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O projeto de transposição é prejudicial ao Nordeste e ao Brasil

Clorofila

Cogumelo maduro
Membro Ativo
24/01/2007
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O projeto de transposição é prejudicial ao Nordeste e ao Brasil


Apesar da roupagem humanitária que o Governo Federal tenta dar a este projeto não temos dúvidas de que trata-se de uma obra para privilegiar poucos e que os grandes beneficiários não serão os nordestinos que vivem no semi-árido. Mais uma vez a industria da seca utiliza-se do sofrimento do nosso povo para justificar o uso de recurso públicos a fundo perdido em empreendimentos que tem como principal objetivo beneficiar as elites políticas e o agronegócio. Neste caso, os mega empresários da irrigação (fruticultura para exportação) do Ceará, os criadores de camarões no litoral do Rio Grande do Norte, grandes empreiteiras e os políticos encastelados no poder, tendo à frente o ministro cearense Ciro Gomes.
Este projeto é prejudicial ao Nordeste sob vários aspectos. Primeiro, por que não resolverá o problema das populações rurais difusas que vivem o drama da seca, conforme atestado por inúmeros estudos e pareceres da comunidade cientifica nacional.
Segundo, por que estabelecerá um ambiente de competição por recursos federais nos próximos anos que prejudicará todas as soluções efetivas para distribuir a água já estocada na região (o maior estoque de semi-árido do mundo e que ainda é subutilizado) e mesmo outros projetos de desenvolvimento da região, incluindo aí aqueles dos estados da bacia do rio São Francisco.
Terceiro, por que é um projeto que pretende beneficiar apenas a metade setentrional do semi-árido brasileiro, aquela contida nos estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco, utilizando-se para isso a retirada impositiva das águas do rio São Francisco, mas voltando as costas para a metade meridional do semi-árido, exatamente aquela que abrange os estados de Alagoas, Sergipe, Bahia e Minas Gerais que ficará relegada ao esquecimento, neste ambiente competitivo por recursos públicos.
Quarto, por que significará a privatização da água bruta do nordeste setentrional, onde aqueles que apóiam este projeto, não foram ainda informados que terão que arcar com um subsídio eterno para garantir a manutenção dos canais e da nova subsidiaria da CHESF. Este subsídio significará, um aumento significativo nas contas individuais de águas dos consumidores das pequenas, médias e grandes cidades do Nordeste. A maior privatização da água bruta em curso no Brasil, vem escondida sob o mito de "água para todos, água para viver". Longe de ser um projeto de água para todos, é um projeto para onerar todos, pois está previsto um aumento nas contas de água dos seus habitantes, de no mínimo, 30% (talvez até 50%), para permitir a manutenção e operação comercial dos canais, através da CHESF. A idéia é que, mesmo sem receber efetivamente as águas do rio São Francisco (cinicamente já foi dito que a água do rio São Francisco não é colorida, portanto, não tem como diferenciar das demais), todas cidades da área de influencia do projeto a receberão apenas nominalmente, de forma a tornar possível a cobrança pela água bruta, muito mais cara que a água local. Como diz o professor João Abner, da UFRN, é um "presente de grego", pois as populações não foram comunicadas de que arcarão com este ônus eterno para subsidiar os verdadeiros beneficiários da transposição: os grandes empresários de fruticultura irrigada para exportação no Ceará, uma possível siderúrgica no litoral do Ceará e a criação de camarões no litoral do Rio Grande do Norte.
Da mesma forma, pode-se esperar um aumento nas contas de energia elétrica para compensar as perdas na geração nas usinas do rio São Francisco e uma diminuição do repasse da CHESF aos municípios no entorno das barragens (Piranhas e Canindé do São Francisco, por exemplo) e aos Estados, como Sergipe e Alagoas, sem que tenha sido acordado previamente as devidas compensações.
Finalmente, como vem sendo alertado pela comunidade cientifica, o destino deste empreendimento é se transformar no maior de todos os malogros governamentais no semi-árido, em uma região que o Brasil não tem mais o direito de errar e trazer novas falsas esperanças ao seu povo sofrido. Uma aventura temerária que trará prejuízos a muitos e benefícios a poucos.

Impactos da transposição na Bacia do Rio São Francisco
Esta não é a primeira vez que o governo federal lança mão das águas do rio São Francisco para atender o desenvolvimento do Nordeste, sem se preocupar com as sérias conseqüências para o baixo São Francisco. O rio São Francisco vem desde a década de 70 reservando a maior parte de suas águas para a geração de energia elétrica e “transpondo-a” através dos fios para todo o nordeste. Enquanto todos se beneficiam, o ônus coube apenas aos ribeirinhos que viviam do rio São Francisco e ao seu ecossistema. O governo reconhece o enorme passivo sócio-econômico-ambiental, mas pouco fez e pouco faz para mitigar os problemas e compensar a região pelos sacrifícios impostos.
É neste contexto que surge a nova ação intervencionista do governo federal. Longe de honrar a sua divida com o baixo São Francisco, o governo tenta impor a transposição e alega que esta não trará nenhum prejuízo, já que vai retirar apenas a “água que é perdida para o mar”. É desta forma depreciativa que o governo federal, em especial o Ministro Ciro Gomes, se refere ao Velho Chico e, por extensão, ao povo ribeirinho do baixo São Francisco que dele depende. Desconhece e desconsidera totalmente o importantíssimo papel que o rio exerce para Alagoas e Sergipe, ao longo do seu curso e na região costeira adjacente a sua foz.
O Comitê da Bacia Hidrográfica do rio São Francisco, vem construindo um pacto das águas para garantir a sustentabilidade futura do rio. O ponto principal e inicial deste pacto foi exatamente consensuar qual o limite máximo de água que pode ser retirada pelos estados que compõem a bacia do rio São Francisco (MG, BA, GO, DF, PE, AL e SE) de forma a garantir as condições médias e mínimas de vazão que devem chegar na sua foz. E isto significa que aceitamos baixar dos atuais 1850 m3/s para 1.500 m3/s, agravando os impactos ambientais já existentes, mas, ao mesmo tempo, garantindo que não ocorra um uso desregrado rio acima.
É este pacto que esta na iminência de ser rompido, devido a agressiva ação do governo federal, significando um retrocesso sem precedentes nos esforços para garantir a sustentabilidade do rio. A vazão da transposição significará até 47% de toda água que pode ser ainda ser retirada do rio. Um impacto de tamanhas proporções significará uma grande limitação ao desenvolvimento futuro aos estados da bacia, que segundo projeções do Plano de Recursos Hídricos aprovado pelo Comitê, esgotará as suas disponibilidades para novas projetos em aproximadamente 20 anos. Isto significa dizer que após 2025 ou 2030 nenhum novo projeto de irrigação poderá ser iniciado na bacia. Isto sem considerar o incentivo a que novas transposições venham a surgir (como já estão sendo projetadas pelo Ministério da “Integração”), agravando substancialmente o quadro.
Qual o grande risco para o baixo São Francisco? As pressões serão cada vez maiores para que os limites atualmente pactuados sejam diminuídos. O governo federal, ao atropelar as decisões do Comitê da bacia, abre um precedente que será cobrado nesta ocasião. O uso intensivo irá se refletir diretamente na drástica redução das vazões para o baixo São Francisco e a foz. As conseqüências poderão ser catastróficas e não será a primeira vez no mundo. O rio Colorado, por uso intenso de suas águas nos Estados Unidos, já não chega mais na sua foz em muitos meses do ano. Assim também o rio Amarelo, na China. Será esse o nosso destino, assistir a lenta agonia do nosso querido rio, fonte fundamental de vida para Sergipe e Alagoas?
É esse o real significado dos “apenas 1% da vazão da foz”, do “filete de água”, da “cuia d’água”, de “ apenas 1 litro em 100 litros” que os defensores do projeto reiteradamente divulgam com o intuito de minimizar os impactos e transmitir a imagem de que os sergipanos e alagoanos são extremamente egoístas. Para eles, que só enxergam o rio São Francisco de forma extrativista, como uma fonte de água para ser usada até a exaustão para o seu próprio beneficio, pouco importa o que venha a ocorrer com o rio, seu povo, o ambiente e a vida que ele sustenta.

Transposição e o futuro do Comitê da Bacia do Rio São Francisco
Se por um lado o Comitê do rio São Francisco por um lado sai fortalecido deste processo pelo reconhecimento do papel fundamental que tem desempenhado em todo este processo de conflito de usos da águas da bacia. O comitê tem sido fiel à sua missão de defender os interesses maiores consensuados pela bacia e tem sido a peça de resistência maior à imposição do projeto de transposição, por desrespeitar o Plano de Recursos Hídricos da Bacia e representar uma séria ameaça à gestão e ao futuro sustentável do rio. Por outro, as atitudes do governo federal, ao atropelar decisões de competência legal do Comitê e ao não considerar as questões relativas à gestão do rio São Francisco frente ao projeto de transposição, estão na contramão do enorme esforço de construção do pacto das águas do rio São Francisco. São os órgãos dos Ministérios do Meio Ambiente e da Integração Nacional que terão que responder perante a sociedade e perante a história pelo deprimente papel que estão desempenhando e pelo desrespeito a ética e aos princípios da gestão nacional dos recursos hídricos e do licenciamento ambiental.
O Comitê vai continuar lutando para que o Plano da bacia seja respeitado e isto inclui a condenação do projeto de transposição, por desrespeitar frontalmente as prioridades e critérios para uso externos à bacia do rio São Francisco. O Comitê entende que diante do conflito federativo instalado, a decisão não deveria caber ao poder executivo, mas sim ao Congresso Nacional.
Por outro lado, o Comitê abriu um processo administrativo para julgar o conflito de usos das águas do rio São Francisco representado pela transposição. Para subsidiar o parecer do Comitê de forma isenta iremos recorrer a uma auditoria nacional e internacional para estabelecer com clareza e isenção a verdade sobre os números e demais questões objeto de controvérsia.

Luiz Carlos S. Fontes
Secretario Executivo CBHSF

:seta: http://www.cbhsaofrancisco.org.br
 
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