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A Cabala - Século XII d.C

Mahasamādhi

Gnossos Papadopoulis
Membro Ativo
09/09/2010
310
55
Em árabe é Kabbalah. Em espanhol e português, Cabbala ou Cabala. Existe ainda a forma Quabala. Num livro dedicado a livros, não se trata exatamente de um livro. De qualquer modo, a grande maioria das pessoas influenciadas pela Cabala - e que dificilmente têm consciência disso -, quando pensa nela, pensa num livro. Vou segui essa corrente, portanto, chamando-a de livro. Afinal de contas, se eu a tivesse listado como Zohar, ou sob o título de um dos livros mais obscuros, como o crucial Livro Bahir, considerado a versão da Cabala em forma escrita, dificilmente alguém saberia do que eu estava falando.


A Cabala, embora conhecida apenas pelos devotos ou, paradoxalmente, por aqueles que não entenderam do que se trata, tem exercido uma incalculável e especial influência sobre todos nós. Isso porque ela é uma incrível concentração de pensamentos e sentimentos por trás de tantas realizações levadas a cabo no mundo. Pode ser até que devamos à Cabala o que sobrou de bom num mundo ganancioso e corrupto. É claro que uma afirmação como essa não pode ser provada. E mais: ninguém que dissesse uma coisa dessas estaria interessado em provas, pois é essencial para o pensamento cabalístico que alguma coisa seja aceita simplesmente por confiarmos nela. Tudo precisa ser uma questão de convicção interna.


A palavra Cabala significa literalmente aquilo que é recebido e, consequentemente, tradição. Por volta do fim do século XII da nossa era, desenvolveu-se no sul da frança uma tradição mística judaica, o corpo de uma doutrina ambígua e complexa que existia fora do Pentateuco, a lei escrita judaica. Uma vez que se desenvolveu paralelamente à heresia gnóstica do catearismo, é válido acreditar, embora evidências sejam poucas, que houve algumas conexões entre estudiosos judeus e cristãos. Todas as religiões – maiores ou menores – têm sua forma mística. A própria palavra misticismo tem duas implicações: primeira, um ímpeto de conhecer o Divino pelo lado de dentro, ter conhecimento íntimo disso e estar consciente disso no nível da experiência pessoal, conhecer Deus diretamente, e segunda, transmitir essa informação apenas aos iniciados.


O homem responsável pelo que sabemos desse vasto, complexo e aparentemente enigmático fenômeno é o estudioso israelense nascido em Berlim, Gershom Scholem (1897-1982). Praticamente sozinho, ele criou o campo moderno dos estudos acadêmicos do misticismo judeu. Ao fazer isso mudou nossa percepção a essência do judaísmo. No século XIX, o judaísmo era considerado por seus líderes uma religião racional baseada na lei. Scholem era um pacifista consciencioso que rompeu com Martin Buber por conta daquilo em que acreditava. Mas não era um místico nem um misticista. Ainda assim, provou que o misticismo foi e continua sendo uma força vital na história judaica. Toda a vitalidade que demonstrou não teria lugar na filosofia judaica e na doutrina pública sem sua desafiante energia e sua, eventualmente, extasiada irracionalidade. Acreditava que o falsos messias – o mais famoso deles foi Sabbatai Sevi (1626-1676) – apresentavam desafios cabalísticos. O livro de Scholem, Sabbatai Sevi (1973), é uma das obras mais excitantes e cruciais do século XX e pode-se dizer que, de certa forma, suas raízes estejam no extraordinário fenômeno da Cabala.


Sholem se impôs a obrigação de explicar o livro (Sefer) Bahir e o Sefer Yetsirah, embora se dissesse que teriam sido produzidos entre 200 a.C e 200 d.C, sendo portanto muito antigos e de grande autoridade, eram, de fato, pseudopigráficos, escritos muito depois das datas aludidas. O mais antigo, o Yetsirah, não foi escrito antes do sexto século da nossa era. Sholem apresentou provas de que Bahir (em hebraico, brilhante) fora escrito no século XII, embora contivesse antigas idéias orientais, vindas diretamente do gnosticismo. É em Bahir que encontramos a primeira referência, na literatura judaica, da transmigração das almas. Há também no livro uma insinuação de sefirot, a importantíssima noção que está na base da verdadeira essência da Cabala e que, de certa forma, foi elaborada no Yetsirah. Em seu livro As Grandes Correntes (publicado em 1914 e posteriormente revisado) Scholem aponta algumas coisas interessantes. Segundo ele, enquanto o cabalismo foi ignorado por judeus racionalistas do século passado, vários cristãos como A.E.Waite tentaram interpretá-lo corretamente, mas seu discernimento havia sido inibido pela ausência de “todo o senso crítico em relação aos...dados históricos”. Por isso “fracassaram completamente quando tiveram que lidar com problemas que desafiavam os fatos”. Ainda assim, os trabalhos desses autores cristãos continuam sendo publicados e tidos como oficiais por muitos mais leitores do que os que conhecem o trabalho de Scholem!


Portanto, por causa do fluxo de lixo (ou, pelo menos no caso de Waite, da falsa especulação histórica), emanou dos inicialmente bem-intencionados – mas condenados ao fracasso – estudos do fim do século passado uma séria confusão sobre o significado da palavra Cabala. Todas essas especulações culminaram também no que Scholem classificou como a “farsa colorida” do tolo e convencido pseudomágico Aleister Crowley. Mas o que, enfim, é a Cabala? Para muitos, ela é uma espécie de cerimonial mágico, às vezes, como acontecia com Crowley, obscuro, desagradável e até mesmo tolo. Apenas para uma pequena minoria, fora de certos círculos íntimos, ela é uma das mais complexas e maravilhosas buscas da verdadeira experiência mística, da autoperfeição de um objetivo conhecimento do criador, que não implica autoridade, muito pelo contrário. Além disso, tem sua própria cosmologia, que é única.


A Cabala é a versão judaica do gnosticismo representado aqui neste livro pelo Evangelho Da Verdade. E a Cabala, a secreta e enlevada especulação de um povo oprimido, contribuiu muito para certas formas modernas de gnosticismo, como o Existencialismo de Sartre, por exemplo. O sistema de Gurdjieff difere do de Rudolf Steiner, pelo que o sistema do russo deve à Cabala. Para ser justo, é preciso que eu acrescente aqui organizações como a Hermética Ordem da Aurora Dourada (da qual não somente Waite, mas o poeta W.B.Yeats foram membros) não eram verdadeiramente cabalísticas. Por outro lado, não eram pretensiosas, vulgares e maldosas como o lixo idealizado pelo não totalmente despido de talento, embora patético Alesteir Crowley. Este queria ser um mestre da magia negra e chegou a afirmar que havia transformado um vendedor de livros num camelo.


O mais importante dos livros cabalísticos é o Zohar, que quer dizer esplendor em hebraico. Houve uma época em que foi igualado a bíblia e ao Talmud. Scholem provou que ele foi escrito pelo cabalista espanhol Moses de Leon (1250-1305), que viveu em Guadalajara, e depois de 1290, em Ávila. O livro, em si mesmo, apesar da sua pretensão, não tem nada de antigo. Na verdade, o próprio cabalismo tem suas origens não apenas nas influências místicas dos textos judaicos verdadeiramente antigos (até que ponto não sabemos) como também nas formulações dos judeus que viviam em Provence no século XII. Essas formulações expandiram o que foi literalmente um novo modo de pensar sobre a vida e o seu significado. O Zohar, escrito por Moses de Leon num aramaico artificial e literário, imita o que o autor pensava ser a língua viva do povo do século II d.C. O trabalho só pode ser descrito como uma espécie de ficção mística, cujo objetivo é comentar a bíblia. Vai de passagens extraordinariamente brilhantes para outras de um tédio insuportável. Ambientado na Palestina do século II, relata as peregrinações do rabino Simeon bem Yohai e seu filho Eleazar, enquanto discutem os significados da vida e da morte. Mostra ainda as influências do neoplatonismo de Plotino, bem como as do pensamento cabalístico da sua era.


Na parte central do pensamento cabalístico está o sefiroth (números). Trata-se da representação cabalística da Criação. Essencial para ela, entretanto, é o fato da incogniscibilidade de Deus. Muitos dos leitores já devem ter deparado com os diagramas do sefiroth, como uma árvore simbólica mostrando as faces ocultas de Deus e apresentando também as linhas divinas no homem. De acordo com o cabalista palestino Isaac Luria (1534-1572), a Criação só foi possível porque um inefável criador, num ato chamado Tzimtzum, retirou-se de si mesmo, causando assim uma catástrofe conhecida como a quebra dos vasos. Isso permitiu que a luz da Criação se espalhasse e centelhas atingissem esferas cada vez mais inferiores, possibilitando assim a criação do Mal e da Vida. Encontramos algo similar na antiga heresia maniqueísta. No cabalismo de Luria, o propósito da existência é o tikkun, ou seja, a restauração: todas as centelhas (almas) caídas nas esferas inferiores devem retornar ao seu lugar de origem. Isso, por seu turno, envolve não só a noção do gilgul , ou seja, o fenômeno da transmigração das almas, como também uma doutrina curiosamente aparentada com o karma oriental. Para cada ato humano o homem pode preencher um papel redentor.


As complexidades e obscuridades do cabalismo, em princípio, parecem imensas, mas, vistas tanto emocional como intelectualmente e à luz de outras doutrinas, podem ser simplificadas. Um especialista do século XIX apontou que Tzimtzum é a única tentativa série de explicar a criação de alguma coisa do nada – um tema geralmente evitado até mesmo por filósofos cristãos. Isso, com todas as suas ramificações e do modo como foi tratado por cabalistas posteriores, é, sem dúvida, uma profunda concepção.


Poderíamos escrever infinitamente sobre a Cabala, que é uma obra viva. Acho justo chamá-la de livro – embora se trate de uma série de livros e os mais importantes tenham sido discutidos aqui, já que não iniciados não podem entrar em contato com a Cabala sem ler pelo menos suas exegeses. Não é irrelevante o fato de ela ter sido tema de um filme: Uma Estranha Entre Nós (1992) , de Sidney Lumet. O filme, em si, é um guia ambíguo, mas a produção deve ter mandado alguém estudar a verdadeira Cabala. E, afinal de contas, a Cabala é ensinada na internet, e não apenas por um pequeno grupo de pessoas. Mas ainda está para ser dito o que ela poderia nos ensinar, na sua forma contemporânea e acessível, caso nós os permitíssemos.


A cosmologia contida nos símbolos do sefiroth e no Tzimtzum de Lura antecipa todas as descobertas dos físicos modernos e o que mais há por vir. Faz isso, porém, de uma forma emotiva. Já os modernos cientitas ateístas tendem a tratar tais temas, como a criação da própria vida ou as leis da natureza, como se elas apenas pudessem ser compreendidos intelectualmente. É certo que o intelecto desempenha sua parte no nosso conhecimento – mas, abordado apenas à luz da razão, nossa visão da existência se torna distorcida e pobre. Os impulsos por trás das grandes religiões também foram reduzidos ao absurdo; frequentemente cristalizados em seus verdadeiros opostos. Os cristãos queimaram gente em nome da sua fé, e os maometanos, ainda hoje, vão de encontro aos seus próprios preceitos em nome da sua crença. E tal comportamento não é absolutamente desconhecido entre os judeus. Scholem, que não era um cabalista, mas um consciencioso e impecável estudioso do cabalismo, desesperava-se tristemente com a atitude dos israelenses em relação aos árabes. Os próprios cabalistas erraram ao se demonstrarem superintelectualizados, supertortuosos, arrogantes...Mas o cabalismo permanece vivo e resistente. Ensina que o homem pode se aperfeiçoar ou que, pelo menos, existe uma caminho para a perfeição. O Universo, como um todo, e todas as suas partes estão permeados pela energia do seu criador. Tudo o que nós, ordinários seres humanos, conhecemos são nossas próprias reações à realidade, mas não a realidade. Não sentimos objetos ou entidades – tais como o amor - em si mesmos, mas somente nossas reações a eles. A afinidade com as várias formas de budismo é óbvia.


Cabalistas modernos contam uma fábula exemplar. Um homem bondoso é atingido pelo infortúnio. Sua mulher morre, seus filhos morrem, ele perde a propriedade e finalmente morre de desgosto. Seu caso está sendo estudado pela mais alta corte. “O que podemos dar a uma alma tão sofredora? A corte decide lhe dar o seguinte: a sensação de que está vivo e de que pode gozar de tudo o que tem. Os zelosos e diligentes funcionários públicos que nos atormentam, os advogados injustos, os super-rigorosos burocratas, os que abusam da religião que professam, os usurários, os opressores do povo, todos eles, não se sentem vivos; não se sentem parte da criação e não são gratos por existir. O cabalista, porém, desponta do meio disso tudo e vê as coisas como elas são. Ele ou ela, no entanto, precisam ter, acima de tudo, a humildade e a paixão pela verdade.


Fonte: Os 100 Livros Que Mais Influenciaram A Humanidade (Martin Seymour Smith)
 
Última edição:

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O tema cabala é interessante, @Thiaguera.

Mas esse texto parece mais interessado em dividir, acusar outros e reivindicar espaço do que informar ...
 
dizer a verdade eu nem li, viu... cansei de estudar esses assuntos e não chegar nem perto do que aprendi em apenas uma aula dos Golden Teacher, dos Mexican, dos Guararemensis... essas sim são lições da verdadeira Cabala de Expansão da Consciência. Mas achei a postagem válida, tem quem nem tem ideia do que se trata. :homenvelho
 
O tema cabala é interessante, @Thiaguera.

Mas esse texto parece mais interessado em dividir, acusar outros e reivindicar espaço do que informar ...

Salve @Ecuador , de pleno acordo com a sua mensagem.

Quem se interessar pela leitura da obra, faço do Ecuador as minhas palavras. O autor se mostra em quase todas as análises disposto a criticar de forma sarcástica as obras que ele considera as mais influentes. Fica evidente o seu profundo conhecimento de literatura, mais em alguns momentos também achava desnecessário ele pegar tão pesado. Mas existem informações interessantes.

dizer a verdade eu nem li, viu... cansei de estudar esses assuntos e não chegar nem perto do que aprendi em apenas uma aula dos Golden Teacher, dos Mexican, dos Guararemensis... essas sim são lições da verdadeira Cabala de Expansão da Consciência. Mas achei a postagem válida, tem quem nem tem ideia do que se trata. :homenvelho

Grande @AshtarSherry , não tenho dúvidas que a aula que você teve com os mágicos foram profundas lições irmão. O Timothy Leary quando comeu alguns cogumelos no México afirmou que em 4 horas aprendeu mais sobre si mesmo do que em décadas como estudante dedicado de psicologia.

Amigos, de maneira alguma postei o texto para provocar discórdia ou algo do tipo. Eu amo esse espaço demais! :)
 
Salve irmãos, satisfação poder participar da conversa, sou novo no fórum, acompanho muitas coisas por aqui e sou muito grato por todos! Sou Thiago e é um grande prazer poder contribuir com algo!
Vou me limitar a não expressar minhas opiniões pessoais pois não os obrigaria a isso, mas como todos sabem existe uma profunda ligação entre o judaísmo, consequentemente a kabbalah e o cristianismo. Para quem tem curiosidade em relacionar esses temas com as experiências shamanicas como o uso de cubensis. Recomendo a pesquisa de um autor chamado John Marco allegro é um livro chamado O cogumelo sagrado e a Cruz. Bem como assistirem a esse documentário no YouTube
View: https://m.youtube.com/watch?v=8hqVrODJFE0


Um grande salve a todos!
 
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