente como os sonhos, a vida eterna já não nos pertença ?

  • Já ouvi falar sobre isso, como se a vida fosse uma transição e como num sonho, acordássemos em outro lugar depois de fechar os olhos pela última vez no nosso mundo.

  • Isso faz parte de uma crença da sub-realidade, e como todas elas, é bem complexo. Vou te contar sobre uma crença especial que não tem um nome específico e nem é tão famosa quanto as outras existentes, e mesmo assim aborda todas de uma vez.

  • Estou escutando .

  • As crenças mais antigas que se têm conhecimento , de uma forma ou de outra, veneravam a vida, o final dela, ou a duração da mesma, quando se entendeu que o sol proporcionava a vida passou-se a acreditar no sol como uma entidade poderosa, e logo em seguida os planetas, na verdade, muitas coisas foram adoradas , e muitas delas não se têm registro, em uma certa região onde a proliferação de certo tipo de árvore era frequente, pôde-se adotá-la como uma entidade protetora, e se fosse frutífera, como mantenedora da vida. Em outra região onde se encontrava plantas alucinógenas , desenvolveram um motivo suficiente para crer que ali habitava algo maior do que os que consumiam-na, para os que viviam próximo ao mar e se alimentavam dele, viam-no como uma mãe.

  • Se não estou enganada, existe uma citação de que não é errado crer em qualquer coisa até que se conheça a verdade.

  • De fato, mas essa crença que vou lhe dizer vai além.

  • Estou ansiosa para saber.
 
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