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Cubensis de Ano Novo - Dia de Reis

PedroK

Hifa
Cadastrado
29/10/2019
9
12
Caros amigos,
Gostaria inicialmente de agradecer a todos que contribuem para a conteúdo deste fórum. Tenho lido muito coisa e achado muita referência útil ao meu aprendizado.
Pensei muito se deveria postar um texto tão longo. Eu sempre acabo escrevendo muito. Mas dois pensamentos me convenceram: 1 - foi uma das melhores experiência da minha vida e, como sou novato nos cogumelos, estava curioso para saber a opinião dos mais experientes; 2 - a expectativa de ser um texto útil para quem está começando sua busca espiritual, como forma de retribuir o que tenho aprendido com o fórum.
Então aí vai:

----

Experiência feita no Sábado, 4 de janeiro de 2020.

Há uns dias decidi que esse sábado seria o dia. Já tinha feito quatro experiências com doses mais baixas e me sentia seguro para continuar. Com doses mais baixas, aprendi que sou bastante sensível à substância. Com apenas 500mg de cogumelos secos, tive efeitos visuais bastante intensos. Minha experiência mais recente tinha sido de 1,5g, que tinha me dado insights interessantes. Decidi testar com 2,5g nessa minha quinta experiência com o Cubensis. Meu objetivo é autoconhecimento e espiritualidade.


Preparação

Sei que o jejum costuma ser usado para intensificar experiências espirituais. Então, dois dias antes, comecei a preparação. Fiz um dia de desintoxicação na quinta-feira, com alimentação à base de frutas. Na sexta-feira mantive alimentação mínima (água, quantidade minúscula de frutas e 2 biscoitos cream cracker), e as últimas 12 horas antes do chá foram de jejum total. Abstinência sexual dois dias antes é uma prática que conheci no Santo Daime, e eu resolvi adotar também.

Decidi fazer sozinho no meu escritório, que fica perto do endereço onde eu moro. Minha mulher não gostou muito, mas eu sabia que era a melhor opção. E realmente foi. Em experimentos anteriores, sob o efeito dos cogumelos, fico muito sensível aos sentimentos dela. Ela fica apreensiva com esse tipo de experiência, eu sinto a insegurança dela, e isso atrapalha demais a viagem. Qualquer movimento dela ou mudança de respiração que indique preocupação me tira da viagem.

Preparei o ambiente com um colchonete no chão e um cobertor, coloquei a caixa de som ao meu lado, celular no modo avião, desliguei o interfone, tudo para garantir que não houvesse interrupções. Era um dia de chuva e vento, então fechei todas as portas para que eu não tomasse um susto durante a viagem, com alguma porta batendo. Eu tinha em meu celular a playlist dos experimentos com psilocibina da Universidade Johns Hopkins. No dia anterior, eu já tinha feito o download da playlist para não precisar conectar à internet durante a experiência. Tinha também baixado um álbum de mantras do Krishna Das.

Procurei fazer o chá praticando Atenção Plena (Mindfulness) para já ir entrando no estado mental correto. Usei 2,5g cogumelos secos triturados – devidamente pesados –, com uns 200ml de água quase fervendo, e depois acrescentei mel. Comi três fatias de gengibre enquanto esperava a água quente fazer seu trabalho, e mais três fatias depois de tomar o chá, para evitar enjoo, o que já tinha funcionado maravilhosamente bem das outras vezes. Algumas partes maiores do cogumelo ficaram boiando no chá. Tirei-as com uma colher e ia descartá-las, mas depois de tomar o chá, decidi mastigar vagarosamente essas partes. Nada foi descartado. O motivo de pensar em descartá-las foi a preocupação com o enjoo. Depois da péssima experiência recente que tive com o Santo Daime, vomitando até a alma e passando muito mal durante toda a sessão, fiquei meio traumatizado. Como nas primeiras vezes com o cogumelo eu senti algum enjoo, o medo de passar mal sempre fica rondando. Tomo cuidado especial com isso. Por isso o gengibre. Por isso o cogumelo triturado. Por isso mastigar bem.

O chá foi tomado às 11h15. Fiz uma oração em seguida, na postura de reverência semelhante à usada em práticas budistas, de joelhos, testa no chão e mãos unidas à frente da cabeça. O mais importante da postura é o sentimento associado a ela. Essa postura tem a intenção de evocar sentimentos de entrega, humildade, reverência. Considerei isso uma preparação importante, pois já tinha lido a respeito da necessidade de se entregar à experiência sem restrições. Nessa oração eu deixo claro que estou disposto a aceitar qualquer ensinamento que vier, não sou eu que escolho. Assumo a intenção de tratar a experiência com o máximo de responsabilidade e de usá-la para o meu aprimoramento pessoal e o de outras pessoas. Falo de meus medos (do enjoo, de novo) e peço compreensão quanto às minhas limitações. Peço que a viagem seja profunda e agradável, e prometo me esforçar para tirar o máximo proveito dela.

Coloquei o álbum do Krishna Das para tocar. Ouvi uns três mantras e resolvi mudar para a playlist da Johns Hopkins. Ouvi um pouco da primeira música, mas achei lenta demais, passei para a próxima, e surpresa! Sem querer, eu tinha selecionado a reprodução aleatória e começou a tocar uma música do final da playlist, uma que eu nunca tinha ouvido. A essa altura, eu já sentia alguns efeitos do cogumelo – leve formigamento no corpo e a mente acelerando – e não consegui entender direito o que estava acontecendo. Achei que a playlist era só instrumental e aquela música cantada em inglês – e sem instrumentos – me pegou no susto. A potência das vozes provocou um arrepio no corpo todo e fui tomado por uma energia absurda, subindo dos pés à cabeça. Meu olhos se encheram de lágrimas na mesma hora, diante de tamanha sensação de força. Olhei nome da música: Rei dos Reis. Era perfeito! Era antevéspera do Dia de Reis (6 de janeiro). Um evento que senti como pura sincronicidade. A música pedia: “Deus Todo-Poderoso, revele-se! Revele-se! Revele-se!” Uau! Essa era A MÚSICA! Senti que tinha que dançar. Era a coisa certa a se fazer diante de tanta energia. Senti que se eu não dançasse, aquilo ia se tornar mais do que eu podia suportar. O corpo precisava participar junto com a mente. Comecei a me mexer ao ritmo da música, de olhos fechados, batendo com força os pés no chão e me senti parte de um ritual tribal africano, dançando com outros homens, numa invocação do poder divino! Repeti a música umas três vezes até que o corpo não aguentou mais. Eu tremia muito. Desliguei o som, deitei e cobri os olhos com um pano.


Início da viagem

Descrever o que se passou a partir daqui é aquela parte difícil. Alguém descreveu esse início de viagem como o lançamento de um foguete. É uma boa descrição. É turbulento, intenso, tudo vibra muito, há uma sensação de extrema energia. É o ponto da viagem onde pode-se ter que lidar com uma série de medos. Medo de morrer, de enlouquecer, de sentir dor, de ficar sem ar. Eu sabia que o truque era a entrega total à experiência. Não resistir. É aqui que eu acredito que a prática de meditação me ajuda muito. Eu esbarro em alguns desses medos, sei que eles estão lá, mas os deixo de lado e a viagem segue. É como se estivesse viajando de trem em alta velocidade e os medos aparecessem vez ou outra na janela. Se eu ficar muito tempo olhando para o medo na janela, o maquinista – a mente, que é super atenta aos meus interesses – tenta frear o trem pra eu continuar olhando, e isso gera tensão. O trem freando é o que gera o mal-estar. Uma tremenda força empurrando aquela máquina pra frente e outra tremenda força para fazê-la parar. Duas forças em conflito. Um desgaste imenso e desnecessário. Reconheça o medo e deixe-o de lado, que o trem volta a fluir. É apenas uma paisagem na janela como outra qualquer. Isso eu aprendi com a prática de meditação.


Perda do corpo e a luz branca

A vibração continuou por um tempo que não consigo dimensionar. Aqui perdi a percepção de tempo completamente. Em certo momento, surgiu a imagem de uma cobra, e a cobra era eu, e eu estava trocando de pele. E a pele que ia sendo retirada da cobra era meu corpo que ia sendo desintegrado por minúsculas brasas que corriam por ele. Como quando se queima uma folha de papel, e após apagar a chama, as brasas ficam correndo pelo papel já escurecido. Aquilo acontecia no meu corpo todo. Lembro do som de crepitação do fogo percorrendo o corpo, lembro da visão das pequenas brasas em movimento, lembro do formigamento que acompanhava o processo. Não havia dor. Meu corpo se queimou inteiramente, e as cinzas se espalharam pelo cosmos. Eu – o Pedro – deixei de existir. Agora eu era apenas um olho boiando no espaço cósmico, e observava aquela imensidão vazia e poderosa do espaço. Uma voz disse: “Olhe para a luz. Ela incomoda no começo, mas você se habitua.” Eu tirei o pano que cobria meu rosto e abri os olhos. A luz da janela realmente me cegou por um instante. Quando me habituei à luz da janela, o que vi foi uma “outra luz”. Eu estava deitado de costas e podia focalizar o teto. Eu tinha noção de que estava naquela sala, mas havia outra imagem sobreposta à visão do teto. Um outro olho, luminoso, de intensa luz branca, um jato de força infinita, olhava para mim – ou para o que tinha restado de mim. O olho acima de mim era uma força poderosíssima. Toda a potência da criação cósmica se concentrava ali. Diante daquela visão, a sensação foi de puro êxtase. Ali à minha frente estava a coisa mais assustadora e ao mesmo tempo a mais deslumbrante que eu jamais tinha visto. Um poder gigantesco, um fluxo ininterrupto e monstruoso de vida e de luz que me envolvia com sua força e me deixava completamente sem ação. Eu era um ridículo grão de poeira diante daquilo.


A risada de Deus

Aquele olho luminoso olhava pra mim e ria. Como pode um olho rir, não me pergunte, mas era exatamente isso que estava acontecendo. No momento em que tentei decifrar o que significava aquela risada, as seguintes frases saltaram prontas na minha mente, como se fossem um texto previamente escrito por alguém:

A risada de Deus é assustadora se você tiver medo
A risada de Deus é um convite se você se entregar
Rir com Ele é rir nEle


E subitamente houve uma compreensão. Com a compreensão, os dois olhos se fundiram. E eu soube que sempre havia existido um único olho – o olho da criação – desde o princípio dos tempos. E eu era esse olho. Era a ilusão criada pela mente que fazia o ser humano pensar que havia múltiplos seres e coisas separadas. O que vê e o que é visto são uma coisa só, eu e Deus somos uma coisa só, o meu olho e o seu olho são uma coisa só! E eu ri muito dessa percepção! Eu ria, por estar vendo o universo pelo ponto de vista daquele olho que ria, e entendi o motivo do riso. Eu ria, e as lágrimas escorriam. Ria do ridículo das guerras, ria da ilusão das diferenças, ria do medo da morte, ria das pessoas brigando por futebol e política. Eu boiava no espaço vazio e via universos e mais universos desabrochando e murchando como flores. Cada desabrochar e murchar de um universo levava trilhões de anos, mas do ponto de vista do olho da criação, era tudo tão pequeno, tão provisório, tão ridiculamente insignificante! Como não rir desse absurdo? Como não rir da importância que essas criaturas insignificantes dão aos seus dramas pessoais tão ínfimos e passageiros? Aos poucos, o riso foi se tornando um riso benevolente e compreensivo, como quem diz: "Não se preocupe, no final, tudo volta ao vazio e a paz absoluta se restabelece. Tudo vai passar." Como um pai que vê uma criança chorando por uma bobagem, e sorri e a conforta, sabendo que aquele acontecimento mínimo, que causa tanta dor a uma criança, não terá nenhuma importância no futuro. Assim eu olhava os dramas humanos, através do olho da criação.


O vazio

Depois vi o poder ainda mais imenso que emanava do vazio escuro onde pairava o olho da criação. Era um vazio profundo e denso, e vivo! Era o criador e destruidor infinito de tudo que existiu e de tudo que ainda virá. O vazio era ainda mais poderoso e assustador que o olho da criação. Ilimitado, sem princípio nem fim, senti que ele poderia engolir todos os universos num só golpe, e vomitar tudo em seguida. Um poder inconcebível de destruição e criação. E ainda assim, ele permanecia estável, eterno, imutável, silencioso, indiferente ao tempo e ao espaço.

Naquele instante eu senti como se cada pequeno evento até aquele momento da minha vida tivesse sido um degrau para me fazer chegar a essa experiência. Essa era a razão final da existência. A partir dali, não havia mais para onde ir, afinal eu estava em contato com tudo, tinha acesso a tudo, todas as respostas estavam diante de mim. Viver ou morrer era completamente irrelevante.


Retorno ao corpo "dele"

E então voltei a ter percepção e controle do corpo. Percebi que meu rosto estava encharcado de lágrimas. A intensa emoção ainda transbordava. Eu me sentei, havia muita força e muita energia, uma enorme disposição. Mas não era o "meu" corpo. O que eu sentia era: “Sou o olho da criação boiando no vazio, mas por ora vou usar este corpo, o Pedro está a anos-luz de distância, ele não vai se importar.” Achei que o corpo funcionava bem, e gostei de usá-lo. Eu sentia ainda com muita intensidade a imensa benevolência do olho da criação. Mas não que a benevolência fosse direcionada a mim. Era eu, vendo através do olho da criação, que emanava aquela sensação maravilhosa. Eu amava intensamente todos os universos e olhava para todas as criaturas como se fossem filhos queridos que precisassem de compreensão e afeto. Nunca imaginei que eu pudesse sentir algo tão imenso e maravilhoso como isso. Como isso pode caber em um ser humano?

Assim que retomei o controle do corpo, a percepção de tempo voltou ao normal. Verifiquei o horário em vários momentos e minha percepção interna estava coerente com o relógio. Decidi mandar mensagem para minha mulher para avisar que eu estava bem. Isso aconteceu 2 horas depois de tomar o chá. Escrevi com uma atenção especial em escrever mais ou menos do jeito que o Pedro escreveria, para que ela não achasse estranho. É engraçado pensar nisso agora, mas era isso que se passava no momento. Depois de acalmá-la, comecei a descrever o que sentia:

“Não tive enjoo. Mas quando escrevo a palavra enjoo, as sensações parecem querer ser agrupar em torno da palavra, e isso realmente pode causar enjoo.” (Isso me fez perceber que meu enjoo tem um componente psicológico. Basta pensar nele, e ele surge.)

“Hoje fui transformado em outra coisa. Meu corpo se desfez e passou a fazer parte do universo. Este que escreve agora é apenas um resquício.”

“Medo é desnecessário. Entrega é necessário. O medo faz parecer que há algo a perder. Não há nada a perder.”


E o que se passou nas próximas duas horas foi que eu continuava me sentindo o olho luminoso flutuando no vazio, e usando um corpo emprestado. Não havia nenhum medo nem ansiedade, era uma sensação de plenitude, liberdade e poder infinito. "Vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim". Essa frase bíblica me veio à mente e fez total sentido naquele momento. Eu soube exatamente o que aquilo significava: a vida experimentada pelo ponto de vista de algo infinito, transcendente, além da mente humana.


Resolvendo os problemas "dele"

A mente funcionava com extrema clareza. Repassei diversos problemas de trabalho, filhos, clientes. Tudo era visto de um ponto de vista amplo, tranquilo, e as soluções brotavam de forma fluida, sem tensão alguma, como a água de um rio que sempre escolhe o caminho mais fácil, desviando dos obstáculos, e não lutando contra eles. Não há esforço, é apenas o caminho óbvio, o fluxo natural das coisas. E, além disso, não era dos “meus” problemas que eu estava tratando. Eram os problemas do Pedro, aquele sujeito que estava a anos-luz de distância. Eu olhava para os problemas e pensava: “Ah, o Pedro costuma fazer desse ou desse jeito, então o caminho será por aqui”. Como se o Pedro fosse apenas mais um personagem de uma história, nesse momento eu – o olho da criação – era alguém que conhecia muito bem aquele tipo de história com aqueles personagens e sabia como ela costumava se desenrolar. Então a solução não era uma questão de decidir qual caminho tomar. Era olhar a cena com os personagens e saber para onde “a história” queria ir. Essa mudança de perspectiva facilita absurdamente a solução de problemas.


Dor

Achei um grampo de papel no tapete e testei sensações de dor espetando-o contra a pele. A sensação era muito diferente, a dor estava lá, mas como a sensação era de que o corpo não era meu, a intenção de não machucá-lo era mais um ato de respeito ao corpo do Pedro do que medo da dor. Eu sentia que se aquele corpo fosse ferido naquele momento, eu não reagiria com medo ou desespero, e cuidar do ferimento seria uma experiência semelhante a colar um vaso quebrado. Simples assim.


Vários tsunamis

O efeito dos cogumelos vinha em ondas, intercalando períodos mais intensos com períodos de maior serenidade. Para mim, a sensação é de um tsunami chegando, com um som grave e com um estremecimento que o anuncia. A onda vai crescendo, crescendo, se aproximando, aquele poder imenso bem ao meu lado, e é preciso relaxar e permitir que o tsunami me atinja e me carregue para onde quer que ele queira. Nos períodos de calmaria entre um tsunami e outro, há reflexões interessantes, insights poderosos, indescritíveis sensações. Mas quando o tsunami me atinge, eu preciso deitar e esperar um pouco. Sensações de frio e calor se intercalam rapidamente, e é quase como se eu estivesse realmente sendo levado rodopiando dentro da água. As noções de tempo e espaço ficam confusas por alguns minutos. A mente mostra uma infinidade de coisas numa velocidade atordoante. Sei que há coisas altamente importantes nesses momentos, mas tenho muita dificuldade de memorizar e recordar.


Finalizando o experimento

Aos poucos, a consciência do dia-a-dia foi retornando. Às 17h15, exatas 6 horas depois de tomar o chá, de repente, o efeito parecia ter passado totalmente. Senti que era hora de encerrar. Durante todo o período, só tomei dois ou três goles de água. A fome era imensa, mas eu decidi levar o jejum até o final. E foi relativamente fácil, sob o efeito do cogumelo, não prestar atenção à fome. Vale lembrar que na maior parte do tempo, eu percebia a fome, mas ela não era minha. Havia uma fome imensa em alguma das criaturas daquele vasto cosmos, e aquela criatura se chamava Pedro, mas isso era totalmente irrelevante diante da vastidão que eu experimentava. Finalizei com nova oração agradecendo profundamente pela experiência, e comendo em seguida a maçã que eu tinha levado para quebrar o jejum, como símbolo do término do ritual. Fui comer decentemente só uma hora e meia mais tarde, depois de ter arrumado o local onde fiz a experiência.


O pós-experimento

O sentimento que fica ao final é de ter sido abençoado com absolutamente tudo de mais precioso que um ser humano poderia receber. Uma força de potência descomunal, que poderia me destruir como se eu fosse um mero cisco, mostrou-me sua infinita benevolência e generosidade, e me permitiu ver – e sentir – pelos olhos dela! ("Tat Tvam Asi" - Eu sou Aquilo). O sentimento de gratidão, reverência e maravilhamento que resulta dessa experiência é além de tudo que eu já tinha experimentado antes!

Termino de escrever este texto no dia 6 de janeiro, Dia de Reis, e a experiência é a coisa que mais ocupa minha mente. Quase não dormi de ontem pra hoje. Eu tentei, mas os detalhes vão sendo relembrados, as tentativas de colocar em palavras são frustrantes, e me fazem reescrever, reescrever, reescrever. Sinto uma necessidade imensa de transmitir a quem ler o texto aquele sentimento que tive durante a viagem, de amor infinito, universal. Sei que é impossível transmitir isso, mas me sinto obrigado a fazer o melhor que posso. E o melhor que posso ainda me parece muito insignificante.


Comentários sobre preparação, set, setting, dosagem

Espero sinceramente que este texto sirva de referência para quem estiver procurando este tipo de experiência. É parte do compromisso que assumi compartilhar a experiência e auxiliar quem está na busca. Os procedimentos de preparação são muito importantes e eu tenho certeza que eles contribuíram para o resultado incrível da minha experiência. Os conceitos de set e setting não podem ser negligenciados. Set é estar com a mente no estado correto antes da experiência e setting é criar um local adequado, confortável e protegido, e de espiritualidade positiva. Um ambiente adequado potencializa a experiência. Acho absolutamente inconcebível eu usar o cogumelo para fins meramente recreativos. Acho um desperdício usar para uma finalidade tão superficial e sem consequências duradouras.

Ainda um comentário sobre a dosagem. Pelo que tenho lido, não é comum que uma dose relativamente baixa de 2,5g de cogumelos secos provoque uma experiência de dissolução do ego como a que eu tive. No livro “Como mudar sua mente”, de Michael Pollan, a dose que ele usou para ter essa experiência foi de 4g. O terapeuta psicodélico Leo Zeff, que atuou clandestinamente nos EUA por décadas, usava de 4 a 4,5g para provocar esse tipo de experiência nas pessoas. A famosa “dose heroica” de 5g foi a dose sugerida por Terence McKenna para essa experiência profunda. As pesquisas na Universidade Johns Hopkins usam psilocibina sintética equivalente a aproximadamente a 4,5g de cogumelos ou pouco mais. Só o que tenho a dizer é: conheça como seu organismo reage à substância. Comecei com doses muito baixas. Eu sou talvez excessivamente cauteloso – ou medroso, se preferir – e comecei com microdoses de 200mg. Eu conheço meu histórico com o Santo Daime. Com o Daime, a dose que é a considerada normal para a maioria das pessoas, por duas vezes me apagou. Eu perdi a consciência e desabei no chão. Esse é um dos motivos por que não prossegui com o Daime, mas isso é outra história. Parece que meu organismo, por razão que desconheço, é mais sensível a esse tipo de substância que a média das pessoas. Busca espiritual é indissociável de autoconhecimento. Conheça-se, faça experiências com cuidado, vá aos poucos. Só você pode conhecer em detalhes as reações da sua mente e do seu corpo.


O uso da meditação

Também vi opiniões de pesquisadores de que a meditação e os cogumelos se entendem muito bem. Um impulsiona o outro, são complementares. Eu pratico meditação há mais de 15 anos. Tenho certeza de que ela ajudou muito na qualidade e profundidade da minha experiência. Aprendizados que tive com a meditação, eu usei durante o efeito dos cogumelos. E certamente, os cogumelos podem dar uma amostra convincente de onde a meditação pode te levar. Eu conheço Zazen, Meditação Transcendental, e Mindfulness. São todas técnicas excelentes, e há dezenas de outras boas técnicas de meditação. Pesquise, leia livros, assista vídeos, pratique e descubra a que mais adequada para você.


Acompanhado ou sozinho

Sobre fazer a experiência sem ninguém acompanhando. Eu não recomendo nas primeiras vezes. Das vezes anteriores, minha esposa me acompanhou, sem usar os cogumelos. Enquanto você não tem noção do que o cogumelo pode fazer com você, é melhor ter alguém sóbrio por perto, para qualquer emergência, ou mesmo para você se sentir seguro. Mesmo com todo o cuidado que tive desde as primeiras vezes, dessa vez, por estar sozinho, eu levei comigo um vidro de clonazepam em gotas, caso a coisa saísse do controle e eu precisasse interromper a experiência. Leve a sério. Vi vídeos de pessoas que tiveram experiências muito traumáticas por não tomarem os cuidados necessários. Conversei com uma pessoa que teve uma experiência tão desagradável que nunca mais quis chegar perto do cogumelo. A pessoa estava passando por um período muito depressivo e decidiu usar o cogumelo, sem muita preparação, para ver se se sentia melhor. Estado mental inadequado, situação inadequada, experiência assustadora.


Busca e Gratidão

Uma última recomendação feita por várias pessoas que tem mais experiência que eu no assunto. O cogumelo não é para todo mundo. Assim como eu senti que não devia prosseguir com o Daime, o cogumelo pode não ser o caminho que você está buscando. Há infinitos caminhos de busca espiritual. Há outras plantas de poder, religiões, terapias, meditações, técnicas corporais, danças sagradas etc. Busque, pesquise e escolha o que faz mais sentido para você!

Sinto-me profundamente agradecido a todos os seres, de todas as épocas e lugares, que tornaram possível essa experiência para mim.

E desejo, de coração, que você encontre o seu caminho!


Pedro, psiconauta amador
6 de janeiro de 2020
 
Pedro, ótimo relato o seu. Com certeza um dos 5 melhores que eu já li aqui no fórum. 🤗

Ah, gostei bastante do seu verso (apesar de ser ateu, haha). Abraço!
 
Pedro, ótimo relato o seu. Com certeza um dos 5 melhores que eu já li aqui no fórum. 🤗

Tanto assim?? Uau, valeu!!!! :)🤗


Ah, gostei bastante do seu verso (apesar de ser ateu, haha). Abraço!

Cara, se você soubesse o quanto esse seu pequeno comentário me fez pensar.... kkkk

Se me perguntassem há uns 2 anos atrás, eu também teria dito que era ateu. Agora já não sei como me classificar.

Minha primeira reação ao seu comentário foi uma estranheza quando li a expressão "seu verso". Eu não sinto o verso como meu. Acho que é isso que os poetas chamam de inspiração: parece ter vindo de fora. Assim com a voz que disse "olhe para a luz" parece ter vindo de fora. O verso simplesmente pingou pronto na minha mente. Traduzo isso da seguinte forma: foi uma criação da mente, mas não do meu ego. Acho que meu ego ainda é ateu (isso soa completamente ridículo rsrsrs).

Minha formação é cristã evangélica. Cresci ouvindo histórias da Bíblia. Mas hoje tenho 47 anos e mudei tanto meu jeito de pensar, que parece que aquela base cristã foi em outra vida. Durante a experiência com o cogumelo, essa base antiga parece ter retornado – de partes externas ao meu ego atual, por isso não as senti como "minhas" – para explicar o que estava acontecendo.

Então, vou com Joseph Campbell: chamar de Deus aquela experiência ainda é uma boa metáfora para mim, porque é o mito fundante da minha personalidade, embora eu não "acredite" mais em Deus da forma como acreditava quando criança.

Eu poderia chamar aquilo de Consciência Cósmica (Pierre Weil, Ken Wilber, ou Meditação Transcendental), Base ou Fundamento (Aldous Huxley), o Self (Jung) ou dizer que era o reflexo de minha própria mente, só que desprovida de conceitos (como na explicação do Livro Tibetano dos Mortos sobre a visão da luz branca). Não vejo conflito entre essas expressões. São metáforas para explicar o inexplicável. Deus é apenas um nome com o qual estou familiarizado, para nomear um aspecto da consciência que não pode ser nomeado. Porque está além da mente racional (ego), além da dualidade do pensamento, além da nossa capacidade de conceituação.

Pessoalmente eu penso que essa "luz branca" seja a base sobre a qual se desenvolve nossa consciência. Como se a luz fosse a raiz, e nosso pensamento do dia-a-dia fossem os galhos. Gosto bastante dessa forma de ver porque elimina barreiras entre crentes e ateus. Gosto até mais do que chamar de Deus, mas o cogumelo não me deu essa opção rsrs.

Muito obrigado por me estimular a reflexão!!!!
 
Última edição:
Acho que um dos motivos de eu ter gostado do verso é que ele parece um verso religioso, mas também pode ser uma boa alegoria da própria experiência psicodélica, com uns conceitos que estão expressos ali: o medo ("assustadora") ante o 'desconhecido', a entrega, a partilha, a sensação de comunhão e de conexão com o universo ("entregar", "rir n'Ele")...
 
Caros amigos,
Gostaria inicialmente de agradecer a todos que contribuem para a conteúdo deste fórum. Tenho lido muito coisa e achado muita referência útil ao meu aprendizado.
Pensei muito se deveria postar um texto tão longo. Eu sempre acabo escrevendo muito. Mas dois pensamentos me convenceram: 1 - foi uma das melhores experiência da minha vida e, como sou novato nos cogumelos, estava curioso para saber a opinião dos mais experientes; 2 - a expectativa de ser um texto útil para quem está começando sua busca espiritual, como forma de retribuir o que tenho aprendido com o fórum.
Então aí vai:

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Experiência feita no Sábado, 4 de janeiro de 2020.

Há uns dias decidi que esse sábado seria o dia. Já tinha feito quatro experiências com doses mais baixas e me sentia seguro para continuar. Com doses mais baixas, aprendi que sou bastante sensível à substância. Com apenas 500mg de cogumelos secos, tive efeitos visuais bastante intensos. Minha experiência mais recente tinha sido de 1,5g, que tinha me dado insights interessantes. Decidi testar com 2,5g nessa minha quinta experiência com o Cubensis. Meu objetivo é autoconhecimento e espiritualidade.


Preparação

Sei que o jejum costuma ser usado para intensificar experiências espirituais. Então, dois dias antes, comecei a preparação. Fiz um dia de desintoxicação na quinta-feira, com alimentação à base de frutas. Na sexta-feira mantive alimentação mínima (água, quantidade minúscula de frutas e 2 biscoitos cream cracker), e as últimas 12 horas antes do chá foram de jejum total. Abstinência sexual dois dias antes é uma prática que conheci no Santo Daime, e eu resolvi adotar também.

Decidi fazer sozinho no meu escritório, que fica perto do endereço onde eu moro. Minha mulher não gostou muito, mas eu sabia que era a melhor opção. E realmente foi. Em experimentos anteriores, sob o efeito dos cogumelos, fico muito sensível aos sentimentos dela. Ela fica apreensiva com esse tipo de experiência, eu sinto a insegurança dela, e isso atrapalha demais a viagem. Qualquer movimento dela ou mudança de respiração que indique preocupação me tira da viagem.

Preparei o ambiente com um colchonete no chão e um cobertor, coloquei a caixa de som ao meu lado, celular no modo avião, desliguei o interfone, tudo para garantir que não houvesse interrupções. Era um dia de chuva e vento, então fechei todas as portas para que eu não tomasse um susto durante a viagem, com alguma porta batendo. Eu tinha em meu celular a playlist dos experimentos com psilocibina da Universidade Johns Hopkins. No dia anterior, eu já tinha feito o download da playlist para não precisar conectar à internet durante a experiência. Tinha também baixado um álbum de mantras do Krishna Das.

Procurei fazer o chá praticando Atenção Plena (Mindfulness) para já ir entrando no estado mental correto. Usei 2,5g cogumelos secos triturados – devidamente pesados –, com uns 200ml de água quase fervendo, e depois acrescentei mel. Comi três fatias de gengibre enquanto esperava a água quente fazer seu trabalho, e mais três fatias depois de tomar o chá, para evitar enjoo, o que já tinha funcionado maravilhosamente bem das outras vezes. Algumas partes maiores do cogumelo ficaram boiando no chá. Tirei-as com uma colher e ia descartá-las, mas depois de tomar o chá, decidi mastigar vagarosamente essas partes. Nada foi descartado. O motivo de pensar em descartá-las foi a preocupação com o enjoo. Depois da péssima experiência recente que tive com o Santo Daime, vomitando até a alma e passando muito mal durante toda a sessão, fiquei meio traumatizado. Como nas primeiras vezes com o cogumelo eu senti algum enjoo, o medo de passar mal sempre fica rondando. Tomo cuidado especial com isso. Por isso o gengibre. Por isso o cogumelo triturado. Por isso mastigar bem.

O chá foi tomado às 11h15. Fiz uma oração em seguida, na postura de reverência semelhante à usada em práticas budistas, de joelhos, testa no chão e mãos unidas à frente da cabeça. O mais importante da postura é o sentimento associado a ela. Essa postura tem a intenção de evocar sentimentos de entrega, humildade, reverência. Considerei isso uma preparação importante, pois já tinha lido a respeito da necessidade de se entregar à experiência sem restrições. Nessa oração eu deixo claro que estou disposto a aceitar qualquer ensinamento que vier, não sou eu que escolho. Assumo a intenção de tratar a experiência com o máximo de responsabilidade e de usá-la para o meu aprimoramento pessoal e o de outras pessoas. Falo de meus medos (do enjoo, de novo) e peço compreensão quanto às minhas limitações. Peço que a viagem seja profunda e agradável, e prometo me esforçar para tirar o máximo proveito dela.

Coloquei o álbum do Krishna Das para tocar. Ouvi uns três mantras e resolvi mudar para a playlist da Johns Hopkins. Ouvi um pouco da primeira música, mas achei lenta demais, passei para a próxima, e surpresa! Sem querer, eu tinha selecionado a reprodução aleatória e começou a tocar uma música do final da playlist, uma que eu nunca tinha ouvido. A essa altura, eu já sentia alguns efeitos do cogumelo – leve formigamento no corpo e a mente acelerando – e não consegui entender direito o que estava acontecendo. Achei que a playlist era só instrumental e aquela música cantada em inglês – e sem instrumentos – me pegou no susto. A potência das vozes provocou um arrepio no corpo todo e fui tomado por uma energia absurda, subindo dos pés à cabeça. Meu olhos se encheram de lágrimas na mesma hora, diante de tamanha sensação de força. Olhei nome da música: Rei dos Reis. Era perfeito! Era antevéspera do Dia de Reis (6 de janeiro). Um evento que senti como pura sincronicidade. A música pedia: “Deus Todo-Poderoso, revele-se! Revele-se! Revele-se!” Uau! Essa era A MÚSICA! Senti que tinha que dançar. Era a coisa certa a se fazer diante de tanta energia. Senti que se eu não dançasse, aquilo ia se tornar mais do que eu podia suportar. O corpo precisava participar junto com a mente. Comecei a me mexer ao ritmo da música, de olhos fechados, batendo com força os pés no chão e me senti parte de um ritual tribal africano, dançando com outros homens, numa invocação do poder divino! Repeti a música umas três vezes até que o corpo não aguentou mais. Eu tremia muito. Desliguei o som, deitei e cobri os olhos com um pano.


Início da viagem

Descrever o que se passou a partir daqui é aquela parte difícil. Alguém descreveu esse início de viagem como o lançamento de um foguete. É uma boa descrição. É turbulento, intenso, tudo vibra muito, há uma sensação de extrema energia. É o ponto da viagem onde pode-se ter que lidar com uma série de medos. Medo de morrer, de enlouquecer, de sentir dor, de ficar sem ar. Eu sabia que o truque era a entrega total à experiência. Não resistir. É aqui que eu acredito que a prática de meditação me ajuda muito. Eu esbarro em alguns desses medos, sei que eles estão lá, mas os deixo de lado e a viagem segue. É como se estivesse viajando de trem em alta velocidade e os medos aparecessem vez ou outra na janela. Se eu ficar muito tempo olhando para o medo na janela, o maquinista – a mente, que é super atenta aos meus interesses – tenta frear o trem pra eu continuar olhando, e isso gera tensão. O trem freando é o que gera o mal-estar. Uma tremenda força empurrando aquela máquina pra frente e outra tremenda força para fazê-la parar. Duas forças em conflito. Um desgaste imenso e desnecessário. Reconheça o medo e deixe-o de lado, que o trem volta a fluir. É apenas uma paisagem na janela como outra qualquer. Isso eu aprendi com a prática de meditação.


Perda do corpo e a luz branca

A vibração continuou por um tempo que não consigo dimensionar. Aqui perdi a percepção de tempo completamente. Em certo momento, surgiu a imagem de uma cobra, e a cobra era eu, e eu estava trocando de pele. E a pele que ia sendo retirada da cobra era meu corpo que ia sendo desintegrado por minúsculas brasas que corriam por ele. Como quando se queima uma folha de papel, e após apagar a chama, as brasas ficam correndo pelo papel já escurecido. Aquilo acontecia no meu corpo todo. Lembro do som de crepitação do fogo percorrendo o corpo, lembro da visão das pequenas brasas em movimento, lembro do formigamento que acompanhava o processo. Não havia dor. Meu corpo se queimou inteiramente, e as cinzas se espalharam pelo cosmos. Eu – o Pedro – deixei de existir. Agora eu era apenas um olho boiando no espaço cósmico, e observava aquela imensidão vazia e poderosa do espaço. Uma voz disse: “Olhe para a luz. Ela incomoda no começo, mas você se habitua.” Eu tirei o pano que cobria meu rosto e abri os olhos. A luz da janela realmente me cegou por um instante. Quando me habituei à luz da janela, o que vi foi uma “outra luz”. Eu estava deitado de costas e podia focalizar o teto. Eu tinha noção de que estava naquela sala, mas havia outra imagem sobreposta à visão do teto. Um outro olho, luminoso, de intensa luz branca, um jato de força infinita, olhava para mim – ou para o que tinha restado de mim. O olho acima de mim era uma força poderosíssima. Toda a potência da criação cósmica se concentrava ali. Diante daquela visão, a sensação foi de puro êxtase. Ali à minha frente estava a coisa mais assustadora e ao mesmo tempo a mais deslumbrante que eu jamais tinha visto. Um poder gigantesco, um fluxo ininterrupto e monstruoso de vida e de luz que me envolvia com sua força e me deixava completamente sem ação. Eu era um ridículo grão de poeira diante daquilo.


A risada de Deus

Aquele olho luminoso olhava pra mim e ria. Como pode um olho rir, não me pergunte, mas era exatamente isso que estava acontecendo. No momento em que tentei decifrar o que significava aquela risada, as seguintes frases saltaram prontas na minha mente, como se fossem um texto previamente escrito por alguém:

A risada de Deus é assustadora se você tiver medo
A risada de Deus é um convite se você se entregar
Rir com Ele é rir nEle


E subitamente houve uma compreensão. Com a compreensão, os dois olhos se fundiram. E eu soube que sempre havia existido um único olho – o olho da criação – desde o princípio dos tempos. E eu era esse olho. Era a ilusão criada pela mente que fazia o ser humano pensar que havia múltiplos seres e coisas separadas. O que vê e o que é visto são uma coisa só, eu e Deus somos uma coisa só, o meu olho e o seu olho são uma coisa só! E eu ri muito dessa percepção! Eu ria, por estar vendo o universo pelo ponto de vista daquele olho que ria, e entendi o motivo do riso. Eu ria, e as lágrimas escorriam. Ria do ridículo das guerras, ria da ilusão das diferenças, ria do medo da morte, ria das pessoas brigando por futebol e política. Eu boiava no espaço vazio e via universos e mais universos desabrochando e murchando como flores. Cada desabrochar e murchar de um universo levava trilhões de anos, mas do ponto de vista do olho da criação, era tudo tão pequeno, tão provisório, tão ridiculamente insignificante! Como não rir desse absurdo? Como não rir da importância que essas criaturas insignificantes dão aos seus dramas pessoais tão ínfimos e passageiros? Aos poucos, o riso foi se tornando um riso benevolente e compreensivo, como quem diz: "Não se preocupe, no final, tudo volta ao vazio e a paz absoluta se restabelece. Tudo vai passar." Como um pai que vê uma criança chorando por uma bobagem, e sorri e a conforta, sabendo que aquele acontecimento mínimo, que causa tanta dor a uma criança, não terá nenhuma importância no futuro. Assim eu olhava os dramas humanos, através do olho da criação.


O vazio

Depois vi o poder ainda mais imenso que emanava do vazio escuro onde pairava o olho da criação. Era um vazio profundo e denso, e vivo! Era o criador e destruidor infinito de tudo que existiu e de tudo que ainda virá. O vazio era ainda mais poderoso e assustador que o olho da criação. Ilimitado, sem princípio nem fim, senti que ele poderia engolir todos os universos num só golpe, e vomitar tudo em seguida. Um poder inconcebível de destruição e criação. E ainda assim, ele permanecia estável, eterno, imutável, silencioso, indiferente ao tempo e ao espaço.

Naquele instante eu senti como se cada pequeno evento até aquele momento da minha vida tivesse sido um degrau para me fazer chegar a essa experiência. Essa era a razão final da existência. A partir dali, não havia mais para onde ir, afinal eu estava em contato com tudo, tinha acesso a tudo, todas as respostas estavam diante de mim. Viver ou morrer era completamente irrelevante.


Retorno ao corpo "dele"

E então voltei a ter percepção e controle do corpo. Percebi que meu rosto estava encharcado de lágrimas. A intensa emoção ainda transbordava. Eu me sentei, havia muita força e muita energia, uma enorme disposição. Mas não era o "meu" corpo. O que eu sentia era: “Sou o olho da criação boiando no vazio, mas por ora vou usar este corpo, o Pedro está a anos-luz de distância, ele não vai se importar.” Achei que o corpo funcionava bem, e gostei de usá-lo. Eu sentia ainda com muita intensidade a imensa benevolência do olho da criação. Mas não que a benevolência fosse direcionada a mim. Era eu, vendo através do olho da criação, que emanava aquela sensação maravilhosa. Eu amava intensamente todos os universos e olhava para todas as criaturas como se fossem filhos queridos que precisassem de compreensão e afeto. Nunca imaginei que eu pudesse sentir algo tão imenso e maravilhoso como isso. Como isso pode caber em um ser humano?

Assim que retomei o controle do corpo, a percepção de tempo voltou ao normal. Verifiquei o horário em vários momentos e minha percepção interna estava coerente com o relógio. Decidi mandar mensagem para minha mulher para avisar que eu estava bem. Isso aconteceu 2 horas depois de tomar o chá. Escrevi com uma atenção especial em escrever mais ou menos do jeito que o Pedro escreveria, para que ela não achasse estranho. É engraçado pensar nisso agora, mas era isso que se passava no momento. Depois de acalmá-la, comecei a descrever o que sentia:

“Não tive enjoo. Mas quando escrevo a palavra enjoo, as sensações parecem querer ser agrupar em torno da palavra, e isso realmente pode causar enjoo.” (Isso me fez perceber que meu enjoo tem um componente psicológico. Basta pensar nele, e ele surge.)

“Hoje fui transformado em outra coisa. Meu corpo se desfez e passou a fazer parte do universo. Este que escreve agora é apenas um resquício.”

“Medo é desnecessário. Entrega é necessário. O medo faz parecer que há algo a perder. Não há nada a perder.”


E o que se passou nas próximas duas horas foi que eu continuava me sentindo o olho luminoso flutuando no vazio, e usando um corpo emprestado. Não havia nenhum medo nem ansiedade, era uma sensação de plenitude, liberdade e poder infinito. "Vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim". Essa frase bíblica me veio à mente e fez total sentido naquele momento. Eu soube exatamente o que aquilo significava: a vida experimentada pelo ponto de vista de algo infinito, transcendente, além da mente humana.


Resolvendo os problemas "dele"

A mente funcionava com extrema clareza. Repassei diversos problemas de trabalho, filhos, clientes. Tudo era visto de um ponto de vista amplo, tranquilo, e as soluções brotavam de forma fluida, sem tensão alguma, como a água de um rio que sempre escolhe o caminho mais fácil, desviando dos obstáculos, e não lutando contra eles. Não há esforço, é apenas o caminho óbvio, o fluxo natural das coisas. E, além disso, não era dos “meus” problemas que eu estava tratando. Eram os problemas do Pedro, aquele sujeito que estava a anos-luz de distância. Eu olhava para os problemas e pensava: “Ah, o Pedro costuma fazer desse ou desse jeito, então o caminho será por aqui”. Como se o Pedro fosse apenas mais um personagem de uma história, nesse momento eu – o olho da criação – era alguém que conhecia muito bem aquele tipo de história com aqueles personagens e sabia como ela costumava se desenrolar. Então a solução não era uma questão de decidir qual caminho tomar. Era olhar a cena com os personagens e saber para onde “a história” queria ir. Essa mudança de perspectiva facilita absurdamente a solução de problemas.


Dor

Achei um grampo de papel no tapete e testei sensações de dor espetando-o contra a pele. A sensação era muito diferente, a dor estava lá, mas como a sensação era de que o corpo não era meu, a intenção de não machucá-lo era mais um ato de respeito ao corpo do Pedro do que medo da dor. Eu sentia que se aquele corpo fosse ferido naquele momento, eu não reagiria com medo ou desespero, e cuidar do ferimento seria uma experiência semelhante a colar um vaso quebrado. Simples assim.


Vários tsunamis

O efeito dos cogumelos vinha em ondas, intercalando períodos mais intensos com períodos de maior serenidade. Para mim, a sensação é de um tsunami chegando, com um som grave e com um estremecimento que o anuncia. A onda vai crescendo, crescendo, se aproximando, aquele poder imenso bem ao meu lado, e é preciso relaxar e permitir que o tsunami me atinja e me carregue para onde quer que ele queira. Nos períodos de calmaria entre um tsunami e outro, há reflexões interessantes, insights poderosos, indescritíveis sensações. Mas quando o tsunami me atinge, eu preciso deitar e esperar um pouco. Sensações de frio e calor se intercalam rapidamente, e é quase como se eu estivesse realmente sendo levado rodopiando dentro da água. As noções de tempo e espaço ficam confusas por alguns minutos. A mente mostra uma infinidade de coisas numa velocidade atordoante. Sei que há coisas altamente importantes nesses momentos, mas tenho muita dificuldade de memorizar e recordar.


Finalizando o experimento

Aos poucos, a consciência do dia-a-dia foi retornando. Às 17h15, exatas 6 horas depois de tomar o chá, de repente, o efeito parecia ter passado totalmente. Senti que era hora de encerrar. Durante todo o período, só tomei dois ou três goles de água. A fome era imensa, mas eu decidi levar o jejum até o final. E foi relativamente fácil, sob o efeito do cogumelo, não prestar atenção à fome. Vale lembrar que na maior parte do tempo, eu percebia a fome, mas ela não era minha. Havia uma fome imensa em alguma das criaturas daquele vasto cosmos, e aquela criatura se chamava Pedro, mas isso era totalmente irrelevante diante da vastidão que eu experimentava. Finalizei com nova oração agradecendo profundamente pela experiência, e comendo em seguida a maçã que eu tinha levado para quebrar o jejum, como símbolo do término do ritual. Fui comer decentemente só uma hora e meia mais tarde, depois de ter arrumado o local onde fiz a experiência.


O pós-experimento

O sentimento que fica ao final é de ter sido abençoado com absolutamente tudo de mais precioso que um ser humano poderia receber. Uma força de potência descomunal, que poderia me destruir como se eu fosse um mero cisco, mostrou-me sua infinita benevolência e generosidade, e me permitiu ver – e sentir – pelos olhos dela! ("Tat Tvam Asi" - Eu sou Aquilo). O sentimento de gratidão, reverência e maravilhamento que resulta dessa experiência é além de tudo que eu já tinha experimentado antes!

Termino de escrever este texto no dia 6 de janeiro, Dia de Reis, e a experiência é a coisa que mais ocupa minha mente. Quase não dormi de ontem pra hoje. Eu tentei, mas os detalhes vão sendo relembrados, as tentativas de colocar em palavras são frustrantes, e me fazem reescrever, reescrever, reescrever. Sinto uma necessidade imensa de transmitir a quem ler o texto aquele sentimento que tive durante a viagem, de amor infinito, universal. Sei que é impossível transmitir isso, mas me sinto obrigado a fazer o melhor que posso. E o melhor que posso ainda me parece muito insignificante.


Comentários sobre preparação, set, setting, dosagem

Espero sinceramente que este texto sirva de referência para quem estiver procurando este tipo de experiência. É parte do compromisso que assumi compartilhar a experiência e auxiliar quem está na busca. Os procedimentos de preparação são muito importantes e eu tenho certeza que eles contribuíram para o resultado incrível da minha experiência. Os conceitos de set e setting não podem ser negligenciados. Set é estar com a mente no estado correto antes da experiência e setting é criar um local adequado, confortável e protegido, e de espiritualidade positiva. Um ambiente adequado potencializa a experiência. Acho absolutamente inconcebível eu usar o cogumelo para fins meramente recreativos. Acho um desperdício usar para uma finalidade tão superficial e sem consequências duradouras.

Ainda um comentário sobre a dosagem. Pelo que tenho lido, não é comum que uma dose relativamente baixa de 2,5g de cogumelos secos provoque uma experiência de dissolução do ego como a que eu tive. No livro “Como mudar sua mente”, de Michael Pollan, a dose que ele usou para ter essa experiência foi de 4g. O terapeuta psicodélico Leo Zeff, que atuou clandestinamente nos EUA por décadas, usava de 4 a 4,5g para provocar esse tipo de experiência nas pessoas. A famosa “dose heroica” de 5g foi a dose sugerida por Terence McKenna para essa experiência profunda. As pesquisas na Universidade Johns Hopkins usam psilocibina sintética equivalente a aproximadamente a 4,5g de cogumelos ou pouco mais. Só o que tenho a dizer é: conheça como seu organismo reage à substância. Comecei com doses muito baixas. Eu sou talvez excessivamente cauteloso – ou medroso, se preferir – e comecei com microdoses de 200mg. Eu conheço meu histórico com o Santo Daime. Com o Daime, a dose que é a considerada normal para a maioria das pessoas, por duas vezes me apagou. Eu perdi a consciência e desabei no chão. Esse é um dos motivos por que não prossegui com o Daime, mas isso é outra história. Parece que meu organismo, por razão que desconheço, é mais sensível a esse tipo de substância que a média das pessoas. Busca espiritual é indissociável de autoconhecimento. Conheça-se, faça experiências com cuidado, vá aos poucos. Só você pode conhecer em detalhes as reações da sua mente e do seu corpo.


O uso da meditação

Também vi opiniões de pesquisadores de que a meditação e os cogumelos se entendem muito bem. Um impulsiona o outro, são complementares. Eu pratico meditação há mais de 15 anos. Tenho certeza de que ela ajudou muito na qualidade e profundidade da minha experiência. Aprendizados que tive com a meditação, eu usei durante o efeito dos cogumelos. E certamente, os cogumelos podem dar uma amostra convincente de onde a meditação pode te levar. Eu conheço Zazen, Meditação Transcendental, e Mindfulness. São todas técnicas excelentes, e há dezenas de outras boas técnicas de meditação. Pesquise, leia livros, assista vídeos, pratique e descubra a que mais adequada para você.


Acompanhado ou sozinho

Sobre fazer a experiência sem ninguém acompanhando. Eu não recomendo nas primeiras vezes. Das vezes anteriores, minha esposa me acompanhou, sem usar os cogumelos. Enquanto você não tem noção do que o cogumelo pode fazer com você, é melhor ter alguém sóbrio por perto, para qualquer emergência, ou mesmo para você se sentir seguro. Mesmo com todo o cuidado que tive desde as primeiras vezes, dessa vez, por estar sozinho, eu levei comigo um vidro de clonazepam em gotas, caso a coisa saísse do controle e eu precisasse interromper a experiência. Leve a sério. Vi vídeos de pessoas que tiveram experiências muito traumáticas por não tomarem os cuidados necessários. Conversei com uma pessoa que teve uma experiência tão desagradável que nunca mais quis chegar perto do cogumelo. A pessoa estava passando por um período muito depressivo e decidiu usar o cogumelo, sem muita preparação, para ver se se sentia melhor. Estado mental inadequado, situação inadequada, experiência assustadora.


Busca e Gratidão

Uma última recomendação feita por várias pessoas que tem mais experiência que eu no assunto. O cogumelo não é para todo mundo. Assim como eu senti que não devia prosseguir com o Daime, o cogumelo pode não ser o caminho que você está buscando. Há infinitos caminhos de busca espiritual. Há outras plantas de poder, religiões, terapias, meditações, técnicas corporais, danças sagradas etc. Busque, pesquise e escolha o que faz mais sentido para você!

Sinto-me profundamente agradecido a todos os seres, de todas as épocas e lugares, que tornaram possível essa experiência para mim.

E desejo, de coração, que você encontre o seu caminho!


Pedro, psiconauta amador
6 de janeiro de 2020
Meu jorel!!!

QUe experiência meu amigo!! que experiência!!!
Gratidão sempre
Abraço
 
Uma experiência fantasticamente linda com um relato muito bem escrito e estruturado. Obrigado por nos trazer essa joia.

Alguns comentários...

Eu esbarro em alguns desses medos, sei que eles estão lá, mas os deixo de lado e a viagem segue. É como se estivesse viajando de trem em alta velocidade e os medos aparecessem vez ou outra na janela. Se eu ficar muito tempo olhando para o medo na janela, o maquinista – a mente, que é super atenta aos meus interesses – tenta frear o trem pra eu continuar olhando, e isso gera tensão. O trem freando é o que gera o mal-estar. Uma tremenda força empurrando aquela máquina pra frente e outra tremenda força para fazê-la parar. Duas forças em conflito. Um desgaste imenso e desnecessário. Reconheça o medo e deixe-o de lado, que o trem volta a fluir. É apenas uma paisagem na janela como outra qualquer. Isso eu aprendi com a prática de meditação.

É muito comum a metáfora do rio caudaloso. Mas essa do trem foi muito original e verdadeira, passando perfeitamente a ideia.

A risada de Deus é assustadora se você tiver medo
A risada de Deus é um convite se você se entregar
Rir com Ele é rir nEle

Um bom mantra.

Repassei diversos problemas de trabalho, filhos, clientes. Tudo era visto de um ponto de vista amplo, tranquilo, e as soluções brotavam de forma fluida, sem tensão alguma, como a água de um rio que sempre escolhe o caminho mais fácil, desviando dos obstáculos, e não lutando contra eles.

Sempre que penso em problemas até então absurdamente irritantes e desesperadores, começo a imaginar soluções engraçadíssimas, resolvendo os conflitos com risos. Queria eu ter essa habilidade de tornar leve os conflitos no dia a dia como o cogumelo me faz ter na trip.

Era olhar a cena com os personagens e saber para onde “a história” queria ir. Essa mudança de perspectiva facilita absurdamente a solução de problemas.

Me lembra o Tao, o Caminho.

Achei um grampo de papel no tapete e testei sensações de dor espetando-o contra a pele. A sensação era muito diferente, a dor estava lá, mas como a sensação era de que o corpo não era meu, a intenção de não machucá-lo era mais um ato de respeito ao corpo do Pedro do que medo da

Aqui vou destacar o que chamo de Princípio do Não-Desperdício. Por exemplo, superar o medo da morte não deve levar o psiconauta a se matar. Ou, superar o receio da dor não deve levar a uma automutilação. Trata-se de não jogar fora algo de valor (vida, integridade física, etc) porque se superou o apego ou o medo.

Sei que você estava sob efeito, mas pense nisso. Evite fazer algo a si em função de transceder a si durante os efeitos numa próxima experiência.

Ainda um comentário sobre a dosagem. Pelo que tenho lido, não é comum que uma dose relativamente baixa de 2,5g de cogumelos secos provoque uma experiência de dissolução do ego como a que eu tive.

2,5g é bem forte pra mim em condições normais de tolerância.

conheça como seu organismo reage à substância
Conheça-se, faça experiências com cuidado, vá aos poucos. Só você pode conhecer em detalhes as reações da sua mente e do seu corpo.

Isso mesmo!
 
Obrigado por nos trazer essa joia.

Alguns comentários...
Obrigado caro irmão @ExPoro pela coragem de ler o texto todo e pelos ótimos comentários.

Queria eu ter essa habilidade de tornar leve os conflitos no dia a dia como o cogumelo me faz ter na trip.
Tenho intencionalmente recordado essa viagem com frequência, na tentativa de melhorar em mim essa habilidade. Tentando olhar minha vida por aquele ponto de vista que a viagem me mostrou. Eu também queria ter isso sem precisar estar sob efeito (Pensando bem, quem não ia querer? rsrs). Não tomei nenhuma dose alta depois dessa experiência, só microdoses de 150mg a 200mg, com espaços de 4 até 10 dias entre elas. E a meditação, embora eu ande meio negligente com ela. Tenho meus altos e baixos de humor, tem horas que me sinto o puro "ego abandonado pelo cosmos, vítima da sociedade malvada", mas há muitos bons períodos em que eu me sinto "conectado" às habilidades da experiência com o cogumelo, até mesmo vários dias após uma microdose. Não dá nem pra comparar a intensidade da habilidade, mas parece que ela está mais à mão, muito mais próxima do que antes da experiência, e com mais frequência. Ainda tô avaliando o quanto isso dura...


Aqui vou destacar o que chamo de Princípio do Não-Desperdício. Por exemplo, superar o medo da morte não deve levar o psiconauta a se matar. Ou, superar o receio da dor não deve levar a uma automutilação. Trata-se de não jogar fora algo de valor (vida, integridade física, etc) porque se superou o apego ou o medo.

Sei que você estava sob efeito, mas pense nisso. Evite fazer algo a si em função de transceder a si durante os efeitos numa próxima experiência.
De minha parte, não havia nenhuma intenção de me machucar. E nem interesse nisso. O que eu fiz não chegou nem a arranhar, foi só pressão sobre a pele mesmo. Mas entendo perfeitamente sua preocupação e achei seu comentário muito pertinente. Demonstra um grande cuidado e sou grato por isso. Me fez ver que, sem querer, eu posso estar dando ideias bem perigosas pra quem ler essa parte do texto.

Na época dessa viagem, eu já tinha em mente o método de trabalho de Leo Zeff (The Secret Chief Revealed). Ele fazia cada psiconauta prometer, antes de cada uma das viagens, que não iria causar dano ou praticar violência contra si ou contra qualquer dos presentes. Tirei muita coisa boa desse livro. A ideia de traduzir tem me passado muito pela cabeça, mas a coragem ainda não apareceu.


2,5g é bem forte pra mim em condições normais de tolerância.
Ah, finalmente! Eu tava me achando "o esquisito". A maioria dos relatos que leio, e as poucas pessoas próximas que eu tenho conhecimento, tomam doses bem mais altas!!! Tô pensando em aumentar radicalmente pra 2,51g na minha próxima :p!!!

Sério, fiquei com a impressão que não teria como "ir além" dessa experiência. Meu plano hoje é tentar sustentar o máximo possível a "lembrança" das coisas que aprendi na viagem, e talvez voltar a usar uma dose similar quando eu perceber que estou "esquecendo". Por ter sido uma experiência que me deu a impressão de que todas as perguntas possíveis foram respondidas, pra mim faz mais sentido buscar periodicamente uma experiência de mesma intensidade, do que buscar algo mais intenso. Existe algo mais além dessa percepção de "todas as perguntas respondidas", que me sugerisse algum benefício extra com doses maiores? Ou devo concluir que essa, por enquanto, é a dose "ideal" pra mim (nas condições normais de tolerância, como você disse)? Não espero ter uma resposta exata, talvez isso seja totalmente subjetivo e eu só vou saber testando, mas uma opinião mais experiente seria bem-vinda. Se alguém mais quiser dar um parecer também, eu agradeço.

Valeu, irmão!
 
Última edição:
Que bom ter me compreendido e não ter se machucado. :)

Existe algo mais além dessa percepção de "todas as perguntas respondidas", que me sugerisse algum benefício extra com doses maiores? Ou devo concluir que essa, por enquanto, é a dose "ideal" pra mim (nas condições normais de tolerância, como você disse)?

Eu diria para ficar nessa dose, não precisa ir além. A menos que haja um chamado dos cogumelos para ir mais fundo. Mas no fim você sentirá o que fazer. Por enquanto, se acostume com essa faixa de efeitos. Lembre-se que seu 2,5 g podem ser os 6 g de outra pessoa. Então não se deve comparar dosagens. Eu mesmo prefiro nem ter mais uma viagem tão forte, hoje em dia.

Boas trips.
 
Eu passei EXATAMENTE por essa experiência, e ri bastante também no quarto!

"E subitamente houve uma compreensão. Com a compreensão, os dois olhos se fundiram. E eu soube que sempre havia existido um único olho – o olho da criação – desde o princípio dos tempos. E eu era esse olho. Era a ilusão criada pela mente que fazia o ser humano pensar que havia múltiplos seres e coisas separadas. O que vê e o que é visto são uma coisa só, eu e Deus somos uma coisa só, o meu olho e o seu olho são uma coisa só! E eu ri muito dessa percepção! Eu ria, por estar vendo o universo pelo ponto de vista daquele olho que ria, e entendi o motivo do riso. Eu ria, e as lágrimas escorriam. Ria do ridículo das guerras, ria da ilusão das diferenças, ria do medo da morte, ria das pessoas brigando por futebol e política. Eu boiava no espaço vazio e via universos e mais universos desabrochando e murchando como flores. Cada desabrochar e murchar de um universo levava trilhões de anos, mas do ponto de vista do olho da criação, era tudo tão pequeno, tão provisório, tão ridiculamente insignificante! Como não rir desse absurdo? Como não rir da importância que essas criaturas insignificantes dão aos seus dramas pessoais tão ínfimos e passageiros? Aos poucos, o riso foi se tornando um riso benevolente e compreensivo, como quem diz: "Não se preocupe, no final, tudo volta ao vazio e a paz absoluta se restabelece. Tudo vai passar." Como um pai que vê uma criança chorando por uma bobagem, e sorri e a conforta, sabendo que aquele acontecimento mínimo, que causa tanta dor a uma criança, não terá nenhuma importância no futuro. Assim eu olhava os dramas humanos, através do olho da criação. "

Senti uma leveza sem igual depois dessa revelação, a leveza da existência humana e não-humana, e a existência nesse corpo orgânico que me faz aprender a viver nessa realidade.

Você já ouviu falar ou tem conhecimento da Kabbalah? Eu acredito que seria muito útil e te daria muitas reflexões ao juntar com essa sua experiência, não importa a religião que tenha. Eu passei a estudá-la e tudo fez sentido na minha visão da compreensão do universo.

Uma frase que ouvi uma vez que fui num observatório astronômico:
"Nós somos uma maneira de o cosmos se autoconhecer. Se somos feitos de poeira de estrelas sistematicamente organizada para formar seres dotados de consciência, então podemos dizer que somos o universo pensando sobre si próprio. estamos intimamente conectados com o cosmos."
(Carl Sagan)
 
Você já ouviu falar ou tem conhecimento da Kabbalah? Eu acredito que seria muito útil e te daria muitas reflexões ao juntar com essa sua experiência, não importa a religião que tenha. Eu passei a estudá-la e tudo fez sentido na minha visão da compreensão do universo.

Uma frase que ouvi uma vez que fui num observatório astronômico:
"Nós somos uma maneira de o cosmos se autoconhecer. Se somos feitos de poeira de estrelas sistematicamente organizada para formar seres dotados de consciência, então podemos dizer que somos o universo pensando sobre si próprio. estamos intimamente conectados com o cosmos."
(Carl Sagan)

Legal demais conhecer mais "parceiros de viagem no olho" kkkk !!! Conheço algo muito superficial sobre a Kabbalah, mas estou aberto a sugestões e indicações de livros!

Linda frase do Carl Sagan! Um cara que conseguia de modo magnífico unir ciência e poesia!

Muito obrigado pelos comentários! Fico muito feliz que o relato tenha encontrado ressonância!

Shalom!
 
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