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Equinócio de Outono no ano de 2007.

Sigillvm Dei

Esporo
Membro Ativo
03/10/2022
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Este é um resumo do meu primeiro contato com esse mundo.

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Eram umas seis, e após uma bem passada tarde a percorrer sendas, montes e vales, acabei por parar no Café Fantasia devido a um improvável convite já algum tempo feito. Era Equinócio de Outono do longínquo ano de 2007. Uma atmosfera muito agradável preenchia aquele espaço sem existência fiscal, mas com plena existência real. Talvez umas 12 pessoas preenchiam os espaços das duas salas que eram o todo do café. A lareira adornada com a cabeça de uma deusa provia um calor tépido - sabe, não posso aquecer demais - dizia Anne, uma senhora Alemã entre copos de licores e elixir que ela confecionava - Já a tive de refazer duas vezes, ela não gosta de muito calor. Percebi a pequena rachadura na cruz egípcia que adornava a cabeça da deusa. Pedi um licor de castanha e sentei-me numa pequena mesa com uma vista para a serra.

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Ainda hoje não sei o nome daquele homem que quando se apresentava, apresentava-se como Oberon. Se era um apelido ou o nome verdadeiro, ainda não sei verdadeiramente dizer. Com um Português sofrível, um sotaque indelével e uma fisionomia esguia, não era propriamente uma pessoa fácil de encontrar. Vivia na floresta. Onde? Muitos poucos sabiam. Surgia de quando a quando por aquelas bandas. Era totalmente avesso a babilônia, ou seja, qualquer coisa que ficava abaixo daquela aldeia cravada nas montanhas. Ele entrou sem deixar-se que não se notasse. Um certo respeito ou admiração se espalhava nos rostos dos presentes tal como a luz das pequenas velas nas mesas.

Já fazia mais de dois anos que havia ouvido o relato sobre os equinócios naquele lugar. Quem me relatou tinha uma aura completamente diferente das vezes anteriores que tínhamos conversado. De fato, o que se encontrava naquele lugar era algo muito diferente de qualquer outra coisa. Mas ficou por uma conversa. As vezes as pessoas não querem transformar um lugar especial na Disneylândia. Entendi isso depois pois fiz o mesmo. Lembram-se das regras do clube da luta? Mas aquilo ficou na minha cabeça por muito tempo...Teria de encontrar o caminho por mim próprio.

Uns meses antes havia de fato encontrado o lugar... fisicamente. Não era propriamente fácil ou rápido chegar. E mesmo quando se encontrava fisicamente não era certo que realmente encontrava-se. Lembrou-me uma placa que havia visto quando criança e que fazia todo o sentido naquele contexto - Abrimos cuando llegamos, cerramos cuando nos vamos y si vienes y no estamos, es que no coincidimos. É uma questão de sincronicidade e as vezes as coisas só surgem quando se está pronto e não quando se quer. Numa certa tarde, contra toda a previsibilidade, dentro de um trem a voltar para casa, pus-me a falar com o passageiro ao lado sobre temas que me agradavam na altura e a ele também por conta do livro que estava a ler. No fim vim a descobrir que ele vivia naquela aldeia e veio o convite para a noite de equinócio.

Uma tarde sozinho a caminhar. A pensar na minha vida. E estava lá naquele fim de tarde.

Não há sinal de telefone. Nada. Não consegui avisar que havia chegado. Só me restava esperar. Um frio repentino surgiu, a pequena porta abriu-se e entraram efusivamente algumas pessoas. Entre elas a pessoa que havia conhecido no trem - Você veio! - Exclamou ele a esticar os braços e vir em minha direção - Por aqui, por aqui - sai da minha mesa onde os dourados raios de um por do sol se esticavam preguiçosamente e fomos para a sala maior.

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Anne, a senhora que servia os licores era a dona. E também era pintora. As paredes estavam forradas de pinturas dela. Uma pintura, particularmente, chamou-me a atenção. Era uma pradaria com lindas montanhas ao fundo e vaquinhas a pastar. - A Anne tinha pintado aquilo no verão quando esteve na Suiça.

Uma menina de rastas ruivas estava em cima de um patamar que dividia a sala horizontalmente. Afinava uma harpa com um diapasão enquanto eu era apresentado ao Oberon. Era um homem de poucas palavras. Fez-me algumas perguntas enquanto quem me havia convidado animadamente apresentava-me. - Quinze. Quinze? Perguntei eu. - Quinze - repetiu ele e nada mais. O meu anfitrião a ver a minha dúvida sussurrou-me - São 15 karatz. O que não foi de grande ajuda também. Não houve tempo de perguntar. Ele puxou-me para o canto, para um sofá ao lado de uma menina. - Esta é a Mariana - disse-me ele - também é a primeira vez que vem cá. Um pequeno sorriso e ele continuou - Bem, o importante é vocês terem calma, lembrem-se, NÃO ENTREM EM PÂNICO, isso dura umas 5 horas. A cada hora vamos tocar um sino com o número de horas já passadas. Se sentirem que precisam de ajuda, peçam. Eu vou estar sóbrio. Relaxem e aproveitem. Não lutem contra a vossa mente. Aceitem e também deixem ir.

Ele levantou-se e passado uns minutos chamou-nos. O Oberon estava a fracionar os cogumelos numa pequena balança de metal dourada. Ele contava sementes que depois vim a saber que era de alfarroba. 15 sementes de um lado e o respectivo em cogumelos do outro. Colocou numa xícara na qual adicionou mel e um pau de alcaçuz. Voltei para o meu lugar, mastiguei e engoli aquilo. O pau de alcaçuz ajuda a mascarar o sabor. O meu anfitrião e a minha colega de viagens voltaram também. Ele trouxe-nos uma jarra com água.

A menina das rastas ruivas começou a tocar harpa. Eu estava a espera que aquilo fizesse efeito e estava quase a cada instante quase a testar se percebia algum efeito. Resolvi relaxar. Fechei os olhos e coloquei a cabeça para trás. Um calor começou a surgir . Abri os olhos. A primeira coisa que percebi é que estava num mundo de cores vivas. A sala parecia mais laranja. E a música da harpa... Cada uma das notas eram cores. Eu não via as cores, sentia as cores da música.

Já não estava na sala. Eu era a sala. Levantei. Sentei no chão. Senti o fulgor brilhante do fogo. A chama largava raios que atravessavam as paredes em direção ao infinito. Eu era a chama, eu era o infinito.. Fechei os olhos, e estava com o meu avô que havia falecido a uns anos. Ele estava novamente de pé a tratar do seu jardim. E o jardim era de flores de cores indescritíveis. E ele acenou-me. E eu acenei. E eu me via a acenar. Eu era ele. Abri os olhos. Estava a rir. E outras pessoas estavam a rir. Deitei-me no chão e vi o teto. E vi as pessoas que construiram o teto. O teto era atravessado por um barrote de madeira. E eu era o barrote. E era a árvore. E eu voltei no tempo. A árvore decrescia. E voltava a semente e a semente voltava ao nada. Eu era nada. E tive pânico. Estava imobilizado. Não sabai o que fazer e foi quando me assustei que poderia ficar assim para sempre. Lembrei que tinha de relaxar e não entrar em pânico. Concentrei-me na música da harpa. E fui voltando. Abri os olhos. Estava a me sentir esperançoso novamente. Voltei-me para trás e estava o quadro da paisagem com as vaquinhas. Eu entrei no quadro, era a vaquinha, era a relva. Chorei. Ri. Meu anfitrião trouxe-me água. Bebi e pedi mais. E depois tive de ir ao banheiro. Urinei diamantes. Fui levado a um mundo caleidoscópico.

Saí um bocado. Vi a lua e as estrelas. Naquele lugar, no meio do monte, e sem cidades próximas havia céus estrelados incríveis naturalmente. Mas aquele ceu foi elevando a todo um novo nível.

Fui levado para dentro. Voltei a sentar, fechei os olhos. Vivi outras coisas que aconteceram, mas não consigo colocar em palavras...

E toda a experiência durou espaço, pois o espaço é a cristalização do tempo.

E foi passando.... e passando... E já era madrugada. Sentia uma aura de alegria a minha volta. Algumas pessoas riam, choravam. Resolvi apenas relaxar e deixar o restante fluir. Acabei por adormecer levemente.

Mudei de sala e sentei-me numa mesa com outras pessoas. Eu não sei o nome de nenhum deles. Mas parecíamos amigos a séculos e séculos. E foi até sentir o amanhecer, e me soube muito bem ver novamente o sol a entrar por uma janela. Aquela manhã sabia diferente. Sabia a ser elevado a um outro universo e voltado.

Naquela casa de xisto na montanha viajei pelo universo.

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