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O cogumelo shiitake (Lentinula edodes)
L. edodes: propriedades medicinais e compostos biologicamente ativosOs basidiomicetos são fungos de micélio septado, que se reproduzem por esporos
exógenos (basidiosporos) formados sobre uma hifa especial denominada basídia.
Geralmente, grampos de conexão são formados no micélio vegetativo para manter a sua
condição binucleada (Moore-Landecker, 1982).
L. edodes, conhecido como cogumelo shiitake, é um basidiomiceto cujo corpo de
frutificação é amplamente utilizado na culinária asiática e cujo consumo vem sendo
difundido atualmente a nível mundial, incluindo o Brasil. O shiitake é a segunda mais
importante espécie de cogumelo comestível cultivada no mundo (Przybylowicz &
Donoghue, 1990). Atualmente, o shiitake é produzido no Japão, Taiwan, República
Popular da China, Tailândia, Coréia e Malásia, além dos países ocidentais (Leatham,
1985), inclusive o Brasil (Eira & Montini, 1997). A produção mundial de shiitake em
1997 foi aproximadamente 144.000 toneladas, em termos de cogumelo seco, sendo a
China responsável por 70% dessa produção (Van Nieuwenhuijzen, 1998).
O padrão de restrição do DNA ribossomal confirma que o shiitake faz parte da
Ordem Agaricales e do gênero Lentinula, e suporta a separação de Lentinula edodes a
partir de Lentinus, gênero ao qual o cogumelo shiitake era incluído (Molina et al., 1992).
O fungo pode ser cultivado em troncos de árvores como o eucalipto, carvalho,
mangueira e abacateiro, ou em cultivo axênico, e tem atraído a atenção de pesquisadores
por apresentar qualidades nutricionais, medicinais e terapêuticas comprovadas
cientificamente.
O cogumelo shiitake é fonte de proteínas de boa qualidade (10-17% da matéria
seca), carboidratos (a maior parte consistindo de fibras dietéticas), vitaminas e minerais.
Além disso, é pobre em lipídios e os ácidos graxos são predominantemente insaturados.
Apesar de conter todos os aminoácidos essenciais, L. edodes apresenta baixos níveis de
metionina e cistina (Breene, 1990).
Várias propriedades fisiológicas têm sido influenciadas por cogumelos, tais como
a imunoproteção, a manutenção de homeostase, a regulação do bioritmo, a prevenção de
doenças coronárias e cancerígenas. Confirma-se também que cogumelos produzem
substâncias efetivas para a redução do colesterol e da pressão sangüíneos, além de
substâncias com ação antitrombótica e hipoglicêmica (Wasser & Weis, 1999).
Estudos conduzidos sob condições controladas mostraram que os princípios
ativos presentes no cogumelo shiitake podem exercer efeitos totalmente diferentes
dependendo da dose, da rota de administração e da condição do hospedeiro. É também
aparente que tipos similares de efeitos podem ser elicitados por moléculas
estruturalmente diferentes. A seguir, os principais componentes de L. edodes já
caracterizados são descritos.
Dentre os compostos ativadores do sistema imunológico encontrados em L.
edodes, destaca-se a lentinana. Trata-se de uma β-D-glucana com alta massa molecular
(aproximadamente 5x105 Da) e configuração helicoidal, isolada a partir do extrato
aquoso do corpo de frutificação do fungo (Chihara et al., 1969). A fórmula molecular da
lentinana é (C6 H10 O5 )n.
O composto lentinana apresentou proeminente atividade contra tumores
alogênicos, tais como sarcoma 180, sinérgicos e autóctones, e preveniu oncogêneses
química e viral. O polissacarídeo não é tóxico às células tumorais, mas inibe o
crescimento do tumor pela ativação do sistema imune, ou seja, a β-D-glucana se liga à
superfície de linfócitos ou a proteínas específicas do soro, que ativarão células efetoras
tais como macrófagos, células T-helper, células natural killer, proporcionando o
aumento na produção de anticorpos, interleucinas e interferon (Mizuno, 1995a). De
forma semelhante, o efeito protetor de lentinana em animais contra infecções causadas
pelas bactérias Escherichia coli, Pseudomonas aureaginosa e Klebsiella pneumonia
ocorreu devido ao aumento da imunoproteção e não pela ação direta do composto sobre
esses microrganismos (Jong & Birmingham, 1993).
Miyakoshi et al. (1984) relataram que lentinana pode inibir câncer em humanos.
A ativação das células T-killer por uma cultura de linfócitos foi acelerada somente
quando células responsivas foram misturadas com um número sub-ótimo de células
estimuladoras e lentinana. O nível de interferon na circulação sangüínea de pacientes
com câncer foi aumentado seguindo-se a administração de lentinana.
O valor da DL50 de lentinana em ratos é superior a 250 mg/Kg (administração
intra-venosa) e acima de 2.500 mg/Kg (administração oral). Doses superiores
produziram cianose, convulsões e até morte (Jong & Birmingham, 1993).
Além de lentinana, vários compostos ativadores do sistema imunológico têm sido
isolados de cogumelos medicinais. A partir do micélio de L. edodes é obtido um α-
mananapeptídeo denominado KS-2, após extração com água quente e precipitação
etanólica. KS-2 contém os aminoácidos serina, treonina, alanina e prolina e também
apresenta atividade antitumoral relacionada à ativação de macrófagos. Quando
administrado oral ou intra-peritonealmente para ratos infectados com o vírus da
influenza, KS-2 apresentou efeitos preventivo e curativo através de sua atividade
indutora de interferon (Suzuki et al., 1979).
Uma glicoproteína contendo galactose, xilose, arabinose, vitaminas do complexo
B e ergosterol, conhecida como LEM (“Lentinula edodes mycelia”), é obtida após a
maceração do micélio de shiitake junto com o meio sólido no qual o fungo cresceu
vegetativamente por 3 a 4 meses, a 22C. Posteriormente, o macerado é incubado por 60
h a 50C, na presença de enzimas de ocorrência natural no micélio do shiitake, e o
resíduo passa por extração aquosa a 60 o C e é liofilizado, resultando num pó castanho
denominado LEM. Alguns dos compostos de LEM modularam respostas imunológicas
em animais, por ativação de macrófagos, enquanto outros apresentaram caráter
antibiótico (Sugano et al., 1982).
Trabalhando com LEM, pesquisadores têm caracterizado outras substâncias
imunoprotetoras, tais como LAP e EP3. LAP é um precipitado obtido a partir de uma
solução aquosa de LEM pela adição de quatro volumes de etanol, enquanto EP3 trata-se
de um complexo composto por 80% de lignina, 10% de carboidratos e 10% de proteínas,
obtido pelo fracionamento de LEM, e que apresenta uma lignina solúvel em água
contendo grupos carboxil como substância ativa (Suzuki et al., 1990). O rendimento de
LEM é 6-7 g/Kg de meio sólido cultivado e o de LAP, 30g/100g de LEM.
Um composto denominado eritadenina, obtido a partir de extrato etanólico (80%)
de basidiocarpos, apresenta ação hipocolesterolêmica, provavelmente por alterar o
metabolismo fosfolipídico hepático. A dosagem de 50 mg desse composto por quilo de
massa corpórea é suficiente para diminuir a concentração de colesterol plasmático em
ratos (Sugiyama et al., 1995). Estudos sobre o modo de ação mostraram que eritadenina
não inibe a biossíntese do colesterol, mas acelera a excreção do colesterol ingerido e a
decomposição dos seus metabólitos (Mizuno, 1995a). Em testes conduzidos com
humanos, Suzuki & Ohshima (1974) reportaram diminuição na pressão sangüínea e no
colesterol do soro em mulheres alimentadas com shiitake fresco ou seco.
cogumelo-do-sol (Agaricus blazei)
A. blazei, um cogumelo nativo do Brasil, tem sido amplamente consumido em
diferentes partes do mundo devido às suas propriedades medicinais. O cogumelo vem
sendo cultivado comercialmente no Brasil desde o início da década de 90 e a maior
produção encontra-se no estado de São Paulo, onde o cultivo principal é feito nas épocas
de primavera e verão (Braga et al., 1998). No Japão, a produção anual varia de 100 a 300
toneladas de basidiocarpo seco (Takaku et al., 2001).
Segundo Mizuno et al. (1990), o basidiocarpo de A. blazei apresenta 40-45% de
proteínas, 38-45% de carboidratos, 6-8% de fibras, 5-7% de minerais e 3-5% de gordura,
valores baseados em relação à matéria-seca. Contém ainda as vitaminas B1, B2 e niacina
e teores elevados de potássio e cálcio. Além das propriedades nutricionais, A. blazei é
utilizado por aproximadamente 500.000 pessoas para prevenção do câncer ou como um
adjuvante no tratamento com drogas quimioterápicas, após a remoção de um tumor
maligno (Takaku et al., 2001). Segundo Eguchi et al. (1999), o extrato aquoso de
basidiocarpo de A. blazei pode ser um alimento útil para o tratamento preventivo e
curativo de disfunções renais.
Vários compostos de interesse medicinal já foram caracterizados (Mizuno,
1995b). Compostos antitumorais incluem polissacarídeos, complexos proteína-
polissacarídeos, esteróides, presentes tanto no basidiocarpo como no micélio. Kawagishi
et al. (1990) obtiveram um complexo gluco-protéico, com um alto conteúdo dos
aminoácidos alanina e leucina, apresentando atividade antitumoral. O efeito,
caracterizado pela inibição do crescimento de sarcoma-180 implantado em
camundongos, ocorreu provavelmente devido às propriedades imuno-regulatórias do
complexo. Mizuno et al. (1990) demostraram efeito similar a partir de polissacarídeos
obtidos a partir do extrato aquoso do basidiocarpo, destancando-se o complexo 1,6- e
1,4-α-glucana e o complexo 1,6- e 1,3-β-glucana como os componentes principais de
diferentes polissacarídeos. Por sua vez, os polissacarídeos isolados a partir de extrato
aquoso do micélio de A. blazei, que apresentaram atividade antitumoral, foram
diferentes dos polissacarídeos antitumorais isolados do basidiocarpo do cogumelo
(Mizuno et al., 1999).
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O complexo 1,6- e 1,4-α-glucana também estimulou a síntese de linfócitos
quando administrado em camundongos normais, sugerindo que polissacarídeos de A.
blazei podem ser importantes para o tratamento preventivo contra o câncer (Mizuno et
al., 1998). Outro indicativo de que o efeito antitumoral de A. blazei ocorre por estimular
o sistema imunológico do hospedeiro veio com o trabalho de Nakajima et al. (2002),
onde a expressão de RNA mensageiro de interleucinas foi aumentada pelo extrato de A.
blazei, tanto nos macrófagos peritoneais como nas células do baço. Isto sugere que o
extrato pode estimular macrófagos e células-T a liberarem interleucinas, resultando no
aumento da produção de anticorpos.
Ergosterol, purificado a partir da fração lipídica do cogumelo, é outra substância
com atividade antitumoral. A inibição direta da angiogênese provavelmente seja a
responsável pelo modo de ação do ergosterol (Takaku et al., 2001).
Atividade antimutagênica em Salmonella foi encontrada em extratos hexânicos
do basidiocarpo e atribuída ao ácido linoléico (Osaki et al., 1994). Por sua vez, os
extratos aquosos mostraram-se antimutagênicos quando testados em células V79 de
hamster chinês (Menoli et al., 2001).
Em termos do efeito antibiótico por parte de A. blazei, poucos relatos foram
feitos. Investigando a atividade antiviral do cogumelo-do-sol, Sorimachi et al. (2001)
mostraram que frações, obtidas pela precipitação etanólica a 44 e a 50% do extrato
aquoso micelial, inibiram completamente a ocorrência de alterações morfológicas
induzidas pelo Western equine encephalitis virus (WEEV) em células VER0-317
derivadas do rim de macaco, enquanto que as frações correspondentes, obtidas do
basidiocarpo, foram pouco efetivas. Osaki et al. (1994) encontraram atividade
antibacteriana nos extratos clorofórmicos e metanólicos do basidiocarpo de A. blazei. A
substância isolada foi ativa contra Salmonella typhimurium e foi identificada como ácido
octadecadienóico.
Matéria parcialmente retirada de uma tese de doutorado:
Potencial dos cogumelos Lentinula edodes (shiitake) e Agaricus
blazei (cogume- lo-do-sol) no controle de doenças em plantas de
pepino, maracujá e tomate, e a purificação parcial de compostos
biologicamente ativos / Robson Marcelo Di Piero. - - Piracicaba, 2003.
157 p. : il.
Tese (doutorado) - Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, 2003.