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Porque o artista experimental John Cage era obcecado com cogumelos (artigo traduzido)

EremitaMarrom

Hifa
Membro Ativo
16/02/2017
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Colegas micofílicos,

Eu gostaria de compartilhar com vocês uma história sobre alguém com uma paixão dupla bastante incomum: música e cogumelos. Traduzo o artigo em sua íntegra. Espero que gostem.

PS: alguns termos, nomes próprios e espécies não tem nem tradução em português e nem correspondente botânico/fúngico no Brasil. Marquei-os em itálico.

PS 2: coloquei alguns links de coisas que achei que poderiam ser interessantes.

PS 3: perdão pelo excesso de seriedade na tradução.

Porque o artista experimental John Cage era obcecado com cogumelos

Sarah Gottesman
Em uma entrevista com o diretor Henning Lohner, o compositor e artista avant-garde John Cage brincou: "Eu sou que se pode chamar de caçador amador de cogumelos, e até agora, ainda não me matei, nem matei ninguém". Entretanto, aqueles próximos do artista sabiam que ele estava sendo modesto, senão desonesto. O fascínio de Cage por fungos era qualquer coisa, menos amador. Uma vez ele se envenenou, junto com outros seis amigos, com uma refeição de hellabore (uma espécie de flor, não um cogumelo de fato), confundida com skunk cabbage.

A obsessão de Cage por cogumelos teve início durante a Grande Depressão. Sem dinheiro o suficiente para comprar comida, o artista coletou os cogumelos que cresciam perto de sua casa em Carmel, Califórnia, levando um para a biblioteca em busca de mais informações. Ele acabou descobrindo que eram comestíveis, e se serviu exclusivamente deles por uma semana. No começo da década de 1950, Cage voltou a coletar cogumelos enquanto vivia em uma comuna com outros artistas na área rural do estado de Nova Iorque. Fascinado por seu crescimento fortuito, o artista passou a realizar mais buscas por cogumelos, estudou métodos de identificação de fungos, passando mesmo a colecioná-los (A extensiva coleção do compositor está localizada na Universidade da Califórnia, em Santa Cruz).

"Cheguei à conclusão de que muito pode ser aprendido sobre música ao se dedicar aos cogumelos" explicava Cage no livro "Music Lovers Field Companion" (1954). Para Cage, a experiência de catar cogumelos, as vezes escondidos sob a grama ou húmus, era similar a experiência de ouvir ruídos baixos que tipicamente são eclipsados pelo choro de bebês ou sirenes de incêndio".

Cage procurou expor sua sinfonia silenciosa através de sua famosa obras seminal 4'33'', encenada em Woodstock, Nova York, em 1952. A performance consistiu no músico David Tudor sentando em frente ao piano por quatro minutos e trinta e três segundos, sem tocar uma única nota. Em vez disso, ele abriu e fechou a tampa do piano três vezes para marcar períodos distintos de silêncio. A performance chamava a atenção para os barulhos ambientes da sala - o folhear da programação do evento, as fungadas e tossidas, os pingos de chuva no telhado - enquadrando estes ruídos como a música em si.

Enquanto sons estimulam a audição, cogumelos estimulam outros dois sentidos: a visão e o paladar. Em 1959, Cage aprofundou seu interesse na identificação de cogumelos dando um curso sobre a disciplina junto com o agrônomo Guy Nearing, na New School em Nova Iorque. Apesar da reitora inicialmente se mostrar hesitante com o oferecimento do curso, eventualmente ela cedeu sua aprovação após reconhecer que as aulas poderiam aprimorar as habilidades observatórias dos alunos. A classe, que incluía Alison Knowles e Dick Higgins, do movimento artístico Fluxus, partiu em expedições de coleta, mas apenas em florestas e bosques acessíveis pelo sistema de transporte público da cidade. Eles celebravam grandes jantares com o resultado de seus espólios, e seu Banquete Anual chegou a figurar nas páginas do New York Times.

Numa visita na Europa, no mesmo ano, Cage participou de um jogo italiano de perguntas e respostas chamado Lascia o Raddoppia (O Dobro ou Nada). Ele escolheu cogumelos como sua especialidade. "Pense bem, senhor Cage", alertou o apresentador Mike Bongiorno, na última questão valendo 5 milhões de liras. "Você deve nos dizer os 24 nomes das espécies de Agaricus que estão listadas no livro Studies of American Fungi". Para a surpresa dos espectadores, o artista replicou com confiança: "Posso enumerar a lista alfabeticamente". Ele ganhou o prêmio principal de 10 mil dólares e usou o dinheiro para comprar um piano novo e um ônibus Volkswagen para a nova companhia de dança organizada por sua esposa Merce Cunningham. Três anos depois, Cage cristalizou sua obsessão por cogumelos co-fundando a Sociedade Micológica de Nova Iorque, com alguns de seus alunos da New School.

Em 1960, Cage se sustentou fornecendo regularmente cogumelos para restaurantes nova-iorquinos como o Four Seasons com as coletas de suas buscas. Ele também inventou suas próprias receitas, publicando uma delas, "dogsup" (nota do tradutor: trocadilho com a caçada de trufas, muito facilitada pela ajuda de cães farejadores), na revista Vogue, como um substituto para o ketchup. Mais tarde ele publicou um livro sobre o assunto - Mushroom Book (1972) - em colaboração com o micologista Alexander H. Smith e a artista Lois Long, preenchendo as páginas com mais receitas, poemas, observações aleatórias, trechos de seu diário e ilustrações. O livro está hoje na coleção do Museu de Arte Moderna.

Para Cage, cogumelos e música andavam de mãos dadas, embora as vezes ele brincasse que a única relação entre as duas palavras era sua proximidade no dicionário (nota do tradutor: "mushroom" e "music"). Seu interesse pelo nicho nunca desapareceu. "As vezes eu entro na floresta pensando, que depois de todos esses anos, finalmente vou me enjoar de cogumelos", ele escreveu em seu diário. "Mas, encontrando qualquer cogumelo em boas condições, o velho encanto é renovado".

Fonte.
 
Muito boa a tradução! Obrigado pelo esforço.

Se me permitires uma pequena sugestão, acho que "anything but" fica melhor em português como "tudo menos".
 
Obrigado @coguosho ! Valeu a correção, nessas coisas de texto só a revisão do autor nunca basta. Em breve vou postar outra tradução de um artigo que encontrei sobre o matsutake.
 
Obrigado @coguosho ! Valeu a correção, nessas coisas de texto só a revisão do autor nunca basta. Em breve vou postar outra tradução de um artigo que encontrei sobre o matsutake.

Eu sei. Também faço traduções e só dando alguns dias para ler novamente e ver os erros ou coisas que poderiam ter ficado melhor, mas a tua tradução ficou excelente e a minha sugestão foi só um detalhe pouco importante.
 
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