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Experiência como Trippsitter

Sigillvm Dei

Hifa
Membro Ativo
03/10/2022
75
6
42
Ser um acompanhante de viagem psicodélica, ou "tripsitter", não é necessariamente a atividade mais divertida do mundo, e não é algo que eu faça com frequência. No entanto, neste caso específico, uma amiga de longa data pediu não apenas para ser apresentada ao universo enteógeno, mas também para que eu a acompanhasse durante o processo.

Conheci-a há muitos anos, nos tempos de escola. Quando decidi sair da minha zona de conforto e explorar outras oportunidades, descobri que ela também tinha seguido um caminho semelhante e retomamos o contato. Para quem já viveu a rotina de expatriado, sabe como é. Nos primeiros três anos, convivemos bastante, e ela me ajudou muito a me organizar. Ela conseguiu ingressar em um doutorado com bolsa de pesquisa na Finlândia, e eu comecei a trabalhar em outra empresa. Passamos alguns anos sem contato até que decidi sair do Facebook, e ela, vendo minha mensagem de despedida, entrou em contato comigo. Retomamos a amizade e acabamos nos encontrando em Londres, para onde ela havia se mudado.

A vida seguiu seu curso para ambos. Ela estava em um relacionamento e trabalhando em uma multinacional, enquanto eu tinha outras perspectivas. Acabei contando a ela tudo o que tinha vivido nos últimos anos, inclusive minha experiência com cogumelos. Ela já tinha experimentado várias substâncias, mas nunca cogumelos, e nunca com esse propósito. Ficou apenas na conversa, entre outros assuntos. Então veio a pandemia, e nos falamos por chamada de vídeo no início, mas depois perdemos contato novamente. Quando foi meu aniversário, ela me enviou uma mensagem com felicitações. Umas semanas passaram e como precisei ir ao Reino Unido a trabalho, lembrei de procurá-la em Londres. E, nossa, ela estava em frangalhos... Sua mãe havia morrido de câncer de pulmão grau IV, e ela não pôde se despedir por causa da COVID-19. Seu relacionamento, que parecia ir muito bem, escondia violência doméstica e outros problemas ainda mais sinistros. Tudo isso, somado à perda de uma gravidez, transformou uma pessoa cheia de alegria e luz em uma sombra de si mesma. Ela já havia tentado de tudo e estava pensando em suicídio, pois não conseguia lidar com tantas coisas acumuladas ao longo dos anos.

Admito, aconselhei-a a procurar um psicólogo antes de qualquer outra coisa. Enfatizei que os cogumelos não são uma solução mágica e que eu não sou um profissional de saúde mental. Mas no fim das contas, ela era minha amiga e precisava de ajuda. Se eu pudesse ajudá-la, faria isso; se não, pelo menos, passaríamos cinco dias de férias juntos, o que já seria um alívio para ela.Atualmente morando na Espanha, aproveitei cinco dias de folga após retornar da sede da empresa na Suíça e convidei-a para me encontrar em Sevilha, onde faríamos uma road trip. Caso ela quisesse embarcar em uma jornada interior também, eu levaria os cogumelos. Ela aceitou o convite e exploramos juntos alguns lugares que conhecia. No entanto, apesar de nossas conversas e de meus esforços para distraí-la e elevar seu ânimo, ela estava determinada a fazer a viagem psicodélica. Então, preparei algumas perguntas:
"O que você aprendeu sobre si mesma ou sobre a vida que poderia ser valioso para o seu futuro?" - Eu queria encorajá-la a explorar suas experiências internas, sentimentos e percepções durante a viagem, e possivelmente obter insights que pudessem ter um impacto positivo em sua vida.
"Qual é a conexão ou relação mais profunda que você sente com outras pessoas ou com o mundo ao seu redor?" - Eu desejava incentivá-la a explorar seus sentimentos de conexão e empatia, algo que muitas vezes é ampliado durante uma experiência psicodélica. Isso poderia ajudá-la a refletir sobre a importância das relações interpessoais e do seu lugar no mundo.
"Como você descreveria a natureza da realidade que está experienciando agora e o que isso pode lhe ensinar?" - A ideia era fazer com que ela explorasse suas percepções alteradas da realidade durante a experiência psicodélica e considerasse como essas percepções poderiam fornecer insights sobre si mesma, seus pensamentos e suas crenças.
"Se você pudesse levar consigo um único insight ou lição dessa experiência, qual seria e como isso poderia impactar a sua vida?" - O objetivo era fazer com que ela sintetizasse sua experiência psicodélica e identificasse algo significativo que pudesse ser aplicado à sua vida cotidiana.

Fiquei satisfeito ao encontrar um espaço adequado para a experiência; ela queria um local aberto e em contato com a natureza. Disse que estava cansada de estar em lugares fechados e sob luz artificial. Para quem vem do Brasil e enfrenta o inverno europeu, os ambientes fechados e a iluminação artificial não são nada agradáveis.
Lembrei-me do Peñón de Bernal, em Almeria. Embora fosse uma imagem minha bem elaborada, acredito que ela não percebeu. Talvez eu tenha sido um pouco rebuscado demais.
Encontramos o local perfeito, sob o calor do sol, e os únicos curiosos ao redor eram algumas raposas. Estendi uma toalha no chão e coloquei água e frutas à disposição.
Dei a ela 3,5 gramas dos cogumelos, em sua maioria chapéus. Os esporos que compartilhei com @SpiritualMind vieram deles.
Coloquei a playlist para tocar e ofereci os cogumelos com chocolate. Em 45 minutos, ela decolou. As próximas quatro horas foram de pânico.
Acho que o uso constante da mesma cepa, que sempre produzo da mesma maneira, me deu a ilusão de que saberia exactamente o que poderia acontecer. Estava errado. Essa é a arrogância perigosa de quem se sente muito confiante. Ela começou com imagens idílicas e logo enfrentou a tempestade de trevas que a atormentava.

O mostrengo que está no fim da mente
Na noite de breu ergueu-se a voar;
À roda da nau voou três vezes,
Voou três vezes a chiar,
E disse: «Quem é que ousou entrar
Nas minhas cavernas que não desvendo,
Meus tectos negros do fim do mundo?»
E o homem do leme tremendo

«Quem vem poder o que só eu posso,
Que moro onde nunca ninguém me visse
E escorro os medos do inconsciente?»
E o homem do leme tremeu.

Três vezes do leme as mãos ergueu,
Três vezes ao leme as reprendeu,
E mais que o mostrengo, que me a alma teme
E roda nas trevas do fim do mundo;
Manda a vontade, que me ata ao leme.

Como acompanhante da viagem, minha obrigação era mantê-la segura e apoiá-la nos momentos difíceis. Mas ela não estava apenas passando por momentos baixos; ela estava no abismo de sua existência.
Quando nos encontramos em Sevilha, ela compartilhou muito do que havia passado, e durante a viagem, ela revelou tudo o que havia vivido. Tornou-se um livro aberto. Eu sei que em minhas próprias experiências psicodélicas, sinto o mesmo. Fiquei profundamente triste e empático, pois nunca imaginei que todas aquelas coisas pudessem acontecer a alguém que eu conheço. Não entrarei em detalhes.
Ela chorou e me abraçou. Senti como se estivesse segurando em minhas mãos os pedaços de um vaso quebrado... tentando reunir todos os cacos e colocá-los juntos novamente...

O Cogumelo não deu tréguas. Ela era um barco num oceano enfurecido. E este se portava como se quisesse se vingar.

Neste momento apercebi-me que... provavelmente ela estaria a tomar algum medicamento tarja preta... e que não me disse com medo de eu não querer prosseguir... E assim seguiu por 2 longas horas... Ela acalmou-se e calou-se... Senti que estava a resolver as coisas na cabeça dela... Ela teve uma conversa com a mãe e afastei-me para ela ter esse espaço. Pelo que percebi a mãe e o bebe que perdeu estava agora juntos.

Quando o pior estava a passar ela entrou em uma fase de êxtase. Teria sido um alívio, mas isso significou ela despir-se toda e não conseguir ficar sentada. Dei-lhe água, dei-lhe comida e açúcar. Tinha perdido toda a inibição... e decoro. Urinou "diamantes" e resolveu masturbar-se. Já estava na fase caleidoscópica da experiência. Contou-me a vida sexual dela e como a abertura dela de algo puro, levou que o namorado na altura a levasse para as cenas dele que a faziam se sentir suja. E que naquele instante ela se sentia purificada e liberta.

Aquilo foi passando... e passando... e ela acalmou-se.

No dia seguinte era outra pessoa.

Eu me senti muito estranho por vários dias.
 
Quanto mais leio relatos por aqui, mais óbvio fica que o cogumelo entrega aquilo que a pessoa precisa. A trip pode ser ruim, mas a conclusão, o pós trip é benéfico (e aqui resisti à tentação para não escrever "sempre benéfico").

Da minha parte, quero muito ser um tripsitter profissional. Obrigado por compartilhar essa experiência.
 
Quanto mais leio relatos por aqui, mais óbvio fica que o cogumelo entrega aquilo que a pessoa precisa. A trip pode ser ruim, mas a conclusão, o pós trip é benéfico (e aqui resisti à tentação para não escrever "sempre benéfico").

Da minha parte, quero muito ser um tripsitter profissional. Obrigado por compartilhar essa experiência.

Embora entenda o valor de um tripsitter, sobretudo para quando se apresenta o enteógeno, pessoalmente não é algo que me atraia. São muitas horas e pode ser muito desgastante.
Se você, entretanto, é psicólogo ou psiquiatra... Terapeuta... E vai fazer isso profissionalmente, bem, aí é outra coisa.
 
Embora entenda o valor de um tripsitter, sobretudo para quando se apresenta o enteógeno, pessoalmente não é algo que me atraia. São muitas horas e pode ser muito desgastante.
Se você, entretanto, é psicólogo ou psiquiatra... Terapeuta... E vai fazer isso profissionalmente, bem, aí é outra coisa.
Sim, este é o meu caso, sou psicanalista.
 
@Sigillvm Dei meu amigo, que experiência mais maluca!

Primeiro, meus parabéns por saber se colocar à disposição e ser um porto seguro para sua amiga. São pouquíssimas as pessoas confiáveis numa situação dessas. Eu não sei se eu saberia encontrar o equilíbrio entre dar espaço o suficiente para a experiência da outra pessoa fluir e manter a pessoa segura e confortável. O trabalho interior pode ser extremamente desgastante mas ao mesmo tempo pode ser muito necessário e dar frutos muito importantes na vida de quem vive esse trabalho. É quase como um parto de si mesmo.

Espero que a sua amiga encontre paz e fique bem. Que experiência de vida pesada. As pessoas vivem dramas que não podemos imaginar muitas vezes, né?
 
@Sigillvm Dei meu amigo, que experiência mais maluca!

Primeiro, meus parabéns por saber se colocar à disposição e ser um porto seguro para sua amiga. São pouquíssimas as pessoas confiáveis numa situação dessas. Eu não sei se eu saberia encontrar o equilíbrio entre dar espaço o suficiente para a experiência da outra pessoa fluir e manter a pessoa segura e confortável. O trabalho interior pode ser extremamente desgastante mas ao mesmo tempo pode ser muito necessário e dar frutos muito importantes na vida de quem vive esse trabalho. É quase como um parto de si mesmo.

Espero que a sua amiga encontre paz e fique bem. Que experiência de vida pesada. As pessoas vivem dramas que não podemos imaginar muitas vezes, né?
Eu tinha a expectativa que aquilo fosse leve, uma tarde bem passada. Tinha levado um livro para ler e tudo se encaminhava por ela estar tranquila e no máximo perceber se ela estava a ter um momento maube atauar... e nem era uma dose a @Texugo que é acima do nível de herói! São por essas que é importante ter acompanhamento nas experiências.
 
Eu tinha a expectativa que aquilo fosse leve, uma tarde bem passada. Tinha levado um livro para ler e tudo se encaminhava por ela estar tranquila e no máximo perceber se ela estava a ter um momento maube atauar... e nem era uma dose a @Texugo que é acima do nível de herói! São por essas que é importante ter acompanhamento nas experiências.

Minhas doses são "tranquilas" agora.
As minhas primeiras eu daria muito mais trabalho que a sua amiga hahaha.

Na segunda trip eu tomei 5g, eu comecei a ficar desesperado e liguei para a minha namorada na época. Ela veio pra minha casa, que era apartamento.

Eu precisava descer abrir o portão, porque não lembrava como fazer pelo interfone.
Peguei qualquer roupa na frente (do cesto), quando ela me viu com calça ao contrário, camiseta toda suja e fedendo, imagino que tenha tido trabalho.
 
Minhas doses são "tranquilas" agora.
As minhas primeiras eu daria muito mais trabalho que a sua amiga hahaha.

Na segunda trip eu tomei 5g, eu comecei a ficar desesperado e liguei para a minha namorada na época. Ela veio pra minha casa, que era apartamento.

Eu precisava descer abrir o portão, porque não lembrava como fazer pelo interfone.
Peguei qualquer roupa na frente (do cesto), quando ela me viu com calça ao contrário, camiseta toda suja e fedendo, imagino que tenha tido trabalho.
rsrs... minha segunda também foi com 5 gramas, e tal como você, tive dificuldades enormes para vestir uma bermuda... para abrir uma simples porta levei uma eternidade, o reset mental foi profundo.
As experiências seguintes doses similares, mesmo perdendo o senso de ego, não me deixaram tão perdido quanto essa segunda experiência.
 
Ser um acompanhante de viagem psicodélica, ou "tripsitter", não é necessariamente a atividade mais divertida do mundo, e não é algo que eu faça com frequência. No entanto, neste caso específico, uma amiga de longa data pediu não apenas para ser apresentada ao universo enteógeno, mas também para que eu a acompanhasse durante o processo.

Conheci-a há muitos anos, nos tempos de escola. Quando decidi sair da minha zona de conforto e explorar outras oportunidades, descobri que ela também tinha seguido um caminho semelhante e retomamos o contato. Para quem já viveu a rotina de expatriado, sabe como é. Nos primeiros três anos, convivemos bastante, e ela me ajudou muito a me organizar. Ela conseguiu ingressar em um doutorado com bolsa de pesquisa na Finlândia, e eu comecei a trabalhar em outra empresa. Passamos alguns anos sem contato até que decidi sair do Facebook, e ela, vendo minha mensagem de despedida, entrou em contato comigo. Retomamos a amizade e acabamos nos encontrando em Londres, para onde ela havia se mudado.

A vida seguiu seu curso para ambos. Ela estava em um relacionamento e trabalhando em uma multinacional, enquanto eu tinha outras perspectivas. Acabei contando a ela tudo o que tinha vivido nos últimos anos, inclusive minha experiência com cogumelos. Ela já tinha experimentado várias substâncias, mas nunca cogumelos, e nunca com esse propósito. Ficou apenas na conversa, entre outros assuntos. Então veio a pandemia, e nos falamos por chamada de vídeo no início, mas depois perdemos contato novamente. Quando foi meu aniversário, ela me enviou uma mensagem com felicitações. Umas semanas passaram e como precisei ir ao Reino Unido a trabalho, lembrei de procurá-la em Londres. E, nossa, ela estava em frangalhos... Sua mãe havia morrido de câncer de pulmão grau IV, e ela não pôde se despedir por causa da COVID-19. Seu relacionamento, que parecia ir muito bem, escondia violência doméstica e outros problemas ainda mais sinistros. Tudo isso, somado à perda de uma gravidez, transformou uma pessoa cheia de alegria e luz em uma sombra de si mesma. Ela já havia tentado de tudo e estava pensando em suicídio, pois não conseguia lidar com tantas coisas acumuladas ao longo dos anos.

Admito, aconselhei-a a procurar um psicólogo antes de qualquer outra coisa. Enfatizei que os cogumelos não são uma solução mágica e que eu não sou um profissional de saúde mental. Mas no fim das contas, ela era minha amiga e precisava de ajuda. Se eu pudesse ajudá-la, faria isso; se não, pelo menos, passaríamos cinco dias de férias juntos, o que já seria um alívio para ela.Atualmente morando na Espanha, aproveitei cinco dias de folga após retornar da sede da empresa na Suíça e convidei-a para me encontrar em Sevilha, onde faríamos uma road trip. Caso ela quisesse embarcar em uma jornada interior também, eu levaria os cogumelos. Ela aceitou o convite e exploramos juntos alguns lugares que conhecia. No entanto, apesar de nossas conversas e de meus esforços para distraí-la e elevar seu ânimo, ela estava determinada a fazer a viagem psicodélica. Então, preparei algumas perguntas:
"O que você aprendeu sobre si mesma ou sobre a vida que poderia ser valioso para o seu futuro?" - Eu queria encorajá-la a explorar suas experiências internas, sentimentos e percepções durante a viagem, e possivelmente obter insights que pudessem ter um impacto positivo em sua vida.
"Qual é a conexão ou relação mais profunda que você sente com outras pessoas ou com o mundo ao seu redor?" - Eu desejava incentivá-la a explorar seus sentimentos de conexão e empatia, algo que muitas vezes é ampliado durante uma experiência psicodélica. Isso poderia ajudá-la a refletir sobre a importância das relações interpessoais e do seu lugar no mundo.
"Como você descreveria a natureza da realidade que está experienciando agora e o que isso pode lhe ensinar?" - A ideia era fazer com que ela explorasse suas percepções alteradas da realidade durante a experiência psicodélica e considerasse como essas percepções poderiam fornecer insights sobre si mesma, seus pensamentos e suas crenças.
"Se você pudesse levar consigo um único insight ou lição dessa experiência, qual seria e como isso poderia impactar a sua vida?" - O objetivo era fazer com que ela sintetizasse sua experiência psicodélica e identificasse algo significativo que pudesse ser aplicado à sua vida cotidiana.

Fiquei satisfeito ao encontrar um espaço adequado para a experiência; ela queria um local aberto e em contato com a natureza. Disse que estava cansada de estar em lugares fechados e sob luz artificial. Para quem vem do Brasil e enfrenta o inverno europeu, os ambientes fechados e a iluminação artificial não são nada agradáveis.
Lembrei-me do Peñón de Bernal, em Almeria. Embora fosse uma imagem minha bem elaborada, acredito que ela não percebeu. Talvez eu tenha sido um pouco rebuscado demais.
Encontramos o local perfeito, sob o calor do sol, e os únicos curiosos ao redor eram algumas raposas. Estendi uma toalha no chão e coloquei água e frutas à disposição.
Dei a ela 3,5 gramas dos cogumelos, em sua maioria chapéus. Os esporos que compartilhei com @SpiritualMind vieram deles.
Coloquei a playlist para tocar e ofereci os cogumelos com chocolate. Em 45 minutos, ela decolou. As próximas quatro horas foram de pânico.
Acho que o uso constante da mesma cepa, que sempre produzo da mesma maneira, me deu a ilusão de que saberia exactamente o que poderia acontecer. Estava errado. Essa é a arrogância perigosa de quem se sente muito confiante. Ela começou com imagens idílicas e logo enfrentou a tempestade de trevas que a atormentava.

O mostrengo que está no fim da mente
Na noite de breu ergueu-se a voar;
À roda da nau voou três vezes,
Voou três vezes a chiar,
E disse: «Quem é que ousou entrar
Nas minhas cavernas que não desvendo,
Meus tectos negros do fim do mundo?»
E o homem do leme tremendo

«Quem vem poder o que só eu posso,
Que moro onde nunca ninguém me visse
E escorro os medos do inconsciente?»
E o homem do leme tremeu.

Três vezes do leme as mãos ergueu,
Três vezes ao leme as reprendeu,
E mais que o mostrengo, que me a alma teme
E roda nas trevas do fim do mundo;
Manda a vontade, que me ata ao leme.

Como acompanhante da viagem, minha obrigação era mantê-la segura e apoiá-la nos momentos difíceis. Mas ela não estava apenas passando por momentos baixos; ela estava no abismo de sua existência.
Quando nos encontramos em Sevilha, ela compartilhou muito do que havia passado, e durante a viagem, ela revelou tudo o que havia vivido. Tornou-se um livro aberto. Eu sei que em minhas próprias experiências psicodélicas, sinto o mesmo. Fiquei profundamente triste e empático, pois nunca imaginei que todas aquelas coisas pudessem acontecer a alguém que eu conheço. Não entrarei em detalhes.
Ela chorou e me abraçou. Senti como se estivesse segurando em minhas mãos os pedaços de um vaso quebrado... tentando reunir todos os cacos e colocá-los juntos novamente...

O Cogumelo não deu tréguas. Ela era um barco num oceano enfurecido. E este se portava como se quisesse se vingar.

Neste momento apercebi-me que... provavelmente ela estaria a tomar algum medicamento tarja preta... e que não me disse com medo de eu não querer prosseguir... E assim seguiu por 2 longas horas... Ela acalmou-se e calou-se... Senti que estava a resolver as coisas na cabeça dela... Ela teve uma conversa com a mãe e afastei-me para ela ter esse espaço. Pelo que percebi a mãe e o bebe que perdeu estava agora juntos.

Quando o pior estava a passar ela entrou em uma fase de êxtase. Teria sido um alívio, mas isso significou ela despir-se toda e não conseguir ficar sentada. Dei-lhe água, dei-lhe comida e açúcar. Tinha perdido toda a inibição... e decoro. Urinou "diamantes" e resolveu masturbar-se. Já estava na fase caleidoscópica da experiência. Contou-me a vida sexual dela e como a abertura dela de algo puro, levou que o namorado na altura a levasse para as cenas dele que a faziam se sentir suja. E que naquele instante ela se sentia purificada e liberta.

Aquilo foi passando... e passando... e ela acalmou-se.

No dia seguinte era outra pessoa.

Eu me senti muito estranho por vários dias.
Estou fazendo isso nesse momento kkk, enquanto espero meu tripper entrar na sua viagem, espero que ocorra tudo bem
 
Ser um acompanhante de viagem psicodélica, ou "tripsitter", não é necessariamente a atividade mais divertida do mundo, e não é algo que eu faça com frequência. No entanto, neste caso específico, uma amiga de longa data pediu não apenas para ser apresentada ao universo enteógeno, mas também para que eu a acompanhasse durante o processo.

Conheci-a há muitos anos, nos tempos de escola. Quando decidi sair da minha zona de conforto e explorar outras oportunidades, descobri que ela também tinha seguido um caminho semelhante e retomamos o contato. Para quem já viveu a rotina de expatriado, sabe como é. Nos primeiros três anos, convivemos bastante, e ela me ajudou muito a me organizar. Ela conseguiu ingressar em um doutorado com bolsa de pesquisa na Finlândia, e eu comecei a trabalhar em outra empresa. Passamos alguns anos sem contato até que decidi sair do Facebook, e ela, vendo minha mensagem de despedida, entrou em contato comigo. Retomamos a amizade e acabamos nos encontrando em Londres, para onde ela havia se mudado.

A vida seguiu seu curso para ambos. Ela estava em um relacionamento e trabalhando em uma multinacional, enquanto eu tinha outras perspectivas. Acabei contando a ela tudo o que tinha vivido nos últimos anos, inclusive minha experiência com cogumelos. Ela já tinha experimentado várias substâncias, mas nunca cogumelos, e nunca com esse propósito. Ficou apenas na conversa, entre outros assuntos. Então veio a pandemia, e nos falamos por chamada de vídeo no início, mas depois perdemos contato novamente. Quando foi meu aniversário, ela me enviou uma mensagem com felicitações. Umas semanas passaram e como precisei ir ao Reino Unido a trabalho, lembrei de procurá-la em Londres. E, nossa, ela estava em frangalhos... Sua mãe havia morrido de câncer de pulmão grau IV, e ela não pôde se despedir por causa da COVID-19. Seu relacionamento, que parecia ir muito bem, escondia violência doméstica e outros problemas ainda mais sinistros. Tudo isso, somado à perda de uma gravidez, transformou uma pessoa cheia de alegria e luz em uma sombra de si mesma. Ela já havia tentado de tudo e estava pensando em suicídio, pois não conseguia lidar com tantas coisas acumuladas ao longo dos anos.

Admito, aconselhei-a a procurar um psicólogo antes de qualquer outra coisa. Enfatizei que os cogumelos não são uma solução mágica e que eu não sou um profissional de saúde mental. Mas no fim das contas, ela era minha amiga e precisava de ajuda. Se eu pudesse ajudá-la, faria isso; se não, pelo menos, passaríamos cinco dias de férias juntos, o que já seria um alívio para ela.Atualmente morando na Espanha, aproveitei cinco dias de folga após retornar da sede da empresa na Suíça e convidei-a para me encontrar em Sevilha, onde faríamos uma road trip. Caso ela quisesse embarcar em uma jornada interior também, eu levaria os cogumelos. Ela aceitou o convite e exploramos juntos alguns lugares que conhecia. No entanto, apesar de nossas conversas e de meus esforços para distraí-la e elevar seu ânimo, ela estava determinada a fazer a viagem psicodélica. Então, preparei algumas perguntas:
"O que você aprendeu sobre si mesma ou sobre a vida que poderia ser valioso para o seu futuro?" - Eu queria encorajá-la a explorar suas experiências internas, sentimentos e percepções durante a viagem, e possivelmente obter insights que pudessem ter um impacto positivo em sua vida.
"Qual é a conexão ou relação mais profunda que você sente com outras pessoas ou com o mundo ao seu redor?" - Eu desejava incentivá-la a explorar seus sentimentos de conexão e empatia, algo que muitas vezes é ampliado durante uma experiência psicodélica. Isso poderia ajudá-la a refletir sobre a importância das relações interpessoais e do seu lugar no mundo.
"Como você descreveria a natureza da realidade que está experienciando agora e o que isso pode lhe ensinar?" - A ideia era fazer com que ela explorasse suas percepções alteradas da realidade durante a experiência psicodélica e considerasse como essas percepções poderiam fornecer insights sobre si mesma, seus pensamentos e suas crenças.
"Se você pudesse levar consigo um único insight ou lição dessa experiência, qual seria e como isso poderia impactar a sua vida?" - O objetivo era fazer com que ela sintetizasse sua experiência psicodélica e identificasse algo significativo que pudesse ser aplicado à sua vida cotidiana.

Fiquei satisfeito ao encontrar um espaço adequado para a experiência; ela queria um local aberto e em contato com a natureza. Disse que estava cansada de estar em lugares fechados e sob luz artificial. Para quem vem do Brasil e enfrenta o inverno europeu, os ambientes fechados e a iluminação artificial não são nada agradáveis.
Lembrei-me do Peñón de Bernal, em Almeria. Embora fosse uma imagem minha bem elaborada, acredito que ela não percebeu. Talvez eu tenha sido um pouco rebuscado demais.
Encontramos o local perfeito, sob o calor do sol, e os únicos curiosos ao redor eram algumas raposas. Estendi uma toalha no chão e coloquei água e frutas à disposição.
Dei a ela 3,5 gramas dos cogumelos, em sua maioria chapéus. Os esporos que compartilhei com @SpiritualMind vieram deles.
Coloquei a playlist para tocar e ofereci os cogumelos com chocolate. Em 45 minutos, ela decolou. As próximas quatro horas foram de pânico.
Acho que o uso constante da mesma cepa, que sempre produzo da mesma maneira, me deu a ilusão de que saberia exactamente o que poderia acontecer. Estava errado. Essa é a arrogância perigosa de quem se sente muito confiante. Ela começou com imagens idílicas e logo enfrentou a tempestade de trevas que a atormentava.

O mostrengo que está no fim da mente
Na noite de breu ergueu-se a voar;
À roda da nau voou três vezes,
Voou três vezes a chiar,
E disse: «Quem é que ousou entrar
Nas minhas cavernas que não desvendo,
Meus tectos negros do fim do mundo?»
E o homem do leme tremendo

«Quem vem poder o que só eu posso,
Que moro onde nunca ninguém me visse
E escorro os medos do inconsciente?»
E o homem do leme tremeu.

Três vezes do leme as mãos ergueu,
Três vezes ao leme as reprendeu,
E mais que o mostrengo, que me a alma teme
E roda nas trevas do fim do mundo;
Manda a vontade, que me ata ao leme.

Como acompanhante da viagem, minha obrigação era mantê-la segura e apoiá-la nos momentos difíceis. Mas ela não estava apenas passando por momentos baixos; ela estava no abismo de sua existência.
Quando nos encontramos em Sevilha, ela compartilhou muito do que havia passado, e durante a viagem, ela revelou tudo o que havia vivido. Tornou-se um livro aberto. Eu sei que em minhas próprias experiências psicodélicas, sinto o mesmo. Fiquei profundamente triste e empático, pois nunca imaginei que todas aquelas coisas pudessem acontecer a alguém que eu conheço. Não entrarei em detalhes.
Ela chorou e me abraçou. Senti como se estivesse segurando em minhas mãos os pedaços de um vaso quebrado... tentando reunir todos os cacos e colocá-los juntos novamente...

O Cogumelo não deu tréguas. Ela era um barco num oceano enfurecido. E este se portava como se quisesse se vingar.

Neste momento apercebi-me que... provavelmente ela estaria a tomar algum medicamento tarja preta... e que não me disse com medo de eu não querer prosseguir... E assim seguiu por 2 longas horas... Ela acalmou-se e calou-se... Senti que estava a resolver as coisas na cabeça dela... Ela teve uma conversa com a mãe e afastei-me para ela ter esse espaço. Pelo que percebi a mãe e o bebe que perdeu estava agora juntos.

Quando o pior estava a passar ela entrou em uma fase de êxtase. Teria sido um alívio, mas isso significou ela despir-se toda e não conseguir ficar sentada. Dei-lhe água, dei-lhe comida e açúcar. Tinha perdido toda a inibição... e decoro. Urinou "diamantes" e resolveu masturbar-se. Já estava na fase caleidoscópica da experiência. Contou-me a vida sexual dela e como a abertura dela de algo puro, levou que o namorado na altura a levasse para as cenas dele que a faziam se sentir suja. E que naquele instante ela se sentia purificada e liberta.

Aquilo foi passando... e passando... e ela acalmou-se.

No dia seguinte era outra pessoa.

Eu me senti muito estranho por vários dias.
tive varias experiências como trippsitter, e sempre me dei bem para manter o bem estar dessas pessoas, é uma das coisas que me dão orgulho na vida
 
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